quarta-feira, 25 de julho de 2018

Fake news, a mentira e a homofobia

POR CLÓVIS GRUNER
Um tuite do vereador carioca Carlos Bolsonaro, publicado no dia 13 último, devolveu às redes sociais uma fake news que vem sendo compartilhada desde 2017, sugerindo que homens gays são pedófilos. Avisado que se tratava de um material comprovadamente mentiroso, Bolsonaro não apenas manteve a postagem, como publicou novos posts associando a homossexualidade masculina e a pedofilia (você pode ler a história aqui).

No mesmo dia, Danilo Gentili usou sua conta na rede para alertar seus seguidores que, em breve, eles verão as “Folhas e UOL da vida manchetando que vc é um monstro preconceituoso se não aceitar a pedofilia”. Isso porque, há uma “geração sendo doutrinada nas universidades para defender isso quando subirem aos postos de editores, agentes da mídia e políticos”. Alertado da mentira, também manteve o post e publicou outro de igual teor, compartilhado um dia antes no Twitter de Voldemort.

Não tenho dúvidas que Gentili e Bolsonaros sabiam o que faziam mesmo antes de serem alertados da mentira, e terem continuado a disseminá-la é um claro indício disso. Associar a homossexualidade masculina à pedofilia é tão falso quanto falar em “ditadura gay” ou, variações do mesmo tema, que “gays querem impor seu estilo de vida” e que o movimento LGBT reivindica “privilégios jurídicos”, mais ou menos como as igrejas.

Mas a disseminação de inverdades, nesse caso, esconde dramas e problemas reais para os quais – e também não tenho dúvidas disso – nenhum deles está realmente preocupado. O primeiro deles é, justamente, o da pedofilia. O último levantamento sobre o tema, de 2016 e divulgado recentemente, revela números assustadores: cerca de 13 mil menores foram vítimas de algum tipo de abuso sexual naquele ano, a maioria perpetrados por familiares ou pessoas conhecidas.

É dentro de casa – e também em alguns templos e sacristias –, portanto, que reside o perigo maior. Apesar disso, a CPI dos maus tratos, liderada pelo senador Magno Malta, e os milicianos do MBL, preferiram atacar museus e artistas, escolas e professoras/es, em um discurso agora reiterado pelos tuites de Gentili e Bolsonaros, que estigmatizam, no limite da criminalização, as práticas e relações homoeróticas, colocando-as no mesmo nível da pedofilia e do abuso infantil.

Na prática, nossos conservadores e seus porta-vozes nas mídias e parlamentos não se importam em manipular um problema real, como a pedofilia ou o abuso infantil, se isso servir a um propósito: atacar e desqualificar LGBTs e seus movimentos, mantendo-os à margem de quaisquer direitos, autorizando e legitimando a violência, física e simbólica, sistematicamente praticada contra eles.

Um ódio fundamental – Somos, entre os países democráticos, um dos que mais mata sua população LGBT. Segundo dados da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em 2011 – ano do último levantamento do órgão federal – cerca de 19 violações contra LGBTs aconteceram, em todo o pais, diariamente. As estatísticas se referem às agressões notificadas e, levando-se em conta a precariedade, as inúmeras dificuldades e mesmo o medo de registrar agressões sofridas, é provável que a incidência seja maior.

Os números são também assustadores no que se refere ao assassinato de gays, lésbicas, transgêneros e travestis: no mesmo ano da pesquisa realizada pela SDH, foram registrados 266 mortes; levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia para 2014, registra um aumento significativo, totalizando 326 assassinatos. No ano passado, esse número saltou para 445 vítimas. O número de mortos é maior entre a população gay masculina, seguida de perto pelos travestis.

Confundidos com homossexuais, nos últimos anos cerca de 20 homens heteros foram assassinados. Em 2014, Alex, de apenas oito anos, foi espancado até a morte pelo pai, que o achava “afeminado” e queria que ele “andasse como um homem”. No ano passado, Itaberlly Lozano, de 17 anos, foi morto a facadas pela mãe e o padrasto que esconderam o corpo, depois de carbonizado, em um canavial. O índice de suicídios entre adolescentes e jovens gays é igualmente desalentador.

Mas a violência não é apenas física. A homossexualidade ainda é vista e tratada como doença, inclusive por profissionais da saúde. Gays são preteridos ou demitidos de empregos por serem gays. São constrangidos em lugares públicos e hostilizados quando demonstram afeto (um simples andar de mãos dadas pode gerar reações violentas imprevisíveis); expulsos do convívio familiar e de amigos; desrespeitados em ambientes públicos, inclusive em escolas, espaços de formação de cidadanias e cidadãos; ridicularizados por programas de humor e humoristas politicamente incorretos.

Militantes denunciam isso há muito tempo. Conseguiram poucos, tímidos avanços, mas esbarram na indiferença, inclusive de governos de esquerda: em 2011, Dilma Rousseff mandou suspender a distribuição do “kit anti-homofobia” (que os detratores chamaram, pejorativamente, de “kit gay”), cedendo às pressões da bancada conservadora. Uma esfera pública não inteiramente laicizada e atravessada pela vontade religiosa corrobora para perpetuar um estado de coisas, que trata alguns indivíduos como subcidadãos em função de sua orientação sexual.

Apesar disso, Bolsonaros, Gentili e seus milhares de seguidores insistem no discurso cretino e mentiroso de uma “ditadura gay” e ousam falar em “privilégios”, enquanto mentem sobre homossexualidade e pedofilia. E mentem porque eles sabem o tipo de efeito que essa associação produz. E porque não suportam que LGBTs tenham acesso e assegurem mesmo os direitos mais elementares. Às vezes, um tuite não é só um tuite. É um reservatório inteiro de ódio.

terça-feira, 24 de julho de 2018

O algoritmo da acessibilidade: parecendo mais protetor, pode não ser na verdade


POR JORDI CASTAN
Não há quem possa discordar desta ideia: as cidades e os seus espaços devem ser acessíveis para todos. Logo, logo haverá alguém dizendo que as cidades têm que ser acessíveis a todos e a todas e os mais “moderninhos” escreverão que as cidades devem ser acessíveis a tod@s. E assim estamos.

Duvido que haja um algoritmo que calcule com precisão quantas vagas devem ser previstas para idosos, grávidas ou pessoas com necessidades especiais. Um estabelecimento comercial aqui da vila tinha três vagas para clientes: uma para idoso, uma para PNE e outra para clientes. Que estava ocupada. Fiquei pensando que, aplicando um algoritmo simples, neste caso 66% das vagas estavam reservadas a minorias e 33% aos demais. Achei o resultado do cálculo estranho.

Nos modernos pontos de ônibus instalados na vila há espaço para que sentar 4 pessoas: 3 num banco de ferro e um espaço reservado especificamente para um cadeirante. Assim, quem projetou os abrigos considerou que 25% dos usuários do sistema de transporte público de Joinville sejam cadeirantes. Ou 1 de cada 4. De novo o resultado desta conta me pareceu estranha. Não consigo, por muitas contas que faça, imaginar onde podem estar todos estes cadeirantes.

Nos supermercados e centros comerciais há dezenas de vagas reservadas para idosos, grávidas e PNE vazias à espera ou dos consumidores que teriam direito a utilizá-las. Ou de espertalhões que, sem terem o direito, as ocupam ilegal e imoralmente.

Quanto mais presto atenção a estas coisas, mais tenho a certeza que há um excesso. Um excesso de protecionismo, um excesso de margem de cálculo e uma falta de dados concretos e verazes que permitam à nossa legislação ser mais justa e adequada à realidade da nossa sociedade. Sinto que estamos vivendo uma espécie de ditadura das minorias. Que ser integrante da maioria teria se convertido num pecado grave. Que a maioria deve ser perseguida e punida por ser maioria. Que estamos fazendo, em nome da acessibilidade, cidades menos amigáveis para a maioria.

Não identifico nos países mais desenvolvidos essa sanha protetora. E o mais interessante é que os vejo as minorias integradas no tecido social e urbano. Cidades acessíveis são acessíveis para todos. Não vi, em qualquer das grandes cidades ocidentais, toda essa parafernália de pisos podo tácteis, nem guarda corpos em tudo que degrau. Mas, sim, é comum que os sinaleiros tenham um aviso sonoro para informar a cegos, que as calçadas estejam niveladas e ofereçam boa segurança para todos. Aliás, calçadas estas que são construídas e mantidas pelo município e não pelo proprietário do imóvel, como acontece aqui. Se o espaço é público deve ser assumido por todos.

Em tempo: não há como concordar com a gambiarra apressada e medonha aprovada pela Câmara de Vereadores de Joinville para o estacionamento rotativo. É incompreensível demorar tantos anos para, no final, aprovar de afogadilho um absurdo destes. Isso só acontece aqui porque o Legislativo se rende ao Executivo e aprova qualquer projeto que venha do alcaide. Multar com quase R$ 200 e 4 pontos na carteira quem ultrapasse em 5 minutos o tempo permitido é um abuso e uma sem-vergonhice. Mas numa cidade de gente acovardada não é novidade.

segunda-feira, 23 de julho de 2018

Sexo, sexo, sexo e pesquisas sobre sexo...



POR LEO VORTIS

Os leitores e leitoras mais habituados às redes sociais já devem ter reparado que hoje em dia há pesquisas para tudo. É uma coisa insana. Desde as coisas mais complexas até às mais insignificantes, tem sempre um estudo feito por uma universidade ou instituto de pesquisas.

Parece que os britânicos são os campeões em números de pesquisas, mas acontece também em outros países. Os temas variam, mas há uma coisa que não falha: sempre tem alguma coisa relacionado ao sexo.

Para ter uma ideia, apresento aqui uma lista de algumas dessas pesquisas. A maioria é do Reino Unido, mas também há de outros países, como o Brasil. É uma loucura. Vejamos os títulos, que começam todos por “pesquisa revela”:

… que o sexo pela manhã, três vezes por semana, fortalece as defesas, levanta o ânimo, queima calorias e retarda o envelhecimento.
… casal que faz faxina junto tem vida sexual mais ativa
... que 63% dos jovens preferem garotas virgens para casar.
... que gays feios têm maior tendência a praticar sexo de risco.
... que 73% dos britânicos não têm energia para o sexo.
... que o casamento entre mulher bonita e homem feio tem mais chance de dar certo.
... que a maioria dos homens não beija durante o sexo.
... que flerte fora do casamento ajuda a relação.
... que dividir tarefas domésticas melhora a vida sexual.
... que casar engorda.
... que mulheres espiritualizadas fazem mais sexo.
... que um em cada três americanos acredita em fantasmas (não tem sexo, mas essa é f...).
... que loiras tingidas fazem mais sexo.
... que preferência por celular fica acima do sexo.
... o que elas odeiam ouvir na hora “h”.
... que 25% das mulheres chinesas estão insatisfeitas com a vida sexual.
... que metade das mulheres britânicas casadas há mais de 20 anos poderiam continuar o casamento sem sexo.
... que brasileiro trai e muitos não usam preservativos.
... que as garotas preferem os “bad boys” aos caras certinhos.
... que mulheres usam álcool para curar a timidez na cama.
... que um terço das mulheres não teve sexo na noite de núpcias.
... que sexo não é prioridade para os homens.
... que há homofobia no sul do Brasil.
... que paulistano é mais infeliz no sexo.
... que sexo casual cresce no Brasil.
... que sul-africanos têm orgasmo quase todas as vezes que fazem sexo (seguidos de espanhóis, mexicanos e italianos).
... que mulher liberal deixa homens inseguros.
... que sexo bom é igual a mulheres produtivas.
... que mulheres gordas fazem mais sexo que as magras.
... jovens na região Sul fazem mais sexo.
... por que as mulheres fazem sexo.

E haveria muitos títulos mais. Aliás, parece que as pessoas não fazem outra coisa a não ser realizar pesquisas. Duvida? Então vá ao Google e digite “pesquisa revela”: são quase 43 milhões de resultados.

Acha que alguma destas pesquisas foi útil para você?

sexta-feira, 20 de julho de 2018

Moro herói: Superman ou Supermané?

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Antes de começar a ler este texto, peço que dê uma olhada na imagem lá no fim. Já viu? Então vamos lá. Um tal movimento “Patriotas do Brasil - Maringá - Terra de Sérgio Moro” vai promover um ato nacional contra a soltura de Lula e de repúdio ao STF. E com um “plus”. O evento, diz o cartaz, vai contar com a presença do próprio Sérgio Moro. Parece um daqueles memes zoeiros, mas o tal movimento tem até página no Facebook.

O pessoal lá no norte do Paraná diz que Sérgio Moro é “o” herói nacional. Devem ser os mesmos que já consideraram Joaquim Barbosa uma espécie de Batman. Porque apresentam o juiz vestido como Superman. Opa! Então, qual será a kryptonita deste Superman de pés-vermelhos? É o ego descomunal. A vaidade de Sérgio Moro é tão grande que não cabe nem livrinho chamado “Constituição Brasileira”, que ele parece desprezar.

Herói? Nelson Mandela foi herói. Luther King foi herói. Mahatma Gandhi foi herói. Sérgio Moro é apenas um homenzinho que não está à altura do poder da sua caneta. Qual foi o seu ato de heroísmo? Ter passado num concurso e, por lógicas do sistema judicial, adquirir o poder de mandar prender e mandar soltar? Não há heroísmo aí. O poder está na caneta, não no homem. Sem a caneta Sérgio Moro seria apenas um mané.

O escárnio não tem limites. O cartaz de Maringá anuncia “a presença confirmada do nosso herói”. Faz sentido. Depois de ser fotografado ao lado de figuras de proa do tucanato, Sérgio Moro parece já não se incomodar com minudências éticas. Nem tem medo do ridículo (afinal, o Superman usa as cuecas fora das calças). Só isso explica a presença num evento promovido por um pessoal que mostra fartos sintomas de lunatismo.

"Patriotas do Brasil - Maringá - Terra de Sérgio Moro"? O ridículo culto da personalidade parece não afetar o juiz. Pelo contrário, fica a ideia de que satisfaz uma insaciável gula pelos holofotes. Nestes tempos, aparecer num evento onde as pessoas o tratam como o Superman é coisa de mané. Um supermané. É uma péssima gestão de imagem. Ou talvez o juiz pense que é mesmo um super-homem.

É a dança da chuva.


À esquerda, o cartaz do evento. À direita, Moro em luta com o seu ego...


quarta-feira, 18 de julho de 2018

Mulheres que amam Bolsonaro são mulheres ou robôs?

POR LEO VORTIS
Pouca gente tem dúvidas do machismo de Jair Bolsonaro. E muita gente duvida que haja mulheres dispostas a votar nele. No entanto, um olhar para as redes sociais mostra que muitas delas apoiam o candidato. Um estudo recente da  organização InternetLab revela que Jair Bolsonaro tem mais de 400 mil robôs entre os seus 1,1 milhão de seguidores. Dá um percentual de 34%, o que torna legítimo concluir que muitos deles sob perfis femininos.

Há mulheres que amam Bolsonaro e há outras que odeiam. E hoje, para tentar elaborar um rápido perfil dessas mulheres, escolhi exemplos aleatórios de posts no Twitter. É fácil perceber que os textos favoráveis são mais longos e menos espontâneos. Já as eleitoras que não aturam o candidato são mais incisivas, diretas e sem necessidade de explicar a posição. Enfim, as mulheres que apoiam Bolsonaro serão robôs?

Veja, tire as suas conclusões e comente.


terça-feira, 17 de julho de 2018

Não queria voltar ao tema, mas: "muito obrigado"

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Não queria voltar ao assunto. Mas seria uma injustiça não mostrar gratidão ao pessoal que anda pelas redes sociais a proteger o mundo do avanço nazista. Como já disse alguém, o preço da liberdade é a eterna vigilância. No meu caso, a Copa do Mundo foi uma tragédia dentro de campo. Os meus dois times – Portugal e Brasil – foram despachados muito cedo e tive que assistir a festa dos outros. Mas nem tudo foi mau...

O lado bom é ter descoberto, pelas redes sociais, que o Brasil tem um sem número de especialistas em política internacional. É impressionante. Afinal, durante quatro anos tudo o que rola sobre o tema é um tanto pífio. De um lado, um discurso que assenta no de sempre:
- Vai  para Cuba.
- Vai para a Coreia.
- Vai para Venezuela.
Do outro, os caras que defendem as virtudes daquilo que julgam ser o socialismo.

Mas o hype aconteceu no jogo final, quando ficaram frente a frente as seleções da França e da Croácia. Foi bonito ver tantos entendidos no tema, com destaque para duas espécies de analistas.

Os especialistas em política internacional gritaram:
- Allez Les Blues, seleção quase africana.
Os especialistas em política da Europa Central foram mais incisivos:
- Fora, Croácia. Fora, nazistas.

Obrigado, senhores. Na minha ingenuidade, não tinha percebido que os croatas estavam a aproveitar a alienação do futebol para distribuir exemplares do “Mein Kampf”. E o que andam fazendo Modric no Real Madrid, Mandzucic na Juventus ou Perisic na Internazionale? Ora... contagiando o futebol europeu com ideias nazistas. E o zagueiro Vida? Esse nem disfarça. Faz campanha pela Ucrânia. Só pode ser mauzão.

Respirei aliviado quando vi que os nossos especialistas em política internacional estavam atentos e na resistência. Croatas não passarão. E nem adianta vir a loiraça presidente com aquele sorriso simpático, porque ninguém acredita nela. Houve até um jornal brasileiro que publicou uma matéria chamada “O Lado Sombrio de Kolinda Grabar”. Li e não entendi bem qual é o lado sombrio, mas a mim ela não engana. 

E para provar que decidi ficar atento, trago aqui a comprovação de que Luka Modric faz abertamente a saudação nazista, na comemoração de uma vitória. Podem ver na foto que ele está a fazer o gesto. A imagem não deixa margem para dúvidas. Ah... tem uns tontos - gente desinformada que não entende de política internacional - dizendo que ele levantou a mão para mandar um beijo. Ah... mas esses croatas não enganam mais ninguém.

Enfim, sinto que estou seguro e livre da ameaça croata. Obrigado a todos estes analistas políticos. Só tenho uma dúvida bem pequenininha. Confesso que ficaria mais tranquilo se tivesse a certeza de que eles são capazes de achar a Croácia no mapa. Just in case.

É a dança da chuva. 

Parece uma saudação nazi, mas talvez seja melhor ver o filme abaixo...




segunda-feira, 16 de julho de 2018

As palmeiras da Al. Bruestlein estão morrendo. Joinville vai perder o seu cartão postal?


POR JORDI CASTAN
Quem fica gazeteando ou dormindo na aula acaba pagando caro pela omissão. Quando Joinville celebrou seus 150 anos, entre outras ações e atividades foi elaborado o projeto de paisagismo e revitalização da Rua das Palmeiras. Antecipando que as centenárias palmeiras imperiais tinham entrado no final do seu ciclo de vida - e para evitar que Joinville perdesse um dos seus cartões postais -, a empresa Whirpool adotou a iniciativa e patrocinou o projeto de recuperação. O projeto seguiu as mesmas diretrizes que anos antes já tinha sido feito no Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Ou seja, intercalar palmeiras novas entre as existentes, de forma a criar uma segunda linha de palmeiras que, no momento certo, iriam tomando o lugar das originais.

O trabalho foi feito. O projeto foi do nosso escritório, o Boa Vista Paisagismo, e a execução feita pela equipe da Agrícola da Ilha. O o resultado está lá, para quem quiser ver. Uma nova geração de palmeiras garante hoje que Joinville não fique sem uma das suas referências históricas mais importantes.

O presidente da comissão organizadora do sesquicentenário deveria lembrar os motivos que incluíram a revitalização da Alameda Bruestlein na lista de eventos organizados para celebrar a data. O projeto previa garantir que Joinville mantivesse a Rua das Palmeiras por outros 150 anos. A equipe que trabalhou no projeto olhou para além de quem, por visão curta, só enxerga quatro anos. E fez a sua tarefa de casa. Foi ao Rio, visitou o Jardim Botânico, viajou a diversos países do Caribe de onde as Roystoneas são originárias, estudou o seu ciclo de vida e propôs a melhor solução.

Depois disso, pouco foi feito. As palmeiras, tanto as originais como as novas, não receberam qualquer cuidado especial. Nenhum programa regular de adubação e manutenção foi previsto e executado. Sem falar da infeliz intervenção no governo Carlito. Agora - e depois de várias reuniões de uma comissão interdisciplinar - foram identificadas deficiências de nutrição e pregos e feridas nos troncos. Ações corretivas serão tomadas.

O governo fez o que melhor tem sabido fazer nesta gestão: acordar tarde e não estudar direito. As suas ações são insuficientes, tardias e lentas. Acrescentaria ainda que têm poucas possibilidades de ter sucesso, porque o problema das palmeiras é um problema de senilidade. Estão no final do seu ciclo de vida vegetativa. Aliás, com a pouca atenção que tem recebido ao longo das ultimas décadas, até que as plantas duraram muito. O nível freático da região é alto, o governo não tem dado qualquer manutenção as palmeiras imperiais, nem tem nenhum cuidado especial para um patrimônio tombado.

Triste sina de uma Joinville que, nas mãos de uma gentalha como esta, não cuida do pouco que ainda resta do seu patrimônio e da sua história. As palmeiras morrem em pé. Com seu porte majestoso imponente nos lembram da grandeza dos líderes que Joinville já teve e da pequenez dos que a governam hoje.

E para não dizerem que foi por falta de avisos, releiam este post de 2016 (as palmeiras morrem de pé). A História da Alameda Bruestlein está toda ela registrada. Quem trouxe as sementes do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Em que ano foram plantadas. Quem plantou as palmeiras. Quanto custou o serviço. Quem tiver interesse deveria ler a publicação elaborada pela equipe do Museu Nacional de Colonização (Rua das Palmeiras).

Em tempo e aproveitando o tema do texto: a equipe do planejamento e da mobilidade segue firme na sua aloprada ideia de levar adiante, sem apresentar nenhum estudo técnico convincente, de converter a Rua Marajó na rua de saída de Joinville. Ver caminhões, ônibus e carretas passando pelo labirinto que estão propondo será um bom entretenimento. Depois não digam que não foram avisados. O problema nunca foi a falta de aviso, o problema é a surdez misturada com arrogância e teimosia. Juntas formam uma mistura explosiva.