POR CLÓVIS GRUNER
Mereceria uma leitura mais cuidadosa o fato de que, mesmo
entre setores da esquerda que atentam para a urgência das pautas identitárias,
a candidatura de Marina Silva não tenha sido nem mesmo cogitada como uma alternativa
ao segundo turno. Não bastasse serem três homens a
protagonizarem as candidaturas de centro esquerda, dois deles, os que disputam nominalmente o voto – Ciro e
Haddad – têm vices mulheres relegadas a um papel coadjuvante.
Os argumentos mais comuns contra Marina são simplistas, quando não
desonestos. Pesa contra ela o apoio a Aécio no segundo turno de 2014, um
equivoco, já que ela podia simplesmente não apoiar nenhuma das candidaturas,
como Luciana Genro. Mas a atitude não me parece mais grave que as alianças
que o PT fez com quase toda a banda podre da política brasileira, incluindo
Michel Temer, escolhido a dedo por Lula para vice de Dilma, por exemplo.
Ela é acusada de ser de direita, mas nada em sua trajetória
passada e presente sustentem isso. Sua aproximação a economistas liberais como
Eduardo Gianetti é supostamente a prova de seu neoliberalismo, dizem os
petistas, olvidados de que Henrique Meireles foi o homem forte da economia nos
governos Lula, que Dilma nomeou Joaquim Levy seu Ministro da Fazenda, e que
Fernando Haddad, mal subiu nas pesquisas, já acena ao também liberal Marcos
Lisboa.
Um debate não polarizado – A lógica vale para a acusação de
que, evangélica, Marina fará um governo “conservador nos costumes”, como se as
administrações anteriores, incluindo e principalmente as do PT, tivessem
assegurado a plena laicidade do Estado. Até prova em contrário, o Estado laico
está menos fragilizado com a orientação religiosa de Marina, do que estava
quando Lula nomeou pastores da IURD como ministros ou Dilma rifou a Comissão de
Direitos Humanos, abrindo as portas para que Marco Feliciano assumisse sua
presidência.
O seu programa de governo, por outro lado, reafirma o que
Marina efetivamente representa: uma candidatura de centro esquerda, com as pautas,
os limites e as possibilidades atinentes a uma candidatura de centro esquerda. Suas
propostas em áreas como educação, cultura e direitos humanos, por exemplo, não diferem
substancialmente do que propõem Lula/Haddad e Ciro, e mesmo avançam em alguns pontos.
Seu alegado liberalismo não a impede de defender os investimentos
públicos como um dos fatores para alavancar a economia, ou a não privatização
da Petrobras, do Banco do Brasil e da Caixa Econômica. Além disso, ela mantém
uma relativa autonomia frente aos grupos políticos que disputam hoje a
presidência baseados na polarização extrema, uma maldição que não poupou o PSOL
e, tampouco, Ciro. Com Marina, penso que teríamos a chance de algum debate
racional, e poderíamos fazer nossa escolha baseados em outros critérios que não
o ódio ou o medo.
***
Post Scriptum: Braziliansplaining – Na semana passada, ainda com o 7 a 1 da
Copa de 2014 atravessado na garganta, brasileiros decidiram acertar as contas numa seara onde somos craques: a história alemã. Um vídeo publicado pela Embaixada da Alemanha mobilizou nossos melhores atletas, que entraram em campo decididos a explicar
aos alemães que o holocausto não existiu e que o nazismo é, sim, de esquerda.
Como aparentemente nem a Alemanha é suficiente para
convencer nossa direita pouco esclarecida, vou tentar com o próprio Adolf Hitler. Em entrevista concedida em 1923 ao escritor alemão George
Sylvester Viereck, publicada anos depois pela conservadora “Liberty”, e
acessível aos leitores coevos no site do inglês “The Guardian”, Hitler explica
o que entende por socialismo, sua relação com a noção de raça ariana e porque o
nazismo não era um movimento de esquerda.
Em um dado momento, para enfatizar seu ponto
de vista e o que o separava do marxismo e dos bolcheviques, o líder alemão
sentencia: “Nós poderíamos ter nos chamado de Partido Liberal”. Como
historiador, posso assegurar que Hitler estava equivocado: não há muito de
liberal ou do liberalismo no Partido Nazista. Por outro lado, e os
comentaristas anônimos desse blog não cansam de me lembrar, a palavra de um
historiador, no Brasil de hoje, não vale nada.
Olha só, achei um Marineiro. Pensei que não tinha ng que votava na Marina "democraticamente" Silva.
ResponderExcluirNão sou eleitor da Marina; mas preferia um segundo turno com ela do que com Ciro ou Haddad.
ExcluirSou de centro, já votei na Marina e assim como muitos perdi a confiança na esquerda e em todos que tem um passado militando nela.
ResponderExcluirA questão é que nenhum dos lados confia na Marina por inteiro, portanto hoje ela não tem chance alguma, mas se no futuro ela transmitir melhor o que pensa, pode voltar a ter apoio do centro e quem sabe de liberais sem perfil conservador.