segunda-feira, 20 de julho de 2015

O mito da gestão ruiu












O tema é Udo Dohler. E para não ficar só nas críticas, vamos falar do que funciona: o controle da mídia, o patrulhamento das redes sociais e o uso de recursos públicos para manter a imprensa amordaçada está funcionando bastante bem. Mas será suficiente? Nos dias de hoje não é possível tapar o sol com uma peneira. As redes sociais são um espaço de participação democrática difícil de calar. Não por acaso que jornais impressos estão perdendo espaço para quem busca estar informado e hoje encontra informações independentes em outros meios.

O rei vai nu. Anais Nin escreveu que quando o mito fracassa é quando o amor começa. Acrescentaria que quando não é amor... é o ódio o que começa. Passados mais de dois anos e meio de governo - e faltando pouco mais de um -, o mito do gestor eficiente está definitivamente esfarelado. O ídolo dos pés de barro mostra hoje, para quem quiser e tiver isenção, o que é: um gestor mediano, num cargo que não consegue preencher.


Para a maioria da população o choque de gestão  propalado aos quatro ventos durante a campanha virou "gestón". O povo é cruel. Mais cruel ainda quando esta desiludido e se sente traído.
No caso do prefeito é difícil dizer onde sua gestão patina mais, mas a saúde é seu maior fracasso pessoal. A saída intempestiva da secretária da Saúde tem mais motivos que os publicamente anunciados, e devem ser buscados em outro prédio da mesma avenida. A saúde enfrenta problemas gravíssimos e há dezenas de ações correndo na Justiça para garantir o acesso aos serviços de saúde, a medicamentos e a consultas. Decisões recentes são demolidoras e não deixam dúvida. Para quem tinha décadas de experiência é um resultado vergonhoso.
As outras áreas de gestão municipal não estão melhor. Não há ação de governo que não enfrente problemas, atrasos e percalços. Propor a "Joinville do Futuro" para os joinvilenses que ainda esperam a do passado não esta funcionando e o relógio é implacável. Não resta tempo hábil para cumprir o que foi prometido na campanha.
O mito do gestor de sucesso caiu e ao esfarelar-se deixa aparecer o homem, com seus defeitos e virtudes. A gestão esta sob o escrutínio diário do eleitor e a palavra que mais se escuta hoje é decepção.

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Lula investigado: diplomacia vira tráfico


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Luiz Inácio Lula da Silva vai ser investigado. Há muita gente a comemorar. Se antes os opositores se limitavam a arreganhar os dentes, agora pensam em morder a reputação do ex-presidente. A oposição solta foguetes e a imprensa conservadora se empenha em empolar o fato. O problema é que, mais uma vez, parece ser um não-fato. Ou, talvez, mais uma ópera bufa da Justiça brasileira.

Investigar o ex-presidente por “tráfico de influência internacional” é descabido, quase ao limite do non-sense. Tentar criminalizar a diplomacia econômica (é o nome da coisa e acontece em todos os países) é estapafúrdio e irrazoável. Lula é um dos grandes divulgadores do Brasil por esse mundão. Aliás, nunca a "marca Brasil" teve um endorser tão empenhado e eficaz. E nunca o país desfrutou de uma imagem tão positiva no exterior.

Aliás, esse aspecto exige um comentário. Desde que Lula chegou ao governo, a imagem do Brasil passou a ser respeitada em todo o mundo e o país saiu da minoridade (a velha teoria da dependência) para tornar-se um player respeitado. O que, sabemos todos, acaba por repercutir na economia, uma vez que atrai investidores. Mas as investidas da oposição, useira e vezeira de táticas suicidas (essa gente parece determinada em arrastar o país de volta para o charco), tem provocado efeitos contrários.

A imagem do Brasil está a ser muito prejudicada no exterior, em especial durante o governo de Dilma Rousseff. As informações que chegam aos outros países têm origem na imprensa conservadora brasileira (reacionária, diria) e transmitem uma imagem de caos que assusta os investidores. Hoje a visão catastrofista vendida pela mídia não se limita ao Brasil, mas chega a outras latitudes.

É estranho que Luiz Inácio Lula da Silva seja respeitado em todo o mundo, mas alvo de uma caça insana no Brasil. E tudo apenas por taticismo político dos seus adversários. Quem anda aí pelo mundo sabe que as pessoas, ao encontraram um brasileiro, antes perguntavam por Pelé ou Senna, mas hoje falam em Lula. Aliás, se vale o comentário, ninguém recebe tantos doutorados honoris causa apenas pela cor dos olhos.

Pode aparecer um opositor e dizer: “Lula recebeu dinheiro nessas viagens”. Deve ter recebido, uma vez que as palestras são pagas. Se sonegou informações ou impostos, obviamente deve responder por isso. Mas não parece ser o caso. Até porque não há bases consistentes na denúncia. Usar como fonte a imprensa conservadora, cujo histórico recente tem sido deplorável, é temerário. Aliás, se houvesse um tostãozinho em jogo, Lula já teria sido esforricado. Ninguém duvida. Afinal, nem todos são Zelotes.

Enfim, é uma ironia sem tamanho. Lula poder ter problemas com a Justiça por fazer diplomacia econômica e tentar ajudar as empresas nacionais. Em países mais avançados esse papel seria motivo para homenagens. Mas estamos a falar do Brasil... e tudo é possível. Até um obscuro procurador tentar virar herói dos conservadores. Déjà vu.


É a dança da chuva.

O feminismo e a fundamental, incrível e despretensiosa explicação masculina

POR EMANUELLE CARVALHO

O feminismo usa uma série de termos para dialogar sobre fenômenos muito conhecidos em nossa sociedade. Entre tantos termos e definições, vou focar hoje (mais pra frente explico outros) em dois comportamentos bem típicos de homens que corroboram para uma sociedade machista. O motivo? Para que você, mulher, consiga perceber e se proteger destes comportamentos e para que os camaradas homens parem de bater o pé para fazer valer suas ideias e vontades.

O primeiro chama-se mansplaining. É talvez a mais clássica, mais conhecida e, na minha visão, uma das armas mais perigosas do machismo. É aquele velho hábito que homens tem de querer explicar tudo, absolutamente tudo, para as mulheres, mesmo quando elas dominam o assunto, mesmo quando eles não entendem nada do que estão falando. 

O mansplaining ou "ozomexplicanismo", como brincam várias feministas, não precisa ser grosseiro. Aliás, ele geralmente vem cheio de boa vontade para tentar explicar o que é e o que não é feminismo, para tentar justificar que "não foi machista". Ora, imagina só que você mulher,  como eu, que vive 20, 30, 50 anos nesse corpo, não tenha mais propriedade e vivência para explicar do que aquele seu camarada de esquerda que começou a ler Alex Castro e se acha o salvador de mulheres. Você vive e se defende do machismo diariamente mas seu amiguinho de esquerda, de direita, ou Marina Silva mesmo, se acha mais conhecedor de causa. Claro né? Ele é homem. Como assim ele não pode opinar sobre absolutamente TUDO?

O blog da Lola fez um texto sobre mainsplaining (http://escrevalolaescreva.blogspot.com.br/2014/09/pare-de-me-interromper-cara.html?m=1)  apontando uma série de casos e estudos específicos onde homens fazem um esforço descomunal para explicar tentar fazer com que mulheres entendam assunto que elas já dominam. O termo surgiu de um artigo da escritora Rebecca Solnit, traduzido e publicado por Lola:
"A experiência de Solnit realmente foi um exemplo perfeito. Ela estava conversando com um homem em um coquetel quando ele lhe perguntou com o que ela trabalhava. Ela respondeu que escrevia livros e descreveu o mais recente deles, River of Shadows: Eadweard Muybridge and the Technological Wild West (Rio de Sombras: E.M. e a Tecnologia do Velho Oeste). O homem a interrompeu logo que ela mencionou Muybridge e perguntou, 'Você ouviu falar sobre o livro importantíssimo sobre Muybridge que foi publicado este ano?' E prosseguiu, baseando-se em uma resenha que leu sobre o livro, sem mesmo ter lido o livro, até que por fim uma amiga disse, 'É o livro dela.' Ele ignorou a amiga e ela teve que repetir mais três vezes até que 'ele ficou pálido'e saiu andando".

O mansplaing abre sempre espaço para um outro comportamento conhecido como mantererrupting, que é a interrupção as mulheres. Há uma série de estudos de interrupção com recorte em gênero, ainda não conclusivos mas que apontam para uma interrupção expressivamente focada em gênero. 

Além da experiência de Solnit, outras interrupções famosas tiveram visibilidade midiática (http://www.revistaforum.com.br/outrofobia/2014/08/28/sou-mulher-deixe-falar/) como as entrevistas de presidenciáveis mulheres nas últimas eleições. Se compararmos a interrupção de Willian Bonner durante a entrevista de presidenciáveis em 2013, fazendo o recorte por gênero, o âncora interrompe mulheres 40 vezes e homens 10. Um absurdo, uma discrepância que dispensa qualquer mansplaining masculino.

Há muitas outras expressões e termos que nos ajudam a perceber e consequentemente combater o machismo diário, especialmente aquelas opressões em doses homeopáticas que nos oferecem em nossos empregos, em nossas casas, nos espaços públicos, nas lutas e em todos os lugares. Aos poucos a gente se empodera mulheres. E homens: parem com seus comportamentos abusivos e de falsa tutela.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

O Papa Francisco me representa


VALDETE DAUFEMBACK NIEHUES

Após participar de uma reunião com o objetivo de elaborar um documento que irá representar os anseios dos moradores do Jardim Paraíso em audiência pública sobre segurança, saí do local com a sensação de estar lendo em texto de Marx sobre o fim do capitalismo motivado pelas suas contradições. O acúmulo de informações e os silêncios velados em razão do medo atentam para um olhar observador de quem não consegue se apropriar inteiramente das intenções geradoras da violência que fazem refém a sociedade e a divide por um discurso que classifica seres humanos em “bandidos” e “cidadãos do bem”, em que o primeiro pode ser eliminado em beneficio do segundo.   

Ao me expressar sobre a sociedade nestes tempos de valorização da meritocracia e de atribuição à falta de moral familiar como responsável pelo aumento da violência urbana, corro o risco de ser mal interpretada porque não consigo entender esse olhar desviante da realidade que aponta negativamente para as pessoas mais vulneráveis e mais expostas às conseqüências deste sistema demente e perverso que concentra a renda e espalha miséria pelo mundo. Quanto mais o capitalismo exclui, considerando que esta é uma de suas funções, mais nos tornamos expostos aos riscos de toda natureza, nos defendendo daqueles que imaginamos ser nossos inimigos, dos quais supostamente poderemos sofrer agressões físicas ou patrimoniais, ou por discriminação pelo fato de não possuirmos um capital econômico ou cultural que nos coloque no rol da meritocracia. 

Neste sistema resta pouco espaço para a solidariedade e cultivo dos laços comunitários. Estamos nos distanciando de uma experiência pautada em interesses coletivos e abraçando uma nova perspectiva marcada por uma relação de interesses de grupos identitários que se fecha em círculos e, por vezes, dotados de sentimentos de intolerância. 

O próprio ecumenismo que tanto se prezou há décadas sucumbiu diante da arena do mercado religioso. Igrejas disputam a fidelidade de seu público, individualizando as almas, a fé e as ações. O seu caráter religioso de “ser no mundo” foi destituído ao convergir à inércia de “estar no mundo”, que significa não interagir com a comunidade, mas que assimila tão somente um fim em si mesmo.  

Na administração pública desenhou-se um trabalho de atendimento em rede, o que efetivamente não aconteceu. Quem precisa dos serviços públicos em vários órgãos sabe do que estou me referindo. E então acabamos nos acostumando e naturalizando a maneira de ser no atendimento porque acreditamos que o melhor a fazer é adequar as necessidades da população aos meios de que dispomos de acordo com o que o Estado oferece, ou seja, ousamos pouco e cada vez menos em matéria de direitos. 

Temos dificuldades em compreender o significado de segurança pública e por isso reivindicamos o controle da violência com a construção de mais cadeias, presídios, redução da maioridade penal, enquanto negligenciamos a necessidade de investimento em políticas públicas que visem à prevenção da violência. 

Investimentos em educação são considerados gastos e não como atributos de prevenção. O modelo de escola que temos já não serve mais para educar nossas crianças. Fizemos um processo inverso de eficiência em educação, uma vez que fechamos as unidades escolares de pequeno porte e transformamos as escolas urbanas em verdadeiros depósitos de crianças, sem as mínimas condições de sustentabilidade. As crianças já não sabem mais o que é pisar na grama, descansar à sombra de uma árvore, apreciar um canteiro de flores. Com aparência cinza, o pátio escolar se revestiu de concreto e brita, provocando stress porque o ambiente não oferece condições para os alunos praticarem brincadeiras que liberem energias e estimulem a criatividade. 

Quando a violência urbana desperta nossa atenção só conseguimos enxergar o tempo imediato e alegamos como causa a desestruturação das famílias, a falta de religiosidade, os métodos de ensino. Porém, praticamente não ouvimos mais vozes ecoarem sobre um dos reais motivos deste desacerto e com isso tenta-se tratar da febre e não de suas causas. 
Refiro-me a este modelo de capitalismo de rapina que não sossega enquanto não estrangular suas vítimas, conforme denunciado pelo Papa Francisco.  

Precisamos agir com coragem para não aceitar apenas as poucas ferramentas de que dispomos para atuar na prevenção da violência. Precisamos ser ouvidos, mas para isso temos que agir em rede, com entrelaçamento de ideias, de atitudes, de solidariedade e não permitir que sejamos fantoches suspensos em cordões a obedecer ao comando do articulador das forças produtivas destruidoras.