quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Secos e molhados.


Portugal na moda... até para os vereadores de Joinville



POR JOSÉ ANTÓNIO CASO


Portugal está na moda. É uma expressão que temos ouvido ao longo dos últimos anos aqui deste lado do Atlântico. E não é para menos. Apenas na última década a cidade de Lisboa, por exemplo, recebeu mais de 37 milhões de turistas de todo o mundo. O Porto não fica atrás. O charme deste pedacinho de terra à beira mar plantado é tão intenso que até os vereadores de Joinville estão seduzidos.

Segundo a imprensa joinvilense, no momento em que escrevo este texto, os vereadores Levi Rioschi e James Schroeder devem estar em Oeiras, cidade próxima a Lisboa, a participar de um seminário. Também entrou em debate uma viagem dos vereadores João Carlos Gonçalves e Rodrigo Fachini, em outubro, com destino ao Porto.

Para que fique claro. Sou totalmente a favor das viagens de integrantes do poder público, internas ou ao exterior. É um processo conhecido no plano empresarial como benchmarking: apreender as boas práticas de outros atores públicos (já escrevi sobre isso aqui e no AN). O problema, no entanto, é que a tradição brasileira aponta para os famosos aviõezinhos da alegria.

Não estou a dizer que seja o caso, mas apenas a relembrar o clichê. Aliás, sob esse aspecto seria interessante a Câmara de Vereadores de Joinville divulgar melhor os motivos das viagens. Há uma tendência dos eleitores em achar que as viagens dos vereadores são apenas farra com o dinheiro do erário. E nem sempre é assim.

Neste momento, Levi Rioschi e James Schroeder estariam a participar de um seminário binacional sobre sustentabilidade urbana e responsabilidade social. Faz sentido, num primeiro olhar. É a Semana Europeia da Mobilidade e o 16º Dia Europeu Sem Carros e a cidade tem extensa programação nesse plano. Fiquei curioso e fui pesquisar.

Não consegui encontrar notícias na imprensa portuguesa sobre o evento, apesar do apoio da Câmara de Oeiras. Uma busca mais demorada permitiu perceber que o seminário é em Portugal, mas organizado por uma organização brasileira, chamada Instituto Ambiental Biosfera. Por que Lisboa? Não consegui encontrar informações a respeito, mas admito que possa ter sido falha da pesquisa.

O outro evento, do qual devem participar os vereadores Rodrigo Fachini e João Carlos Gonçalves, cujos nomes constam no programa, também terá a presença de outros representantes da região (link aqui). Denominado "Tributo à Língua Portuguesa", o encontro propõe a "promoção de um intercâmbio turístico, cultural e empresarial entre o Brasil e Portugal, como o foco nas cidades de Salvador e Joinvile (sic)".

É possível tirar algumas conclusões sobre os dois eventos (os portugueses querem é vender os seus vinhos e destinos turísticos). Mas que seja a comunidade a exigir que os vereadores - e também os representantes do executivo - apresentem os resultados das viagens, de forma concreta e com números. Ou, melhor ainda, que sejam eles a apresentar, de forma proativa, os resultados para o turismo, a cultura e a economia da cidade.

Por uma questão de transparência, para que as pessoas saibam se o dinheiro está a ser bem ou mal gasto.

É a dança da chuva.

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

...os cães ladram.


Quem é Ivandro de Souza?

POR VANDERSON SOARES



vanderson.vsoares@gmail.com


Dias atrás publiquei um texto sobre os possíveis candidatos a prefeito da nossa cidade. Afirmei, na ocasião, que Ivandro de Souza (PSDB) estaria ali apenas segurando a vaga enquanto o verdadeiro candidato se apresentaria mais pra frente, que poderia ser o Paulo Bauer ou o nosso velho conhecido Tebaldi. 

Não é segredo para ninguém que sou filiado ao PSDB (mesmo não sendo tão participante quanto gostaria), e mesmo nesta condição, não conhecia muito bem Ivandro de Souza. Passei a conhecê-lo melhor nos últimos tempos, em que tive a oportunidade de ouvir alguns discursos, algumas palestras e devo dizer que ele é quem realmente deveria ser o candidato a prefeito pelo PSDB. 

Digo isto, pois alguns pontos de conversa me chamaram atenção nele. Antes de conhecê-lo, sabia apenas que era empresário e, pela experiência que estamos tendo com o Sr. Udo Dohler, estava até desiludido, pensando que era apenas mais um empresário a vender a imagem de gestor milagreiro.

Pois bem, Ivandro de Souza é um pouco diferente. É empresário e tem uma empresa forte, bem conceituada e com bom nome no mercado joinvilense. A novidade começa, e é nesse ponto a diferença nevrálgica com o Udo, é sua sensibilidade. Em dado momento de um discurso ele declarou a seguinte frase:

“Hoje quando se pergunta sobre qualquer área ao Prefeito ele repete incansavelmente ‘que as contas estão equilibradas, estamos com o caixa em dia**’, mas qual pai de família não entraria no cheque especial, não deixaria de comprar algo, para pagar um tratamento de saúde para o filho? Este prefeito não pensa nisso. Pensa apenas na saúde financeira, que deve ser observada e levada em conta, mas jamais sobrepor-se às necessidades da população como saúde, educação, etc...”*

Udo Dohler seria um excelente prefeito se tivesse sensibilidade aliada ao seu conhecimento sobre gestão. A diferença crucial da gestão privada da gestão pública consiste em que uma visa lucros financeiros e a outra lucros de qualidade de vida da população.  E Ivandro mostrou que entende de ambos.

Outro ponto muito interessante que Ivandro falou, em algumas ocasiões, foi sobre suas ideias de como desafogar o serviço público e diminuir os prazos das secretarias na execução dos expedientes da atual Secretaria do Meio Ambiente no que diz respeito aos Alvarás de Construção, Certificados de Conclusão de Obras, etc.

Comentou da possibilidade de certificar e auditar escritórios técnicos (engenharia/ arquitetura) de modo que a Secretaria apenas fiscalize pontos cruciais e auditem os escritórios.  São ideias que ainda podem ser aperfeiçoadas e desafogar, em muito, o trabalho desta secretaria. Citou outras secretarias nesta palestra que ouvi, mas recordo-me bem apenas desta.

Deste modo, confesso que Ivandro de Souza ganhou minha admiração e respeito mostrando dominar a técnica, ter sensibilidade e ainda por cima muito bom humor (outra característica que falta ao atual prefeito). 

*transcrição do que o autor ouviu na referida palestra.
** Essas falas do prefeito foram antes do Secretário Corona, afirmar que a prefeitura está pagando com atraso de 40 dias e que vai piorar ainda mais. Comenta-se hoje que o Hospital São José passa por dificuldades com falta de medicamentos e materiais básicos porque os fornecedores não suportam mais o atraso.

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Eu violento / Eu violência


POR FELIPE CARDOSO

Constantemente recebo a opinião de pessoas próximas a mim e em alguns comentários anônimos dizendo que sou uma pessoa agressiva. Esse estereótipo é direcionado para qualquer pessoa negra, para qualquer mulher ou LGBT que lute pelos seus direitos.

Quem está na luta sabe das dificuldades que enfrentamos para conseguirmos que nos ouçam, diante tantas violências que nos perseguem. Violências físicas e psicológicas que nos são destinadas, que nos machucam e matam, diariamente.

Temos que aguentar todo tipo de opressão calado, mas quando nos cansamos e decidimos reivindicar, somos taxados de violentos e extremistas. Tudo isso por apenas mostrar as violências que nos atingem. É notável que a sociedade brasileira, racista e patriarcal, não está acostumada (e parece não querer se acostumar) a dar voz as “minorias”.

Com o medo de perder os privilégios, principalmente o financeiro, os detentores do poder usam seus veículos de massa para propagar os estereótipos negativos dos grupos que lutam. Dividindo, ainda mais, os trabalhadores, que também recebem as violências diárias, mas que muitos não percebem.

São várias as violências que a população negra recebe e que, talvez, boa parte da imprensa não queira divulgar de uma só vez, para não gerar uma grande revolta na população. Procurarei listar algumas das várias opressões que somos reféns.

Mulheres negras gestantes enfrentam a violência obstétrica. Sem contar as que preferem abortar, mas por conta da ilegalidade, acabam morrendo. A maioria são mulheres negras.

Jovens negros são impedidos de usufruir o direito de ir e vir por conta da polícia, que tem em sua tradição a sanha de perseguir jovens com o perfil conhecido: negros e pardos.

Nem nos ambientes acadêmicos, negros e negras estão imunes de sofrerem com a repressão policial ou com as agressões dos outros acadêmicos. Há uma enorme resistência a mudança, a pluralidade, ao respeito a diferença nas universidades brasileiras.

A juventude negra brasileira enfrenta um genocídio. Milhares de jovens negros, em sua maioria, homens, pobres, estão sendo mortos pela polícia que se utiliza dos autos de resistência para assassinar.

“56 mil pessoas foram assassinadas em solo brasileiro, em 2012, sendo 30 mil jovens e, entre eles, 77% negros”.

Segundo os dados do relatório “Crianças Fora da Escola 2012”, do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em relação ao trabalho infantil, a maioria é de crianças e adolescentes negros e do sexo masculino das zonas urbanas, vindas das camadas mais pobres da população.

O estudo aponta que mais de um milhão de crianças e adolescentes, entre seis e 14 anos, encontram-se trabalhando no Brasil, o que representa 7,8% do total desse público no país. Entre as crianças brancas, a taxa é de 34,60% (377.167). Entre as negras, de 64,78% (706.160). Nessa faixa etária, o trabalho infantil é uma causa importante do abandono escolar, e aqueles que exercem alguma atividade profissional em paralelo aos estudos também estão em situação de risco”.

Precisamos de uma lei para obrigar escolas e professores a estudar e ensinar a cultura africana e afro-brasileira. Mesmo assim, a Lei 10.639 não é cumprida, deixando milhares de jovens negros sem ter o contato com sua ancestralidade, sem conhecer a sua história e cultura, recebendo, apenas, uma visão eurocêntrica, somada a visão da mídia, do mundo da moda e dos detentores do capital. O que pode gerar um desinteresse e, principalmente, uma falta de identidade, tendo como consequência a dificuldade no aprendizado e a evasão escolar.

A taxa de analfabetismo entre os negros (11,5) é mais de duas vezes maior que entre os brancos (5,2)“.

Vendo desde cedo o padrão de beleza e uma religiosidade eurocêntrica pré-estabelecida e propagada como certa e civilizada, tendo os seus traços e a sua cultura ridicularizadosperseguidos, muitos negros enfrentam a depressão, que trazem consequências graves para sua vida e de seus familiares, como a dependência química, por exemplo.

No mercado de trabalho, os menores salários são das mulheres negras, que recebem um pouco menos do que os homens negros. Fora isso, os negros são a maioria dos desempregados no Brasil. A famosa desigualdade social tem relação com a desigualdade racial. Segundo dados do estudo do “Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça”, do Ipea, enquanto o desemprego atinge 5,3% dos homens brancos, o índice chega a 6,6% entre os homens negros. Já entre as mulheres, a diferença aumenta. Entre as mulheres brancas, o desemprego é de 9,2% enquanto entre as mulheres negras, ultrapassa os 12%. Na pirâmide social, as mulheres negras estão na base, suportando todas as opressões, tanto as delas, quanto as dos filhos e companheiros.

De acordo com a pesquisa, realizada em 2014, pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), intitulado “A Inserção dos Negros no Mercado de Trabalho”, os trabalhadores negros ocupam, em geral, cargos de menor qualificação e, consequentemente, têm salários com até 57,3% de diferença, sendo menos valorizados do que os não negros.

Fora tudo isso, ainda temos que conviver com a hipocrisia de ver os brasileiros se revoltando com o descaso da Europa com os imigrantes sírios, ao mesmo tempo em que fazem o mesmo com imigrantes haitianos e senegaleses.

Diante de tudo o que foi apresentado, diante do cotidiano violento que enfrentamos, tenho total certeza que os meus discursos e meus textos não são violentos. Não chegam nem aos pés das atrocidades cometidas pelo Estado, financiado por banqueiros, gerando lucro para milhares de empresários.

Violento é o Estado genocida. Violento é o racismo. Violento é a hipocrisia. Violento é a desigualdade. Violento é o capitalismo.

Para encerrar, o vídeo da apresentação da Porsha O., de 2014, que contempla muito bem o que foi apresentado aqui.