quarta-feira, 11 de abril de 2018

Lula preso: epílogo ou um novo capítulo?


POR CLÓVIS GRUNER
O assunto é incontornável: a prisão de Lula, decretada pelo juiz Sérgio Moro na quinta (05) e efetivada no sábado (07), quando o ex-presidente se entregou à Polícia Federal, mobilizou o país. Apesar das muitas paixões despertadas, de um lado e de outro, não se trata ainda de um desfecho, mas de mais um capítulo de uma narrativa cujo fim, me parece, não está próximo nem, tampouco, é previsível.

Das inúmeras imagens produzidas a partir do evento, duas são emblemáticas. Uma delas, a de Lula sendo conduzido por uma multidão na sua saída da sede do Sindicato dos Metalúrgicos, em São Bernardo. Outra, a do empresário e cafetão Oscar Maroni, simulando o estupro em uma “performance” com uma prostituta, em frente ao Bahamas Hotel Club, um bordel de luxo na capital paulista, sob o olhar grave de dois juízes, Carmem Lúcia e o próprio Moro, cujos retratos adornavam a comemoração.

Como quase tudo que envolve o nome de Lula, elas são carregadas de um forte caráter simbólico, seja ele o reconhecimento pelos feitos dos governos Lula (em seu ex-blog, “Desafinado”, o historiador Murilo Cleto publicou, em 2014, um dos mais completos balanços das duas primeiras gestões petistas), ou os desejos perversos de subjugação violenta alimentados pela elite brasileira e parte da classe média – além, óbvio, dos milicianos do MBL –, que pensa e age como se fosse parte dela.

Mas é também interessante que, por caminhos opostos, ambas reforçam o caráter algo mítico de Lula em relação ao seu partido, em grande medida reafirmado a partir dos acontecimentos que culminaram com sua prisão. Principalmente depois que a Lava Jato e o juiz Moro decidiram sacrificar, abertamente, mesmo a mais pálida imagem de isenção, surfando na onda do antipetismo e ampliando seu apoio e base social, uma das linhas de defesa do PT e de Lula tem sido reforçar o caráter parcial e seletivo da operação.

O argumento é que a operação mira, mais que o próprio partido, sua principal liderança, o “sonho de consumo” de Moro. Há alguma razão nisso. Desde março de 2016, quando vazou a conversa telefônica entre Lula e Dilma, interferindo diretamente nos rumos da vida política do país, o juiz curitibano deixou de agir apenas como magistrado, confundindo o papel de julgador que se pretende imparcial com o de inquisidor – e sua sentença é uma clara demonstração disso.

Além disso, desde o impeachment, em agosto do mesmo ano, todos os indícios evidenciam que está a se cumprir a profecia de Jucá, a do aparelhamento da Lava Jato em um “grande acordo com o STF com tudo” para “estancar a sangria” e salvar quem realmente importa da cadeia. Nada estranhamente, práticas que foram condenadas e provocaram escândalo em governos petistas, mereceram o silêncio e a indiferença, inclusive da PF e da justiça, quando praticadas por Temer, ele próprio blindado de duas denúncias em troca de alguns bilhões distribuídos aos deputados da base aliada.

Sem crítica, nem projeto – Mas se o quadro geral justifica o discurso de Lula e do PT, ele serviu também como pretexto para que ambos não fizessem, nem uma autocrítica, nem tampouco um igualmente necessário mea culpa, seja pelo desastre que foram a gestão e meia de Dilma Rousseff – incluindo o estelionato eleitoral de 2014 –, ou pelos deslizes cometidos durante os 12 anos de governos petistas, aí incluídas as denúncias de corrupção.

Na narrativa do golpe, que ganhou força e impulso à medida que o verdadeiro desastre ético e político do governo Temer ficou mais claro, os muitos erros das gestões petistas foram obliterados na figura cada vez mais mítica, e na devoção quase religiosa, criada em torno à imagem e ao nome de Lula. A sua prisão reiterou esse caráter personalista, e em ambos os espectros que orbitam passionalmente ao seu redor, com prejuízos políticos a ambos, ao menos no médio prazo, e ainda que com resultados distintos.

À direita, a prisão de Lula pode diminuir a força do discurso antipetista, que tem sido a tônica desde as manifestações de 2015. Com Dilma deposta e Lula preso, os partidos de direita conseguiram atingir sua meta mais imediata, a retomada das instituições e a redistribuição de poder no interior delas, blindando a quadrilha que tomou de assalto o governo depois do impeachment.

Mas o empenho em estancar a sangria, mobilizando recursos na criação e demonização de um inimigo único e fonte de todo o mal, dificultou o surgimento de um nome e projeto alternativos. Dito de outra forma, se o problema começava e terminava em Lula, e com ele fora do páreo, o que sobra para a direita? O carisma de Geraldo Alckmin? Ou os delírios autoritários de Bolsonaro, disposto a transformar o Brasil em uma versão reacionária da Venezuela ou em um Irã tropical?

A situação não é mais confortável para a esquerda. É verdade que a prisão de Lula unificou parte dela, levando para o mesmo palanque Guilherme Boulos e Manuela D'Ávila. Mas seria melhor se essa unidade fosse construída também em torno a um projeto ou um programa mínimo – a auto proclamada “Frente Antifascista” não existe de fato –, o que a esquerda tampouco tem, porque nos últimos dois anos salvar Lula se tornou o único projeto que realmente importa.

A imagem da multidão a conduzi-lo em São Bernardo e a reação apaixonada de militantes dentro e fora das redes virtuais, parecem deixar claro que, se as forças e grupos de esquerda viviam um impasse e um vazio programáticos, seu encarceramento não os resolveu mas, antes, os aprofundam e estendem sua solução talvez indefinidamente. E em um ano eleitoral isso pode ser um problema a mais a ser contornado. Mas isso é tema para outro artigo.

terça-feira, 10 de abril de 2018

Ocupação


Odiar Lula. E odiar, odiar, odiar...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
- “Leva e não e traz nunca mais”.
- “Manda este lixo janela abaixo aí”.
De férias, fui despertado por uma mensagem de alguém a perguntar se eu sabia da veracidade do áudio com essas frases. Elas teriam sido proferidas por pessoas envolvidas no voo que transportava o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para Curitiba. Tudo indica que são verdadeiras, mas nem precisariam ser. Os desejos de morte do ex-presidente são mais do que reais. É só dar uma olhada nas redes sociais.

É apenas fruto da escalada de ódio (de classe, mas não só) que tomou conta do Brasil. A cultura do ódio fez perder todas as referências, ao ponto de tornar irrelevante o valor da vida humana. É a rejeição da civilização. É a invalidação do imperativo categórico de Kant, aquele que fala em só querer para os outros o que queremos para nós (a vida é um bem universal). Enfim, é a negação do contrato social.

O episódio, somado a tantos outros que têm acontecido ao longo dos últimos tempos, revela o estado de putrefação a que chegou um certo inconsciente social. O ódio fez perder as referências da vida em sociedade. A decência, a tolerância e o respeito pelo ser humano – e pela vida – tornaram-se moeda podre. A corrosão do caráter dos indivíduos é o caminho para o fracasso da democracia. E parece não haver volta.

Sigmund Freud escreveu que o ódio é um processo do ego que projeta a destruição do ser odiado. O alvo dessa projeção? É todo aquele que se mostra irredutível à minha própria imagem. Ou seja, se o outro é diferente e não se converte à minha imagem, é inevitável odiá-lo. E surge a negação desse outro e, em situações mais extremas, o desejo de destruição (a pulsão de morte). Lula é alvo de todo esse ódio.

Há quem rejeite a expressão “ódio de classe” (os odiadores são os primeiros), mas ela é uma evidência no Brasil. O discurso do ódio ocupa o dia a dia dos conservadores. E é sempre oportuno lembrar Bernard Shaw, quando ele diz que o ódio é a vingança do covarde. Quem tem olhado para a caixa de comentários deste blog sabe do que estou a falar.

É a dança da chuva.

Danilo Gentili, por exemplo, sugere a morte de Lula.

segunda-feira, 9 de abril de 2018

Hoje tem Reinaldo Azevedo...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
De férias, deixo o Reinaldo Azevedo ocupar o meu lugar no blog (e vejam que não sou nadinha fã do Rola Bosta). É uma fala com alguns dias, mas dado os acontecimentos dos últimos dias parece ter interesse histórico.


Lula esta preso. E agora?

POR JORDI CASTAN
Prefiro manter o foco nos assuntos paroquiais, no quotidiano da vida da vila. Esse quotidiano que nos últimos anos tem sido dominado pela inação da inépcia. Mas hoje o tema não poderia ser outro que a prisão de um condenado em segunda instância.

Depois do espetáculo vergonhoso e lamentável promovido per unas centenas de fanáticos que colocaram acima da lei, finalmente o ex-presidente Lula foi preso por crime comum. O primeiro ex-presidente brasileiro preso por crime comum. Seus seguidores insistirão em que se trata de um julgamento político, alguns até insistem em dizer que Lula é hoje um preso politico. Lula, e é bom não confundir, é um politico preso. É oportuno lembrar que esta condenação em segunda instancia é pelo primeiro processo que corre na justiça contra ele, há ainda outros e, se for condenado, como tem grandes possibilidades de acontecer sua pena será aumentada.

Lula e seus seguidores vivem num mundo fantasioso, um mundo em que acreditam que podem construir a sua realidade. Se consideram cidadãos acima do bem e do mal, membros de uma casta superior que tem direitos que não são os mesmos dos cidadãos comuns. Preocupa esta incapacidade de ver a realidade como ela é. No mundo fantástico em que acreditam que podem decidir quando, onde e como se entregar para cumprir a ordem de prisão. Acreditam ainda que podem, com truculência e bravatas, impor a "sua verdade" sobre o cumprimento da lei. É oportuno lembrar que neste episódio a imagem da justiça, da lei e da própria Policia Federal saíram arranhadas. Verdade que tanto o juiz Moro como a Policia Federal agiram com o bom senso que faltou aos organizadores do espetáculo circense em que tudo se converteu.

É bom para a imagem do Brasil ver finalmente um condenado preso. Muitos chegamos a duvidar que isso algum dia acontecesse. Ilude-se quem acredita que Lula possa ficar preso por muito tempo. Ele sabe demais e pelos seus antecedentes no passado, não seria nenhuma surpresa se, depois de uns dias em prisão, ele decidisse contar um pouco do muito que sabe. Lula não tem perfil de herói. Tal vez por isso haja tantos interessados em que ele não fique muito tempo preso.