domingo, 11 de junho de 2023

A “esquerda” brasileira e a nostalgia da URSS

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

A invasão da Ucrânia trouxe à discussão um sentimento que andava meio adormecido: a nostalgia da URSS. É um sentimento compreensível quando estamos a falar de pessoas que viveram nos antigos países soviéticos. Mas vira um elefante atrás da orelha quando esse sentimento afeta uma certa “esquerda” brasileira. Afinal, é possível sentir nostalgia de uma coisa que não se viveu?

É uma matriosca de estupidezes. Há brasileiros a acreditar que o autocrata Putin é comunista. Tolice. Desde que assumiu, ele implementou políticas econômicas liberais que promovem o capitalismo de Estado e a consolidação do poder estatal. O surgimento de uma casta de oligarcas russos, que açambarca fortunas ultrajantes, é a demonstração de que o regime pode ser tudo menos comunista.

Há também quem o considere herdeiro da antiga URSS. Mas até uma criança de seis anos sabe que as ações de política externa de Putin têm muito de imperialismo. É só lembrar a segunda guerra da Chechênia, o conflito da Ossétia do Sul, a anexação da Crimeia ou mesmo guerra na Ucrânia. Tudo isso sem falar na intervenção militar na Síria, que ainda persiste.

Enfim, essa nostalgia é apenas um samba do crioulo doido (reproduzindo expressão da música de Sérgio Porto). É preciso olhar para a etimologia da palavra. Nostalgia vem do grego “nóstos” (reencontro) e “álgos” (dor, sofrimento). Não há reencontro ou qualquer experiência pessoal de sofrimento. E ter saudades de um regime que não se viveu é apenas esquizofrenia ideológica.

É a dança da chuva.

terça-feira, 6 de junho de 2023

O Efeito Flynn Reverso explica a burrice dos bolsonaristas


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
 
Como foi que o Brasil elegeu e suportou, por quatro anos, um presidente que, em português suave, era uma perfeita mula? Pior. Como se explica que, ainda hoje, haja gente a seguir esse muar? É possível encontrar muitas explicações e uma delas pode ser aquilo que muita gente chama “Efeito Flynn Reverso”. O que é?
Tendo estudos de QI como referência, alguns resultados sugerem que, em certos lugares, as pontuações começaram a diminuir nas últimas décadas. Ou seja, as pessoas estariam ficando mais burras do que as gerações anteriores. A teoria não tem consenso, mas não resisto a dizer que é uma explicação bastante razoável para o bolsonarismo.
O Efeito Flynn, uma homenagem ao psicólogo James Flynn, fala do fenômeno observado em muitos países de aumento constante nos resultados de testes de QI, ao longo dos tempos. Ou seja, havia um aumento na capacidade cognitiva da população. O efeito foi observado desde a década de 1930 até quase ao final do século XX.
O chamado “Efeito Flynn Reverso”, uma ideia controversa, defende que alguns estudos apontam para a diminuição das pontuações de QI em alguns países. Isso quer dizer que as pessoas estariam a ficar mais burras. Mas é importante destacar que esses estudos são limitados a certas populações ou contextos específicos.
Existem várias teorias e hipóteses propostas para explicar o possível “Efeito Flynn Reverso”, como mudanças ambientais, fatores educacionais, impacto da tecnologia, desnutrição ou até mesmo a seleção genética. É claro que é preciso mais pesquisas para saber se esse efeito é real. E, caso seja, quais são as suas causas e implicações.
Sem tomar lado sobre a validade do “Efeito Flynn Reverso”, acho que o bolsonarismo e os idiotas que seguem Bolsonaro de forma quase canina podiam ser alvo desse estudo. Só a queda do quociente de inteligência explica que, por exemplo, 76,6% dos eleitores de Joinville tenham votado nele. É toupeirice demais para ser verdade.
É a dança da chuva.

Joinville é uma cidade que deu 268.079 votos a Bolsonaro e 71.140 ao atual deputado Zé Coiso.






segunda-feira, 5 de junho de 2023

E o PT, hein? O whataboutism é a tática dos malas



POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O whataboutism é uma das coisas mais irritantes nestes tempos de redes sociais. E o pior é ser uma tática usada tanto pelo pessoal de esquerda quanto de direita (porque, afinal, a chatice não tem lado).

Não sabe o que é? Ora, o whataboutism é uma técnica de “argumentação” usada para desviar a atenção de um assunto em discussão. Ou seja, a ideia é mudar o foco da conversa, tentando apontar uma hipocrisia do interlocutor.

Como funciona? Através da introdução de um contra-argumento relacionado a outro tópico, com o objetivo de descreditar ou desviar a crítica original. Para trazer o tema mais para perto da nossa realidade, podemos lembrar o célebre “e o PT?”.

A expressão tornou-se um meme popular no Brasil durante o período eleitoral de 2018 e ainda persiste. Os opositores do Partido dos Trabalhadores (PT) respondiam a críticas usando essa caricatura de argumento.

O problema é maior. Se o “e o PT?” é uma expressão ligada à direita brasileira, também a esquerda tem a sua quota-parte na difusão do whataboutism. É só ver o caso da guerra na Ucrânia. Você diz:

- A Rússia de Putin é o estado invasor.

Ao que os defensores do ditador russo respondem:

- E a OTAN, hein?

Aliás, isso remete para a etimologia da palavra. Ao contrário do que muita gente pensa, o termo é antigo e não surgiu com as redes sociais. Apenas foi intensificado. O whataboutism surgiu durante a Guerra Fria como uma crítica aos argumentos da União Soviética que consistiam em responder às acusações ocidentais com perguntas como “e sobre...?" ou “e quanto a...?".

O fato é que essa tática tem o poder de matar o debate logo à partida. É a ferramenta dos intelectualmente despreparados. O mais trágico é que, pela baixa qualidade de pensamento nas redes sociais, é impossível escapar ao whataboutism.

É a dança da chuva.




sábado, 3 de junho de 2023

Idolatrado pela esquerda brasileira, Putin persegue o público LGBTQIA+

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Há quem defenda regimes autocráticos, como é o caso de muitos brasileiros que estão do lado de Vladimir Putin, na invasão da Ucrânia. É sempre um risco estar do lado de um proto-ditador, porque os ditaduras nada trazem de positivo no plano das liberdades e dos direitos civis.

É interessante, por exemplo, que esses brasileiros apoiem um regime alicerçado, entre outras coisas, na negação e criminialização dos públicos LGBTQIA+. A liderança de Vladimir Putin tem sido problemática. Nos últimos anos, houve um aumento significativo da discriminação e da repressão contra a comunidade LGBTQIA+ no país.

Em 2013, o governo russo aprovou uma lei conhecida como "lei da propaganda gay" ou "lei da propaganda homossexual", que proíbe a promoção de "relações sexuais não tradicionais" para menores de idade. Essa lei tem sido amplamente utilizada para restringir a liberdade de expressão e os direitos dos indivíduos LGBTQIA+.

A lei tem sido o vetor para censurar eventos públicos, paradas do orgulho e para justificar ações contra ativistas e defensores dos direitos LGBTQIA+. Além disso, tem havido relatos de violência, agressões e discriminação, muitas vezes sem a devida proteção e punição das autoridades. Isso cria um ambiente hostil e perigoso para a comunidade LGBTQIA+ no país.

As restrições e a discriminação também afetam a liberdade de expressão e a disponibilidade de recursos e apoio para a comunidade LGBTQIA+. Organizações e grupos de direitos civis enfrentam dificuldades para operar e são frequentemente alvo de assédio por parte das autoridades.

No geral, a situação dos públicos LGBTQIA+ na Rússia sob a liderança de Vladimir Putin é preocupante, com uma crescente onda de discriminação e repressão. No entanto, é importante notar que existem indivíduos e organizações dentro e fora da Rússia que continuam lutando pelos direitos e pela igualdade da comunidade LGBTQIA+.

Enquanto isso, no Brasil tem gente que idolatra Putin. Porque, afinal, ditadura no fiofó dos outros é refresco.

É a dança da chuva.



sexta-feira, 2 de junho de 2023

Plástico no meio ambiente: você não ouviu falar, mas há gente a discutir

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

A mídia não deu muita importância, mas nos últimos dias a cidade de Paris recebeu representantes de 175 países para deliberar sobre a redução da produção de plásticos no planeta. As metas, lançadas pelas Nações Unidas, são ambiciosas: reduzir em 80% a produção de plástico até 2040. É difícil que isso venha a acontecer, uma vez que a proposta contraria os interesses de grupos econômicos, mas o fato de haver uma discussão sobre o tema é por si muito relevante.

É importante a pretensão de lançar um tratado global para atuar contra a poluição causada pelo plástico. Mas qual é a razão para a preocupação? Nunca é demais lembrar que o plástico, pela sua degradação lenta,  apresenta enormer problemas ambientais. A começar pela poluição dos oceanos, uma vez que o descarte inadequado de plásticos, especialmente de produtos de uso único, resulta em uma grande quantidade de resíduos plásticos nos oceanos.

Esses resíduos causam danos à vida marinha, como tartarugas, pássaros, peixes e mamíferos marinhos, que podem ficar emaranhados em fragmentos de plástico ou ingerir pedaços de plástico, levando à asfixia, ferimentos e morte. Enfim, o impacto na vida selvagem é sério, uma vez que ingestão de plástico por animais terrestres também representa uma ameaça para a fauna selvagem. Muitos animais confundem o plástico com alimentos e acabam sofrendo danos internos ou morrendo devido à obstrução do trato digestivo ou à liberação de substâncias tóxicas dos plásticos.

Mas talvez um dos maiores problemas sejam os microplásticos, fragmentos menores que cinco milímetros encontrados em diversos produtos. Os microplásticos podem entrar na cadeia alimentar humana e animal, representando riscos para a saúde. As pessoas não estão atentas, mas é possível que os microplásticos, pela dificuldade de serem identificados, já façam parte da dieta e muita gente avisada e desavisada.

Pouca gente dá atenção. Mas o fato é que a produção anual de plástico duplicou nas duas últimas décadas, atingindo um nível de 460 milhões de toneladas. A projeção é de que poderá triplicar até 2060. O problema é complexo, mas está a passar batido em muitas regiões do planeta. Enquanto nos países desenvolvidos há um maior controle, há outros onde o uso de plástico ainda não tem sido enfrentado de frente.

Para dar um exemplo, na União Europeia há anos estão a ser implementadas regras severas para reduzir o consumo de plástico descartável, incluindo a proibição de produtos de plástico de uso único, como talheres, pratos, canudos e cotonetes. Além disso, há metas ambiciosas de reciclagem e estão incentivando a transição para alternativas mais sustentáveis.

Mas ainda é pouco. Muito pouco. E em poucos lugares.

É a dança da chuva.

Foto: Magda Ehlers