A notícia da morte de Luiz Carlos Cancellier, reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), causou estupefação em todos os moradores do Estado. No meu caso, senti a mesma indignação que se abatia sobre mim, nos anos duros da ditadura, quando tomava conhecimento do assassinato de mais um combatente pela liberdade. Um homem justo, sem qualquer fato que desabonasse a sua conduta pública, foi enxovalhado ao ser levado para a prisão. O colocaram nu entre presos comuns, como se fosse um bandido contumaz. Isso foi muito para Cancellier. Ele saiu daquela masmorra alquebrado e o seu protesto contra esta injustiça foi o suicídio.
O ex-senador Nelson Wedekin, na cerimônia de despedida na UFSC, falou sobre o amigo de várias décadas. “Mãos visíveis e invisíveis o empurraram das alturas (...) Mãos que sabem o que é vingança, mas não sabem o que é justiça”. Ele denunciou os abusos desta ditadura da toga que, sob o argumento de combater a corrupção, pratica todo tipo de arbitrariedade. A presunção da inocência, princípio basilar da democracia, foi deixada de lado nestes tempos bicudos. Wedekin desabafou: “Estamos com medo das autoridades que deveriam nos proteger”. Este é o mesmo sentimento que eu tinha quando os militares estavam no poder e que volto a sentir diante do arbítrio desta casta que age à sombra da Lava Jato.
Luiz Carlos Cancellier não era acusado de nada, apenas estava sendo investigado pela Operação Ouvidos Moucos, da Polícia Federal. A juíza que decretou a sua prisão poderia simplesmente chamá-lo para explicar a denúncia de que, supostamente, estaria obstruindo as investigações sobre irregularidades em um programa de ensino a distância na gestão anterior. A PF armou uma operação cinematográfica, com mais de 105 agentes para prender o reitor. Em seguida a mídia fez o trabalho sujo de linchamento público, sem maiores investigações, acatando tudo o que as autoridades afirmavam.
Não é assim que se combate a corrupção. Isto serve mais para colocar alguns agentes públicos em evidência na mídia. Por outro lado destrói a reputação de um profissional que durante quatro décadas trabalhou para ajudar a transformar a UFSC em uma das universidades mais conceituadas do país.
Espero que esta morte sirva para a mudança de rumo neste tipo de investigação nos mesmos moldes da Lava Jato, onde o que menos interessa são as provas. Basta apenas alguma delação para que haja o massacre público da vítima. Com a morte do jornalista Vladimir Herzog, em um quartel do Exército, em São Paulo, em 1975, houve um grande clamor contra o arbítrio. Ali foi o começo da caminhada rumo ao fim da ditadura. Acredito que agora foi dado o passo inicial para o desmonte da ditadura da toga. O povo cansou dos abusos desta casta de privilegiados que pratica todo tipo de irregularidades e não é investigada. Punição para quem ajudou a empurrar Cancellier para a morte.