A luta pela água deverá ser o principal ponto de discórdia ao longo deste século. No Brasil, um dos países com maior potencial hídrico, os conflitos se avolumam nas regiões mais secas. No início de novembro, cerca de 500 agricultores do município de Correntina, no Oeste baiano, invadiram a Fazenda Igarashi, derrubaram postes de energia elétrica e colocaram fogo em máquinas e imóveis. A grande imprensa e autoridades afirmaram que foi uma ação terrorista. Uma semana depois, 10 mil pessoas, metade da população de Correntina, tomaram as ruas e afirmaram que a defesa do rio Arrojado não pode ser tachada como terrorismo.
Há cerca de 20 anos o Oeste da Bahia foi ocupado por grandes agricultores que utilizam o plantio irrigado. O caso da Igarashi gerou revolta por causa do abuso na captação da água. Por dia, a fazenda retira 106 milhões de litros de água do rio Arrojado enquanto as 7 mil residências da cidade de Correntina consomem diariamente 3 milhões de litros. As imensas tubulações que saem do manancial é a prova concreta do gigantismo da irrigação autorizada pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente.
Os pequenos agricultores da bacia do rio Corrente dizem que há anos reclamam e que o governo não atende seus pedidos. Somente na região, oito pequenos riachos já secaram por causa da destruição do cerrado e das veredas para o plantio de soja e outros produtos rurais.
Quatro décadas atrás o frei franciscano Luiz Flávio Cappio chegou às margens do rio São Francisco, na Bahia. Além de atender espiritualmente a população mais pobre, ele se transformou em um grande defensor do rio de integração nacional. Ao longo deste tempo o religioso, que agora é bispo da diocese de Barra, tem visto a redução na vazão do maior manancial da região. Ele diz que o dia que o rio São Francisco secar o sertanejo terá que fugir para outras regiões.
Dom Luiz Cappio se tornou conhecido nacionalmente porque fez duas greves de fome para protestar contra a transposição das águas do rio São Francisco. Ele explica que, ao invés de tirar água do rio, devemos revitalizar as suas margens. Trezentas nascentes que desembocam no rio São Francisco já morreram por causa da ação do homem.
Numa cidade como Joinville, com um índice pluviométrico bastante alto, a maior preocupação é com a captação de água para abastecimento. Há cerca de 20 anos foi criado o Programa SOS Nascentes que pagava um valor em dinheiro para os agricultores que protegessem a mata ciliar do rio Cubatão. Hoje este trabalho foi abandonado. Um grande empresário de Joinville comprou as terras nas nascentes dos rios Cubatão e Quiriri, que fornecem a água para o abastecimento da cidade. Quem sabe, em um futuro não muito distante, ele poderá vender este líquido que a cada dia que passa torna-se mais precioso. Nós ainda não damos o devido valor a este bem que a natureza nos fornece gratuitamente. O pior, muitas vezes transformamos a água em esgoto.
Os indígenas são os maiores protetores do meio ambiente. Numa conversa com o cacique Ronaldo Costa, da aldeia Piraí, em Araquari, ele nos deixa uma lição: “Se um dia acabar a floresta, os rios vão secar e nós vamos acabar”. Não podemos deixar isto acontecer.
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Foto publicada no blog Mural do Oeste |