POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
> A primeira edição do Charlie Hebdo
pós-massacre já está nas bancas. O primeiro número anunciado era de um milhão de
exemplares, passou para três milhões e, no final, acabou em cinco milhões. E foram poucos. Logo pela manhã os franceses formaram filas para comprar um
exemplar do semanário, que hoje tem edições em 16 línguas e mais de 25 países.
Esgotou.
> A capa da edição de hoje (à esquerda) traz uma imagem de
Maomé a falar em perdão, a dizer que é Charlie, mas com uma lágrima no canto do
olho.
> Fontes do “Le Canard Enchaine”, o maior
semanário satírico francês, com tiragem de cerca de 500 mil exemplares,
disseram ter recebido ameaças terroristas, com a promessa: “agora é a vossa
vez”. Mais ataques à liberdade de expressão.
> A direita europeia começa a sacudir a água do
capote. Diz que a austeridade imposta ao velho continente nos últimos anos nada
tem a ver com a gênese de terroristas como Charif e Said Kouachi. Será que não? De qualquer forma, a preocupação dos conservadores em desconstruir essa
teoria é um bom indicativo do contrário.
> A austeridade resulta em desemprego, desigualdade
e miséria. O clima de exclusão tem relação com a cooptação de jovens europeus
pelos extremistas? Tem. Que tal este exemplo? Há alguns anos, antes de ser recebido
por Nicolas Sarkozy, o terrorista Amedi Coulibaly (o do segundo atentado em
Paris) disse à imprensa que, caso tivesse oportunidade, iria pedir um emprego
ao então presidente francês.
> Por estranho que pareça, no Brasil há muita
gente a demonizar a França. Deve ser coisa de gente que nunca pôs os pés na
terra de Asterix. A sociedade francesa é uma das mais inclusivas do mundo. É
claro que há islamofobia. Mas não é generalizada e atinge mais intensamente franjas
situadas à direita.
> A esquerda brasileira entrou numa espiral
esquizofrênica. Refém de ideias monolíticas, não sabe como reagir aos fatos.
Não raro há tentativas de relativizar o ataque terrorista ao semanário Charlie.
Temos que aceitar todos os pontos de vista. O problema é que os argumentos por
vezes roçam a infantilidade.
> Em Paris, na França, morreram 17 pessoas. Em
Baga, na Nigéria, morreram 2 mil pessoas. Ora, são ambos casos deploráveis e
cada um tem o seu simbolismo. Mas fazer – como muita gente tem feito – uma
comparação contábil entre os casos, de forma a relativizar o massacre de Paris,
é um caso de desonestidade intelectual.
> Gente que se diz marxista a pedir respeito
pela religião do outro. Ora, o primeiro objeto de estudo do velho barbudo (então jovem) foi
justamente a religião, que ele considerava o maior problema das sociedades.