Há muito tempo, obrigações acadêmicas me levaram a estudar Roland Barthes com muita atenção. De tudo o que li (e escrevi) da sua obra, houve um conceito que adotei para a vida: é imprescindível ser um mitoclasta.
O que é isso? Em resumo: é ir contra as verdades prontas, questionar as
certezas consumadas, duvidar do argumento fácil. Foi o que me levou a estudar,
com maior atenção (ainda que à distância), o caso Hugo Chávez. E hoje toco no assunto porque tenho visto muita gente aí pelas redes sociais a detonar o homem, mas sem conseguir formular qualquer pensamento razoável.
Por que isso acontece? É o efeito do linchamento midiático que há anos a comunicação social vem produzindo. Não tenho dúvidas de que, como já escreveu Ignacio
Ramonet, doutor em
Semiologia pela École des Hautes Études en Sciences Sociales de Paris, Hugo Chávez é o chefe
de Estado mais difamado no mundo. E agora, com as redes sociais, a coisa ficou
ainda mais acintosa: qualquer tipo que nunca leu uma linha a sério sobre o tema tem sempre seis ou sete opiniões para dar. Todas arrasadoras.
Atenção, leitor e leitora. Uma pequena pausa para um aviso ao pessoal da
Reaçolândia: não estou aqui para discutir se Hugo Chávez é bom ou mau. O meu
tema é essa tentativa de assassinato midiático. Afinal, a gente pode procurar, procurar,
procurar e dificilmente vai encontrar um texto da grande imprensa ou uma reportagem na televisão a falar bem
dele. Mas será que o homem não acertou nadinha? Você, leitor e leitora, não acha isso estranho? Não duvida?
Uma das patranhas mais ridículas é a imprensa venezuelana (efetivamente
um partido de oposição) fazer manchetes a dizer que há censura na Venezuela. A televisão a dizer que não há liberdade de expressão. Peraê. Se há censura, como é que o jornal pode publicar? Como é que a televisão está no ar para reclamar liberdade? A censura não é
justamente para silenciar, impedir a crítica? Lembram que durante a ditadura militar no
Brasil os jornais substituíam matérias censuradas por receitas e poemas? Isso
sim é censura.
Mas os caras sacaneiam na cara dura. Vejam essa charge (ao lado) publicada há anos no jornal El Nacional, associando o presidente aos famigerados membros do clã
Duvalier, François e o seu filho Baby Doc, responsáveis por autênticos banhos
de sangue no Haiti. Por quê? É um sistema semiológico interessante. Se a gente
põe Chávez no lugar do Baby Doc, então Chávez parece um autoritário e sanguinário. Barthes
explica: é a construção do mito.
Outra coisa ridícula que os conservadores brasileiros engolem sem
pestanejar. A imprensa mundial – e obviamente a revistona semanal brasileira – gostam de chamar Hugo Chávez de “ditador eleito”. Mas quem acredita que um ditador
possa ser eleito por voto popular em eleições livres? Ah... você
vai argumentar que há fraude. Tolice. Não vamos esquecer que há observadores
internacionais para garantir a lisura dos processos. Os europeus, por exemplo,
estiveram nas últimas eleições e nada viram de errado.
Mas por que esse ódio da grande mídia contra Hugo Chávez? Podia apontar muitos fatores, mas fico por este: vocês
acham mesmo que o petróleo nada tem a ver com isso? Bem ou mal, o cara afrontou
as oligarquias venezuelanas, cheias de corruptos e vendilhões, e os defensores dos interesses dos poderosos. Hugo Chávez tem sido uma pedra no sapato daqueles que
pretendem a liberalização do mercado e a privatização da PDVSA - Petróleos de
Venezuela. E há que considerar os interesses dos Estados Unidos na região. Ok... não dá para negar que alguma culpa dessa imagem negativa é do próprio Hugo Chávez que, com o seu
estilo fanfarrão, não se cansa de cutucar a onça com vara curta.
E você, leitor e leitora, por que odeia Chávez? É claro que eu podia ficar aqui a tecer teses acadêmicas sobre o
linchamento midiático do presidente venezuelano. Mas vou no popular. No Brasil, os conservadores odeiam Lula. Lula é amigo
de Chávez. Então os conservadores odeiam Chávez. Simples assim. Sem sociologia. Sem discussão. Sem inteligência. É apenas pobreza
intelectual. Os conservadores ficam cegos e, nessa cegueira, contra os argumentos não há fatos.
É como diz o velho deitado: “quando todos pensam da mesma
forma, então alguém não está a pensar”.
Lembram da adolescente Malala Yousafzai, símbolo
da luta anti-talibã no Paquistão, que havia sido baleada quando saía da escola com algumas amigas? A
boa notícia é que há poucos dias ela recebeu alta e deixou o Hospital Queen
Elizabeth, na Inglaterra, para onde havia sido transferida. Para quem não
lembra, Malala é odiada pelos talibãs por defender o direito das mulheres, e em
especial o direito de as meninas irem à escola, como os rapazes. Longa vida a
Malala.
E por falar em
direitos das mulheres, todos ficamos a saber do caso da Índia, onde uma
estudante de medicina foi violada por seis homens e morreu em consequência da
violência. Mas um caso que parece tão ou mais grave aconteceu no vizinho
Paquistão, onde uma menina de apenas nove anos foi violada por três adultos e
abandonada à frente da própria casa desmaiada e a sangrar. Os agressores ainda
não foram presos e, até fechar esta coluna, não soube se a menina, que foi
levada para um hospital, teria sobrevivido. Índia, Paquistão... terras de
muitos canalhas.
"Entroikado".
Escolhida a “palavra do ano”
em Portugal.
A portuguesa Porto Editora tem
essa iniciativa bastante interessante: escolher a palavra do ano. O caras pegam
em 10 das palavras mais usadas ao longo do ano e põem em votação pela internet.
E em 2012 a palavra eleita foi “entroikado”. Não sabe o que significa? Tem tudo
a ver com a famigerada troika - formada pela Comissão Europeia, Banco Central
Europeu e FMI -, que dá as diretrizes para os governos dos países em crise,
como é o caso de Portugal.
FLASH
Viagem de turismo é
assim. O trem para e os turistas curtem o ambiente. A foto mostra a entrada de
um túnel nas montanhas entre Myrdal e Flam, na Noruega. Os noruegueses afirmam
que é o mais belo percurso ferroviário do mundo. A via foi construída em meio a
montanhas (começa a 866 metros e termina a dois metros de altitude) e tem 20
túneis e uma ponte, tudo construído com tecnologia rudimentar, uma vez que as
obras tiveram início em 1923. É uma exemplar obra de engenharia, feita com
recursos quase sempre manuais.