domingo, 23 de julho de 2023

No fio do bigode

 POR JORDI CASTAN

A CAJ (Companhia Águas de Joinville) é a joia da coroa da administração municipal. Uma empresa que, se for bem administrada, fiscalizada e cobrada poderá ser motivo de orgulho para todos os joinvilenses. Como toda empresa pública, seus processos estão sujeitos as leis. A famosa lei 8666 estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Esta lei foi atualizada com a publicação da 14133. A principal diferença entre a lei 8666 e a lei 14133 é que a nova lei 14133 se adequa às novas tecnologias e às necessidades do setor público atual.

Conheço bem a 8666, da época em que fui presidente da CONURB, empresa municipal de economia mista. Conheço menos a 14133, mas em nenhum dos seus artigos e parágrafos encontrei o termo “no fio do bigode” como forma de contratação ou de negociação ou acordo entre as partes, quando uma delas está sujeita ao cumprimento da lei. Mas de acordo com o depoimento dado na Câmara de Vereadores pelo proprietário do imóvel alugado à CAJ, tudo foi feito no "fio do bigode".

Fui estudar o significado da expressão e a época em que surgiu: o bigode era um símbolo de homem honrado, que, além de barba, tinha "vergonha na cara". Seu significado é prometer algo verbalmente, sem precisar de assinatura, e sua origem é incerta. Acredita-se que tenha surgido da frase germânica “Bei Gott”, usada em juramentos e que significa “por Deus”.

Nada de encontrar essa figura como forma válida e legal para contratação com o serviço público de produtos e serviços. Ainda para complicar, nesta época em que há tantos “homens” usando barba e bigode fica mais difícil poder assegurar que haja tanto homem honrado. Vai que duvido da honestidade de muitos que são. Mas o legislador quando não previu a contratação “no fio do bigode” deveria saber por que não o fez.

A história é simples, até simples demais. A CAJ contratou, se acreditarmos no depoimento do Sr, Arlindo Tambosi  que construiu um prédio completo para a Companhia Águas de Joinville. Sem outra garantia que o fio do bigode. No mínimo é temerário. O prédio em questão é a nova sede da CAJ localizada na região central de Joinville e foi construída sob medida para atender as demandas da Companhia, num modelo denominado BTS ou Build to Suite, numa tradução livre, construído para servir a um propósito específico.

Não vou entrar no mérito do saber se a nova sede melhorou o acesso do joinvilense, nem se representou um aumento da qualidade do atendimento ou do número de posições de atenção ao cliente porque não há ônibus passando na frente, não houve aumento do numero de posições. Portanto, até agora parece que não melhorou em nada a vida do cliente.

O processo de contratação desperta dúvidas, especialmente na forma de pago do aluguel, nos valores e nas parcelas contratadas. Está mais do que na hora de colocar luz neste esgoto em que esta se convertendo a que deveria ser motivo de orgulho para todos. Aliás, Joinville tem ainda um dos percentuais de cobertura de saneamento básico mais vergonhosos do Brasil, especialmente entre as cidades de seu porte. Quando a água da torneira deixa de ser incolor, inodora e insípida? É hora de investigar mais. 

terça-feira, 18 de julho de 2023

Se Floripa vai ter o Dia do Batman, Joinville devia ter o Dia do Riquinho

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Floripa pode vir a ter o Dia do Batman. E eu, que sou muito invejoso, fico a imaginar a criação de uma data para Joinville poder competir com a capital. Depois de um extensivo benchmarking (palavrinha que esse pessoal do Novo adora de paixão), tenho uma sugestão a fazer: que tal criar o Dia do Riquinho? Sim, aquele menino podre de rico. Não sei se vocês concordam, mas acho que tem tudo a ver com a vida política da cidade.

Riquinho é um personagem das histórias em quadrinhos criado por Alfred Harvey e Warren Kremer. É um garoto herdeiro de uma fortuna. As histórias de Richie Rich, o seu nome em inglês, geralmente envolvem aventuras a explorar o seu parque de diversões privado ou a enfrentar vilões. Olha a metáfora aí, gente: poderíamos dizer que os vilões são os caras da esquerda (geralmente pobres de marré) e o parque de diversões seria a própria cidade. Não faz sentido?

Resumindo, Riquinho é conhecido por ser uma criança rica, muito rica. É herdeiro de uma fortuna incomparável, proveniente dos negócios bem-sucedidos de seus pais e ancestrais. Na história em quadrinhos, a sua riqueza é retratada através de uma mansão gigantesca, conhecida como "Mansão Rich". Sem querer ficar repisando nas metáforas, acho que podemos fazer outra analogia com um certo prédio na avenida Hermann August Lepper, que também é muito grande.

O personagem Riquinho é tido como inteligente, tudo graças à sua educação privilegiada. Mas há um contrassenso. Se existisse em carne e osso, o rapaz seria bolsonarista, até porque é uma questão de classe. Os muito ricos – em especial de Joinville – adoram Bolsonaro. Mas não existe coisa mais desinteligente do que ser bolsonarista. Enfim, mesmo que uma pessoa seja criada com iogurte de leite de beija-flor, isso não é garantia de pensamento sofisticado.

E como o pessoal que manda na city tem o mindset nas coisas do marketing, proponho a introdução de um processo de "ritual markerting". A data (um feriado, claro) seria a 15 de dezembro, o Dia do Jardineiro, e teria um ritual: nesse dia seria implantado o costume de dar flores e livros. A ideia é inspirada na festa de Sant Jordi, o santo padroeiro da Catalunha. Lá são rosas, mas em Joinville pode ser qualquer flor. Quanto aos livros, só obras do “filósofo” Olavo de Carvalho.

Vai ser um sucesso. Chupa, Batman. Chupa, Floripa.

É a dança da chuva.

Em Floripa, Dia do Batman. Em Joinville, Dia do Riquinho



sábado, 15 de julho de 2023

Joinville não gosta de Lula, Lula gosta de Joinville

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

A notícia foi veiculada em junho. A Secretaria de Saúde de Joinville aderiu ao programa Mais Médicos, com um pedido para a contratação de 51 médicos (é um número esquisito, mas todos sabemos que 51 é uma boa ideia). O Mais Médicos, agora retomado pelo Governo Federal, é um projeto vantajoso para os municípios, já que a prefeitura paga apenas os auxílios moradia e alimentação, com o Governo Federal assumindo as outras despesas. 

Muita gente podia imaginar entraves por parte do atual Governo Federal. Afinal, Joinville é um dos redutos mais bolsonaristas do país. É irônico lembrar o azedume revanchista do ex-presidente, que discriminou os governadores da região Nordeste, onde teve menos votos. Em 2019, ele afirmou que muitos dos governadores nordestinos "são socialistas". "Eles vão ter que falar que estão trabalhando com o presidente Jair Bolsonaro. Caso contrário, eu não vou ter conversas com eles", disse. 

Mas no caso de Joinville não houve qualquer entrave. Ainda esta semana, apenas um mês depois, o município soube que o pedido tinha sido aprovado e que os médicos iriam ser contratados. Qual a diferença entre Bolsonaro e Lula da Silva? É que Lula segue uma lógica muito clara: o presidente governa para todos os brasileiros, mesmo os que não gostam dele e não votaram nele. Lula segue o mais elementar espírito republicano, algo que o inelegível Bolsonaro nunca praticou e sempre desprezou.

A previsão é de que os médicos do iniciem as atividades até ao final deste ano. Mas não vamos fazer de contas que  muita gente ligada à esquerda não conseguiu esconder um certo sorriso. Porque, cá entre nós, não deixa de ser um tapa com luva de pelica no pessoal que odeia o atual presidente. Lula, que é odiado, faz o bem para a cidade. Bolsonaro, que é amado e até recebeu uma machadinha, sempre cagou e andou para a cidade e nunca trouxe qualquer contributo para a vida dos joinvilenses. Ironias...

Só faltava o presidente Lula criar o programa Mais Jardineiros. Isso sim ia fazer a felicidade da administração pública em Joinville.

É a dança da chuva.



sexta-feira, 14 de julho de 2023

Os meus filhos

POR JOSÉ ROBERTO PETERS

Amo meus filhos. São parecidos comigo e com a mãe deles, só que mais bonitos. São preparados, só que mais inteligentes. Têm qualidades e defeitos. Por isso estão preparados. Vão errar? Com certeza. Mas vão acertar muito mais. Minha filha é doutoranda, meu filho faz duas faculdades. Falam inglês, espanhol e sei lá mais que línguas. Se fossem viajar pelo mundo não seriam como eu: pra comer eu ia ter que fazer gestos ridículos de passar a mão pela barriga e meio que “abanar a língua”.

E é pra isso que a gente cria filhos: pra se virar no mundo, que é bem diferente do que era quando eu tinha a idade deles. Se eu tenho saudades do meu tempo? Não. Criar filhos hoje é mais fácil. Eles têm mais informação, mais teorias e mais acesso à informação. Imagino se meus pais vivessem no tempo do google — e não da “Barsa”, quando a gente estava em idade escolar —, onde estaríamos (eu e meus irmãos) hoje? Não porque o google é superior à Barsa, mas porque meus pais entendiam o poder da educação e da informação.

Hoje ouvi alguém no ônibus contar uma história (era uma conversa alheia) — no transporte coletivo não há como não ouvir — de uma mãe que estava tendo um problema: “Dois filhos: a filha doce e o filho rebelde, que tinham conseguido uma vaga numa ‘escola militar`”.

[Abro aqui um parêntesis (no caso usei colchetes): a escola é “militarizada” e não militar. A escola militar (das forças de segurança: polícia, exército etc.) tem um propósito: formar policiais, oficiais do exército etc. A escola militarizada tem o objetivo de “disciplinar” os alunos com: fazer tarefas, se calar ante os de hierarquia superior, não usar cabelos soltos e brincos (as meninas) ou cabelos grandes e brincos (os meninos) e que tais]. Fechado o parêntesis (ou colchetes), volto à história.

Pois bem, “a filha doce odiou. O filho rebelde amou. Ah! Dizia a que mulher que contava a história. ´As crianças de hoje — mesmo falando sobre adolescentes — não gostam de disciplina, não sabem cantar o hino nacional e não gostam de rezar`”. Parece que estas eram as atribuições que se queria na tal escola: obedecer, cantar o hino e rezar. Vai ver — e isso é um palpite — que a “filha doce” (que obedecia, sabia o hino e orava) descobriu que a vida é mais do que isso. E que o “filho rebelde” (que não obedecia, não sabia o hino e não orava) descobriu que a vida é também isso.

Ora, me lembrei de uma aula que dei em um curso de pós-graduação, em Goiânia, em que uma aluna falou que agora que a escola estava militarizada e a disciplina era outra: muito melhor. Eu perguntei sobre o aprendizado. Ela disse que “a mesma coisa de antes, ruim. Mas, pelo menos, não precisava ficar pedindo silêncio”. Isso: alunos dóceis e ainda sem aprender.

Paulo Freire dizia que educação é amor. Onde tem alguém disposto a ensinar e alguém disposto a aprender está estabelecida uma relação de educação. E a disposição para ensinar (ou aprender) é nata do ser humano (talvez a sua essência). E educar é libertar. É propor (e expor) o outro pro mundo. E o mundo é o que se vê por aí: tem de um tudo. Sonegar informação é dificultar a caminhada.

Assim, meus filhos, na medida do possível e das possibilidades — veja nessa construção: possível e possibilidades. O mesmo radical para dizer “o que demos conta” e “o que dava pra fazer” — vão até onde quiserem, mas terão que fazer a sua parte na construção e com as “armas” que demos e que têm. E estas “armas” são privilégios. Os defensores da tal meritocracia não levam em conta os privilégios. E é isso, todos deveriam ir até onde quiserem, independente do ponto de partida. Mas a gente sabe que não é bem assim. E não é só ensinar hino, obrigar a obedecer e fazer orar que vai fazer um cidadão. A vida é mais do que isso.
 
José Roberto Peters é pai de dois filhos e professor universitário.





quinta-feira, 13 de julho de 2023

Lugar de milico é nos quartéis, não nas escolas

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Mas que boa notícia. O Ministério da Educação decidiu acabar com essa coisa das escolas militares. Há quase quase 200 instituições na mira, em todo o país, e o desmanche dessa aberração bolsonarista exige alguns cuidados. É claro que já existe um certo choro e ranger de dentes, em especial dos militares que vêm atuando na gestão escolar e educacional dessas instituições. Afinal, uma graninha extra sempre calha bem. E os militares brasileiros parecem habituados à teta estatal.

“A partir desta definição, iniciar-se-á um processo de desmobilização do pessoal das Forças Armadas envolvidos em sua implementação e lotado nas unidades educacionais vinculadas ao Programa, bem como a adoção gradual de medidas que possibilitem o encerramento do ano letivo dentro da normalidade necessária aos trabalhos e atividades educativas", diz o ofício do Ministério da Educação. Traduzindo, quer dizer que lugar de milico é no quartel.

Educação é coisa séria e há muito a fazer neste caso. Ou melhor, a desfazer. Os defensores do modelo argumentam que, por impor disciplina, essas escolas trazem benefícios. É só estupidez. A disciplina é importante, mas o foco excessivo nesse aspecto não pode se sobrepor a outras áreas do conhecimento. Isso limita o desenvolvimento de habilidades acadêmicas e criativas, bem como a capacidade dos alunos de questionar e explorar diferentes ideias.

Os aspectos negativos são evidentes. A abordagem autoritária num mundo que exige pensamento crítico e criativo é o mais relevante. A hierarquia e a disciplina rígida levam a um ambiente onde a liberdade de expressão e individualidade são suprimidas. Não é pedagógico e também não aponta para a necessária vivência em democracia. O que surpreende em nada, uma vez que estamos a falar de uma iniciativa bolsonarista. E nada de bom vem de Bolsonaro.

Nem se trata de discutir a questão pedagógica. Os milicos sequer sabem o que é isso. Mas grana é grana e um extra no fim do mês seduz. Eis o problema: essas escolas estavam a se tornar um tremendo cabidão de emprego. Portanto, é melhor passar uma borracha nessa cagada. O Brasil precisa sair do atraso. O caminho precisa ser o futuro e não a volta desse fedor de 64. Voltem para os quartéis, senhores!

É a dança da chuva.