sábado, 15 de julho de 2023

Joinville não gosta de Lula, Lula gosta de Joinville

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

A notícia foi veiculada em junho. A Secretaria de Saúde de Joinville aderiu ao programa Mais Médicos, com um pedido para a contratação de 51 médicos (é um número esquisito, mas todos sabemos que 51 é uma boa ideia). O Mais Médicos, agora retomado pelo Governo Federal, é um projeto vantajoso para os municípios, já que a prefeitura paga apenas os auxílios moradia e alimentação, com o Governo Federal assumindo as outras despesas. 

Muita gente podia imaginar entraves por parte do atual Governo Federal. Afinal, Joinville é um dos redutos mais bolsonaristas do país. É irônico lembrar o azedume revanchista do ex-presidente, que discriminou os governadores da região Nordeste, onde teve menos votos. Em 2019, ele afirmou que muitos dos governadores nordestinos "são socialistas". "Eles vão ter que falar que estão trabalhando com o presidente Jair Bolsonaro. Caso contrário, eu não vou ter conversas com eles", disse. 

Mas no caso de Joinville não houve qualquer entrave. Ainda esta semana, apenas um mês depois, o município soube que o pedido tinha sido aprovado e que os médicos iriam ser contratados. Qual a diferença entre Bolsonaro e Lula da Silva? É que Lula segue uma lógica muito clara: o presidente governa para todos os brasileiros, mesmo os que não gostam dele e não votaram nele. Lula segue o mais elementar espírito republicano, algo que o inelegível Bolsonaro nunca praticou e sempre desprezou.

A previsão é de que os médicos do iniciem as atividades até ao final deste ano. Mas não vamos fazer de contas que  muita gente ligada à esquerda não conseguiu esconder um certo sorriso. Porque, cá entre nós, não deixa de ser um tapa com luva de pelica no pessoal que odeia o atual presidente. Lula, que é odiado, faz o bem para a cidade. Bolsonaro, que é amado e até recebeu uma machadinha, sempre cagou e andou para a cidade e nunca trouxe qualquer contributo para a vida dos joinvilenses. Ironias...

Só faltava o presidente Lula criar o programa Mais Jardineiros. Isso sim ia fazer a felicidade da administração pública em Joinville.

É a dança da chuva.



sexta-feira, 14 de julho de 2023

Os meus filhos

POR JOSÉ ROBERTO PETERS

Amo meus filhos. São parecidos comigo e com a mãe deles, só que mais bonitos. São preparados, só que mais inteligentes. Têm qualidades e defeitos. Por isso estão preparados. Vão errar? Com certeza. Mas vão acertar muito mais. Minha filha é doutoranda, meu filho faz duas faculdades. Falam inglês, espanhol e sei lá mais que línguas. Se fossem viajar pelo mundo não seriam como eu: pra comer eu ia ter que fazer gestos ridículos de passar a mão pela barriga e meio que “abanar a língua”.

E é pra isso que a gente cria filhos: pra se virar no mundo, que é bem diferente do que era quando eu tinha a idade deles. Se eu tenho saudades do meu tempo? Não. Criar filhos hoje é mais fácil. Eles têm mais informação, mais teorias e mais acesso à informação. Imagino se meus pais vivessem no tempo do google — e não da “Barsa”, quando a gente estava em idade escolar —, onde estaríamos (eu e meus irmãos) hoje? Não porque o google é superior à Barsa, mas porque meus pais entendiam o poder da educação e da informação.

Hoje ouvi alguém no ônibus contar uma história (era uma conversa alheia) — no transporte coletivo não há como não ouvir — de uma mãe que estava tendo um problema: “Dois filhos: a filha doce e o filho rebelde, que tinham conseguido uma vaga numa ‘escola militar`”.

[Abro aqui um parêntesis (no caso usei colchetes): a escola é “militarizada” e não militar. A escola militar (das forças de segurança: polícia, exército etc.) tem um propósito: formar policiais, oficiais do exército etc. A escola militarizada tem o objetivo de “disciplinar” os alunos com: fazer tarefas, se calar ante os de hierarquia superior, não usar cabelos soltos e brincos (as meninas) ou cabelos grandes e brincos (os meninos) e que tais]. Fechado o parêntesis (ou colchetes), volto à história.

Pois bem, “a filha doce odiou. O filho rebelde amou. Ah! Dizia a que mulher que contava a história. ´As crianças de hoje — mesmo falando sobre adolescentes — não gostam de disciplina, não sabem cantar o hino nacional e não gostam de rezar`”. Parece que estas eram as atribuições que se queria na tal escola: obedecer, cantar o hino e rezar. Vai ver — e isso é um palpite — que a “filha doce” (que obedecia, sabia o hino e orava) descobriu que a vida é mais do que isso. E que o “filho rebelde” (que não obedecia, não sabia o hino e não orava) descobriu que a vida é também isso.

Ora, me lembrei de uma aula que dei em um curso de pós-graduação, em Goiânia, em que uma aluna falou que agora que a escola estava militarizada e a disciplina era outra: muito melhor. Eu perguntei sobre o aprendizado. Ela disse que “a mesma coisa de antes, ruim. Mas, pelo menos, não precisava ficar pedindo silêncio”. Isso: alunos dóceis e ainda sem aprender.

Paulo Freire dizia que educação é amor. Onde tem alguém disposto a ensinar e alguém disposto a aprender está estabelecida uma relação de educação. E a disposição para ensinar (ou aprender) é nata do ser humano (talvez a sua essência). E educar é libertar. É propor (e expor) o outro pro mundo. E o mundo é o que se vê por aí: tem de um tudo. Sonegar informação é dificultar a caminhada.

Assim, meus filhos, na medida do possível e das possibilidades — veja nessa construção: possível e possibilidades. O mesmo radical para dizer “o que demos conta” e “o que dava pra fazer” — vão até onde quiserem, mas terão que fazer a sua parte na construção e com as “armas” que demos e que têm. E estas “armas” são privilégios. Os defensores da tal meritocracia não levam em conta os privilégios. E é isso, todos deveriam ir até onde quiserem, independente do ponto de partida. Mas a gente sabe que não é bem assim. E não é só ensinar hino, obrigar a obedecer e fazer orar que vai fazer um cidadão. A vida é mais do que isso.
 
José Roberto Peters é pai de dois filhos e professor universitário.





quinta-feira, 13 de julho de 2023

Lugar de milico é nos quartéis, não nas escolas

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Mas que boa notícia. O Ministério da Educação decidiu acabar com essa coisa das escolas militares. Há quase quase 200 instituições na mira, em todo o país, e o desmanche dessa aberração bolsonarista exige alguns cuidados. É claro que já existe um certo choro e ranger de dentes, em especial dos militares que vêm atuando na gestão escolar e educacional dessas instituições. Afinal, uma graninha extra sempre calha bem. E os militares brasileiros parecem habituados à teta estatal.

“A partir desta definição, iniciar-se-á um processo de desmobilização do pessoal das Forças Armadas envolvidos em sua implementação e lotado nas unidades educacionais vinculadas ao Programa, bem como a adoção gradual de medidas que possibilitem o encerramento do ano letivo dentro da normalidade necessária aos trabalhos e atividades educativas", diz o ofício do Ministério da Educação. Traduzindo, quer dizer que lugar de milico é no quartel.

Educação é coisa séria e há muito a fazer neste caso. Ou melhor, a desfazer. Os defensores do modelo argumentam que, por impor disciplina, essas escolas trazem benefícios. É só estupidez. A disciplina é importante, mas o foco excessivo nesse aspecto não pode se sobrepor a outras áreas do conhecimento. Isso limita o desenvolvimento de habilidades acadêmicas e criativas, bem como a capacidade dos alunos de questionar e explorar diferentes ideias.

Os aspectos negativos são evidentes. A abordagem autoritária num mundo que exige pensamento crítico e criativo é o mais relevante. A hierarquia e a disciplina rígida levam a um ambiente onde a liberdade de expressão e individualidade são suprimidas. Não é pedagógico e também não aponta para a necessária vivência em democracia. O que surpreende em nada, uma vez que estamos a falar de uma iniciativa bolsonarista. E nada de bom vem de Bolsonaro.

Nem se trata de discutir a questão pedagógica. Os milicos sequer sabem o que é isso. Mas grana é grana e um extra no fim do mês seduz. Eis o problema: essas escolas estavam a se tornar um tremendo cabidão de emprego. Portanto, é melhor passar uma borracha nessa cagada. O Brasil precisa sair do atraso. O caminho precisa ser o futuro e não a volta desse fedor de 64. Voltem para os quartéis, senhores!

É a dança da chuva.



terça-feira, 11 de julho de 2023

Ei, Eduardo Bolsonaro, vai se f...

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Há coisas que nem o diabo acredita. E não é que o deputado Eduardo Bolsonaro foi associar os professores a traficantes de drogas? O tipo disse disse que os pais precisam estar atentos a professores doutrinadores e que eles podem ser piores do que quem sequestra crianças para o tráfico. A fala surpreende? Não. Estamos a falar da tática de "dog whistle", usada para mobilizar o gado.

A família Bolsonaro é um caso típico de “dark factor”. Não sabe o que é? É uma teoria da psicologia que busca descrever um conjunto de características da personalidade associadas a comportamentos e tendências ruins. Também conhecido como “D-factor", ele se baseia na ideia de que existem traços negativos que são compartilhados e que podem influenciar uma série de comportamentos antiéticos ou imorais.

Eduardo é uma expressão de Jair. Aliás, no Brasil eu me atreveria a chamar “B-Factor, numa “homenagem” à alma sombria dos Bolsonaro. O conceito surgiu de estudos que tentavam explicar o comportamento humano negativo. As conclusões são baseadas em pesquisas que identificaram uma correlação entre diferentes traços de personalidade negativos, como o narcisismo a psicopatia e o sadismo. 

O "dark factor" fala de indivíduos com traços psicopáticos que podem ir da falta de empatia a comportamentos destrutivos. Vejam lá se estes fatores não correspondem ao bolsonarismo raiz: a falta de empatia, o uso da manipulação e da mentira, o comportamento impulsivo, a busca por poder e controle ou mesmo as práticas antiéticos. Se fosse uma aposta era jackpot. 

É claro que o deputado estava a falar para os bolsonaristas. Porque ainda há muita gente receptiva a esse tipo de discurso. Aliás, sem querer psicanalisar, não foi Bolsonaro que fez essas pessoas ficarem más, ele apenas libertou a maldade que estava reprimida em cada uma delas. A identificação com líder ocorre quando os seguidores projetam suas esperanças, aspirações ou a própria maldade nessa figura. 

O exemplo dos Bolsonaro permite lançar a suspeita de que a maldade pode ser genética. É tudo ruim. E pensar que esse Eduardo Bolsonaro é considerado o "intelectual" da família. Enfim, eu, como professor, só tenho uma coisa a dizer ao deputado. E vou escolher a forma mais acadêmica e letrada possível: “Ei, Eduardo, vai se foder, seu bosta”.

É a dança da chuva. 

Eduardo Bolsonaro: a favor das armas, contra os professores


domingo, 9 de julho de 2023

Socorro! Há um comunista debaixo da cama

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O povo de Santa Catarina morre de medo de comunismo. E há políticos que estimulam essa doideira, como a deputada Júlia Zanatta, aquela das florzinhas. Credo! A mulher é mais bolsonarista que o próprio Bolsonaro. “Os deputados que votaram pela Reforma chancelaram ao Conselho Soviético a possibilidade de editar Lei Complementar. Não existe mais Constituição no país”, afirmou. 

Conselho Soviético? Mas o tema não era a Reforma Tributária? Que raio de deambulação mental permite introduzir os sovietes na equação? Até estaria tudo bem se não estivéssemos a viver num tempo em que a União Soviética não é União e muito menos Soviética. "Todo poder aos sovietes", diria alguém com a memória num longíquo 1917. Entenderam a deputada? Não? Tudo bem. Ninguém entende. 

O irônico é que a maioria das pessoas - deputados ou não - não faz ideia do que está a falar. Porque para essa gente, sobretudo os bolsonaristas, o comunismo não é um programa político ou um sistema de governo. É apenas o bicho-papão para assustar os tolos. Os catarinenses não votam contra a esquerda, mas contra o espantalho comunista criado pelo conservadorismo. 

Santa Catarina sofre de "comunismofobia". Quando um catarinense ouve a palavra "comunismo", surta e começa a delirar. É capaz de ver perigo quando alguém propõe que os pobres tenham três refeições por dia. O cidadão imagina, cheio de horror, o dia em que vai ser obrigado a partilhar o último pedaço de bolo com o vizinho. O povo catarinense, talvez uns 70% dele, transformou o bolsonarismo em estilo de vida.

Lula é o inimigo a abater. O atual presidente é o "comuna-mor", a encarnação de todo esse medo. É como se à noite Lula se transformasse num super-vilão que sai pelas ruas obrigando todas as pessoas a usar estrelinhas do PT. E como se fosse um Freddy Krueger vermelho, que invade os sonhos burgueses para pregar o comunismo. Enfim, esses comunas são bandidos capazes de qualquer crueldade. 

E o mais divertido. Os anticomunistas falam sobre comunismo sem jamais terem lido um texto. É como um jogo de telefone sem fio, mas em vez de palavras, eles passam e repassam estereótipos e caricaturas. Imaginam barbudos comunistas tentando implantar o regime soviético. Enfim, o medo do comunismo só não é maior que a burrice voluntária desse pessoal. Ninguém faz a mais pálida ideia do que está a falar.

Quem entra numa rede bolsonarista é logo capturado pelo anticomunismo mais primário. E nem vale a pena tentar argumentar porque são estados mentais muito rudimentares. É como no “Complexo do Pombo”: discutir com essa gente é o mesmo que jogar xadrez com um pombo. Ele derruba as peças, caga no tabuleiro e sai voando a cantar vitória. Então, rir (deles) é o melhor remédio.

É a dança da chuva.