Há muito tempo eu não via uma história tão bizarra como a publicada na Folha de S. Paulo em 31 de janeiro. O jornal informava que a prefeitura de São Francisco do Sul está reivindicando compensação financeira do governo da Alemanha a título de reparação de guerra. Isso porque, alegam os advogados, o canal do Linguado foi fechado em 1935 para que o governo nazista transportasse material bélico para Joinville. Como essa obra causou danos ambientais, a cidade quer ser recompensada.
A advogada Maristela Basso, que é professora de direito da Universidade de São Paulo e coordena o processo, diz que este material bélico chegava ao porto de São Francisco em navios e submarinos da Alemanha, era finalizado na região e então enviado para outros destinos. “Queremos que São Francisco do Sul seja incluída no rol das reparações de guerra da Alemanha”, frisou Basso para a repórter da Folha. O prefeito Renato Lobo explicou que quer usar este dinheiro da reparação para financiar estudos sobre impactos ambientais da possível reabertura do canal.
Esta é mais um fato fantástico envolvendo São Francisco. No passado já ocorreram outros acontecimentos extraordinários, comprovados, tais como a do capitão francês Binot Gonneville, a do explorador espanhol Cabeza de Vaca e do médico francês Benoit Mure, fundador do Falanstério do Saí. Agora surge esta história, ainda não documentada, das garras do governo nazista às margens da baía da Babitonga. O governo alemão já se manifestou, através do consulado geral em São Paulo, dizendo que o aterramento “foi uma decisão do governo brasileiro, tomada antes da Segunda Guerra”, portanto sem nenhuma responsabilidade do governo alemão.
É verdade que os municípios brasileiros passam por dificuldades financeiras por conta da crise, mas existem maneiras mais práticas de solucionar estas carências. Apelar por uma ajuda da chanceler Angela Merkel chega a ser ridículo, podendo ser motivo de chacota. A abertura do canal do Linguado é uma necessidade e há cerca de 20 anos se discute isso mas a justiça não chega a um acordo. Quem perde é a população, pois a baía da Babitonga está sendo assoreada e dentro de pouco tempo ficará imprópria para a navegação.
Oportunidades surgem e os administradores deixam escapar. Há cerca de dez anos o médico Carlos Alberto Fiorot, então presidente da Associação Médica Homeopática Brasileira, se deslocou de Vitória (ES) até São Francisco do Sul para um encontro agendado com o prefeito Luiz Zera. O chefe do Executivo não pode atender e a conversa foi com um dos secretários. Fiorot propunha a criação de um Museu da Homeopatia na Vila da Glória, no local onde Benoit Mure criou a primeira escola homeopática brasileira. Diante do desinteresse da prefeitura, o assunto não prosperou.
O escritor Victor Hugo dizia que uma boa ideia no tempo certo tende a ser vitoriosa. Mas, no caso desta reparação de guerra não é uma ideia genial, mas apenas um jogo de marketing em busca de dividendos econômicos. Só que a história está tão mal contada que pode deixar a cidade envergonhada.
![]() |
Ponte no Canal do Linguado foi substituída por aterro e pode gerar indenização. |