segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

O índice Big Mac

POR JORDI CASTAN




2015 será o ano em que falaremos muito de crise. Aqui mesmo no Chuva Ácida o debate já começou. Valdete Daufemback Niehues publicou o post Crise! Qual crise com a sua visão da crise. Assim, enquanto há quem pergunte onde está a crise, também há quem ache que já estamos nela. Há opiniões para todos os gostos e especialistas de todas as tendências, prontos a defender com argumentos abalizados os seus argumentos. Começo avisando que não sou especialista no tema e que aguardo com interesse os comentários a favor e contra.

O Brasil vive um momento ímpar. Nunca se consumiu tanto e nunca se pagou tão caro por produtos de qualidade equivalente aos disponíveis em mercados de outros países. Vez por outra aparecem informações e estudos mostrando que o mesmo carro que aqui custa X  em outro país custa Y. Tênis, roupas, perfumes, cosméticos e as bugigangas eletrônicas mais comuns são outros produtos que permitem fazer rápidas comparações de preços e tirar conclusões. O brasileiro, quando viaja ao exterior, rapidamente faz a mesma descoberta que qualquer turista que aqui chegue. No mesmo momento em que desça do avião e tenha contato com a nossa realidade econômica, vai perceber que o Brasil está muito caro. Na verdade, os preços por estes lados estão cada vez mais fora da realidade internacional. O que se tem como resultado é que a maioria de destinos turísticos frequentados por brasileiros se regozijem com a chegada de milhares de ávidos consumidores com dinheiro e com um prazer quase compulsivo por consumir. O bom e velho "tá barato, me dá dois”, em alguns casos chega ao ponto de “tá barato, me dá três”. 

Em 1986, a revista The Economist criou o Índice Big Mac, com o objetivo inicial de servir de referência para acompanhar o valor real das diferentes moedas. O popular hambúrguer da Mc Donalds se converteu assim em um indicador fiável de valor e permite avaliar se uma moeda esta mais o menos valorizada. A lógica é que os preços do Big Mac tenderiam ser parecidos em diversos países e mostrariam o valor “correto” de cada moeda. A base é a chamada Paridade do Poder de Compra (PPP, por sua sigla em inglês) comparando preços de produtos e serviços idênticos, neste caso um hambúrguer. Como exemplo, o preço médio em 2015 de um Big Mac nos Estados Unidos é de 4,75 dólares, na China é de 2,77 dólares, ao câmbio oficial, o que, grosso modo, mostra que o Yuan esta abaixo do seu valor em 42%.

Claro que a ideia não é usar o hambúrguer como um indicador veraz. Mas é uma referência interessante, tanto que há vários livros que o citam e tem sido objeto de mais de 20 estudos acadêmicos. Para o brasileiro que sofre na pele o impacto das primeiras medidas do pacote de maldades que o governo lançou semana passada, é interessante poder utilizar indicadores fáceis de entender, fora a sua própria percepção na hora de fazer a compra do supermercado.

Para aumentar a credibilidade do índice e evitar que se crie a imagem que em países pobres o preço é menor porque os salários são mais baixos, o índice incorpora o cálculo da correção entre o preço do hambúrguer é a renda per capita para 48 países, entre eles o Brasil, o que permite avaliar melhor se uma moeda esta sobre o subvalorizada.


Para os otimistas de plantão, o Brasil vai muito bem porque o nosso Big Mac é o 4º mais caro do mundo, só superado por Suíça, Noruega e Dinamarca e na frente de Suécia, Estados Unidos, Canadá e toda a zona do Euro. Os países em que o Big Mac é mais barato são Ucrânia, Rússia e Índia. Tirem suas conclusões.

sábado, 24 de janeiro de 2015

Para mergulhar no lixo...

Adaptação de um post que circula no Facebook
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Woody Allen tem uma frase engraçada. Diz que na Califórnia o lixo não é jogado fora, mas reciclado na forma de programas de televisão. Só que quando ele disse isso não havia internet e ainda menos as redes sociais. Porque em países como o Brasil, hoje o lixo é reciclado na forma de aberrações como o tal Revoltados Online.

Mas o que querem esses revoltados? Os caras são contra Dilma. Isso é legítimo numa democracia. E pedem o impeachment da presidente. Aí já entramos no plano da toupeirice, pois não há bases legais (eles querem “porque sim” e isso, bem sabemos, não é suficiente). Mas o pior é que os caras distorcem os fatos e mentem na cara dura. E aí é pura canalhice.

De qualquer forma, a existência dessa paranóia online é legítima. Tanto que a coisa tem mais de 400 mil seguidores. Inclusive há sete ou oito “amigos” da minha timeline lá na rede do Mark Zuckerberg. O que não me tira o sono, uma vez que são pessoas que não conheço e muito provavelmente nunca verei pessoalmente. Mas distorcer fatos não é legítimo.

Há um aspecto que me toca pessoalmente, enquanto pessoa ligada ao design. O grafismo dos posts é tão ruim que parece feito com os pés. O que nem chega a ser surpreendente. Sendo feito para analfabetos políticos, é perfeitamente natural que o Revoltados Online também esteja em sintonia com os analfabetos visuais.

Enfim, se você quiser mergulhar no lixo online da política, os revoltados são a resposta. Porque lá tudo é distorção. A começar pelo dono da coisa. Um cara que, segundo li, não é exatamente alguém de quem você gostaria de comprar um carro em segunda mão. Mas a medida exata das coisas pode ser dada por um exemplo: enquanto o ex-presidente Lula é chamado “vagabundo”, o execrável Jair Bolsonaro é tratado como herói.

E há mais. Vez por outra tem um vídeo de Sheherazade que, nesta fase da Jovem Pan, parece disposta a detonar todas as regras do jornalismo. E do bom senso. O rola-bosta Reinaldo Azevedo é outro queridinho. Os pastores Silas Malafaia e Marco Feliciano são referências morais. E, claro, o derrotado Aécio Neves é tratado como se fosse a consciência da nação.


Enfim, só gente boa. Ah... e tem aquela coisa que eles não param de repetir: “povo vem para a rua”. Eu não iria tão longe. Bastava que esse povo fosse para a escola ler livros e que deixasse de se informar apenas através de posts do Facebook.

É como diz o velho deitado: "Gente que se alimenta de lixo moral tem mau hálito político".


O post original

E a maluqueira nunca acaba...



As redes sociais têm a virtude de democratizar a opinião. Esse é o lado bom. O lado mau é que isso permite que as pessoas exponham o quanto podem ser patuscas, como esse senhor aí no post. Onde essa gente quando queria passar vergonha antes das redes sociais?




sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Estelionatos eleitorais

POR SALVADOR NETO

Mais conhecido entre o povão como “171”, que vem a ser tipificado no código penal brasileiro como estelionato. Ou, esclarecendo melhor, o que vem a significar tudo isso, como dizem os dicionários Aurélio e Barsa, é a “obtenção de lucro ilícito, para si ou para outrem, em prejuízo de outra pessoa, que é induzida ou mantida em erro por qualquer meio fraudulento”. Para além do estelionato conhecido, temos algo que cresce a cada eleição no Brasil: o estelionato eleitoral, ou o 171 do voto.

É importante trazer ao debate este tema. Vivemos em nível nacional, e também local, dois estelionatos eleitorais em fases distintas. Dilma Rousseff a partir de Brasília dá uma guinada do discurso para a prática que deixou tontos até os mais ferrenhos petistas e sindicalistas. Começou mexendo nos benefícios trabalhistas e previdenciários, arrochou financiamentos, aumentou juros, aperta firmemente a classe média, e faz de conta que não é com ela. Um caprichado 171 eleitoral. Mas é início de mandato, o segundo da durona petista. Não se sabe ainda os efeitos. Veremos mais à frente os resultados do rasga discurso.

Já na maior cidade catarinense, o 171 eleitoral já vai para o terceiro ano. Eleito com fama de gestor competente, comandante da associação empresarial em vários mandatos, nome forte de empresa centenária do ramo têxtil, figura conhecida dos bastidores econômicos e políticos de Joinville, o prefeito Udo Döhler anunciou à época em 2012 que não faltava dinheiro na Prefeitura, mas sim gestão. Pois bem. Ao que vemos hoje estão faltando no mínimo ambas. Nada anda, a não ser os buracos, o mato tomando conta de ruas e praças, as carências da saúde que tanto ele prometeu resolver. No caso provinciano, o tempo já passou, e muito. Aqui temos um 171 eleitoral continuado, uma espécie de 171 governamental, parcialmente encoberto pela mídia compreensiva.

Tanto no planalto quanto na província, o uso da promessa eleitoral não cumprida é praxe nas últimas décadas. José Sarney (1986) quando desvalorizou o cruzado após as eleições estaduais. Collor, que arrestou as poupanças do povo; FHC em 1998 quando depois de se reeleger desvalorizou o real, até então supervalorizado. Por aqui, temos o ex-prefeito Lula (1988) com as chalulas (lembram?) ele iria acabar com a falta de casas. LHS com as pontes ligando o bairro Adhemar Garcia ao bairro Boa Vista, entre outras promessas que os leitores certamente relembrarão.

Marco Tebaldi também produziu das suas com a limpeza do rio Cachoeira, ou o reclamou vai pro final da fila. Carlito Merss nem prometeu tanto, mas falhou na gestão em setores chave, e a mídia não perdoou. Ou seja, o uso corriqueiro da promessa fácil sem qualquer comprometimento mais firme com a realização de fato da obra, ou projeto de governo vendido ao eleitor, tem se intensificado. E por favor, não são só políticos de carreira os prometedores do paraíso, não os achincalhem sozinhos, hoje há também empresário na política produzindo o mesmo. E isso é péssimo para a democracia.

Agora, diferentemente do 171 do Código Penal, que pune na letra da lei a quem produz o estelionato, o 171 eleitoral não tem uma punição mais dura a quem usa do verbo fácil para vencer, e depois deixa os eleitores a ver navios, ou seriam buracos, mato, juros altos, corrupção crescente? Ah, sim, dirão alguns, há a punição do eleitor no pleito seguinte. Mas isso é pouco, e a duração e o alcance dos prejuízos são muito difíceis de recuperar. Sem contar que o eleitor, induzido, recoloca muitos novamente no cargo.


O vale tudo eleitoral não pode continuar, sob pena de levarmos a um descrédito total da atividade política, da gestão pública e até da democracia. Ou nos elevamos a um patamar civilizado e coerente, ou viramos todos estelionatários, até como forma de sobrevivência. Como dizia um velho militante da política que não chegou a vencer eleição a Prefeito: ou mudamos a forma, e os ingredientes, ou teremos sempre o mesmo pão.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

África, economia e violência

POR BELINI MEURER
A relação da África com o restante do mundo acontece a partir de dois pontos dicotômicos: o continente tem uma importância histórica para a humanidade, por um lado, mas vive um abandono cruel na história recente, por outro. Informações esparsas mostram que, ao longo do continente, milhares de pessoas morrem vitimadas pela fome, por doenças, por guerras, por desmandos políticos e por fundamentalismos religiosos.

Se na França, a morte de doze pessoas causou uma comoção internacional, reunindo chefes de estado do mundo inteiro, o mesmo não aconteceu quando, na Nigéria, o Boko Haran usou meninas de onze ou doze anos para detonar bombas e matarem dezenas de pessoas. Mas o mais estranho é que essa mesma Europa, assim como a América, sabe que a situação que o homem africano vive hoje se deve a uma escravocracia e uma era de sua história chamada de Partilha da África, período de expropriação das riquezas do continente.

A história dos povos africanos remonta à origem da humanidade; arqueólogos, antropólogos e pré-historiadores mostram que em regiões sub-saarianas teriam surgido os primeiros homens e mulheres modernos. Pesquisas em restos encontrados no Chifre da África e na Península Arábica, bem como resultados de análises em situações geológicas, mostram que nos primórdios da humanidade, os povos saíram da África e espalharam-se pelo mundo cruzando o estreito Bab-el-Mandeb.


Mas a história dos povos africanos também está relacionada diretamente com a opulência européia e americana, suas histórias de colonizações, com escravismo, desmandos e imposição cultural. No século 19, a Europa ocidental, munida de réguas, compassos e transferidores, dividiu a África de acordo com seus interesses econômicos. O episódio ficara conhecido como Partilha da Africa: uma parte para os Ingleses, uma parte para os franceses, outra para os holandeses e assim por diante.


Hoje, do alto do idealismo alemão, do empirismo inglês, da religiosidade italiana ou do requinte francês, fecham-se os olhos diante da situação da Mama África. Não mais lhe interessa; o parasita não vê mais o que tirar do hospedeiro. E só assim, é possível entender o por quê de os mortos franceses causarem tanta comoção internacional e as meninas-bombas da Nigéria ocuparem nos jornais, espaços tão pequenos que mais pareceram notas de roda-pé.