sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Legisladores da "causa" própria

POR SALVADOR NETO



Diárias para viagens nacionais e internacionais em busca de “subsídios” para embasar projetos. Carros alugados para deslocar suas excelências pelos bairros da cidade, com gasolina incluída. Assessores. Cotas para pagamento de fotocópias, telefonia, entre outros. Salários de 11 mil reais, e ao Presidente da Casa, quase 17 mil.

Um milhão em ruidosas catracas para “controle” do povo que acessa o legislativo. Homenagens comemorativas a pessoas, instituições. Vereadores denunciados por compra de votos, caixinha de 10% com salários de assessores, uso de laranjas para receber salário indevidamente, e outro que ataca cidadão que o cobra na Casa do Povo...


Com tantas mordomias, crescentes, diga-se de passagem, a população esperaria uma produtividade altíssima, um retorno devido diante do espetacular gasto público! Mas o que ela tem é um elenco de 19 eleitos cuja produtividade é baixíssima, e com resultados coletivos tacanhos, iníquos. Isso, a um custo de quase R$ 40 milhões ao ano, conforme orçamento.


Sinalização viária é miragem. Pavimentação de ruas, apenas uma longínqua lembrança das promessas feitas nas eleições de 2012. Saúde? Bom, neste setor não faltava dinheiro, faltava gestão, dizia o então candidato Udo, e hoje faltam ambos e mais alguma coisa, sem contar quedas de secretários de saúde, e ausência de quase todos os demais, por falta de ação mesmo.


Porque calam as vozes de 19 vereadores, quando deveriam gritar e denunciar as falhas da administração, cobrar solução, abrir investigações de fato, não de brincadeirinha? Em que mundo vivem os senhores vereadores do PMDB, PSDB, PP, PSD, PT, PPS, SD, PSC e PDT? Para quem legislam esses nobres vereadores tão regiamente e bem pagos, com todas as mordomias!


Produzir leis de alto nível que promovam a cidade de fato ao seu patamar merecido? Zero. Defender os direitos das minorias, dos operários, nada! E não adianta mostrar grandes números de projetos ajuntados com moções, indicações, tudo como diz o povo, encheção de linguiça. Não há qualidade, não há produtividade. Há somente jogo para a torcida, o discurso fácil.



Poderia elencar aqui mais dezenas de situações que envergonham a maior cidade catarinense justo no Poder Legislativo, o mais importante poder na democracia, a Casa que deveria a caixa de ressonância dos anseios, problemas, direitos dos cidadãos joinvilenses. Mas o que temos é isso.

Hoje, todos sabem, Joinville é uma cidade abandonada pela administração do PMDB, Governo Udo Döhler. Não há quem ande pelas ruas sem literalmente cair em buracos que já brigam por espaços entre eles. Nas praças e poucos parques, o mato é morador perene, sem ninguém da Prefeitura a importuná-lo, além de se deteriorarem a olhos vistos, vide Parque da Cidade.

O eleitor pergunta o tempo todo: por onde caminham, ou passam em seus carros alugados pagos com meu dinheiro, estes vereadores? Em quais ruas de qual cidade eles vivem? Em quais praças levam seus filhos? Como tratam seus pais idosos, crianças adoecidas, sem atenção básica de saúde, com falta de remédios, sem condições adequadas?

Eles legislam em causa própria. Comissões Processantes, ou de investigação contra eles próprios? Não abrem. Investigar o Prefeito após graves denúncias do Ministério Público pela falta de ação de governo na saúde? Abrem, mas com governistas a conduzir, sem perguntas sérias, sem busca de documentos, sem vontade política. Cortar gastos, mordomias, custos excessivos para os cofres públicos diante de grave crise financeira internacional que chegou ao país? Nada!

Os vereadores joinvilenses poderiam, e devem por obrigação de responsabilidade com sua cidade, cortar na carne e mostrar serviço. Sugiro algumas atitudes e ações efetivas:

- reduzir seus salários ao nível dos salários de professores, ou mais ainda, para no máximo três salários mínimos

- cortar o aluguel de carros, e com isso economizar dinheiro público também com o combustível
- abolir as diárias para viagens, oferecendo apenas o pagamento de hospedagem e transporte, em casos essenciais que tragam realmente benefícios para a cidade

- desativar a tal catraca, um dinheiro jogado fora e que visa impedir o acesso do público, doando o valor da possível venda a uma entidade social

- pagar cursos somente com critérios duríssimos de escolha, evitando passeios a lugares turísticos que nada trazem de benefício

- utilizar a internet como meio para conhecer as famosas alegadas “experiências” de outras cidades e países, realizando teleconferências que fazem o mesmo efeito

Poderia elencar aqui mais sugestões, mas deixarei para os eleitores comentarem e indicarem mais medidas. É imperativo que a Câmara de Vereadores dê o exemplo para a comunidade, e quem sabe até para o país cortando gastos desnecessários, excessivos, coisas que o seu eleitor, assalariado, estressado, lutador, não tem, e mesmo assim, corre atrás e custeia seus desejos com o dinheiro suado do seu emprego.

Vereadores, vereadoras. Mostrem que o espírito público de vossas excelências está acima do desejo individual. Façam as mudanças nas leis, proponham, cortem seus gastos. Legislem em favor dos cidadãos que já não aguentam mais a surdez dos homens públicos em sua cidade. Aguardamos respostas oficiais e institucionais. Se você concorda com a atual situação do Poder Legislativo, leia e apague. Se não, compartilhe, comente, faça seu papel de cidadão.

É assim, nas teias do poder...

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Ki bom pra você!


Mentiras que parecem verdades


POR VALDETE DAUFEMBACK

No ano de 2000, a filósofa Marilena Chaui, em oposição ao mito fundador verdeamarelismo e ao culto do patriotismo abstrato, escreveu que por questões  óbvias (diga-se a herança do período colonial e imperial refletida e reafirmada na República), não havia motivo para se comemorar os 500 anos de Brasil. No ocasião não foram poucas as vozes que se levantaram contra para expressar descontentamento sobre a postura da autora. 

A minha geração aprendeu na escola que tínhamos o dever de sermos patriotas, de revelar amor incondicional à Pátria, de respeitar a Bandeira Nacional, de saber “de cor” a letra do Hino Nacional, de marchar em pelotão pelas ruas, de nos fantasiarmos de soldadinhos ou de personagens históricas, independentemente se seus feitos contribuíram para ceifar vidas. Não podíamos sequer questionar a validade de estarmos em “sentido” na vila enquanto a bandeira era hasteada em ritmo preciso para chegar à ponta do mastro enquanto o Hino Nacional era entoado. Áh, que alívio trazia aquela ordem “debandar” no final da aula quando, novamente ao som do hino a bandeira era descida e dobrada para o rito do dia seguinte. 

Há quem diga sentir saudades daquele tempo por ter aprendido o sentido de patriotismo a partir desta obrigação repetida durante anos e anos na escola.

Desde menina, mesmo não achando graça nas operações matemáticas, costumava fazer as contas do tempo perdido em ano letivo com a repetição do mesmo ato no início e no fim de cada manhã durante a semana. 

Mas na minha comunidade rural a resignação fazia parte do patriotismo. Assimilar as cores da bandeira brasileira e sua relação com a natureza, a localização de cada estrela disposta no campo azul recortado pelo branco da paz, a máxima positivista “ordem e progresso” constituíam parte da matéria de prova, escrita com caneta tinteiro, com direito a um mata borrão para casos eventuais. O que se escrevia não se apagava. O que se aprendia se guardava como verdade. 

Ignorávamos, no entanto, que as cores da Bandeira Nacional têm origem na tradição de famílias nobres européias, que o verde simboliza a Dinastia de Bragança, a qual pertencia D. Pedro I e que o amarelo representa a Dinastia de Habsburgo, da família de D. Maria Leopoldina. O artista francês Debret foi contratado para desenhar o símbolo nacional após a independência do Brasil, inspirando-se em bandeiras militares de seu país. O círculo azul, em substituição ao Brasão Imperial, só aparece com a Proclamação da República. A ideia positivista era mostrar um cometa com a flâmula na cauda com os dizeres “Ordem e Progresso” transpassando o céu azul.  

Convém lembrar que o Brasil foi o único país da América Latina em que o próprio colonizador concedeu independência política à sua colônia, instalando, porém, a Monarquia, forma de governo que já estava em total decadência na Europa. Esta experiência também foi inédita na América Latina e que durou praticamente um século. 

Esta posição de “vanguarda do atraso e atraso da vanguarda”, no dizer do sociólogo Francisco de Oliveira, teve início desde o período colonial quando se tentou reproduzir o sistema feudal por meio das Capitanias Hereditárias, implantando o trabalho escravo em tempo de expansão capitalista mercantil. Diga-se, uma contradição aos tempos. Neste contexto, considera-se também que o Brasil foi o último país a abolir a escravidão. 

Não há como negar que o sistema escravocrata deixou uma herança maldita de poder de uma elite raivosa, responsável pela classificação e exclusão social de parte da população brasileira, mediante justificativa da meritocracia. Por estas e por outras razões é que fica subentendida a necessidade de reflexão sobre comemorações no aniversário da Pátria. O sentido de patriotismo está para além das abstrações de mitos que se ingere sem conhecimento.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

VTNC


Fora, Hungria!

 
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Budapeste foi um dos lugares que mais gostei de visitar. Não há uma razão clara, mas arrisco a dizer que talvez seja resultado de uma certa porção “terceiro mundo” da cidade. A capital húngara tem similaridades com muitas cidades brasileiras a que estamos habituados, por exemplo, apesar de ter muito mais história (vem desde o Império Romano).

Há um ou outro monumento mal conservado. Muitos sem abrigo nas ruas. Alcoólatras que se instalam sob as marquises dos prédios. Uma certa incivilidade (há lugares onde o cheiro de urina torna impossível respirar). Os transportes públicos são pouco convidativos. Mas o que assusta mesmo é haver uma extrema direita muito saliente, mesmo nas ruas.

É comum encontrar homens a ostentar sinais neonazistas (é verdadeiro o estereótipo do skinhead fortalhão, com roupas cheias de mensagens pouco amigáveis). Para ter uma ideia, em fevereiro a ultra-direita comemora o “dia da honra”, que marca o fim da batalha pela cidade na Segunda Grande Guerra, em 1945: húngaros e alemães juntos de um lado, soviéticos do outro.

Fora isso é um dos mais belos destinos da Europa Central. Tanto que o turismo representa cerca de 8% do PIB da Hungria. O lado bonito de Budapeste faz com que os visitantes não prestem muita atenção a essas mazelas. Afinal, a xenofobia não é contra os turistas ocidentais, que têm dinheiro, mas contra “inimigos” atávicos (é uma miscelânea onde cabe tudo, de judeus a comunistas).

O fato é que sempre tive o projeto de voltar. Não tenho mais. E a decisão veio com o anúncio, há algum tempo, da construção de uma cerca de 175 quilômetros na fronteira com a Sérvia. Não pela cerca em si, porque elas podem ser contornadas (e são). Mas por representar o extremar das posições do governo de Viktor Orbán, que tem dado repetidas provas de não ser amigo da democracia.

É difícil opinar sobre a questão dos refugiados, porque é muito complexa. Mas se há certezas possíveis, uma delas é que não se resolve o problema levantando mais cercas. O governo de Viktor Orbán namora a ultra-direita e anda na contramão do ideal de solidariedade, um dos pilares da democracia europeia. E se é para ser assim, não fazem falta à União Europeia.

Fora, Hungria.

Quanto a mim, não volto mais ao país enquanto for governado por esses reacionários.


É a dança da chuva.