segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Revista


Udo Dohler e o moinho: entre a preguiça e a falta de coragem


POR JORDI CASTAN
O nosso gestor municipal tem todo o seu tempo ocupado. Passa os dias entre a articulação da sua quimérica candidatura ao governo do Estado, não fazer nada por Joinville e vistoriar o setor de hortifrúti do Angeloni. Não fosse isso, me atreveria a lhe propor uma visita a Santa Fé, na Argentina. Há na cidade um moinho que lembra o nosso em tudo. Também foi abandonado pela empresa que o operava. E também surgiram mil propostas amalucadas envolvendo especuladores imobiliários e o poder público.

A diferença é que lá decidiram pôr as mãos na massa e, com pouco orçamento mas muita criatividade, fizeram o que precisava ser feito. Incorporaram o moinho ao patrimônio da cidade. Incorporaram não quer dizer o que se fez aqui com a Cidadela Cultural ou com a antiga prefeitura na Max Colin. Não se trata só de comprar e deixar abandonado. Ou converter o espaço num cortiço sem dono. Incorporar quer dizer primeiro ter um projeto.  E depois gente capaz de levar o projeto adiante. É aí que a coisa complica sempre em Joinville. Não há projetos, quando há estão mal feitos, ou são inviáveis e não há propostas para o uso posterior do espaço.




O máximo que os nossos gestores fazem, além de ficar o dia inteiro sentados olhando a maré subir e descer o Cachoeira, é imaginar que alguém vai implantar lá um shopping ou um prédio comercial. O que, claro, geraria mais IPTU e empregaria alguns vendedores, repositores ou caixas se for um supermercado. Convenhamos que criatividade e inovação não são características pelas quais Joinville tenha se destacado nos últimos anos.

A lógica cartesiana do contador de centavos só entende de cortar, depenar, desmantelar, derrubar, demolir. A cultura e o meio ambiente têm sido as áreas mais duramente castigadas por esta gestão. O que, alias, é bem significativo. O preço dessa visão retrógrada sairá caríssimo para as gerações futuras. Mas essa é outra historia.

O que fazer com o velho moinho? Que temos a aprender de Santa Fé? Muito. Primeiro é uma cidade com pouco mais de 500.000 habitantes, banhada por três rios, um deles o Paraná e outro o Salado. Uma cidade que convive com enchentes enormes e gravíssimas, das que matam gente e causam enormes prejuízos econômicos. 

Mas os santafesinos criaram parques nas margens dos rios para que tenham por onde crescer sem destruir ou minimizando ao máximo os estragos. Entenderam que não é uma boa ideia ocupar várzeas e fundos de vale. Também têm o costume de preservar e valorizar seus marcos históricos e, neste sentido, o projeto de converter o velho moinho Marconetti numa escola de Artes, Música, Dança, Cerâmica e num espaço para exposições e eventos é um sucesso. Só as escolas que formam o chamado Liceo Municipal reúnem mais de 2600 alunos, incluindo também os dos cursos de idiomas gratuitos oferecidos pelo município.



Assim, o que inicialmente era uma área degrada e prevista para projetos imobiliários que implicavam a demolição do velho moinho, hoje é uma ampla área verde, que acolhe a centenas de alunos. O projeto de Santa Fé Cidade é mais amplo mais ambicioso e faz da cidade o maior polo de indústrias criativas da Argentina, é uma referencia para América Latina.

Ah... mas voltemos a Joinville. O nosso problema, além da nossa incapacidade de projetar a cidade para o futuro, é que pensamos pequeno. O mais arrojado a que chegamos é discutir mão inglesa ou mudança de mão. Até nossos vereadores tem palpites da dar sobre o tema. Usamos a falta de dinheiro como desculpa para nada fazer, quando na verdade o verdadeiro problema é a inépcia e a incompetência. E estou começando a incluir nesta lista de motivos a preguiça. Porque não acredito que esta falta de iniciativa seja covardia. Aí sim seria uma vergonha que uma cidade como Joinville se apequene na mão de gente covarde, sem coragem.




A proposta é simples. Mandem alguém a Santa Fé. A passagem é bem mais econômica que ir para Europa ou para os Estados Unidos e as semelhanças entre as duas realidades são muito mais próximas. A diferença é o espírito dos homens públicos de lá, gente que enxerga longe e tem coragem. 

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

Em Santa Catarrina não falta dinheirro, falta xestón


POR BARÃO VON EHCSZTEIN
Voll geil! Até que enfim. A nossa querrida prefeito decidiu chutar a balde. E falou, lá na xornal, que quer renunciar e deixar o Prefeiturra em april. Mas nón precissam ficar tristes e nem chorrar, xoinvilenses, porque é tudo parra melhor: a nossa querrida prefeito vai virrar a nossa querrida governador. Podem comemorrar, catarrinenses, porque agorra foceis vón ter uma governo de verdade. Ein prosit! Uma brinde.

Eu nón gosto de me meter nos coisas da política. Das ist nicht mein Bier. Nón é o meu cervexa... ops... nón é o meu praia. Mas agorra o coisa anda. Todo mundo sabe que em Santa Catarrina não falta dinheirro, falta xestón. E com uma xestor profissional, que resolveu todas as problemas de Xoinville, vamos construir a Santa Catarrina dos próximas 30 anos. É como a xente diz no meu querrida Alemanha: “Abwarten und Tee trinken”. Esperre e veja...

Xá imaginaram? Agorra Santa Catarrina vai ter o mesma estilo de governo que transformou Xoinville num citade de primeira mundo. Se a nossa querrida prefeito – e futurra governador – promete, pode acreditar porque vai cumprir. Parra começar, vai acabar esse wasserkopf, aquele administraçón cheia de comissionadas inúteis na governo da Estado. Como ele fez em Xoinville. Ein Schwein haben! É muita sorte, catarrinenses.

Mas tem um coisa que me deixa encafifado. O que vai acontecer com Xoinville quando a nossa querrida prefeito for ser governador? Quem assume o Prefeiturra é a vice. E dessa mato nón sai Coelha. Xente, eu sou conservadorra, mas fico parrecendo uma anjinho perto dele. A Coelha é muito... como é aquela palavra que as kommunist gosta de ussar... ah... lembrei... reacionárria. Nón tem “alle Tassen im Schrank"... nón joga com a barralho todo.

Mas vamos esquecer a Hase, porque o horra é de comemorar. É Santa Catarina a caminho da primeiríssima mundo (mas é melhor nón ir pela Santos Dumonte). Viva a nossa querrida prefeito. Viva a nossa futurro governador. Achtung, palim, palim! Vai ser uma tremendo sucesso, porque nón tem segreda, aqui é trabalho.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

A Notícia - 95 anos.


O Rio, a insegurança pública e a irresponsabilidade política


Muito se comentou, nos últimos dias, sobre o temor expresso pelo general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, de que os militares enfrentem uma nova Comissão da Verdade caso atuem no Rio sem nenhum respaldo jurídico excepcional. A preocupação, manifestada durante reunião do Conselho da República e da Defesa Nacional, se soa uma excrescência à primeira vista, deixa de sê-lo se lida com mais vagar.

Para uma instituição que prendeu, estuprou, torturou e assassinou sem nunca ter sido chamada à responsabilidade, mesmo o trabalho de uma Comissão cujos resultados práticos foram próximos ao zero pode constranger de alguma forma sua costumeira impunidade. Mas o comentário de Villas Bôas ganha outro sentido se o colocamos lado a lado à entrevista do Ministro da Justiça, Torquato Jardim, concedida ao Correio Braziliense.

Ele parece não ter dúvidas quanto a natureza da intervenção, nem tampouco sobre os seus efeitos. De acordo com Torquato Jardim, “não há guerra que não seja letal”, e quando se trava uma guerra tão peculiar, que ele classifica de “assimétrica”, todos são potencialmente inimigos, mesmo uma criança bonitinha, de 12 anos, que ninguém sabe o que faz depois que sai da escola.

A retórica belicista não é nova em se tratando das comunidades periféricas, onde se acumulam cadáveres assassinados em incursões policiais eugênicas. E tampouco é novidade que sua população seja tratada como inimiga: durante a cobertura televisiva dos confrontos entre manifestantes e policiais em junho de 2013, por exemplo, um ex-membro do BOPE, Rodrigo Pimentel, censurou um soldado que descarregou uma metralhadora com tiros para o alto porque “uma arma de guerra, uma arma de operação policial em favelas, não é uma arma pra ser usada no ambiente urbano…”.

No discurso de um ministro que se diz da Justiça, esse tipo de retórica ganha outros significados. O primeiro e mais imediato é que, sob o pretexto de combater o crime, em especial o chamado crime organizado, e diminuir os índices de violência, o Estado está a declarar guerra contra uma parcela de sua população – ou talvez seja mais correto dizer, está a aprofundar uma guerra já declarada há muito tempo.

Mas há coisas não ditas nas entrelinhas do discurso de Torquato Jardim que merecem nossa atenção. Ela denota, de um lado, a total ausência de planejamento, um conjunto de intenções, alguma coisa que sinalize uma preparação por parte do governo a fundamentar a intervenção. O despreparo pós-decreto caminha pari passu e é o complemento à total opacidade dos governos, federal e carioca, sobre os números que justificam a intervenção.

Uma guerra contra os pobres – É verdade que parte da cidade do Rio de Janeiro vive um cotidiano de violências por vezes extremo, incluindo a violência policial. Mas não se trata de um problema limitado ao Rio, que ocupa o 12º lugar nos índices de homicídio por 100 mil habitantes. Em janeiro, o ministro da Defesa, Raul Jungmann, e o governador Pezão, descartaram intervenção do exército durante o carnaval, solicitada pelo prefeito Marcelo Crivella, alegando que o efetivo policial era suficiente para garantir a ordem.

Além disso, não há informação sobre os resultados efetivos de operações anteriores em que as Forças Armadas interviram, ainda que mais pontualmente, na cidade. Especificamente no caso da ocupação do Complexo de Favelas da Maré, entre 2014 e 2015 – no governo Dilma, portanto –, além dos 600 milhões consumidos aos cofres públicos e a chacina que resultou na morte de nove moradores, nada mais sabemos.

Se a intenção era estrangular o tráfico, não funcionou, e tampouco há indícios de que funcionará agora. Antes pelo contrário, mesmo que consiga eventual e provisoriamente fragilizar os traficantes que mandam nos morros e o Comando Vermelho, a intervenção tende a fortalecer o grupo paulista PCC, cuja atuação aparentemente mais organizada e ramificada que o CV, já conseguiu uma vez parar uma cidade do tamanho de São Paulo.

No fim das contas, o que sobra é a motivação política, tomada a expressão aqui no seu pior sentido. De um lado, o governo Temer consegue com ela jogar para a frente a votação da Reforma da Previdência, promessa que fez ao mercado mas que estava a ter dificuldades em cumprir. Além disso, proporciona um espetáculo midiático bem ao gosto de muitos eleitores, alguns sinceramente amedrontados pela percepção que têm de estarem sitiados pela violência, outros simplesmente dispostos a apoiar qualquer medida autoritária e truculenta.

Para um governo que amargava índices abaixo de vergonhosos de aprovação, pode ser a chance de uma sobrevida, principalmente se a intervenção conseguir que o tráfico e os índices de violência recuem temporariamente. Mesmo que eles voltem a subir e que tudo retorne à “normalidade”, as eleições já terão passado, e Temer e seus cúmplices têm a chance de, talvez, manterem seus mandatos. E esse parece ser o único projeto que realmente interessa. Que ele seja pontuado pelo sofrimento de corpos e vidas precárias, não importa, porque nunca importou, a um governo que os considera e trata como inimigos.