POR FELIPE SILVEIRA
O desinteresse pelo conhecimento, penso, é um das mais graves causas e também consequência da múltipla crise que vivemos. Reparem nos seus ambientes, entre seus amigos, sua família, seu trabalho. Note a maneira como eles se informam, o que pensam sobre o mundo, como interagem socialmente. De modo geral, e há muitas exceções, estão todos ocupados com frivolidades, mas fazendo delas o referencial para as suas vidas.
O whatsapp tem ocupado, dia após dia, o posto de fonte de informação de uma parte considerável da sociedade. E lá na terra de ninguém há desinformações das piores espécies, trabalhando as mentes mais diversas, e muitas vezes fragilizadas, mentes.
Outra mudança de hábito provocada pela tecnologia e que interfere na questão é a informação por meio de canais de youtube. Eu, por exemplo, assino algumas dezenas deles. Mas tenho notado que é um hábito cada vez mais comuns de crianças, adolescentes e jovens. E, se por um lado há excelentes canais de informação, alguns dos mais populares se caracterizam pela edição socada de cortes, gritos, palavrões e "reflexões" que demonstram indignação com "tudo que está aí".
Não se trata aqui de ser contra as inovações, os novos hábitos, e muito menos de tratar os jovens como tontos alienados. Pelo contrário, cada nova tecnologia nos abre um universo de possibilidades e os jovens de hoje são pura potência e energia que é capaz de mudar o mundo. Mas se trata de refletir e entender como tudo isso nos afeta cotidianamente. E, se a crítica à política do "pão e circo" é mais velha do que Roma, é preciso reconhecer e entender como ela se apresenta hoje.
A desinformação é o adubo do fascismo que cresce a cada dia no Brasil. Eu imagino que tipos de conversas há nos whatsapps dos marombeiros da zona sul do Rio de Janeiro. Ou que tipo de informação busca um jovem que se torna neonazista. Fico pensando o que eles falam de imigrantes, dos "comunistas do PT", quais posts do Bolsonaro curtem.
A desinformação também impede que a sociedade veja as causas da violência que a assombra. Assim, pede mais violência como solução. Nessa levada, fica revoltada online, começa a curtir páginas de promoção do ódio e até a comemorar quando esse ódio se expressa em forma de violência, seja ela física ou simbólica.
Mas o pior do desinteresse pelo conhecimento é que ele impede a reflexão sobre uma solução para os problemas do país. Afinal, sem o povo não é possível mudança alguma. Mas o povo está ocupado demais recebendo, absorvendo e espalhando ódio no whats.
Culpar o povo, no entanto, é inútil. Quem deveria ter feito algo e não fez enquanto pode foi o Estado brasileiro, como destacou o jornalista e meu querido professor Samuel Lima na última vez que o vi. Ele lembrava da Conferência Nacional de Comunicação realizada no governo Lula, cujas metas propostas foram solenemente ignoradas pelo governo. Pensei, então, no que o Estado deixou de fazer em outros campos, como a educação. Ou de que forma o governo incluiu o povo na construção de um projeto de país. Os dias de hoje mostram que, se fez algo, foi insuficiente.
Mas nunca é tarde, embora tudo sugira o contrário, para mudar essa realidade. O conhecimento está aí, doido pra ser encontrado, usado e abusado. Basta que algo promova este encontro entre nós e ele. Quem sabe nós mesmos.