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quinta-feira, 25 de julho de 2013

Dane-se a Toulon! Cadê o Amarildo?

POR CLÓVIS GRUNER 

Uma imagem e uma pergunta circularam intensamente pelas redes sociais nos últimos dias. A imagem é esta ao lado: a de um homem comum, 47 anos, casado, pai de seis filhos, pedreiro e morador da Rocinha, no Rio de Janeiro. No dia 14 de julho, ele foi levado por policiais para averiguações à sede da UPP – Unidade de Polícia Pacificadora – que ocupa a favela desde setembro de 2012. Não voltou para casa e está desaparecido desde então. “Cadê o Amarildo?” é a pergunta que vem sendo feita, repetidamente, desde a semana passada. Mas nem mesmo o humilde Papa Francisco, certamente interessado no destino de Amarildo, um pobre, conseguiu resposta.

O Comando de Polícia Pacificadora (CPP), disse que ele foi levado à base da unidade por se parecer com um suspeito procurado e que foi liberado quando se constatou não se tratar da mesma pessoa. À imprensa – ou ao menos aqueles jornalistas interessados no desaparecimento de seu marido –, Elizabeth Gomes afirmou não ter esperanças de encontrá-lo vivo e pede apenas o corpo para enterrá-lo. Nem o comando da UPP, nem a secretaria de Segurança Pública e muito menos o governador Sérgio Cabral parecem dispostos a lhe dar alguma satisfação.

O silêncio contrasta com a reação do governo quando a loja Toulon, no elitizado Leblon, foi atacada durante manifestação na noite de 17 de julho. Bastaram apenas seis horas para o governador convocar a cúpula da segurança pública e instituir uma bizarra Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo em Manifestações Públicas. A chacina na Favela da Maré, ocorrida no final de junho, não apenas não mereceu nenhuma comissão especial de investigação, como foi necessário mais de uma semana até que Cabral lamentasse a morte de dez pessoas, barbaramente assassinadas por soldados do BOPE, a tal “Tropa de Elite” da polícia guanabara.

O QUE RESTA DA DITADURA – É claro que a violência policial não é exclusividade do Rio de Janeiro. Pelo contrário, ela é prática recorrente, especialmente nas capitais e grandes cidades, onde não apenas o aparato militar é maior, mas também a demanda por sua presença mais ostensiva, uma coisa alimentando e justificando a outra. Por paradoxal que pareça, nossa crescente obsessão por proteção e segurança fez aumentar justamente a sensação de insegurança e o medo, estimulando ações defensivas que tornam tangíveis e conferem proximidade e credibilidade às ameaças de violência, mesmo às mais imaginadas e imaginárias.

O resultado é que tornamo-nos cada vez mais, e com o estímulo estratégico dos grandes meios de comunicação e de uma verdadeira "indústria do medo", reféns de uma política de segurança baseada, fundamentalmente, no aparato policial repressivo e na sua crescente necessidade de produzir sempre mais e mais inimigos. Historicamente, este inimigo foi personificado na figura do pobre, quase sempre negro. Um roteiro típico, em que se nomeia o outro a partir de certos atributos principalmente de classe e etnia – um processo definido por um sociólogo carioca, já nos anos de 1970, de marginalização da criminalidade e criminalização da marginalidade –, permitiu principalmente às camadas médias urbanas uma indiferença crônica sempre que o assunto era a violência policial. Especialmente se ela recaía sobre territórios e grupos não apenas periféricos – as favelas e os favelados, por exemplo –, mas considerados marginais e desviantes, como os oito menores assassinados na Candelária, os 111 presos massacrados no Carandiru ou as dez vítimas na chacina da Maré.

Nas últimas semanas, no entanto, algo mudou. A repressão policial recaiu também sobre jovens de classe média e jornalistas; profissionais foram ameaçados, virtual ou presencialmente, e pelo menos um sociólogo foi sequestrado por soldados depois de uma entrevista onde criticava as ações da PM carioca; nas mídias sociais pipocaram denúncias de infiltração de policiais à paisana nas manifestações, com o propósito de incitar a violência e justificar a repressão e prisão de manifestantes – tática, aliás, que remonta aos anos de exceção. Descobrimos, enfim, que o inimigo nem sempre precisa ser pobre e negro – embora ele continue sendo preferencialmente pobre e negro. 

A polícia militar brasileira é uma das instituições onde se percebe mais claramente os resquícios da ditadura e o profundo descompasso entre as políticas de segurança pública e o processo de democratização iniciado há quase três décadas. Discutir seu papel, sua estrutura e o lugar que deve ocupar na sociedade é uma tarefa urgente, porque não é tolerável a um país que pretende consolidar sua democracia conviver com a truculência institucionalizada. Precisamos de uma política de segurança que não se limite a investimentos vultosos e eleitoreiros no aparato militar e prisional – duas faces da mesma moeda –, e de uma polícia que não aja como se estivesse em uma guerra permanente. A rua não é um front e cidadãos não são inimigos a serem combatidos, independente da idade, posição social, etnia ou de seus antecedentes.

A desmilitarização da polícia, assunto para um próximo texto, é uma discussão não apenas necessária como urgente. Mas, neste momento, ainda mais urgente é saber onde está Amarildo. Embora, desconfie, todos nós saibamos a resposta.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

A verdadeira “Faixa de Gaza” catarinense


POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Nos últimos dias estamos acompanhando os ataques supostamente organizados aos ônibus e órgãos de segurança pública de algumas cidades de Santa Catarina. Em Florianópolis, Blumenau, Itajaí, Navegantes e Criciúma os ataques aconteceram e foram noticiados pela mídia. Parece que, para alguns setores, Santa Catarina está em pé de guerra e a polícia é a salvadora da pátria dos cidadãos. A mídia faz um alarde desnecessário e até incoerente, pois a verdadeira onda de ataques acontece o ano inteiro: as taxas de homicídios, roubos, seqüestros e outros crimes dos principais municípios do estado são preocupantes, e são invisíveis para os grandes setores da mídia.

A partir do momento em que um ônibus foi incendiado na região com o metro quadrado mais caro de SC, perceberam que tinha algum problema na segurança pública. Sério? Que novidade! Eu não sabia! E a violência que ocorre todos os dias na periferia de todas as cidades? E o “favelado”, “negro”, “pobre” que morre diariamente e é tratado apenas como uma citação nas páginas policiais? E as fugas dos presídios? Cadê o alarde para estes assuntos? Cadê os especialistas em segurança pública contratados para explicar estes casos, o comandante geral da PM, e o Governador Raimundo Colombo? Quantas mortes estes ataques supostamente organizados provocaram nos últimos dias? Ou o problema está no incêndio aos ônibus de grandes empresários catarinenses?

Não que eu apóie os ataques, muito pelo contrário. A questão que fica é o enfoque dado pela mídia a alguns casos. E o pior: a mídia vende que a omissa e pífia Secretaria de Segurança Pública parece trabalhar como nunca. Mas não é verdade. Se estivesse trabalhando corretamente, isto não aconteceria. Na verdade, nada de tão grave aconteceria! A história infelizmente se repete e a polícia nunca previne, nunca protege. Ela sempre é o “band-aid”, e a responsável por mais insegurança.

Para completar, os hospitais públicos administrados pela gestão Colombo estão sucateados e várias escolas estaduais estão interditadas. Pode parecer que não há conexão com os fatos desta última semana, mas a saúde pública também “mata” (que ironia!) muita gente por não dar um atendimento adequado e a educação é a principal responsável pela criminalidade, por não educar e não abrigar o jovem.
Por isso, por mais que a mídia tente esconder, e o poder público empurre para debaixo do tapete, a verdadeira “Faixa de Gaza” acontece diariamente diante de nossos olhos. As reportagens policiais estão aí como prova disso. É nojento ver plantões, matérias especiais, entrevistas com “Deus e o mundo” para explicar ataques que são uma conseqüência do que acontece há muito tempo por aqui. Nós vivemos um Estado de exceção todos os dias, mas ele só existe para alguns. Os mais ricos, o poder público e a mídia que o diga!

PS: Segundo dados de uma pesquisa do Ministério da Saúde, mais da metade das vítimas dos homicídios no Brasil, 53% delas, são pessoas na faixa etária entre 19 e 29, das quais mais de 75% são jovens negros, de baixa escolaridade, sendo a maioria do sexo masculino. O número de mortes de jovens negros passou de 14.055 em 2000 para 19.255 em 2010 – um crescimento de 37%. Isto a mídia divulga? Faz alarde? Poder público explica?