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sexta-feira, 3 de maio de 2013

O direito de coçar o saco


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Gente, todas as semanas deveriam ser como esta, com um feriado na quarta-feira. É que além do descanso a gente acaba por ter duas sextas-feiras. É tempo para o relax, para o dolce far niente e para manter o cérebro a vadiar. Mas cabeça vazia é a oficina do diabo. E foi São Jerônimo quem avisou, por outras palavras:
-     - Trabalha em algo, para que o diabo te encontre sempre ocupado.

Em resumo, o santo mandou um tremendo "vai trabalhar, vagabundo". Mas tem uma coisa chata nessa história. Se você acredita que o trabalho realmente dignifica o homem, então a expressão  “arbeit macht frei” (o trabalho liberta) deve soar como música para os seus ouvidos. O problema é que, por uma triste ironia, esta frase estava escrita no portão do campo de concentração de Auschwitz. É uma metáfora a ter em conta nos dias de hoje.

UMA INVENÇÃO DO DEMO - Não tenho dúvidas, caro leitor, de que o trabalho foi uma invenção do demo, o coisa-ruim. Afinal, todo mundo sabe que no paraíso ninguém trabalhava (é por essa razão que o lugar se chamava paraíso). Só depois de Adão e Eva terem sido apanhados no rala-e-rola é que surgiu aquela coisa de "comerás o pão com o suor do teu rosto". Quer dizer, o trabalho foi um castigo imposto ao homem e à mulher por eles terem caído na gandaia.

Aliás, as palavras trabalho (português), trabajo (espanhol) e travail (francês), por exemplo, vêm todas do latim tripallium, que era um instrumento de tortura na Idade Média. Está tudo dito: é uma punição. E o castigo é passarmos 8, 9, 10 ou até mais horas enfiados em ambientes sacais, na companhia de pessoas que não aturamos, a fazer coisas que não gostamos e a ganhar salários que nunca chegam para o que precisamos.

MENOS EM JOINVILLE - Todos sabemos que o trabalho é aquela coisa chata que acontece no meio da diversão. É assim em todos os lugares. Menos em Joinville, claro. Porque quem mora na cidade acaba por se sentir dentro de um livro do Max Weber. O espírito do capitalismo e a “ética” do chão de fábrica são coisas sagradas para os joinvilenses. É o culto do trabalho.

Bem... a esta hora imagino que haja leitores a torcer o nariz e a me chamar de vagabundo (certo, mas sou um vagabundo que trabalha muito). E não deixa de ser divertido que as pessoas nunca questionem a validade do trabalho, que em outros momentos da história já foi visto como uma maldição, uma vergonha. É só lembrar que os nobres, antes da queda do feudalismo, tinham pavor a pegar no duro.

Há umas curiosidades divertidas. O leitor e a leitora sabem, por exemplo, de onde surgiu aquele hábito dos ricos, que esticavam o dedo mindinho sempre que seguravam uma xícara? A coisa vem dos tempos feudais e era um forma que os nobres tinham para mostrar que eram diferentes dos trabalhadores. Por terem as mãos grossas e calejadas do trabalho, os coitados não conseguiam esticar o tal dedinho. Viu? Cabo de enxada também é cultura.

UM DEFUNTO NA SOCIEDADE - Para que o leitor não fique aí a imprecar contra a minha pessoa, não sou eu a questionar o trabalho. E apresento aqui um excerto de um texto de Paul Lafargue, genro de Karl Marx (por sinal, o velho barbudo errou, porque achava que a emancipação do homem viria justo pelo trabalho):

-       Uma estranha loucura se apossou das classes operárias das nações onde reina a civilização capitalista. Esta loucura arrasta consigo misérias individuais e sociais que há dois séculos torturam a triste humanidade. Esta loucura é o amor ao trabalho, a paixão moribunda do trabalho.

Aliás, Lafargue relembra que o trabalho foi um castigo de Deus, com aquela coisa do “suor do teu rosto”. Não concorda? Pois fique a saber que há opiniões piores. E atuais. O Grupo Krisis, por exemplo, diz que o trabalho é um defunto que domina a sociedade.

-       A produção de riqueza desvincula-se cada vez mais, na sequência da revolução microeletrônica, do uso de força de trabalho humano - numa escala que há poucas décadas só poderia ser imaginada como ficção científica. Ninguém poderá afirmar seriamente que este processo pode ser travado ou, até mesmo, invertido. A venda da mercadoria “força de trabalho” será no século XXI tão promissora quanto a venda de carruagens de correio no século XX.

Imagino que muita gente nunca tenha pensado nisso. Mas o trabalho, como o entendemos hoje, logo vai ser apenas uma memória. Quem viver...

sábado, 27 de abril de 2013

Racista, homofóbico e agora chantagista?


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Deixei passar um tempo para ver o que rolava. Como nada aconteceu, agora retorno ao assunto. Esse pessoal da “esquerda” por vezes decepciona. E escrevo esquerda com aspas porque é um guarda-chuva onde muitos querem se abrigar de forma imerecida. Os caras andavam numa sanha onde só se falava em Marco Feliciano. Era Marco Feliciano para cá para cá, Marco Feliciano para lá, Marco Feliciano para acolá. Mas agora é só silêncio.

Tudo mudou quando o estafermo do pastor veio com aquela treta de impor uma condição para deixar a Comissão dos Direitos Humanos: os deputados João Paulo Cunha e José Genoíno, ambos do PT e condenados no processo do “mensalão”, tinham que abandonar a Comissão de Constituição e Justiça. Foi tiro e queda. A partir daí não se ouviu um pio sequer sobre o tema.

Era óbvio que deputado pastor estava a fazer uma ironia e não a propor uma negociatazinha, até porque estava garantido no cargo. Mas parece muita gente levou a chantagem a sério. Ou seja, em vez de juntar a palavra “chantagista” a “homofóbico” e “racista”, esse pessoal meteu o rabinho entre as pernas e silenciou. Um erro estratégico, porque parecia óbvio que se a contestação continuasse o cara não se aguentava no cargo.

Meus amigos, vamos separar as águas: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. É mais do que óbvio que o deputado não tem perfil – e sequer qualidades deontológicas – para defender os direitos humanos. Tirá-lo de lá é uma guerra específica. A batalha para tirar José Genoíno e João Paulo da Comissão de Constituição e Justiça é outra e provavelmente terá outros interessados.

Ora, essa desmobilização não faz sentido. Há duas semanas o cara era o demo em forma de pastor e hoje está tudo bem? Ou será que as causas de internet não resistem a uns diazinhos? Ou podemos acreditar que a consistência política das pessoas não resiste a uma chantagenzinha despudorada? O cara continua lá. Vocês vão baixar os braços? Então não reclamem.

sábado, 23 de março de 2013

Viagem de Dilma: o que a imprensa não me disse

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Confesso que, n0 início, o assunto da grana gasta pela presidente Dilma Roussef na viagem à Europa não me interessou. Afinal, é um tema recorrente que vez por outra surge por aí pelo mundo (até aqui mesmo neste pequenino Portugal). Mas quando vi, nas redes sociais, o pessoal ligado ao partido do poder pedindo desculpas pelo ocorrido fiquei curioso.

Aliás, o que me fez escrever sobre o assunto foi uma notinha do Guilherme Gassenferth, ex-integrante do blog, no Facebook. Ele reproduzia a charge (ali abaixo) com o seguinte comentário: “Que patada certeira no PT/governo federal a charge do Iotti em ANotícia hoje, não? É indefensável, infelizmente”. E os comentários que se seguiam eram todos a desancar a presidente.




Mas se todos - opositores e defensores do partido da presidente - estão em acordo é motivo para olhar a questão mais de perto.  Afinal, quando todos estão a pensar igual, é porque ninguém está a pensar. E aí baixou o bicho jornalista em mim. Fui dar uma pesquisada e, depois de muito ler, fiquei com muito mais perguntas que respostas.

Se eu ainda trabalhasse numa redação de jornal, tentaria esclarecer algumas questões. Mas não lembro de ter lido, na grande imprensa brasileira, alguém a fazer as perguntas óbvias que mesmo um jornalista inexperiente teria a obrigação de fazer:
Pergunta 1. Quantas pessoas são precisas numa viagem presidencial?
Pergunta 2. Qual é a estrutura necessária para um governo em viagem poder governar?
Pergunta 3. Qual é o custo diário médio diário de uma viagem presidencial?

Procurei, procurei, procurei. Mas na imprensa brasileira, ao não ser que a coisa me tenha escapado, parece que ninguém perguntou e ninguém respondeu. Só parece importar a indignação do populacho e dos desafetos do partido no poder. Eu entendo que o tema desperte paixões nas mentes mais simples, mas a imprensa tem que manter o rigor.

Tudo isso fez lembrar um caso parecido, que aconteceu nos States faz uns meses. A chazista Michelle Bachmann (queria saber que chá ela bebe) foi à televisão dizer que uma viagem do presidente Obama à Índia iria custar US$ 200 milhões por dia aos cofres públicos. Foi um berreiro. O pessoal afeito ao Tea Party tentou estimular uma onda de indignação. Mas logo as pessoas perceberam que a informação era falsa e a coisa parou.

Mas como estava no tema, aproveitei para ver se os jornalistas norte-americanos tinham feito a lição de casa. E não é que fizeram? Fiquei a saber que uma viagem de um presidente dos Estados Unidos a outro país custa a bagatela US$ 10 milhões por dia. A explicação, dada há alguns anos por um porta-voz de George W. Bush, pareceu-me convincente: “é preciso recriar uma mini Casa Branca”.

Então pergunto: qual seria o valor aceitável para uma viagem de Dilma Roussef? Não sei. Mas a grande imprensa parece não gostar de fazer as perguntas certas e não ajuda a esclarecer. Pelo contrário, prefere estimular o irracionalismo de uma indignação balofa, desinformada e com rancores de classe.

Ou é desatenção minha ou acho que as perguntas ainda não foram respondidas. Aliás, se o leitor e a leitora chegaram até aqui na leitura deste texto vão perceber que não fiz qualquer julgamento de valor. Até porque acho a visita ao papa uma tremenda parolice. Mas acho interessante refletir sobre o papel da imprensa, que prefere o "auê" à informação.

P.S.  E antes que apareça alguém a dizer que estou a fazer a defesa de Dilma (coisa que não estou) explico que já no tempo de FHC achava essa discussão uma babaquice. Os presidentes dos países têm que poder viajar com a dignidade que o cargo exige. Ou querem que a presidente vá dormir no Ibis Budget?

quinta-feira, 21 de março de 2013

A sua cidade é moderna? Faça o teste


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Hoje proponho um teste aos leitores. É uma forma de tentar saber o quanto a sua cidade (qualquer cidade, em qualquer país) está no caminho da modernidade. Ou seja, se é feita a pensar nas pessoas. Como é óbvio, o teste tem os seus limites, uma vez que não é feito com bases científicas aferidas por um instituto qualquer. Mas permite um rápido diagnóstico. E, no final, pode conferir os resultados (que são baseados na minha opinião, claro).

1. O planejamento em termos de mobilidade urbana é feito a pensar nas pessoas. Ou seja, o cidadão tem prioridade em relação aos carros.
(   ) SIM (   ) NÃO

2. Há um grande leque de opções destinadas ao lazer da população, como parques, praças, jardins ou áreas verdes com boas infraestruturas etc.
(   ) SIM (   ) NÃO

3. O transporte público é de qualidade e tem opções intermodais (mais de um tipo de veículo), oferecendo interfaces para o usuário.
(   ) SIM (   ) NÃO

4. A mídia é independente, informativa, educativa. Não existem os tais canetas ou bocas de aluguel.
(   ) SIM (   ) NÃO

5. Os turistas têm coisas relevantes para ver, como museus, monumentos, espaços culturais. O calendário de eventos é atraente para o visitante e as opções de lazer são suficientes para reter o turista por mais que dois dias.
(   ) SIM (   ) NÃO

6. Os serviços públicos são capazes de atender as necessidades da população, mesmo levando em consideração as dificuldades econômicas por que passam as cidades.
(   ) SIM (   ) NÃO

7. Tem uma vida cultural efervescente e movimentos de vanguarda que vão transformando o espaço público num lugar que aponta para o futuro.
(   ) SIM (   ) NÃO

8. A economia da cidade dá prioridade às indústrias modernas e ecológicas, como as ligadas às tecnologias da informação e à sociedade do conhecimento.
(   ) SIM (   ) NÃO

9. A ecologia é uma preocupação. O lixo é separado, as ruas estão bem cuidadas, as áreas verdes são estão preservadas, os rios são pontos de atração para os moradores.
(   ) SIM (   ) NÃO

10. Há a uma preocupação com a inclusão digital, com o acesso das camadas mais pobres às tecnologias da informação (zonas públicas de internet wi-fi, por exemplo).
(   ) SIM (   ) NÃO

11. Desde o jardim de infância à universidade, o sistema de educação atende às necessidades da cidade, tanto do ponto de vista econômico quanto cultural.
(   ) SIM (   ) NÃO

12. O patrimônio público, como escolas, museus, bibliotecas ou arquivos, está em bom estado de conservação.
(   ) SIM (   ) NÃO

13. Os formadores de opinião são pessoas estudiosas, bem informadas (e formadas) e que inspiram respeito.
(   ) SIM (   ) NÃO

14. Os políticos são, na maioria, pessoas interessadas em defender o bem comum e em quem o cidadão pode confiar.
(   ) SIM (   ) NÃO

15. A tolerância política é uma norma. A liberdade de expressão é total e ninguém corre o risco de ser discriminado por uma posição qualquer.
(   ) SIM (   ) NÃO


RESULTADOS
- 10 a 15 respostas SIM: você mora numa cidade onde até pessoas do tal primeiro mundo gostariam de viver. Legal.
- 5 a 9 respostas SIM: a sua cidade tem problemas, mas há uma base interessante que permite consertar o que está mal.
- 1 a 4 respostas SIM: Você precisa ter uma conversa com o seu título de eleitor.
- 0 (zero) respostas SIM: Oooops!


P.S. Se fez todo o teste, aproveite para contar a sua experiência nos comentários.

segunda-feira, 11 de março de 2013

10 linhas sobre Chávez


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Ouvi dizer, há muitos anos, que um teste da Unesco sobre a alfabetização era pedir à pessoa que escrevesse 10 linhas sobre a própria vida. Se conseguisse, era considerada alfabetizada. Verdade ou não, parece ser um bom método de análise.

Decidi usar esse mesmo método no caso Hugo Chávez. Sempre que alguém fazia uma acusação, como negar a inexistência de democracia na Venezuela, eu pedia que elaborasse um texto de 10 linhas sobre o que tinha acabado de afirmar. 

Ops! Atenção aos caras que odeiam Lula e, por causa disso, odeiam Chávez. Não há aí uma tomada de lado: é apenas um pedido de argumentário. Só os fatos, nada de “ouvi dizer”. E nas “regras do jogo” dizia que não aceitava afirmações genéricas e links da Veja.

É só uma questão a alfabetização política. Claro que até agora não obtive uma única resposta.