quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Todo verão é a mesma história

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

O ano de 2014 acabou, as festas de fim de ano também. A cidade aos poucos vai ganhando a sua forma deprimente de sempre (um ciclista, menino de 8 anos, já morreu em 2015 por causa da insegurança que assola a mobilidade joinvilense). Mas é necessário fazer um registro do que aconteceu nas praias da região neste período festivo, principalmente pelo lado urbanístico da coisa, pois as cidades litorâneas são o escárnio da qualidade de vida e da urbanidade.

A sazonalidade do veraneio brasileiro causa grandes impactos para as cidades, as quais não possuem uma estrutura adequada para seus moradores fixos e nem para os turistas. Todos os problemas já existentes se multiplicam exponencialmente devido ao acúmulo de gente no mesmo ambiente. E quando não há uma organização mínima, a falta de respeito e de alteridade imperam, graças ao ser humano dotado de suprema inteligência.

O que mais presenciei foram desrespeitos a tudo aquilo que defendemos durante os outros meses de dano, sobretudo aos direitos dos ciclistas e aos pedestres. A quantidade de carros amontoados em cima das calçadas foi absurda, só porque era o lugar mais perto da praia. Faixa de pedestres, no alto verão, tornou-se apenas um acessório que ilustra as ruas. As ciclovias (ou ciclocoisas, dependendo do lugar, quando existem) foram sistematicamente desrespeitadas e fiscalização alguma surgia para combater a infração. O resultado todos já sabemos: vidas humanas colocadas em risco.

É incrível como o brasileiro é um analfabeto urbanístico (usando o termo empregado pela professora Ermínia Maricato) e as gestões municipais são omissas. E mais assombroso é como nas praias, durante o verão, isso se exacerba. Vira uma terra sem lei, onde ser "espertinho" é sempre o melhor e danem-se os outros, pois ninguém irá fiscalizar. Infelizmente é algo repetitivo. Você vai para a praia fim de ano e vai encontrar este cenário descrito.

Ou as cidades litorâneas mudam seu pensamento, ou nosso tipo de turismo ficará saturado em pouco tempo. O mar, por si só, não garante qualidade de vida. Ter lindas praias não segura o turista todos os anos, pois o meio em que ele convive está piorando e a qualidade de vida é tão ruim quanto os grandes centros urbanos brasileiros. A capacidade de inovar precisa vir destas cidades litorâneas, principalmente das mais desejadas pelo setor imobiliário, graças à aplicação dos instrumentos redistributivos do Estatuto da Cidade. Com transporte público eficiente, mobilidade com segurança para todos, organização fundiária e sanitária as cidades se tornarão minimamente melhores do que são hoje e trarão muito mais renda pelo turismo (e durante o ano todo, sem depender somente do veraneio).


terça-feira, 6 de janeiro de 2015

A Revolução dos Bichos- Parte I


Mirian França, mais uma vítima do racismo


POR FELIPE CARDOSO


Mulher, preta, pobre, carioca e universitária. Mirian França, 31, decidiu passar suas férias no Ceará. Longe da mãe e dos amigos, a jovem, que faz doutorado na UFRJ, onde se formou em Farmácia e, por não ter renda, morava desde os 20 anos, vive um pesadelo.
Acusada pelo assassinato da italiana Gaia Barbara Molinari, a acadêmica negra que curtia as suas férias está presa desde o dia 26 de dezembro, incomunicável e sem o direito de defesa. 

Assim como tantos outros milhares de casos, quando o suspeito é pobre ou preto a imprensa trata logo de mostrar o rosto do indivíduo e invadir sua privacidade, fazendo seu julgamento antes mesmo do judiciário que, ultimamente, vem sendo muito influenciado pela opinião pública. Como não bastasse a imprensa brasileira dar seu espetáculo com a falta de profissionalismo, Mirian sofre com o racismo e a podridão da imprensa italiana que, desde o acontecimento, tem atacado a jovem brasileira.

O crime ocorreu em Jijoca de Jericoacara, área conhecida por ser preferida da máfia italiana e pela morte e estupros de turistas que visitam a região. A brutalidade com que a jovem foi assassinada indica que o crime foi cometido por um homem muito forte ou, até mesmo, por dois homens, e que houve luta corporal. Mas o interessante é que nada disso foi dito na “grande mídia”, nem a polícia do Ceará apresentou fatos, como marcas no corpo, por exemplo, que mostrem que Mirian tenha alguma participação no crime. Também não foi dito que querem cremar o corpo de Gaia sem que o caso seja concluído.

Enquanto mais um circo é armado pela imprensa brasileira, mais um corpo negro é exposto, explorado e humilhado. Enquanto eles aumentam a audiência e a tiragem dos jornais, mais um corpo negro sofre com a injustiça. Isso já se normatizou no país, por isso, já não causa estranheza e os brasileiros aceitam como verdade.

O jornalismo sensacionalista e mau caráter se torna, a cada dia, o órgão de justiça mais importante do país. O quarto poder realmente existe: a mídia. E Elza Soares tinha razão: “A carne mais barata do mercado é a carne negra... que vai de graça para o presídio”.

O que está acontecendo com Mirian França, aconteceu com Claudia, morta e arrastada por policiais. Aconteceu com o dançarino DG, assassinado por policiais. Aconteceu com Amarildo, assassinado por policiais que até hoje não revelaram o paradeiro do corpo do ajudante de pedreiro. Aconteceu com o ator Vinícius Romão de Souza, preso por engano pela polícia.

Aconteceu e acontece com milhares de negros diariamente e ninguém fala nada. Todos acreditam na versão da polícia e dessa imprensa golpista. Por isso volto a repetir: a nossa voz é importante e garantirá a nossa liberdade.

Devemos lutar por justiça para que esses casos cessem. Esses safados querem nos manter amarrados, acuados e sem voz.

Não somos suspeitos. Não somos criminosos.

Por que não ficam comovidos com a morte de milhares de jovens negros anualmente? Por que sentem pena da morte da italiana e não sentem pena da jovem negra injustiçada?
Se fosse uma mulher branca, estudante, fazendo doutorado em uma das maiores faculdades do país, dificilmente estaria encarcerada. Mas é uma mulher negra e pobre.

Seu pensamento escravista vai ser desconstruído por bem ou por mal.
A luta de classes não começou no governo petista... Ela sempre existiu.
Liberdade para os negros injustiçados. Liberdade para as favelas oprimidas. Liberdade para Mirian França. 

Verdadeira liberdade a todos os negros e negras do mundo!


segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Feliz ano velho!


39 ministros - só falta um para empatar com o Gabão

POR JORDI CASTAN


Tem gente demais ou competência de menos

Em todos os níveis da política opta-se pela maior quantidade, em lugar de priorizar a maior competência. O resultado é gente demais para eficiência de menos. Administrar uma casa, uma família, inclusive uma pequena empresa é mais complexo do que pode parecer. Os recursos são limitados e é difícil atender todos os interesses a contento.

Administrar uma cidade, um estado ou um país é muito mais complexo. A estrutura necessária para superar este desafio muda caso a caso. No Japão, por exemplo, o primeiro ministro Shinzo Abe consegue reunir todo o gabinete formado por 8 ministros em quaisquer sala do palácio de governo. O presidente Barack Obama, precisaria convocar só a 15 secretários de estado, equivalente norte-americano ao cargo de ministro. A chanceler alemã Angela Merkel precisa de 16 ministros para governar o país. Só o Gabão com 40 ministros supera os 39 ministros da Presidente Dilma.

No Brasil são necessários 39 ministros para preencher os 24 ministérios e as 10 secretarias da presidência e cinco  órgãos com status de ministério, para poder acomodar todos os partidos aliados e atender todos os acordos feitos durante a campanha eleitoral, alguns ministérios são tão exóticos como o da Pesca, das Cidades, do Esporte ou os dois ministérios um da Agricultura e outro do Desenvolvimento Agrário. Ou ainda as secretarias de políticas de promoção da igualdade racial ou a das relações institucionais. O presidente da Câmara de Gestão, criada pelo Planalto, o empresário Jorge Gerdau, acha que não se pode trabalhar com 23,5 mil assessores de confiança na estrutura política. E tem razão. Se cada um dos 39 ministros fizesse um breve relato da sua pasta, coisa de 15 minutos, tempo improvável em se tratando de gente em geral bastante loquaz e prolixa, seria preciso uma reunião ministerial de no mínimo 9 horas e meia.

E em Joinville? 
O problema do excesso de cargos e da falta de competência não é só federal. Em Joinville, o prefeito Udo Dohler, conta com uma equipe de 14 secretários centrais, 8 subprefeitos, 10 presidentes de fundações e companhias. Sem contar miríades de auxiliares e achegados, uma equipe de 32 homens e mulheres comprometidos com o único objetivo de fazer o melhor por Joinville. Caso tomasse a iniciativa de promover uma reunião de trabalho do primeiro escalão, não conseguiria que durasse menos de 8 horas se cada um fizesse um relato bem sintético do que anda ou não fazendo. Dificilmente administraria una empresa privada com uma equipe deste tamanho.

Reduzir o número de secretarias e consequentemente de cargos comissionados para passar a contar com uma equipe mais enxuta e capaz envolveria um enorme custo político que o prefeito já não tem. Por outro lado enfrentaria a resistência dos próprios vereadores, tanto os da situação, como inclusive os da oposição, para reduzir o número de cargos. Situação que escancara tanto a promíscua relação entre Executivo e Legislativo, como uma atitude irresponsável na busca e preservação de mais vagas para afilhados políticos e apaniguados próximos. É algo que deve ser visto como uma atitude estranha é, a todas as luzes, prejudicial aos interesses maiores da cidade a que também eles deveriam servir. Neste aspecto tanto Joinville, como Florianópolis, como Brasília seguem o mesmo mau exemplo.