terça-feira, 14 de novembro de 2017

Lula deve morrer? Não, o que deve morrer é o “jornalismo” da Istoé

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Lula deve morrer. A manchete da Istoé correu como um rastrilho de pólvora e incendiou as redes sociais. Poderia ser apenas um título provocador, exagerado de propósito, para vender mais revistas. Mas não. Quem leu o artigo percebe que o desejo de morte é literal: essa gente quer mesmo que Lula morra. O artigo foi recebido com perplexidade e mesmo quem não gosta do ex-presidente achou que a revista foi longe demais.

Um texto a pedir a morte de um político (um ex-presidente) mostra o fosso de areia movediça em que se debate boa parte da velha mídia brasileira. Muita gente desejou, ao autor do artigo, o mesmo que ele pediu para Lula. Mas o buraco é mais em cima. O jornalista está apenas a ser a voz do dono, a fazer o trabalho sujo para os seus superiores. Afinal, um texto assim não sai para as bancas sem a concordância dos patrões.

A situação pede um olhar por trás da cortina. Haveria motivações menos evidentes? É lídimo imaginar que o pano de fundo é a sobrevivência da própria revista. Mais do que desejar Lula morto, a Istoé tenta permanecer viva. Há uma crise. Há informações recentes a dizer que, com a queda de Dilma Rousseff, a publicidade na Istoé cresceu 1.384%. Ou seja, ascensão de Michel Temer permitiu, à revista, ganhar algum fôlego financeiro.

Que tal um exercício de memória? Em 2015, a revista publicou um texto choramingas a acusar Dilma Rousseff de estar contra alguns meios da velha mídia. “Uma das estratégias para minar o fôlego dessas publicações é reduzir a verba publicitária a elas destinada pelo Governo Federal. Esta ação ganha a alcunha de ‘guerrilha política’, em um documento do Planalto que ficou conhecido esta semana”, dizia a Istoé, em tom de lamúria.

Qualquer pessoa familiarizada com o meio jornalístico sabe que os problemas financeiros da empresa editora da revista têm sido notícia ao longo dos anos. Impostos atrasados, dívidas a bancos, dívidas trabalhistas e até penhora de imóveis fizeram a pauta do noticiário nos últimos anos. O fato é que a revista luta para sobreviver. Mas onde é que Lula entra nessa história? A resposta é simples.

Sem as verbas publicitárias do Governo Federal – e das empresas na órbita da administração central de Brasília – a vida pode ficar ainda mais complicada para a publicação. Se Lula for eleito, a torneira das verbas publicitárias pode deixar de jorrar os milhões de reais. É essencial que Lula não possa concorrer. Se concorrer, é preciso que seja derrotado. Mas Lula diz que vai concorrer. E, para piorar, as pesquisas o põem na liderança.

É aqui que a porca torce o rabo. Se Lula não morrer, talvez morra a revista, que há muito deixou de fazer jornalismo (ao ponto de ser chamada “QuantoÉ”). O jogo de sobrevivência muitas vezes obriga ao ridículo. Não vamos esquecer que no ano passado a revista atribuiu o prêmio “Brasileiro do Ano” ao presidente Michel Temer. Não há argumento racional que sustente a escolha. A não ser, claro, um piscar de olho para as verbas publicitárias.

É óbvio. Não dá para viver só das vendas e dos leitores. A revista tem penetração num meio formado por antipetistas e alguns liberais (daqueles que não vivem sem as tetas do Estado). Mas esse público representa quase um nicho de mercado, formado por leitores pouco fieis e insuficientes para dar saúde financeira a qualquer projeto editorial. Portanto, sem verbas publicitárias – e eventualmente outras bondades governamentais – a coisa complica.

Enfim, Lula é um perigo para a Istoé. E por isso deve morrer.

É a dança da chuva.

P.S.: Para evitar mal-entendidos, como jornalista não desejo o fim de qualquer título, mas lamento que alguns estejam a matar o jornalismo.





Perdão


POR SANDRO SCHMIDT

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Evolução


POR SANDRO SCHMIDT


Como vai a cidade? Pergunte ao motorista de táxi...


POR JORDI CASTAN
Hoje mesmo de caminho para o aeroporto escutei as lamentações do motorista de táxi que me levava. Se queixava da má qualidade da obra da (mal) chamada duplicação da avenida Santos Dumont. O traçado, a péssima sinalização, o ritmo das obras, o perigo que representa trafegar por uma rua nestas condições. Não faltaram os impropérios comuns a quem, morando em Joinville, não consegue aceitar o nível de abandono, a má qualidade das obras e o descaso com a gestão da coisa pública.

Da cantilena para reclamar do novo atraso na data de conclusão das obras e, quase sem tomar fôlego, o motorista passou a se queixar do orçamento divulgado para a publicidade da Prefeitura. Na sua opinião, há dinheiro demais para obras e resultados de menos. Motoristas de táxi são bons indicadores da situação de qualquer cidade e permitem medir com precisão a temperatura política. Incomoda o cidadão comum que a verba usada para divulgar o pouco que se faz seja maior, na sua percepção, que o dinheiro investido nas próprias obras.


Com poucos minutos de viagem até ao terminal só deu tempo para escutar os comentários sobre a suposta ponte que o prefeito anda anunciando. Desde sua sabedoria, o chofer de táxi, vaticinou que a dita ponte não seria executada nem no prazo, nem pelo custo divulgado, nem seria seguido o projeto apresentado. Impossível discordar da sua leitura. Sem a menor credibilidade, perplexa, a gestão municipal passa os dias mergulhada na sua própria incompetência.

A conversa, que mais foi um monólogo, me fez lembrar da frase: "Quando os de cima perdem a vergonha, os de baixo perdem o medo". As críticas são tantas, tão comuns e tão frequentes que ninguém mais tem vontade de perder tempo discordando dos comentários. A única resposta é assentir e torcer para que acabe logo. E que na próxima eleição possamos ter a opção de votar num candidato que tire esta cidade do marasmo em que está mergulhada.

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Ioga antipetista. Ideal para os anônimos...

POR ET BARTHES

A saúde pública, o conhecimento popular e o preconceito do gestor

POR DOMINGOS MIRANDA
O universo tem como característica a diversidade. A sociedade também segue este padrão, não é formada apenas por branco e preto, existem inúmeros outros matizes. E na saúde sabemos que é possível tratar as doenças do corpo e da mente das mais diferentes maneiras. O bom gestor não deve ter preconceito e colocar em prática todos os métodos possíveis. Duas cidades do Sul do Paraná – Rebouças e São João do Triunfo – deram um exemplo neste sentido. O serviço público de saúde criou carteirinhas para as benzedeiras e benzedores, permitindo que estes frequentem os estabelecimentos de saúde e que acompanhem os pacientes que desejarem o seu serviço. A população da vizinha Irati também está se mobilizando para alcançar o mesmo objetivo.

Isto não tem nada de anormal, falta apenas vontade política dos gestores. A Organização Mundial de Saúde, através da sua Declaração de Alma Ata, de 1978, deixa claro que é importante o aproveitamento dos saberes populares no atendimento primário de saúde. A Política Nacional de Práticas Alternativas, do Ministério da Saúde, já permite esta prática. No caso das comunidades do Paraná, isto aconteceu porque o povo se uniu em torno do Movimento Aprendizes da Sabedoria. O médico neurocirurgião Sérgio Felipe de Oliveira defende a presença das benzedeiras nos tratamentos e diz que “a força da fé é tremenda”.

No entanto há um outro lado importante desta prática religiosa. Quase todas as benzedeiras também trabalham com a fitoterapia, oferecendo de graça remédios feitos com plantas medicinais. Em um momento de crise profunda na economia, está aí uma boa solução para aliviar o bolso dos doentes e dos cofres públicos. A ciência já provou que as ervas curam, como faziam nossos avós no passado.

No entanto, como dizia o aclamado físico Albert Einstein, “é mais fácil quebrar um átomo do que derrubar um preconceito”. E isto é o que estamos vendo em Joinville. Em 2010 foi aprovada a Lei 6.774, de autoria do vereador Manuel Bento, que criava o Programa Municipal de Plantas Medicinais e Fitoterápicos. O então prefeito Carlito Merss, com o apoio de outras entidades como a Pastoral da Saúde, começou a colocar em prática a fitoterapia na Secretaria de Saúde. Mas, a partir de  2012, no governo do prefeito Udo Döhler, o programa foi desativado. Por falta de incentivo, uma associação de pessoas que produziam remédios fitoterápicos deixou de existir. Quem mais perde com atitudes como esta é a população.

Em 2016, o deputado Darci de Matos encaminhou ofício à reitora da Univille,  Sandra Furlan, propondo que fosse estabelecido contato com a Universidade de Medicina Tradicional Chinesa, em Henan, cidade irmã de Joinville, no sentido de firmar um convênio. A universidade chinesa tem importantes trabalhos na área de fitoterapia e em Joinville temos um dos maiores laboratórios fitoterápicos do país. A Univille poderia ser um elo importante nesta parceria. Mas até hoje o parlamentar não obteve resposta.

Assim, caminhando na contramão de outras cidades que deixaram de lado o preconceito, Joinville abdica de usufruir dos benefícios de uma terapia alternativa tradicional, já testada pelos cientistas, pelos índios e por nossos antepassados. A fitoterapia tem custo barato, pois a natureza nos oferece de graça os seus ingredientes básicos. Mas, nossos gestores continuam teimosos, se recusando a enxergar uma saída para as dores da sociedade. Há cerca de dois anos foi feita uma pesquisa e 65% da população colocou a saúde como a principal queixa contra a prefeitura. Está na hora de atentar para este dado e aliviar o sofrimento do povo que depende do SUS.

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Pobre


POR SANDRO SCHMIDT

Por que Judith Butler assusta os obscurantistas?

POR JANDIRA FERRAZ
“Queima, bruxa. Aqui no Brasil não”. Esta foi a proclamação feita ontem, em altos berros, em frente ao Sesc Pompeia, em São Paulo. Parecia o anúncio da chegada da Idade Média, mas não. A bruxa em questão – materializada num boneco queimada em termos simbólicos – é a pensadora Judith Butler, uma referência no estudo da teoria do gênero em todo o mundo.

Mas o que faz essa perigosa Judith Butler para provocar tamanha ira? Talvez a resposta comece pela própria descrição: “pensadora”, “filósofa”. Ah… nada assusta mais os obscurantistas que uma pessoa associada ao pensamento. E para os fanáticos do Brasil destes tempos tudo virou “ideologia de gênero”, tudo tem o objetivo de destruir os alicerces da família.

E que tal tentar entender o que pensa a filósofa? Um aviso: o texto que segue não pretende analisar a obra da professora norte-americana, mas apenas fazer uma recolha de algumas citações (quotes) facilmente encontradas na internet. Mas se são citações normais em qualquer universidade do mundo, não é a mesma coisa no Brasil, onde provocam medo.

- “Sempre fui uma feminista. Isso significa que eu me oponho à discriminação das mulheres, a todas as formas de desigualdade com base no gênero, mas também significa que exijo uma política que leve em consideração as restrições impostas pelo gênero no desenvolvimento humano”. 

- “O jornalismo é um lugar de luta política... Inevitavelmente”. 

- “Sem dúvida, o casamento e as alianças familiares do mesmo sexo devem ser opções disponíveis, mas convertê-las um modelo de legitimidade sexual é precisamente restringir a socialidade do corpo de forma aceitável”.

- “Qualquer que seja a liberdade por que lutamos, deve ser uma liberdade baseada na igualdade”.

- “Existe uma boa maneira de categorizar os corpos? O que as categorias nos dizem? As categorias nos dizem mais sobre a necessidade de categorizar os corpos do que sobre os próprios corpos”.

- “As pessoas se perdem no que leem, apenas para retornar a si mesmas, transformadas e fazendo parte de um mundo mais amplo".

- “Afinal, a justificativa para a luta está no campo sensorial. O som e a imagem são usados para nos recrutar para uma realidade e para nos fazer participar dela. De certa forma, toda guerra é uma guerra contra os sentidos. Sem a alteração dos sentidos, nenhum Estado poderia fazer a guerra”.

- “Também não acredito que a literatura possa nos ensinar a viver, mas as pessoas que têm dúvidas sobre como viver tendem a recorrer à literatura”.

- “A estrutura das crenças é forte ao ponto de permitir que alguns tipos de violência sejam justificados ou nem mesmo sejam considerados como violência. Assim, vemos que não se fala de assassinatos, mas de baixas, e que não se menciona a guerra, mas a luta pela liberdade”.

- “Se Lacan presume que a homossexualidade feminina é causada por uma heterossexualidade mal resolvida, como mostra a observação, não seria tão claro para o observador que a heterossexualidade provenha de uma homossexualidade mal resolvida?”

- “O amor não é um estado, um sentimento, uma disposição, mas uma troca. Desigual, repleta de história, fantasmas, anseios que são mais ou menos legíveis para aqueles que tentam se ver com a sua própria visão defeituosa”. 

- “Os papéis masculino e feminino não são biologicamente fixos, mas socialmente construídos”.

E então? Dá para achar que Judith Butler é uma bruxa?

terça-feira, 7 de novembro de 2017

O mito e o mico: Bolsonaro vai ter aulas de economia “básica”

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
O negócio é o seguinte. Segundo a imprensa, Bolsonaro está a contratar um professor para ter aulas de economia “básica”. Atenção, que nunca é demais repetir: “básica”. E tudo por causa daquele mico gigantesco na entrevista concedida à jornalista Mariana Godoy, na RedeTV. Há o risco de a notícia ser falsa. É difícil acreditar que Bolsonaro esteja disposto a estudar. Não faz sentido. A ignorância é a essência do “mito”.

A ser verdade, a civilização terá uma rara oportunidade de concordar com Bolsonaro. Quem não sabe estuda. Pena que a sua rude capacidade intelectual não lhe permita ir além do “básico”. Mas pode ser um precedente perigoso para o putativo candidato à presidência. Se ele está determinado a estudar as coisas em que é ignorante, então os professores terão muito trabalho para os próximos anos. Não é só a economia.

Bolsonaro deveria estudar história, geografia, administração, relações internacionais, antropologia, sociologia, educação física (lembram das flexões?), comunicação social, oratória, direitos civis, cultura e tantas outras áreas onde já demonstrou ser olimpicamente ignorante. Mas se Bolsonaro não for estudar há uma saída: estudar Bolsonaro. Afinal, quem já estudou semiologia sabe que o mito é distorção da realidade. Faz sentido. 

O problema para Bolsonaro, se for mesmo estudar, é o risco de perder votos. Afinal, expressiva parte do seu eleitorado é formada por gente que aposta no obscurantismo e que não cansa de dar provas de fé no anti-intelectualismo. Ou seja, o “mito” só existe para pessoas que rejeitam o conhecimento, as luzes e a modernidade. Se introduz a ideia de estudo no seu perfil, Bolsonaro arrisca-se a quebrar os elos que o unem ao eleitorado.

Mas no frigir dos ovos, o candidato já  proporcionou um dos momentos mais antológicos da televisão nos últimos tempos. A reação perplexa da jornalista Mariana Godoy ao ouvir Bolsonaro a trucidar a história e elogiar os governos militares. Uma interjeição simples, formada por apenas duas simples letrinhas, é a melhor definição das qualidades intelectuais de Bolsonaro. E vale também para os seus seguidores.

- Oi!?!?!?!?!?

Está tudo dito.

É a dança da chuva.