sexta-feira, 23 de junho de 2017

Desenvolvimento sustentável: dá para acreditar? (parte 2)


POR MICHEL LATOUCHE
Ontem falamos sobre o desenvolvimento sustentável a partir do conceito de progresso de Walter Benjamin. Hoje falamos de um autor mais recente, o francês Michel Serres, que usa o quadro “Luta com Clavas”, da fase negra de Francisco Goya, para falar de um embate onde não há vencedores. Esse embate é entre o homem e a natureza. O pensador francês descreve a cena que podemos ver no quadro (abaixo).

“Dois inimigos brandido bastões lutam, em areias movediças. Atento às táticas do outro, cada um responde golpe a golpe e dá a sua réplica à esquiva. Fora da moldura do quadro, nós, espectadores, observamos a simetria dos gestos no decorrer do tempo: que espetáculo magnífico e banal”, analisa o pensador.

Michel Serres, autor do livro “O Contrato Natural”, também publicado no Brasil, faz uma descrição vigorosa da cena e, a seu modo, lança a sorte. “O pintor enfiou os duelistas até os joelhos na lama. Quem vai morrer, nos perguntamos? Quem vai ganhar, pensam eles e nos perguntamos mais ainda? Apostemos”, ironiza o pensador, para quem o ser humano é um voyeurista doentio.

“Mas, numa terceira posição, exterior à contenda, percebemos um terceiro lugar, o pântano, onde a luta se enterra. Aqui, na mesma dúvida acerca dos duelistas, os apostadores arriscam perder juntos, como os lutadores, já que é mais provável que a terra absorva os últimos antes que eles próprios e os jogadores tenham liquidado a sua conta”, completa Serres.

Há uma evidência. Num sistema capitalista nada pode parar ou questionar o progresso. Quem questiona ou é filósofo ou tomado por tolo. O mito do progresso é, provavelmente, a mais forte linha de orientação da economia capitalista. O quotidiano das sociedades é fundado em pressupostos ideológicos que pregam o crescimento ininterrupto. É a ditadura do PIB.

O discurso do progresso é axiomático e, como é próprio dos mitos, dispensa qualquer demonstração. Tudo o que ganha estatuto de natural não precisa ser comprovado. O fato é que e ao longo de toda a história da sociedade capitalista, a discussão sobre o tema progresso tem sido residual e o seu questionamento quase inexistente.

A sustentabilidade é importante? Claro. Mas não se a palavra for falseada, posta a serviço de um conceito que mantém uma exploração insaciável dos recursos naturais. O ponto de retorno das mudanças climáticas já foi ultrapassado e truques linguísticos não permitem voltar atrás.


quinta-feira, 22 de junho de 2017

Desenvolvimento sustentável: dá para acreditar? (parte 1)


POR MICHEL LATOUCHE
Desenvolvimento sustentável. Eis uma expressão para olhar com muita desconfiança. Porque não passa apenas do branqueamento linguístico de uma coisa nefasta: o processo de destruição dos recursos naturais continua, mas com um argumento – sustentado por uma palavra – que serve de álibi. A palavra é “sustentável”.

Dizem os especialistas que o desenvolvimento sustentável é uma forma de conciliar o progresso com a preservação da natureza. Mas o que acontece na prática nunca é uma conciliação. Porque a gula do progresso é insaciável e a natureza acaba sempre por perder. Não vamos esquecer que os cientistas há muito falam do “ponto de não retorno”.

A intenção deste artigo é apresentar dois autores que falam da questão a partir de obras de arte. O primeiro é o pensador frankfurtiano Walter Benjamin, que faz uma leitura de um quadro de Paul Klee. O segundo, de autoria do filósofo francês Michel Serres, descreve essa luta (a natureza e o progresso) a partir de um quadro de Goya.

O primeiro está centrado na ideia que as pessoas têm do conceito de progresso. A imagem de progressista faz parte do “vestuário” de qualquer político ou administrador nos dias de hoje. Ou seja, quanto mais progressista melhor. O verdadeiro problema está no conceito de “progresso”. Temos uma descrição pungente em Walter Benjamin.

Ao elaborar suas teses sobre o conceito de história, o pensador alemão, que se suicidou para não cair nas mãos dos nazistas, fala de um retrato catastrófico do progresso. É um texto que merece ser lido muitas vezes. Benjamin afirma que história e progresso estão muito intrincados, ao ponto de quase não poderem ser dissociados.

Diz o pensador alemão: “Há um quadro de Klee que se chama ‘Angelus Novus’. Representa um anjo que parece querer afastar-se de algo que ele encara fixamente. Seus olhos estão escancarados, sua boca dilatada, suas asas abertas. O anjo da história deve ter esse aspecto. Seu rosto está dirigido para o passado. Onde nós vemos uma cadeia de acontecimentos, ele vê uma catástrofe única, que acumula incansavelmente ruína sobre ruína e as dispersa a nossos pés”.

E continua: “Ele gostaria de deter-se para acordar os mortos e juntar os fragmentos. Mas uma tempestade sopra do paraíso e prende-se em suas asas com tanta força que ele não pode mais fechá-las. Essa tempestade o impele irresistivelmente para o futuro, ao qual ele vira as costas, enquanto o amontoado de ruínas cresce até o céu. Essa tempestade é o que chamamos progresso".

O quadro é o que vemos abaixo.

*(o artigo está dividido em duas partes, uma hoje e a outra amanhã).





quarta-feira, 21 de junho de 2017

Gente que se mete onde não foi chamada

POR FELIPE SILVEIRA
Em primeiro lugar, rodeios têm que acabar. Já começo com isso para marcar minha posição sobre o assunto. Se a galera da vaquejada quiser me tirar pra Cristo como faz com o pessoal da causa animal, os comentários são serventia da casa.

E já digo isso porque aqui eles são bem-vindos a comentar, estão sendo "consultados".  Não é o caso do Projeto de Lei Complementar 53/2017, discutido na noite de terça-feira (20) na Câmara de Vereadores. O PLC, de autoria da vereadora Ana Rita Hermes, eleita com a bandeira da causa animal, propõe o abandono gradativo do uso de tração animal no perímetro urbano.

A ideia principal do projeto é impedir o uso de animais para puxar as carroças de catadores, situação que leva os bichos à exaustão, que não permite o tratamento adequado de doenças, que leva ao abandono e ao sacrifício quando os animais ficam velhos, que, por falta de condições, não permite os cuidados básicos com os bichos de grande porte.

O projeto, portanto, pode levar a um conflito entre catadores que usam tração animal e defensores dos animais. A discussão, no entanto, contou com a participação de um grupo inusitado, o pessoal ligado à vaquejada. O que estavam fazendo lá?

Um deles, em entrevista à TV, reclamou que sua associação não foi consultada. Pelo sobrenome do sujeito, acho que ele pensa que o legislativo deve lhe consultar sobre os temas polêmicos.

Nunca vi esse pessoal da vaquejada catar uma latinha pra vender no ferro-velho. Será que eles estavam mesmo preocupados com os catadores? O que o projeto lhes diz respeito? Há alguma mágoa com a galera da causa animal? Ou a ideia é minar a força desses movimentos antes que cheguem até eles?

O projeto voltou às comissões parlamentares para ser melhor discutido. Olhando os sobrenomes envolvidos  a gente pode começar a entender a má vontade de alguns vereadores para votar o projeto.

Os animais que puxam as carroças são presos, em geral, pelo pescoço. Acho que outros são presos pelo rabo.

Recepção.


terça-feira, 20 de junho de 2017

A internet dos objetos vai mudar a sua vida. E muito...


POR LEO VORTIS
A Internet dos Objetos (IoT- Internet of Things) é o casamento do objeto material com a tecnologia imaterial das plataformas digitais. Ou seja, as tecnologias de informação tomam corpo físico. É um processo pelo qual os objetos estão ligados em redes digitais, seja em casa, no trabalho ou na rua. Não se trata apenas de ligar pessoas a objetos, mas também de ligar objetos a objetos.

Os países desenvolvidos trabalham no desenvolvimento dessas soluções. A Comissão Europeia, por exemplo, há anos desenvolve um programa nessa área, o Internet of Things Europe130, que se apresenta sob o slogan “Part of Our Future” e anuncia aplicações infinitas, sempre com a promessa de um mundo melhor.

A campanha de publicidade desenvolvida para divulgar a ideia mostra exemplo práticos de como seria o mundo se tudo estivesse em rede. Fazer uma melhor gestão do dia a dia. Fugir da confusão do tráfego. Não perder tempo na fila do médico. Ter uma geladeira que avisa quando falta algum produto. Ter um carro que, quando sofre um acidente, avisa imediatamente os serviços de socorro. Um personal trainer no celular para melhorar o desempenho desportivo. Ou mesmo uma bengala capaz de indicar o caminho a um cego.

Muitas dessas coisas já existem, apesar de não estarem popularizadas. Esse mundo idílico prometido pelos objetos de alta tecnologia e em rede não gera contestação. O otimismo é tanto que alguns pesquisadores preferem falar num Segundo Renascimento. É apenas uma questão de tempo até que essas soluções estejam presentes nas nossas vidas. E muita coisa vai mudar. Fiquem ligados. O filme a seguir mostra situações práticas que serão comuns dentro de pouco tempo.