![]() |
Para participar da enquete da página, clique no link no começo do texto |
POR FELIPE SILVEIRA
A página de humor e informação ÉÉÉguaaa postou recentemente que os cidadãos de Porto Alegre, capital do vizinho Rio Grande do Sul, podem pedir para os ônibus do transporte coletivo pararem a qualquer momento durante a madrugada, chamando atenção para o fato de que as linhas da madrugada mal existem em Joinville, e o que existe ainda será cortado. Aí alguém que cuida das redes sociais de uma das empresas de transporte público da cidade teve a brilhante ideia de responder o seguinte: “Que ótimo para Porto Alegre, necessário, para toda cidade que tem ‘vida noturna.’”
A imagem foi apagada, mas o tiro no pé já havia sido dado. A popular página fez outra postagem, agora com o print da resposta, que tem gerado bem mais repercussão e crítica do que o post original. Além disso, o fato nos leva à reflexão deste texto.
O comentário é uma amostra do modo de pensar da elite econômica sobre a cidade. Outro exemplo é a campanha do então candidato a prefeito Udo Döhler, que, perguntado sobre mobilidade urbana, prometeu fazer 300 quilômetros de asfalto. A promessa ainda não foi cumprida, mas, mesmo que fosse, o asfalto é mais uma questão de saúde pública do que de mobilidade. Nesse quesito, poderia ser chamada de anti-mobilidade.
Voltando ao caso das linhas da madrugada, conto minha experiência pessoal para ilustrar, mas tenho certeza que a maior parte dos leitores passou por isso ou conhece alguma história. Como fui universitário até pouco tempo atrás, e ainda convivo no meio, fui inúmeras vezes ao bar com os amigos e também a inúmeras festas. Infelizmente, como as aulas acabam às 22h30, aos amigos que dependiam do transporte público sempre precisavam sair cedo, ficando, no máximo, meia hora com a gente. Já nas festas, houve inúmeras situações de gente que não pode ir ou teve que se virar pra voltar por causa da falta de ônibus. São apenas dois exemplos de como faz falta o coletivo na madrugada.
Mas há outros exemplos mais graves. No tempo que morei no bairro Paranaguamirim, soube de vários casos de pessoas que não tinham como levar seus filhos ao hospital por causa da falta de ônibus. Sem contar nas vezes que as pessoas chegam cansadas de um dia de trabalho e perdem o último ônibus, sendo obrigadas a ir a pé, pagar um moto-táxi, arrumar uma carona...
Em suas mansões ou no conforto de seus carros de luxo importados, os ricaços que comandam a cidade e o transporte coletivo não fazem ideia do perrengue que passa o trabalhador e o estudante para simplesmente viver o cotidiano. Eles não sabem, ou fingem, que uma uma simples corrida de táxi pode custar 1/5 do salário de um trabalhador. Na cabeça desses caras, todo mundo vai ter carro, então a cidade deve ser feita para carros. Se não me engano, o prefeito disse algo parecido na campanha, quando falou nos 300 km de asfalto.
A lógica dos caras está tão invertida que eles não sabem que, se as pessoas não tiverem como chegar e sair dos lugares, as pessoas não vão aos lugares. Aí não tem como ter vida noturna mesmo. Se os lugares não têm clientes, é claro que eles vão fechar mais cedo.
A mesma lógica vale para as ciclovias. Algumas pessoas criticam o investimento em ciclovias, dizendo que há poucos ciclistas. É claro que apenas um número baixo de pessoas vai pedalar enquanto as condições forem tão ruins. A partir do momento que as ruas se tornarem mais seguras, mais gente vai pedalar e possivelmente mudar de vida com isso.
Nesta quarta-feira, 26 de agosto, vai rolar um Catracaço contra a extinção das linhas da madrugada. O ato é chamado pelo MPL, que há anos luta contra os malucos que comandam o transporte coletivo. Compareça, se manifeste contra a extinção das linhas e contra a exploração dos trabalhadores e estudantes.