terça-feira, 11 de setembro de 2018

Quem nasceu para Bolsonaro sequer chega a Trump

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Deve ter sido o britânico “The Guardian” o primeiro a chamar Jair Bolsonaro de “Trump dos Trópicos”. E agora tem muita gente aí pelo mundo a usar a denominação. É um erro. As diferenças começam numa evidência. Os dois são grandessíssimas cavalgaduras, mas não são vinho da mesma pipa. Trump é um idiota, mas pelo menos sabe fazer dinheiro e é milionário. Bolsonaro, ao contrário, é um cara que sempre viveu às custas do dinheiro público. 

Não duvido que Jair Bolsonaro goste da comparação, mas duvido que Donald Trump fique feliz. É a velha história do primo pobre e do primo rico. Historicamente os EUA mandam e desmandam no Brasil e, portanto, um Bolsonaro presidente seria apenas vassalo de Trump. Aliás, já é. Quem não lembra de um ridículo Bolsonaro a fazer continência para a bandeira norte-americana? Ou de quando ele disse que o melhor era entregar a Amazônia para uma nação estrangeira?

Lanço um desafio ao leitor e à leitora. Responda a pergunta: entre Trump e Bolsonaro, quem é o maior fascista? Não tenho dúvidas de que a maioria das pessoas com dois dedinhos de testa não titubearia em apostar no brasileiro. Trump é um doidivanas, mas nunca foi visto a homenagear um psicopata torturador como o execrável Brilhante Ustra, acusado, entre outras coisas, de torturar mulheres na frente dos filhos.

Mas em termos práticos, qual é o maior fator de separação entre os dois? É a sociedade. A democracia norte-americana é sólida e tem regras que impõem limites ao seu presidente. As ações provenientes da Casa Branca estão sob constante escrutínio. O Brasil nunca teve uma cultura democrática e a coisa facilmente vira a casa da Mãe Joana. Aliás, um país onde sequer os juízes respeitam a Constituição está fadado a estar sempre na rabeira da história.

A sociedade tem que ser melhor que o indivíduo. Ou seja, a sociedade norte-americana (em que pesem os rednecks que votam nos republicanos) é mais evoluída que Donald Trump e tem mecanismos de defesa. Nem é preciso ir muito longe. É só lembrar o texto de Op-Ed, publicado semana passada no “NY Times”, em que um funcionário da Casa Branca afirma haver ações de resistência interna para impedir que o presidente tome decisões estapafúrdias.

No Brasil o buraco é mais em baixo. Qualquer pessoa mais inteligente que um símio sente arrepios ao imaginar Jair Bolsonaro como presidente. O homem é um inútil. Tem evidentes limitações intelectuais. Não possui cultura suficiente para ler o mundo. Vive perdido em paranoias solipsistas. É claro que a ideia de vê-lo no Planalto assume proporções de um filme de terror. Porque todos sabemos que a sociedade brasileira não tem mecanismos de defesa.

É a dança da chuva.



segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Sorte


156: uma Ouvidoria que é surda para contribuinte e só serve para engabelar

POR JORDI CASTAN
A Ouvidoria Municipal não ouve o cidadão. Portanto não me representa. E isso não é novidade. Tampouco deveria ser surpresa, até porque segue o padrão desta gestão municipal é dizer que ouve e fazer ouvidos moucos. Ligar para o 156 pode ser considerado uma perda de tempo, uma inutilidade. O joinvilense cansou de não ser ouvido, de receber respostas padrão que são pura empulhação e optou por se fazer ouvir por outros meios.

A Ouvidoria tampouco serve para o que deveria servir. Porque conceitualmente sua função e seu objetivo foram distorcidos e perderam o sentido. A Ouvidoria assumiu o papel de balcão de reclamações, onde o contribuinte pode, depois de demorado e pouco transparente processo, informar o problema identificado para que, a partir deste momento, a pesada máquina da burocracia pública comece a mover suas engrenagens para empulhar e justificar o que não fez, não faz e não fará. Não tem como objetivo "resolver" ou "corrigir”, mas sim justificar ou empulhar.

Como a Ouvidoria é um órgão interno da administração municipal, estando ocupada por funcionários públicos, seu objetivo principal é o de proteger o sistema. Não há um ouvidor geral, alguém com responsabilidade e autoridade para defender o cidadão. O que há é uma estrutura para receber informações de um novo buraco na rua, de um sinaleiro que não funciona, de uma árvore caída, de um imóvel abandonado ou de um terreno baldio tomado de mato.

Em alguns casos, há até denúncias de crimes ambientais, de obras ilegais ou fora de conformidade com a legislação e a Ouvidoria encaminha estas solicitações, reclamações ou sugestões aos setores e departamentos correspondentes. O resultado é uma resposta protocolar no estilo: “Agradecemos sua informação. O problema será resolvido de acordo com a disponibilidade de recursos, equipamento, etc”. Ou o mais habitual: “Esta obra, reparação ou ação já está prevista dentro da programação da secretaria de XYZ”. E para a ouvidoria e a Prefeitura tudo resolvido. O contribuinte reclama, sua chamada é cadastrada, depois de se identificar e pouco ou nada vai acontecer.

Para que o serviço funcionasse de fato haveria, entre outras, duas alternativas claras. A primeira é converter a Ouvidoria em Resolutiva. Assim, em lugar de ficar ouvindo poderia começar a resolver. Em lugar de uma longa lista de justificativas e delongas, o contribuinte receberia uma resposta rápida, certeira, precisa e o problema se resolveria num prazo rápido: 24, 36 ou 48 horas. Seria um serviço rápido e eficiente, duas coisas que esta gestão não é.

A segunda alternativa seguiria o modelo do “Ombudsman”, pessoa encarregada pelo município de defender os direitos dos cidadãos, recebendo e investigando queixas e denúncias de abuso de poder ou de mau serviço por parte de funcionários ou instituições públicas. Assim, em lugar de ficar protegendo o próprio sistema, se orientaria a defender o contribuinte. Para isso, deveria ser nomeado ou escolhido um “ombudsman” ou ouvidor que, com um mandato determinado que transcenderia esta ou aquela gestão, não poderia ser demitido durante o exercício do seu mandato e teria potestade ara resolver problemas. Identificar o que não esta funcionando, por que não esta funcionando, onde está ou quem é o problema e recomendar as ações necessárias para corrigir o problema com celeridade e eficiência.

Mudar o foco de “ouvidoria” que ouve e não faz para “fazedoria” seria um passo importante na direção de mudar a forma de atuar. Mas para ter um ouvidor municipal com um mandato de quatro anos, podendo ser reeleito uma única vez e sem que coincida com o do Executivo e do Legislativo seria um salto em direção ao futuro, a uma gestão transparente, justa e cidadã. Tópicos inimagináveis numa gestão inepta, autoritária e fechada.

Por isso, o joinvilense não se sente atendido pela ouvidoria, não acredita nela e não espera soluções de um órgão público que tem como finalidade principal engabelar, não resolver e criar a ilusão que o cidadão é ouvido. O mais avançado que há por aqui é uma espécie de SAC (Serviço de Atendimento ao Cliente) sem que exista uma agência reguladora que audite a eficiência da Ouvidoria. O que a sociedade precisa é transparência, eficiência, respeito e rapidez. Não tem nada disso. 

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Bolsonaro, a facada e as eleições

POR CLÓVIS GRUNER
Em março desse ano, quando a vereadora Marielle Franco, do PSOL carioca, e seu motorista, Anderson Gomes, foram assassinados, ela com três tiros na cabeça, o deputado Jair Bolsonaro, à época já presidenciável, silenciou. Um de seus assessores justificou o silêncio alegando que “a opinião de Bolsonaro seria polêmica demais”. Dois outros membros da família, no entanto, se manifestaram.

O deputado estadual pelo Rio, Flávio Bolsonaro, chegou a prestar condolências à família em um tuite para, logo depois, apagá-lo. Já Eduardo Bolsonaro, deputado federal por São Paulo, tuitou: “Se você morrer seus assassinos serão tratados por suspeitos, salvo se você for do PSOL, aí você coloca a culpa em quem você quiser, inclusive na PM. Eis o verdadeiro preconceito, a hipocrisia”. E compartilhou outro, de um ferrenho seguidor do clã: “O assassino da vereadora Marielle Franco, se for um PM guilhotina, se for um traficante é vítima da sociedade. Assim é a esquerda”.

Quase seis meses depois, o assassinato de Marielle Franco continua impune, apesar dos alegados esforços da polícia para elucidá-lo. E mesmo sendo um candidato supostamente preocupado com a segurança pública, Bolsonaro segue silente sobre o crime. Mas se não sabemos até hoje sua opinião polêmica sobre os três tiros que executaram Marielle e Anderson, sabemos o que o candidato pensa a respeito de outras violências.

Sabemos que ele sugeriu terem sido os petistas que atiraram contra a caravana de Lula no interior do Paraná. Sabemos, também, que ele prometeu – em uma de suas típicas “brincadeiras” – fuzilar os mesmos petistas em um comício, semana passada. Sabemos ainda o que ele pensa de mulheres, negros, quilombolas e LGBTs e, finalmente, de seus muitos elogios e homenagens a um torturador, estuprador e assassino, o coronel e chefe do DOI-CODI, Brilhante Ustra. A lista é grande, mas paro por aqui.

Minha reação imediata quando soube do atentado, no final da tarde de ontem, foi de ceticismo. Na minha página do Facebook, escrevi: “Se não for um novo Riocentro, algum imbecil escolheu uma péssima hora pra brincar de Justiceiro”. A desconfiança era mais que legítima: aí estão, além do Riocentro, o incêndio ao Reichstag como evidências históricas de que fascistas, sempre que lhes convém, mandam os escrúpulos às favas.

Violência e oportunismo – As informações nas horas seguintes desfizeram as suspeitas e confirmaram que Jair Bolsonaro foi vítima de um atentado à faca, e que deve ficar de fora da campanha eleitoral – o que inclui os debates, no que a agressão foi providencial – até o fim do primeiro turno. À direita e à esquerda, analistas parecem não ter dúvidas de que, se as chances de um segundo turno com Bolsonaro eram significativas, desde ontem a questão é saber de quem será a outra vaga.

A tendência é que os usos políticos que ele e seus seguidores farão do acontecimento, sigam na direção de apresentá-lo como vítima porque ameaçava “tudo que está aí”, num esforço narrativo que pretende consolidar sua imagem como aquilo que obviamente não é: um candidato antissistema. A estratégia é aproveitar a violência contra Bolsonaro para diminuir a enorme rejeição contra ele e, ao mesmo tempo, inflar ainda mais o ódio contra seus adversários e a esquerda.

Pode dar certo, o que coloca os demais candidatos, especialmente os de centro-esquerda, em uma posição delicada: se persistem nas criticas, podem ser vistos como insensíveis; se recuam, deixam o campo aberto à militância pró-Bolsonaro monopolizar as narrativas de vitimização do candidato e culpabilização dos grupos adversários, jogados na vala comum da “esquerda” e representados como responsáveis pelo atentado, porque a eles supostamente interessa que ele esteja fora da disputa.

Nessas horas, dizer que Bolsonaro colheu o que plantou, a violência, não faz diferença, embora seja verdade. Desde ontem, da alta cúpula do partido à militância anônima das redes e nas ruas, a narrativa é a mesma, e sua ausência física na campanha não diminuirá o efeito eleitoral do atentado, que torna ainda mais agudo um ambiente político já extremamente polarizado.

E se alguém tinha alguma ilusão sobre a possibilidade de Bolsonaro refletir sobre as consequências de seus discursos de ódio e de sua defesa da violência como método, as declarações do presidente do PSL, Gustavo Bebianno, à Folha – “agora é GUERRA!!” –, e do candidato à vice, o general Mourão – “os profissionais da violência somos nós” –,   trataram de desfazê-la. Estamos lidando com o pior da política, com um fascista, um apologista da tortura que rende homenagens a um assassino fardado. Um atentado não muda o que Bolsonaro é nem o perigo que sua candidatura representa.

Cota 40 - As palmeiras imperiais estão morrendo?

POR JORDI CASTAN



Quando as palmeiras imperiais começaram a morrer, criou-se uma comisão para salvá-las. Boa ideia, mas foi pouco e foi tarde. A morte das palmeiras imperiais é uma morte anunciada. Só a Prefeitura Municipal não sabia.

No words...


quarta-feira, 5 de setembro de 2018

No domingo, um pedaço do futuro ardeu

POR CLÓVIS GRUNER
“O Brasil é um país onde governar é criar desertos. Desertos naturais, no espaço, com a devastação do cerrado, da Amazônia. Destrói-se a natureza e agora está-se destruindo a cultura, criando-se desertos no tempo”. O depoimento do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro é uma das imagens que melhor sintetiza o significado do incêndio que, no domingo (02), destruiu boa parte da estrutura física e do acervo do Museu Nacional, onde Viveiros de Castro é professor.

A tragédia, que consumiu um dos mais valiosos patrimônios históricos e culturais da América Latina, além de um acervo riquíssimo de ciências naturais, vinha sendo anunciada há muito tempo. Apesar do corte brutal de verbas, fruto das políticas de austeridade praticadas pelo governo Temer e que impactaram negativamente no orçamento do Museu, o descaso com a instituição vinha de longa data.

Em 2004, matéria da Agência Brasil alertava para o risco de incêndio ante as condições precárias do prédio. Nada foi feito. Mais recentemente, em 2014, uma verba de R$ 20 milhões foi incluída no Orçamento da União para custear, entre outras coisas, a modernização de seus espaços e equipamentos culturais. O governo Dilma, no entanto, contingenciou os recursos, que nunca foram empenhados e repassados à direção do Museu Nacional.

As condições de funcionamento se agravaram sensivelmente, ano após ano. Em 2016, ele chegou a fechar as portas para visitação, cuja frequência também diminuiu sensivelmente, em parte por conta da precariedade das instalações. Acompanhando o estrangulamento financeiro das Universidades públicas, – o Museu é subordinado à UFRJ –, o orçamento caiu para menos da metade nos últimos cinco anos; em 2018, a verba de manutenção foi de R$ 98 mil.

Ignorância e má fé – Desde o domingo, o Museu virou objeto de discursos inflamados e escandalizados. O problema é que parte deles está mais empenhado em espalhar boatos baseados em mentiras e desinformação. Uma dessas vozes foi a do Ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, que não apenas se mantém no cargo – qualquer governo decente já o teria demitido –, como o usou para desqualificar a UFRJ e fazer jogo político baixo, culpando o reitor da Universidade pelo incêndio.

Entre outras estultices, Sérgio Sá afirmou que a reitoria deveria ter buscado recursos em outras fontes, já que o orçamento público era insuficiente. Nos últimos anos, seis projetos de preservação e recuperação do Museu Nacional foram aprovados pela Lei Rouanet. Mas como os recursos precisam ser captados na iniciativa privada, as verbas não vieram, pois nossos empresários não se importam: dos R$ 17,6 milhões autorizados, a direção do Museu conseguiu captar no mercado, apenas R$ 1,07 milhão.

No primeiro semestre desse ano, um convênio com o BNDES, que o ministro de Temer se jacta de ter intermediado, garantiu ao Museu o repasse de quase R$ 22 milhões. Mas a verba foi contingenciada por conta das restrições do período eleitoral e só seria liberada, parceladamente, depois das eleições de outubro. Ironicamente, uma parte dela seria investida em infraestrutura para a prevenção de incêndios.

Um pequeno cartaz fixado na entrada do “Museo de la Memoria”, em Montevideo, informa aos visitantes: “Más memoria. Más futuro”. A mensagem é clara: sem uma ideia de passado, sem um conhecimento prático do passado possibilitado por instituições como o Museu Nacional, é o nosso horizonte de expectativas que resta vazio. As chamas de domingo destruíram parte de nosso patrimônio passado, mas incineraram também um pedaço do nosso futuro.

terça-feira, 4 de setembro de 2018

Bolsonaro não só fuzila a "petralhada", mas também mata a decência

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO
Uma pergunta hipotética: num segundo turno entre Haddad e Bolsonaro, em quem você votaria? Não tenho dúvidas de que muita gente, em Santa Catarina e particularmente em Joinville, escolheria votar em Bolsonaro. Ora, qualquer pessoa com dois dedinhos de testa percebe que Bolsonaro não joga com o baralho todo. O homem é um cretino. Mas o ódio ao PT é maior do que a prudência e tem muita gente a mandar os escrúpulos para os diabos.

Quem andou pelas redes sociais nos últimos dias deve ter visto o discurso de Bolsonaro no Acre, quando o candidato, simulando uma arma nas mãos, disparou no alvo: “Vamos fuzilar a petralhada toda aqui do Acre. Vamos botar esses picaretas pra correr do Acre. Já que eles gostam tanto da Venezuela, essa turma tem que ir pra lá. Só que lá não tem nem mortadela, hein galera?! Vão ter que comer é capim mesmo”. Sim... esse homem quer ser presidente.

Não é fato único na trajetória do candidato. Mas há linhas vermelhas que não se deve ultrapassar. Um candidato à presidência deve ter um certo recato. É inaceitável essa apologia da violência e incitação ao crime. Há quem durma bem com esse barulho, mas qualquer democrata perde o sono. O discurso foi aplaudido, o que leva a um exercício de imaginação: que tipo de pessoa apoia um homem do baixo calibre de Bolsonaro?

Mas para além da questão da violência do candidato, há pelo menos duas ironias no episódio. A primeira é que, pela manifestação da plateia, é possível ouvir mulheres entre o público. E uma mulher capaz de votar em Bolsonaro deve ter algum problema com a sua condição feminina. A outra ironia é Bolsonaro dizer que as pessoas vão ter que comer capim. Sério? Porque todos sabemos sobre quem recai a imagem de burro.

Haver gente capaz de fechar os olhos para esse tipo de episódio e, mais que isso, estar disposta a votar em Bolsonaro, é motivo de preocupação. Porque mostra o avançado estado de putrefação da democracia (que nunca foi, mas poderia ter sido). O comportamento de Bolsonaro seria inaceitável em sociedades civilizadas, mas no Brasil os números das pesquisas evidenciam uma clara opção pela barbárie. Isso não vai acabar bem.

É a dança da chuva.



segunda-feira, 3 de setembro de 2018

O Executivo é o novo Rei Midas: transforma terra em ouro


POR JORDI CASTAN
Lembram da pressa em alterar a qualificação de área rural para urbana da gleba onde se instalaria a UFSC? Tanta pressa por nada. A universidade não deve instalar-se lá antes de uma década. Agora surge o projeto de regulamentação da Área de Expansão Urbana Sul. São aproximadamente 2.600 hectares (1 hectare equivale a 10.000 m2) e, de acordo com o diagnóstico elaborado pelo Executivo, 80% desta área apresenta algum tipo de restrição ambiental.

Que outro motivo poderia haver por trás dessa mudança de qualificação para ocupação humana de áreas ambientalmente vulneráveis e de risco? Ora, não é outra senão a de enriquecer os seus proprietários. Curiosamente entre eles há conhecidos nomes da sociedade, da política e da economia local.

O valor venal das áreas rurais em Joinville, de acordo com a Tabela de Valor da Terra Nua (VTN), elaborado pela SEFAZ - Secretaria da Fazenda Municipal, é de R$ 3,75 por metro quadrado, com picos de R$ 9,5 e menores de R$ 2,0. Com a mudança de zoneamento, proposta na regulamentação da Área de Expansão Urbana Sul, este valor multiplicará facilmente por 10, 20 ou mais de 30 vezes. O executivo se converte assim num moderno Rei Midas, que, do dia para a noite, transforma em ouro 26.000.000 de m2. Que passam de valer R$ 100 milhões a valer entre R$1 e R$2 bilhões, numa conta conservadora e entre R$ 4 e R$ 5 bilhões numa conta mais realista.

Pode estar aqui o motivo principal de tanta pressa e a falta de estudos e justificativas bem elaboradas ou bem embasadas para regulamentar a Área de Expansão Urbana Sul. Pode ser também este o motivo da insistência em aprovar logo está AEU (Area de Expansão Urbana), mesmo depois que a UFSC tenha assinado um contrato por 10 anos para o campus instalado no Condomínio Industrial da Perini.

É bom lembrar os nomes dos notáveis que se empenharam, com pessoal dedicação para que a UFSC se instalasse, justamente, naqueles brejos e com isso se sobrevalorizasse grandes áreas de terras ambientalmente frágeis e de risco (e, portanto, com pouco valor de mercado). É bom lembrar também, que não seria a primeira vez, na história da colônia, a decisão de ocupar áreas baixas sujeitas a enchentes por interesses econômicos. E, claro, para atender a pedidos de financiadores de campanha ou dos que dividem as cadeiras do “stammtisch” das associações de classe.

O resultado sempre acabou sendo o mesmo, enriqueceu a uns e criou e continua criando problemas para a maioria da sociedade que posteriormente paga as obras para corrigir estes desatinos, como as obras de macrodrenagem dos Rios Morro Alto e Mathias estão ai para não nos deixar esquecer.

Por que Joinville teima em não querer aprender? Por não aprender comete uma e outra vez os mesmos erros.

(*) STAMMTISCH – mesa cativa





sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Nunca existiu um “kit gay”

POR CLÓVIS GRUNER
A família Bolsonaro nutre uma obsessão patológica pela homossexualidade e os homossexuais. Há quem sugira que Jair Bolsonaro e os filhos, no fundo, odeiam a imagem de si que veem refletidas nos homens gays. Não é uma alternativa a ser inteiramente descartada, porque é lícito supor que alguém que odeia tanto e tão intensamente seja, de algum modo, atormentado por sabe-se lá quais e quantos demônios internos.

A mais recente manifestação da homofobia do candidato foi essa semana, durante a entrevista de Bolsonaro à bancada do Jornal Nacional, na terça (28). Indagado sobre suas muitas declarações homofóbicas, o deputado voltou a falar do “kit gay”. E para provar que era tudo verdade, mencionou a realização, em 2010, do “9º Seminário LGBT Infantil” e a distribuição de um livro às escolas públicas, parte da estratégia da URSAL para desviar “crianças de seis anos” do caminho natural da heterossexualidade.

Vamos por partes. Nunca aconteceu um “Seminário LGBT Infantil”, muito menos nove deles. O livro que Bolsonaro insistiu em mostrar durante a entrevista, “Aparelho sexual & cia.”, de autoria da escritora francesa Hélène Bruller e com ilustrações do suíço Philippe Chappuis, já foi publicado em mais de 10 países e vendeu cerca de dois milhões de exemplares desde seu lançamento, em 2001. No Brasil, saiu pela Companhia das Letras, que negocia seu relançamento – a obra está esgotada há alguns anos.

Mas as duas mentiras “menores” emolduram uma primordial: nunca existiu um “kit gay” e, obviamente, nunca houve a intenção de distribuir cartilhas sobre “ideologia de gênero” (essa excrescência conservadora) nas escolas públicas para “crianças de seis anos”. Bolsonaro mente e, por ignorância, má fé ou simplesmente preconceito, milhares de pessoas passaram os últimos dias compartilhando e espalhando a mentira.

“Escola sem Homofobia” – Em 2011 o MEC criou a campanha “Escola sem Homofobia”, uma iniciativa institucional com o intuito de propor atividades e o debate em torno ao tema da homofobia. Além de três vídeos explicando casos de homossexualidade, bissexualidade e transexualidade entre jovens, aos professores seriam entregues cartilhas e material de apoio para a discussão com os alunos, de acordo com a faixa etária das turmas.

A campanha tampouco era voltada a “crianças de seis anos”, mas à turmas de Ensino Fundamental 2 (6º a 9º anos) e Ensino Médio. Além dos conteúdos mais específicos sobre educação sexual e temas transversais – prevenção de DSTs, gravidez na adolescência, etc.. –, os vídeos (disponíveis no YouTube) e o material destinado a docentes reforçavam a importância de combater as muitas manifestações de preconceito, entre ele os de gênero, comuns entre adolescentes no ambiente escolar.

A campanha, no entanto, nunca chegou a ser desenvolvida porque Dilma Rousseff, para não perder os votos dos deputados conservadores – entre eles, do próprio Jair Bolsonaro, à época parte da base aliada da presidenta na Câmara – dobrou-se à pressão de grupos religiosos e a vetou. Não seria a única vez, aliás, que o governo do PT negociou direitos das chamadas minorias em troca de votos, no parlamento ou fora dele.

O preconceito fere e mata – É lamentável, em pleno ano de 2018, ser obrigado a dizer o óbvio: nenhum vídeo, cartilha ou discussão sobre homofobia no ambiente escolar vai interferir na orientação sexual de alguém. Tampouco está em curso a implantação de uma “ditadura gay” a ameaçar a “tradicional família brasileira”, seja lá o que os reacionários entendem por isso.

Mas discutir e prevenir a homofobia na escola pode contribuir significativamente para melhorar a qualidade de vida de muitos adolescentes. Porque nas escolas há tanto alunos e alunas que se identificam com a heterossexualidade, como há alunas e alunos gays, lésbicas e trans. Mas, diferente de seus colegas, elas e eles não se sentem confortáveis nem seguros em sua orientação, porque diariamente expostas e expostos ao preconceito e às suas muitas formas de violência.

Pesquisas têm mostrado que o bullying homofóbico colabora para elevar os índices de repetência e evasão escolar e de suicídio entre adolescentes – na semana passada, em Denver, nos Estados Unidos, um menino de nove anos tirou a própria vida após ser ridicularizado na escola pelos colegas. A campanha “Escola sem Homofobia” pretendia atacar de frente esses problemas. Jair Bolsonaro e aqueles que corroboram as suas mentiras, colaboram para naturalizá-los.