sábado, 16 de setembro de 2017

Futebol ainda é coisa de macho

POR LAERTE FERRAZ
Não é à toa que chamamos o futebol de jogo da paixão e o Brasil país do futebol. O amor por esse esporte, que nem invenção nossa é, começa a ser incutido cedo no nosso meio. Ainda criança era levado ao estádio por meu pai, junto com meus irmãos. Eram ainda os tempos em que futebol era coisa de homem, para homens.

Eis o "pq" (aproveito o espaço para mostrar a minha indignação com nossos quatros porquês, a maior aberração inútil de nossa língua pátria) de nos dias atuais o futebol continuar sendo majoritariamente masculino, na proporção de sete para um. Para cada sete homens que gostam de futebol, existe uma mulher que gosta. O principal motivo para barrar as mulheres é que nesse capo se falava muito palavrão, como se fala até hoje. Não sei "pq" se pensava que mulheres não gostavam de falar palavrão.

Estava eu, com meus sete anos, vendo o Ceará perder por dois gols para o Remo no campeonato que chamávamos de Nordestão, já na metade do segundo tempo, quando precisávamos de apenas um empate. Comecei a gritar: "vamos, Ceará!" Um senhor ao meu lado, com cara de desiludido, falou com a voz triste: "vamos para onde, meu filho, não dá mais tempo não, tem que fazer dois gols".

Sem lembrar o ensinamento de meu pai, de que devemos respeitar os mais velhos, tasquei: "se você não quer torcer que vá tomar no cu!!!" Meu pai, se esforçando para segurar o riso, tentava me chamar a atenção quando o senhor, já com o riso aberto, falava que era coisa de criança, que não tinha problema. E o Ceará fez o primeiro gol. Depois da explosão de alegria, o senhor, que não foi tomar no cu, aderiu ao grito de "vamos, Ceará!". E logo aquele pedaço da arquibancada onde estávamos passou a gritar também. E nosso artilheiro Gildo, com uma cabeçada fulminante, nos levou ao delírio com o segundo gol.

O senhor me jogava para cima numa alegria sem limites. Ao final do jogo me deu um picolé e um forte abraço. O futebol mudou de lá para cá em muitos aspectos. Alguns bons, como a presença de mulher dentro e fora de campo. Outros ruins, como a troca da arte e do talento pela aplicação disciplinada, onde a tática e a obediência do jogador ao técnico é o que mais importa. Outras mudanças virão, como o recurso eletrônico, que sou contra, aliás. Mas o palavrão esse permanece, para tristeza das mães dos juízes, que serão as únicas beneficiadas, de fato, quando adotarem o recurso eletrônico.





Laerte Ferraz é produtor de vídeo
e torce por três times
(mas isto é tema para outra crônica)

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Brasil, uma nau sem rumo

POR DOMINGOS MIRANDA
Dirigir um país sem ter um projeto de nação é como navegar em alto mar sem uma bússola ou GPS. O governo federal só tem duas preocupações imediatas: 1) tentar se defender das acusações de corrupção já que a Polícia Federal, em relatório encaminhado ao Supremo Tribunal Federal, disse que Michel Temer é o chefe da organização criminosa; 2) fazer leilão das empresas estatais o mais rápido possível, sem um estudo mais aprofundado.

Em países com economia diversificada como a nossa não existe notícia sobre um desmonte de tal magnitude, a não ser o que ocorreu no governo de Vichy, na França, durante a segunda guerra mundial. O governo de Vichy correspondia a dois terços da superfície da França e foi capitaneado pelo marechal Pétain e por Pierre Laval, O Estado títere dos alemães surgiu com o armistício feito em julho de 1940, depois da derrota diante das tropas nazistas.

É um período que os franceses gostariam de esquecer porque foi um retrocesso em todas as conquistas do povo desde a revolução de 1789. Para começar, trocaram o famoso lema “liberdade, igualdade e fraternidade”, usado desde a Revolução Francesa, por “trabalho, família e pátria”. A dor era maior porque a população ainda guardava na mente as conquistas do governo de esquerda, de 1936 a 1938, como aumentos salariais, semana laboral de 40 horas e férias pagas para todos os trabalhadores.

Um pequeno grupo, capitaneado pelo general Charles de Gaulle, criou no exílio a Frente Nacional, que abrangia de comunistas a monarquistas, para liberar o solo francês dos ocupantes e dos traidores. Rapidamente cresceu o movimento da resistência até a destruição do governo de Vichy e a expulsão dos nazistas. Laval e Pétain foram condenados à morte, mas este último teve a pena comutada para prisão perpétua por causa de sua idade avançada.

O fim para os traidores nem sempre é bom. No Brasil vemos uma situação semelhante à França da Vichy. Nossos governantes chegaram ao poder através de um golpe arquitetado pelo serviço de informações americano e agora eles pagam a fatura. Estão entregando a preço de banana as nossas maiores empresas (parte da Petrobras, Eletrobrás), as reservas minerais e implodiram as grandes empresas de engenharia através da Lava Jato.

O economista Delfim Neto disse, em artigo na Carta Capital, que o nosso destino está em nossas mãos. “Para realizá-lo precisamos de um consenso social mínimo em torno de um Projeto Nacional”. Para que consigamos evitar o desmonte de nosso país é necessário criar uma ampla frente em torno de um projeto que preveja nossos destinos para daqui 30 anos. Corremos um sério risco de desmembramento da pátria pois o poder central está em frangalhos e as forças regionais tentam buscar o butim para o seu lado.

Mesmo com todos os males existentes, o Brasil conseguiu chegar unificado ao século 21 e é uma das maiores economias do mundo. Seria burrice perder todos estes avanços. A mudança de rumo depende de nós. Vamos nos unir.

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Udo, Acij & Cia e o Jardim da Fátma

POR DAUTO J. DA SILVEIRA
O anúncio feito pela Prefeitura de Joinville de que os processos de licenciamento ambiental da cidade não serão mais realizados pela Secretaria de Meio Ambiente (SEMA) revela duas questões perigosas: 1) a mentalidade inocente da atual gestão e 2) o desmantelamento das instituições públicas municipais.

A primeira delas pode ser observada no que era dito, em 2014, durante a reforma administrativa que transformou a Fundação Municipal de Meio Ambiente (FUNDEMA) em secretaria. O prefeito da cidade, no uso das suas prerrogativas de ser um “gestor de novo tipo”, cantava a velha cantilena liberal de que tal transformação agilizaria os processos, reduziria a burocracia e melhoraria a gestão relacionada às atividades da Fundema. (AN, 11/fev/2014). Com base nisso, se desfaz a defesa cínica, de boa parte da elite acijiana, de que a Sema é incapaz de garantir a agilidade dos processos de licenciamento.

Ora, se a Sema é produto da ineficiência da Fundema e se sua função, entre nós, é, por conseguinte, melhorar a gestão, como podemos explicar tal incapacidade atual? O cinismo nunca foi tão débil. A alma das associações empresariais toma o corpo da prefeitura por completo e apresenta os seus dentes e garras: agora o problema passou a ser a morosidade do corpo técnico municipal. 

Segundo Aguiar, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil de Joinville, a cidade “vinha enfrentando problemas antigos na questão dos licenciamentos feitos pela Sema, que era um processo muito moroso e não tinha como continuar com essa demora (na emissão de licenças)” (AN, 08/set/2017, grifo nosso). Já para Valcanaia, presidente da Associação de Joinville e Região de Pequenas, Micro e Médias Empresas, “a Ajorpeme sempre esteve muito insatisfeita com os prazos de licenciamento em Joinville. Entendemos que toda mudança tem riscos, mas nosso foco é em diminuir os tempos de licenciamento, independente se feito pela Sema ou pela Fatma”. (AN, 08/set/2017). Thomazi, sem vacilar, vocifera “a perspectiva é boa porque quem teve processos de licenciamento tramitando na Sema sabe da morosidade que é, então é provável que a mudança produza efeito positivo com relação a essa demora na tramitação”. (AN, 08/set/2017).

Pois bem, a fabricação de consenso que explique a incapacidade da própria burguesia em administrar os seus próprios negócios se manifesta de forma meridiana. Como explicar essa sucessiva troca de responsabilidades dos serviços ambientais senão pelo viés do desespero dos “donos da cidade”? Diante de tal situação os funcionários do Licenciamento Ambiental da Sema, em um ato de coragem, apresentaram um quadro com dados concretos sobre os trabalhos desenvolvidos no interior da secretaria. 

Os dados reais desmascaram a farsa apresentada pelos dois corpos que possuem o mesmo espírito: de um lado a retórica de políticos pusilânimes e de outro o cinismo dos empresários da cidade. Os técnicos trazem dados pormenorizados e demonstram, por exemplo, que o tempo médio dos processos apresentados de 01 a 31 de agosto de 2017, no tocante à análise interna de Meio Ambiente foi de 9 dias e no tocante aos Licenciamentos e Serviços de Meio Ambiente, foi de 15 dias, 23 horas, 57 minutos e 24 segundos. Como se não bastasse, sublinham que “no mês de agosto de 2017, o setor de licenciamento ambiental da Sema emitiu 4 Licenças Ambientais Prévias com dispensa de Licença de Instalação, 3 Licenças Ambientais de Instalação e 26 Licenças Ambientais de Operação e Corretivas. No mesmo período, a FATMA – CODAM [Coordenação de Desenvolvimento Ambiental] Joinville emitiu apenas 08 Licenças Ambientais, sendo 04 ampliações de Licença Ambiental de Operação, 01 renovação de Licença Ambiental de Operação, 01 Licença Ambiental Prévia, 01 Licença Ambiental de Operação e 01 Licença Ambiental de Operação Corretiva” (Fonte: http://www.fatma.sc.gov.br/).

Ainda que a Sema seja a versão empobrecida da Fundema, isso aponta, em primeiro plano, que de algum modo o andamento dos trabalhos não satisfazia os interesses, cada vez mais vorazes, dos empresários da cidade. Nada nos garante que a Fatma conseguirá resolver esses mesmos problemas, uma vez que eles brotam da “tara” incontrolável dos burgueses da Acij & Cia em ampliar os seus negócios, sem que ocorra o mínimo controle dos órgãos ambientais.

Na segunda questão supracitada, estamos a perceber o desmonte das instituições públicas municipais que, não obstante as profundas dificuldades, ainda guardam expressiva funcionalidade para a maioria da população. Depois de três contrarreformas, que transformaram a cara da administração pública, assistimos mais uma medida que visa suprimir qualquer tipo de impedimento aos negócios burgueses em crise estrutural. Não significa, ao mesmo tempo, pôr em relevo as limitações subjetivas do corpo técnico da Fatma ou indicar (a priori) uma certa fragilidade ética que, no horizonte, responderia ao desejo incansável de mudança dos processos de licenciamento da prefeitura e da Acij & Cia.

O busílis aqui é outro, ou seja, afastar os licenciamentos de Sema (órgão arraigado à estrutura municipal) e levá-lo a um espaço estadual, com outro ordenamento político e cultural, submetido a práticas administrativas de natureza distinta pode ser um grande negócio. “E, se não der certo, o próprio prefeito Udo Döhler sinalizou que volta a estaca zero”, adiantou o acijiano Thomazi (AN, 08/set/2017). Diante do acirramento das contradições dos dias correntes, isso não é pouca coisa.

Aos poucos, mas de modo peremptório, o comitê executivo da classe dominante da cidade, engendra as condições necessárias para um novo padrão de acumulação. Para que alcance tal desígnio é necessário muito mais. O segundo mandato, as três contrarreformas e medidas pontuais como essa, são insuficientes. A médio prazo teremos novas medidas, ainda mais rapinantes. 

Dauto J. da Silveira é professor e doutor em Sociologia

terça-feira, 12 de setembro de 2017

Não discuto com fascistas. Limito-me a zoá-los...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Não discuto com fascistas. Limito-me a zoá-los. É uma espécie de lema que sigo há muito tempo, em especial desde que comecei a escrever artigos de opinião para jornais. Mas se no passado era difícil dar de cara com um “facho” (a maioria tinha vergonha de assumir o fascismo abertamente), hoje em dia eles pululam por aí. A terra sem lei das redes sociais é o ambiente ideal para a proliferação desse entulho.

E foi no Facebook que o MBL-Joinville fez um desafio nominal a alguns integrantes do Chuva Ácida, atuais e de outros tempos (imagem abaixo). Parece que queriam discutir a “mentalidade esquerdista” a partir do episódio da Exposição Queermuseu. Discutir? Não, obrigado. Afinal, os caras pensam que o mundo é um imenso Facebook e que memes mal amanhados são argumentos.

Os fachos do MBL parecem achar que a burrice virou uma ciência. Aliás, se houvesse um vestibular para entrar no Facebook, esse pessoal ainda estava todo lá no Orkut. O desafio tentava ser engraçadinho (não dá, a direita não sabe fazer humor) e acabou gerando uma expressão interessante. “Rufem os tambores”, exaltava o post. Faz sentido. Porque o MBL é exatamente como um tambor: faz muito barulho, mas é vazio por dentro.

É claro que recuso o “desafio”. Afinal, qualquer pessoa sensata sabe que não deve se aproximar de uma cabra pela frente, de um cavalo por trás ou de um idiota do MBL por qualquer dos lados. Facebook incluído. Aliás, como debater a “mentalidade esquerdista” se eles acham que todo mundo é de esquerda? O Jordi Castan, por exemplo, foi ao post e reagiu à citação: “Eu esquerdista? Alguém andou bebendo água da privada”.

Mas um coisa é certa: os caras não têm problemas de auto-estima. Têm alta estima. Para eles um debate livros versus memes parece natural. Mas que pessoa com dois dedinhos de testa entra numa discussão que já sabe como vai terminar? Afinal, como já disse alguém, as opiniões dos tontos são como os pregos: quanto mais se martelam, mais se enterram. E a melhor maneira de ganhar uma discussão com idiotas é deixá-los falar. Sozinhos, claro.

É a dança da chuva.