sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Heroínas Negras - 20 de novembro



POR CINTIA SOARES


Novembro é considerado o mês da Consciência Negra, por conta do dia de hoje (20 de novembro). Nesse período, vemos muitas homenagens para Zumbi dos Palmares que foi líder do quilombo de Palmares e um guerreiro contra a escravidão no período colonial. Concordo que Zumbi seja uma importante figura histórica, mas e as mulheres negras como Dandara,Tereza, Luisa e Aqualtune? Elas também lutaram e resistiram bravamente, na liderança dos quilombos e nas comunidades de luta contra a escravidão e o racismo. Mesmo com toda essa luta, ainda assim só os homens são lembrados. Essas mulheres também precisam ter seus nomes, histórias e lutas expostos.

Mas enquanto essas mulheres tão notáveis e com tamanha importância raramente recebem o devido reconhecimento, as mulheres negras, atualmente, também encontram dificuldade para conseguirem qualquer reconhecimento nas mais diversas áreas da sociedade.

Vemos muita divisão até na luta das mulheres por igualdade. Como pode? 

Uma das mais fortes reivindicações das mulheres brancas é o mercado de trabalho ou o combate aos estereótipos que representam as mulheres como o sexo frágil. Enquanto isso, as mulheres negras enfrentam há tempos a luta contra a escravidão moderna, uma cópia mais "light" do que era imposto até o século XIX. Muitas mulheres brancas, patroas, acabam com a moral das suas empregadas ou babás que, em sua maioria, são negras. Quando não as veem como rival, pois mulheres negras ainda são vistas como objeto sexual por alguns patrões, herança da cultura escravista do país, em que os "senhores" estupravam as escravas. 

Vemos tudo isso ser representado nas novelas. Raramente vemos novelas em que não se tenham empregadas negras, ou que se tenham protagonistas negras. Só me lembro da Tais Araújo, única, na minha geração. 

Nós, mulheres, devemos nos unir, juntar forças para vencermos.

Os diversos índices e pesquisas sociais no Brasil mostram,  frequentemente, evidências de que as mulheres negras vivenciam os níveis mais altos de violência e violação de direitos. A desigualdade salarial entre homens e mulheres, quando analisada sob a perspectiva racial, se torna também uma desigualdade salarial entre mulheres brancas e negras. As mulheres negras estão entre a maioria das vítimas de feminicídio (perseguição e morte intencional de pessoas do sexo feminino, classificado como um crime hediondo, no Brasil.). Quando o tema é a ilegalidade do aborto, as consequências da clandestinidade também são mais pesadas para as mulheres negras por serem maioria pobre na estatística de classe social e que, por isso, não têm as mesmas oportunidades que as mulheres brancas de interromper a gestação em outro país ou em clínicas particulares.

Gente, de que adianta Consciência Negra se não temos um combate contra o machismo em paralelo? 

Pra realmente surtir efeito, não ser mais uma data em que são feitas homenagens, falsas promessas e declarações, além de feriados em muitas cidades e da pergunta típica: "feriado de que mesmo?", é preciso realizar reflexões, fazer um resgate histórico, analisar as consequências da escravidão e como os negros e as negras estão vivendo hoje no país. 

Não tem como existir luta por igualdade de gênero sem combater o racismo. Assim como não há luta antirracista sem a luta por igualdade de gênero. A intersecção das lutas contra as opressões é necessária. Por isso, o feminismo negro é necessário.

As pessoas devem entender que mulheres negras não têm escolha sobre a possibilidade de sofrerem um ou outro tipo de discriminação; ambas as violências se repetem de maneira interligada, em moldes direcionados exclusivamente e especificamente às mulheres negras.

Ainda hoje, há muitas diferenças entre as questões das mulheres brancas e negras. De maneira similar, por mais que estejam unidos na luta contra o racismo, há certos tipos de violência que os homens negros não enfrentam. Infelizmente, tanto nos movimentos de mulheres quanto nos movimentos negros, as mulheres negras ainda lutam para que suas necessidades sejam ouvidas e representadas. À exemplo das guerreiras negras na história do Brasil, nem sempre a dedicação à luta é o suficiente para que as nossas demandas sejam atendidas ou contempladas.

Encerro esse texto citando um poema com autoria de Zuleika dos Reis:

SER NEGRA - Homenagem ao Dia da Consciência Negra

Negra é a mulher que tem sido minha irmã, que nos ajuda, há muito, a mim e a minha mãe, a segurar as barras do cotidiano insalubre.
Negra é a pele que me vai por dentro, herança dos meus ancestrais.
Negro é o blues que me invade, com todas as suas línguas feitas de saudade e de desterro.
Negras são certas saudades: volúpia, sofrimento.
Negra é a linda canção que cantava a filha daquele que foi meu homem, canção que ela aprendeu de sua avó.
Negra é a negra noite, quando se sonham os sonhos mais profundos.
Negro de belezas é o silêncio dos amantes plenos um do outro.
Negra sou eu quando deixo que acordem em mim todas as áfricas.
Negra é a África, berço do mundo.
Felizes dos que se alegram, dos que se orgulham pelo negro, pela negra que todos carregamos por fora, por dentro; negritude que nos amplia, que nos ensina, que nos ultrapassa, que fere os nossos limites, para que possamos prosseguir.

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Jurássico.


Mídias Sociais e Racismo


POR ANDRESSA KAROLINE

Com o passar do tempo, nosso cotidiano tem se tornado mais e mais digital. A evolução dos meios de comunicação nos tem feito abraçar a praticidade. Agora nos perguntemos: qual a relação entre o racismo ainda relutante no Brasil e as mídias sociais?

Tal praticidade, em conjunto com o atraso da legislação em conseguir sanar tais demandas, é um encorajamento para que racistas incumbidos venham à tona despejar seu discurso, ofensa e agressão. Discurso esse, que vem carregado de um preconceito enraizado, antigo, alimentado, protegido e com uma imensa relutância em se abrir mão.

O racismo é uma prática construída, como já dizia Mandela: “Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar.” Ele nasce em lares preconceituosos, em escolas que não discutem o assunto com propriedade e clareza (exceto na semana da consciência negra, quando todos se transformam em seres politizados e apoiadores da causa). Ele permanece com o apoio dos grandes personagens das redes sociais que tratam os casos com uma simples hashtag acompanhada do nome se algum(a) famoso(a) e que enchem os telejornais de um sensacionalismo ridículo e abominável, que tem o intuito de explorar a situação diante de mais uma manchete, e que se gerar audiência, permanecerá nas telinhas por mais alguns dias.

A grande verdade é que nosso povo teve voz, mas sempre foi calado, silenciado ou de alguma forma censurado. Pois bem, é o fim dessa era. Enquanto não houver equidade, enquanto “morro” na favela continuar sendo verbo, enquanto nossas escolas não demonstrarem a importância que a cultura negra teve na construção do nosso país, enquanto houver alguém, atrás de algum aparelho eletrônico, que se sinta confortável e seguro para despejar seu ódio racista desenfreado, não vamos nos calar. 

Não vamos deixar de comunicar, de lutar, de insistir no sonho de criar um lugar onde a cor da nossa pele não seja um divisor de águas. É preciso acreditar que há tempo. É preciso não silenciar. É preciso descontruir, politizar, reeducar e conscientizar. É preciso que tenhamos coragem para enfrentar as batalhas diárias em nossos locais de trabalho, de estudo, de convivência. É preciso que entendamos que nossas raízes não são motivo de vergonha, pelo contrário.

Que nosso black cresça, que nosso axé floresça e que a cada vez nos tornemos mais fortes e unidos para um dia quem sabe, se não se tratar de apenas uma utopia, possamos sair de nossas casas e encarar o mundo como um lugar livre dessa doença contagiosa que é o racismo.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Precisamos falar de criminalização das drogas


POR CÁSSIA SANT'ANNA

Na semana em que se celebra a Consciência Negra, precisamos falar daquilo que vem dizimando centenas de negros diariamente: a criminalização das drogas. 

Com suas raízes racistas, a Guerra às Drogas é uma falácia, uma guerra instaurada contra os pobres, notadamente contra a população negra, que vem sendo exterminada pelo Estado, em nome da “pacificação” e do “bem social”.

O Brasil conta com a 4ª maior população carcerária do mundo, com mais de 500 mil presos. 26% dos presos, estão envolvidos com crimes relacionados à proibição das drogas, e desses 26%, 60% são pessoas negras ou pardas.

A violação de direitos fundamentais dos cidadãos, frente à guerra às drogas, está presente no cotidiano das comunidades pobres, com execuções sumárias, revistas seguidas de torturas, adolescentes que não podem ir à praia porque são barrados, tendo em vista suas características “criminosas”: negro e favelado.

A guerra às drogas tem produzido um alto índice de mortes no Brasil, inclusive com casos emblemáticos que ganharam notoriedade, como no caso de Amarildo, no caso da Cláudia, e no caso de Eduardo. Ressalta-se, que todas essas execuções foram praticadas nas favelas.

Quantos usuários e traficantes da classe média encontramos diariamente nas universidades, baladinhas de playbas, academias e colégios? Porque essa guerra às drogas é feita somente nas periferias das cidades? Se o Estado está tão preocupado com o bem estar social e quer, de fato, uma política de combate às drogas, porque não abrange todos os grupos? Porque somente nós negros que preenchemos esses 60% quando o assunto é drogas?

Todas essas perguntas se chocam com uma única resposta: isso tudo é devido a nossa guerra - racista - às drogas, que são feitas nas favelas, nos bairros pobres, aonde dificilmente chega o acesso à justiça, a segurança e a educação.

A mídia sensacionalista mostra as periferias como um local com alto grau de perigo, e impressa na população que as execuções praticadas por policiais em nome da Guerra às Drogas e, que ocorrem diariamente nas periferias, são algo comum, ou seja, não são vistas como uma grave transgressão ao direitos humanos, aos princípios e normas do direito penal e processual penal.

O racimo é um problema estrutural do sistema de segurança pública, o qual tem contribuído para a morte de crianças negras, jovens negros, pais negros, avós negros, entre outros que “não importam para o Estado”.

A descriminalização das drogas precisa ser a nossa luta, a luta dos movimentos negros, a luta do coletivo da mulher negra, do coletivo do jovem negro. Precisamos salvar a população negra das atrocidades cometidas pelo Estado!