A evolução da sociedade é realmente algo
bizarro e contraditório. Nos últimos 100 anos, a tecnologia mudou radicalmente
as formas como as pessoas se relacionam.
Na infância da minha mãe, meu avô levou os filhos de uma cidade de interior ao litoral de São Paulo num Fordinho a manivela, numa viagem de pouco mais de 300 km que levou 3 dias.
Na infância da minha mãe, meu avô levou os filhos de uma cidade de interior ao litoral de São Paulo num Fordinho a manivela, numa viagem de pouco mais de 300 km que levou 3 dias.
Pensar em se comunicar instantaneamente por
voz e imagem com uma pessoa em qualquer parte do globo a um custo irrisório
era, naquela época, uma fantasia improvável da ficção científica. E ainda assim
o comportamento social parece ter evoluído muito pouco desde então. As pessoas
continuam a ser quase tão moralistas quanto há 100 anos.
A gente percebe que os
papeis de gênero não mudaram quase nada quando um caso de traição vira assunto
público e a mulher é o foco de todo escárnio e humilhação. A diferença é que,
se antes era em praça pública, agora é nas redes sociais e no aplicativo
Whatsapp.
A grande fofoca do dia aconteceu em Belo Horizonte. Um sujeito
flagrou a própria mulher com um amigo seu entrando em um motel. O irmão do
marido traído gravou um vídeo, alternando a função de videomaker improvisado
com a de juiz da cunhada, a quem ofendeu com uma série de impropérios.
A cena
toda é de um constrangimento absurdo. E aí a coisa toda se transforma numa
espécie de festival de quem faz a piada mais engraçada e compartilhada, mesmo
às custas da vida pessoal de uma mulher que está sendo destruída, que vai ser
apontada na rua, pode perder o emprego, os amigos, a liberdade, e muitas vezes
a coragem de seguir vivendo.
Mas o importante é acumular seguidores às custas
da dignidade alheia. Tristemente, já prevejo que dirão que ela será a culpada e
merecedora de tudo de ruim que lhe acontecer, como castigo por ter traído o
marido. Ao mesmo tempo, a traição masculina é prática comum e amplamente
entendida e até tolerada.
Não é o caso aqui de discutir fidelidade e o contrato
entre um casal. O problema é a diferença de tratamento dado ao homem e à
mulher. Parece que, essencialmente, na nossa sociedade, o lugar do prazer não
pertence à mulher. Muda a tecnologia, mas não muda a mentalidade.