quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Eu quero pagar pela Tarifa Zero e você também deveria querer

POR FELIPE SILVEIRA

Depois de muito tempo de esquiva, me enfiei novamente em um debate sobre Tarifa Zero com um amigo de direita (estou falando daquilo que nós, identificados com a esquerda, chamamos de direita, embora muitas vezes eles não se assumam como tal – e respeito a posição). Mais uma vez o debate gira em torno da questão do financiamento e o chavão “não existe almoço grátis” vem à tona. É clichê, mas é um debate que importa e muitas vezes fica jogado de lado. Por isso decidi escrever algumas palavras sobre o assunto.

A direita erra ao considerar que pessoas e movimentos que propõem e defendem a Tarifa Zero, especialmente o MPL (grande protagonista da causa no Brasil), não se importam com a questão do financiamento. Não há uma pessoa que defenda a ideia a sério, com profundidade, que não saiba das complicações que a execução da ideia exige. Porém, muitas vezes esta questão nos é tão óbvia que parecemos não nos preocupar com ela. Às vezes, no calor das palavras de ordem, da indignação com a violência, da defesa de um direito (agora constitucional), não ligamos muito em mostrar que temos propostas, que não estamos sonhando e que faz sentido lutarmos, imediatamente, por esta causa.

Feita a introdução, vamos ao que interessa. Enumero alguns pontos abaixo, mas friso que alguns são inspirados em construções coletivas (ideias que o MPL defende, por exemplo) e outros argumentos são posições individuais, a partir da observação de outras pautas e conceitos não diretamente relacionados ao transporte. Algumas ideias são do candidato a prefeito pelo PSOL nas últimas eleições, Leonel Camasão, que escreveu as suas sugestões aqui. Acho importante dizer que sempre participei de manifestações e atividades pelo passe livre, mas nunca fiz parte do MPL.

1) CONTE UMA NOVIDADE SOBRE ALMOÇO GRÁTIS
O passe livre custa caro e ninguém sonha com almoço grátis. Porém, entendemos que este direito é importantíssimo, assim como saúde e educação, de modo que, não importa o custo, precisamos desenvolver uma forma de pagá-lo. Por isso faz pouco sentido falar em valores específicos. As cidades têm tamanhos e contextos diferentes. Cada uma vai exigir um diálogo com a sociedade e um desenvolvimento diferente da questão.

2) DESIGUALDADE QUE GERA MAIS DESIGUALDADE
Entendemos que a distribuição dos recursos no mundo e no Brasil é bastante desigual, de modo que há dinheiro para pagar saúde, educação, lazer e transporte para todos. A maneira como as coisas funcionam hoje tira dinheiro de quem tem pouco para encher o bolso de quem já tem muito. No caso da tarifa de ônibus é exatamente assim que funciona. O trabalhador gasta uma parte considerável de seu salário para usar um serviço essencial e que rende altos lucros para as empresas que exploram o serviço. Os imensos lucros das empresas contrastam com o bolso do trabalhador, que esvazia a cada viagem. Alguns afirmam que as empresas não tem lucro, em evidente negação da realidade. Ora, as famílias que controlam as empresas aparecem na coluna social, exibem suas viagens, joias e jantares. De onde acham que sai o dinheiro?

3) SERVIÇO PÚBLICO FUNCIONA
É justamente pelo argumento acima que defendemos a municipalização do transporte público. O transporte é um direito, um serviço essencial, não é para dar lucro. Pessoas andam quilômetros a pé ou deixam de comer para pagar a passagem. Se vocês não conhecem alguém que passou por isso, muito prazer, Felipe Silveira. E conheço mais algumas dezenas de pessoas próximas que vivenciaram isso. Então, como o serviço público não dá lucro (em teoria), faz todo sentido que o transporte público seja operado por uma empresa pública.

Você vai dizer que o serviço público é uma droga, que não funciona, que a burocracia atrapalha, que há corrupção. E, bem, nada disso é mentira. Mas, assim como criamos e defendemos o SUS, que sofre de tudo isso também, temos que resolver os problemas que vem junto com o pacote. Para alguém de direita (aquilo que entendemos como direita, em suas mais variadas vertentes), o serviço é falho por ser público, faz parte do credo e da campanha de difamação. Mas a verdade é que o SUS salva milhões de vidas que só tiveram uma chance por causa do serviço público.

4) PROCESSO E DIÁLOGO
Eu defendo que a implantação da Tarifa Zero seja gradativa. Acredito que não seja possível, de uma hora pra outra, comprar centenas de ônibus, contratar e capacitar profissionais, preparar a oficina e o setor administrativo do órgão responsável etc. É preciso dialogar com a sociedade para decidir a forma de implantação. Sendo assim, começar a operar o serviço a partir de algumas linhas é uma possibilidade. No caso de um sistema integrado, como em Joinville (SC), elas teriam que ser separadas. De todo modo, é necessário o diálogo com a população para definir a melhor estratégia.

5) REDUZIR A CONTA É NECESSÁRIO
Reduzir os custos é necessário. Meu amigo de direita gosta de economia e, no meio do papo que motivou esse texto, alertou para algo importante. Diz ele que todo serviço público depende de um fator para funcionar: baixa demanda. Eu acho que ele está coberto de razão. Evidentemente a demanda do transporte coletivo é altíssima, e com a Tarifa Zero tenderia a aumentar. Muita gente deixa de usar o sistema porque não pode e até mesmo não quer pagar o preço. Porém, acredito que as soluções para os problemas são múltiplas e há maneiras de reduzir bastante a demanda. Escrevo sobre duas abaixo:

5.1) Como cicloativista, e ciclista desde a infância, acredito que uma cidade ciclável tem muito mais qualidade de vida. Por experiência própria e com base em centenas de histórias contadas na internet, digo que andar de bicicleta muda a vida para muito melhor. Melhora a saúde, a resistência, é barato, é prazeroso. Por isso, acredito que tornar a cidade mais ciclável pode reduzir muito a demanda do transporte coletivo. Isso aconteceu, por exemplo, em Copenhague, na Dinamarca. A cidade investiu na melhoria das condições para andar a pé, de bicicleta e de transporte coletivo, reduzindo o uso do carro. Dessa forma, cerca de 25% da população (o número pode estar desatualizado) usa, diariamente, a bicicleta para se locomover, outros 25% usam transporte coletivo, outros 25% andam a pé e o restante de carro. Isso não quer dizer que você não possa usar o carro num dia, o ônibus no outro e ir a pé quando quiser. Significa, apenas, que você vai escolher o modal que faz mais sentido para a sua necessidade.

5.2) A cidade precisa ser reorganizada. No século 20, as cidades se desenvolveram de modo desigual, promovendo mais e mais desigualdade, concentrando riqueza no centro e aumentando a pobreza nas periferias. Assim, o trabalho ficou muito longe de casa, impedindo que as pessoas façam suas viagens diárias a pé ou de bicicleta, transformando bairros em dormitórios. Por isso, é preciso reorganizar a cidade e trazer o emprego/estudo para perto de casa ou ir morar perto do emprego/estudo. Ninguém que more a dez minutos a pé do trabalho vai optar pelo ônibus (salvo exceções). Andar a pé é prazeroso e saudável. É algo que deve ser estimulado.

6) COMO PAGAR A CONTA?
Em certo sentido, administrar uma cidade ou uma empresa é a mesma coisa. A tarefa do administrador é organizar, fazer render mais com os recursos que existem. Por isso que candidatos do meio empresarial ganham eleições, vendendo a ideia de bons gestores. A coisa pública, porém, tem várias diferenças que não permitem tratar os dois tipos de administração da mesma maneira. Cidadãos não são clientes, certos setores não podem ser cortados, as regras são mais rígidas e o jogo é mais complexo. Assim, financiar o transporte coletivo é uma decisão política e recursos do município serão usados para executá-la.

São inúmeras as maneiras de aumentar a arrecadação e distribuí-la de forma mais justa, mas é preciso coragem política e efetiva participação popular para colocá-las em prática. Um exemplo disso é a tentativa do próprio Haddad de implantar o IPTU progressivo em São Paulo, que fracassou na hora de passar na Câmara de Vereadores. Nenhuma vitória política é resultado de canetaço. Tudo que os trabalhadores e trabalhadoras conquistaram foi na base do sacrifício, da pressão. A partir do momento que a pressão for maior do que a resistência daqueles que não querem ceder, qualquer pauta vai ser aprovada. Nossa tarefa é seguir na luta e mostrar que é possível. Por isso, listo abaixo algumas das formas de financiamento da Tarifa Zero.

6.1 IPTU progressivo
A implantação desta política é urgente, pois resolve inúmeros problemas de uma só vez. Ela é fundamental para reorganizar a cidade, combater a acumulação de capital, gerar emprego e diminuir custos para a população. Ela afeta diretamente aqueles que acumulam com especulação imobiliária, o que justifica a forte resistência deste setor. E quem lucra com especulação? Todos os ricos que adquirem imóveis e os usam como poupança. Ou vocês conhecem algum rico (rico mesmo) que não tenha imóveis? Contudo, a partir do momento que se aumenta a alíquota para os especuladores, isso resulta no aumento da arrecadação do município ao mesmo tempo que força a redução da especulação. Explico:

Vamos supor que um especulador seja dono de cem imóveis. Destes, 50 estão ocupados e outros 50 vazios, esperando que alguém pague o alto preço do aluguel que tanto sacrifica famílias e pequenos e médios empreendedores. Como o especulador vai ter que pagar mais, ele vai ter que tirar o dinheiro de algum lugar. Assim, ele pode vender alguns imóveis ou baixar a taxa para conseguir alugar alguns para novos clientes. Entra aí a lei da oferta e da procura, pois este movimento vai forçar o aumento da oferta de imóveis no mercado. Com o aluguel mais barato, mais pessoas podem morar perto do trabalho, mais negócios vão surgir, outros não vão fechar, vai haver mais emprego. Tudo começa a funcionar melhor, menos a acumulação de capital do especulador, que ainda assim não vai ser ruim. Com o aumento da arrecadação para a cidade, um percentual pode ser destinado ao financiamento do transporte coletivo. O aumento no IPTU não será repassado no aluguel por uma questão da lei da oferta e da procura. É ela que vai forçar a baixa dos valores cobrados atualmente.

6.2 CIDE
Essa é uma proposta defendida pelo próprio Fernando Haddad. O Cide é um imposto federal sobre o combustível que pouco retorna para o município. Existe uma PEC (179/2007), de autoria de Jilmar Tatto (PT/SP), que propõe justamente o uso do imposto no subsídio ao transporte coletivo.

6.3 Destinação de multas de trânsito, estacionamento rotativo e estacionamentos públicos
Diminuir a circulação de carros e a velocidade média do tráfego é um desafio para as cidades mais progressistas do mundo. Radares que geram multas por excesso de velocidade são eficientes para alcançar o objetivo da diminuição. As multas, que ninguém precisa tomar se não ultrapassar a velocidade permitida, podem reforçar o caixa destinado ao transporte público. O estacionamento rotativo também gera arrecadação e resolve o problema de vagas no centro. Ao contrário de alguns, defendo que o custo da hora no estacionamento rotativo não pese demais no bolso do cidadão.

6.4 Publicidade no transporte coletivo
No sistema capitalista, a publicidade é um lucrativo negócio. Ônibus são ótimos espaços de publicidade ambulante. Pode-se muito bem aproveitar o espaço para arrecadar fundos que serão destinados ao financiamento do sistema.

6.5 Pedágio Urbano
Outra medida a ser utilizada é o pedágio urbano, mas deve gerar mais polêmica. Por isso que essa demanda precisa ser de uma boa parte da sociedade, de modo que todos topem fazer sacrifícios para financiar o melhor para a coletividade. Se a ideia é diminuir a circulação de carros e fazer com que os mais ricos paguem uma parte da conta, então o pedágio é uma boa forma de somar à arrecadação e diminuir a circulação de carros.

6.6 Economia gerada em outros setores
Uma das melhores consequências da Tarifa Zero é a melhoria na saúde da população. Além de diminuir a poluição, as pessoas que optarem pela caminhada e pela pedalada vão fazer atividade física automaticamente. A consequência poderá ser vista na fila dos hospitais. Além disso, o número de acidentes de trânsito deve diminuir consideravelmente, pois teremos menos gente de carro e moto, menos velocidade, menos pressa e mais consciência. Logo, isso gera uma economia dos recursos destinados à saúde. Sobra mais para a cidade.

6.7 Cobrança de empresas
A população da cidade pode debater uma taxa a ser cobrada das empresas pelo número de funcionários que vão ao trabalho pelo sistema gratuito. É uma ideia que vai ter resistência empresarial, mas pagar o passe já faz parte dos benefícios que muitas empresas oferecem. Trata-se de chegar a um consenso social.

6.8 Percentual na conta de água ou luz
Se a sociedade decidir custear a tarifa, uma pequena taxa poderia ser incorporada às contas de luz ou de água. Um pequeno valor custeado por todos para um serviço que poderia ser usado por qualquer um a qualquer momento. Seria muito mais barato pagar um pequeno valor uma vez por mês do que três ou quatro passagens do jeito que é hoje. Valeria muito a pena. Tudo é uma questão de a sociedade querer fazer isso. Eu quero, e você?


OUTRA SOCIEDADE É POSSÍVEL

Defender a Tarifa Zero como uma política pública concreta, possível a curto e médio prazo, é defender um outro modelo de sociedade que apenas parece inalcançável. Sem dúvida que os contrários ao novo modelo o vendem como impossível, sonho, utopia. Mas as transformações ocorrem todos os dias, em todos os lugares, e dependem de corações e mentes trabalhando juntos. Um exemplo de política pública que também tem tudo a ver com o parto do novo mundo é a Renda Básica Incondicional, que vai promover uma redistribuição considerável de renda e acabar com a pobreza. Mais um exemplo é a redução da jornada de trabalho, urgente no combate ao desemprego em um mundo que cada vez reduz postos de trabalho ao mesmo tempo que cada vez mais suga o trabalhador, obrigando-o a dedicar a maior parte de sua vida e energia para as empresas. O modelo atual afeta diretamente a saúde e o bem-estar das pessoas, cada vez mais tristes e dependentes de remédios para aguentar o tranco que é viver.

Somos convencidos de que é inútil, mas imaginar, planejar e executar um novo mundo está ao nosso alcance. Neste texto falei de apenas uma coisa que vai mudar a vida de todo mundo para melhor e citei mais duas no último parágrafo. Sem utopias, sem ilusões, apenas criatividade e planejamento bastam.

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

E ainda tem gente que não gosta de cotas...



POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

É risível o barulho que ainda se faz em torno do tema das cotas nas universidades públicas brasileiras. O chororô vem sempre da pequena burguesia, que esgrime sofismas para escamotear um único fato: os ricos querem manter os seus lugares nas universidades públicas, como tem acontecido em toda a história recente do País. Uma vaga para um negro ou um índio é uma vaga a menos para um pequeno-burguês (perdão pelo truísmo).

Os liberais adoram falar em mobilidade social e os moralistas não largam o argumento furado da meritocracia. Defendem a idéia peregrina de que todas as pessoas podem dar certo na vida. E que basta trabalhar muito e aproveitar as chances. Tudo isso, claro, independente da classe social, do ambiente em que se vive ou das oportunidades que se tem. É uma lógica (idiota) de classe.

Ora, os liberais não querem o Estado a se meter nos seus negócios. E, por extensão, também rejeitam intervenções no plano da educação. O conservadorismo tem explicação: a universidade pública fornece, sem custos, o capital intelectual que vai permitir, aos filhos da pequena burguesia, as condições para permanecer no topo da escala social. O ideal é não haver mobilidade.

Mas o mundo dos liberais e dos reaças (não são exatamente a mesma coisa) só é bom para os liberais e os reaças. A experiência ensina: hoje em dia é cada vez mais difícil um pobre ficar rico. E a educação representa uma rara possibilidade de ascensão social. Quem tem acesso à escola tem maiores chances de ascender na vida, mas nem isso é garantia nos dias de hoje.

Aliás, estudos realizados nos Estados Unidos, paraíso do liberalismo, revelam o que todos sabemos: há uma forte relação entre o rendimento dos pais e a qualificação dos filhos. Ou seja, pais ricos conseguem educar melhor os seus filhos. E, claro, o pimpolhos da pequena burguesia conseguem melhores lugares no mercado de trabalho.

Ficar por aí com o rame-rame da meritocracia é uma tergiversação antropológica que não resolve o essencial. A realidade mostra que não há igualdade de oportunidades, nem mãos invisíveis. Nesse caso, a mão visível do Estado tem que dar um empurrãozinho para impor alguma justiça. Enfim, nenhum humanista pode ser contra as cotas.


É a dança da chuva.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Udo Dohler: quem não sabe fazer... ensina


POR JORDI CASTAN

Há coisas na vida que não se recuperam: a palavra, depois de proferida; a ocasião, depois de perdida. É um antigo ditado que cai como uma luva sobre a atuação do prefeito Udo Dohler. As palavras que proferiu, a oportunidade que perdeu. A ocasião, como diz o adagio, foi perdida. Mas as palavras ele deixou em documentos encontrados na internet. 

Quem quiser conhecer mais sobre o pensamento do prefeito Udo Dohler pode visitar o link “ideias e pensamentos de Udo Dohler”. Lá ele expõe suas ideias sobre o trabalho, sua visão da gestão, além de reunir uma série de conselhos que se dispõe a compartilhar de forma generosa na internet. Para quem tiver interesse, recomendo uma visita.

No entanto, para poupar o seu tempo, selecionei alguns slides do site que poderiam ser úteis ao próximo prefeito de Joinville. É bom lembrar a diferença que existe entre “dizer” e “fazer”. Há dezenas de empresários mais ou menos bem sucedidos que oferecem receitas de bolo para quem quiser emular o seu modelo de gestão. Udo, num ato de suprema generosidade e desprendimento, compartilha a sua sabedoria. Porque é importante deixar o seu modelo de gestão ao alcance de todos. Obrigado, prefeito.


Não tenho palavras para agradecer um presente como este. Em tempo, por um instante fiquei com a impressão de que é um caso daqueles em que o autor diria: “façam o que eu digo, mas não façam o que eu faço”. E deixo uma sugestão: seria boa ideia manter atualizado o site. Afinal, sabemos que uma coisa é o discurso de campanha, para iludir incautos (ops!, digo, eleitores) e outra é gerenciar uma cidade como Joinville.


Em tempo. Há diferenças abissais entre o administrador e o gestor. Enquanto o primeiro sabe o que deve ser feito, o segundo sabe como fazer. Saber o que deve ser feito implica conhecimento, planejamento e capacidade. Saber como fazer requer treinamento e trabalho. Deve ser por isso que Udo Dohler destaca tanto o valor do trabalho, o mérito que tem que acorda cedo, trabalha duro e suja as mãos trabalhando. Pena que não se vejam resultados.


Mas vejamos, então...





sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Boa Vista!


Nós queremos mais, nós podemos mais



















POR SALVADOR NETO


Há coisas em Joinville que nos surpreendem, e para pior. Como imaginar uma cidade acessível, moderna, sustentável, feliz e centro de excelência se ainda nos ufanamos de, agora, em pleno século 21, anunciarmos a instalação de abrigos de ônibus como se fossem a última moda no primeiro mundo? Sim, este anúncio foi feito pela Prefeitura de Joinville, gestão Udo Döhler, com muita pompa. Uma verdadeira piada de mau gosto, espalhada por veículos de comunicação. E fazem isso com a certeza de que vão engabelar os cidadãos que pagam impostos esperando algo de inovador em troca.

Por baixo ouvimos falar de novos abrigos de ônibus há duas décadas, para ser generoso com os gestores que sentaram na cadeira de Prefeito. Até hoje milhares de usuários do transporte coletivo são obrigados a ficar sob o sol escaldante, ou chuva torrencial, sem qualquer abrigo. E com o título de tarifa mais cara do Brasil. Os primeiros abrigos então foram aqueles que copiam os modelitos dos anos 1960/1970... Depois mostraram fotos de outros, modernos e reluzentes, mas que ficarão somente em áreas onde transitam “mais” pessoas.

Ou seja, na cidade que se diz a segunda melhor do Brasil (??) teremos, sim teremos, porque até agora é só mais uma promessa, novos (?) abrigos de ônibus para áreas de primeira classe e de segunda classe. É o que se entende com o anúncio de dois tipos: um para periferias, outro para o centro, e se saírem! É somente isso que a população da maior cidade de Santa Catarina merece? Um governo que dizia a novidade, de gestão exímia, moderno, anunciar abrigos de ônibus? Nós queremos mais, nós podemos mais! Não subestimem o desejo, a força e a vontade do povo de Joinville! Tenham mais respeito, apresentem o futuro, porque de passado estamos fartos!

Não bastasse o executivo municipal se mostrar atrasado, incipiente, iníquo, fraco, incompetente, temos também o modelo novo/velho do legislativo. Com raríssimas exceções – e muito raras mesmo! – são incapazes de fiscalizar os atos do Prefeito e sua gestão, ou por comodismo, por cargos, ou por medo, e mais que isso, propor leis que promovam o debate para uma cidade realmente moderna, acessível, inclusiva, sustentável, e assim feliz. Os vereadores repetem a receita do passado: denominações de ruas, homenagens a personalidades, empresas e entidades, moções de fazer rir, indicações para que fechem buracos das ruas, ignorados solenemente pelo executivo. Basta andar nas ruas para constatar isso. E o presidente da Casa, Rodrigo Fachini, joga para a torcida: economizou grana.

Seria verdade, ou seriam palavras ao vento? Claro que são palavras ao vento. Somente nas famosas catracas foram gastos mais de um milhão de reais! Viagens e diárias abusivas denunciadas à vontade. Vereadores que seriam promoters da Festa das Flores em Portugal! E viva Joinville? O povo de Joinville quer mais, pode mais e merece muito mais senhores Prefeito e vereadores! A cidade precisa de investimentos, e economia por economia não melhora a vida dos cidadãos, e em muitos casos, mostra a incapacidade de gastar naquilo que é essência e que mudaria a vida da cidade para melhor. Gastar bem e melhor é mais efetivo do que anunciar economia.

A maior cidade precisa ser também maior em líderes inovadores, tanto no executivo quanto no legislativo. No executivo, um Prefeito corajoso, inovador, que peite interesses e faça as obras que podem tirar Joinville do atraso em que se encontra. Quatro anos de atraso podem representar na verdade muitos anos mais de retrocesso até que se encontre o caminho do desenvolvimento. No legislativo, legisladores criativos, provocadores, propositores de debates que elevem o nível dos projetos e sonhos de uma cidade evoluída. Outubro vai chegar, e cabe a você eleitor observar o que foi feito, o que não foi feito, o que foi prometido e não entregue, e decidir melhor. Joinville grita: quer mais, pode mais.

É assim, nas teias do poder.


quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Retrospectiva


POR VALDETE DAUFEMBACK

Há um ano escrevi um texto questionando a tal crise anunciada em coro nas redes sociais. À época era de muita tensão originada pela recém vitória eleitoral que reelegeu Dilma ao segundo mandato à presidência da República. Os ânimos estavam alterados. A oposição não admitia a derrota, era preciso disseminar o mais rápido possível ideias que desqualificassem o governo popular para desgastar a imagem da presidente. 

Naquele texto fiz menção às contradições da suposta crise, tendo em vista o movimento nas rodovias, nas praias, nos aeroportos, nos shoppings, restaurantes, enfim, a desenfreada compulsão pelo consumo estava em toda parte, que em nada se parecia com uma situação de crise. Recebi muitas críticas e reprovação por discordar da profecia apocalíptica da crise no Brasil. 

O ano se passou. Foram trezentos e sessenta e cinco dias vividos com a sensação de elevação desse número a um potencial geométrico, considerando o peso do ódio que se espalhou como instrumento contra tudo o que se assemelhasse a direitos humanos e à política distributiva de renda. Linchamentos físicos e políticos foram aceitos e recomendados. A sociedade passou a ser dividida entre pessoas “de bem” e de outras categorias. Às “de bem” foi recomendado o porte e uso de armas para se protegerem do “mal”, daqueles “suspeitos” que não foram agraciados pela talentosa meritocracia. 

Pobres, negros e homossexuais foram agredidos gratuitamente, muitas vezes com o aval da grande mídia que mostrou ser competente na prestação de um desserviço à sociedade. Intencionalmente, não raras vezes, meios de comunicação publicaram matérias incriminando personagens políticas para, posteriormente, pedir desculpas pelo deslize de informação infundada, ou por imagens que foram trocadas “acidentalmente”. 

Tentando isolar a situação “da crise” ao Brasil sem analisar o contexto mundial, os donos do poder econômico arrastaram, sob sua influência, uma quantidade de analfabetos políticos para fazer coro frente a práticas inventivas e difamatórias de natureza partidária, provocando agressões a cidadãos em lugares públicos e ou privados. 

Mais um ano se iniciou e a compulsão pelo consumo se repete da mesma forma. Milhares de pessoas se deslocam e lotam praias, clubes, aeroportos, rodovias, centos de compras contrariando o agouro de comunicadores da grande mídia que, mesmo reconhecendo este fenômeno repetem como mantra: “apesar da crise”, “apesar da crise”. Fico a imaginar que como brasileiros somos excêntricos, pois quem diante de uma crise viveria neste paraíso de consumo? 

Lembro muito bem dos anos de 1990 quando o país atravessou uma crise econômica em que vinte e cinco por cento dos joinvilenses estavam desempregados ou não conseguiam o primeiro emprego. Praia, viagem, compras? Nada disso, nem pensar! Lideranças comunitárias, sindicais e religiosas passavam sábados e domingos em reuniões em sede de sindicatos a fim de encontrar saídas à situação dos trabalhadores. Lembro do slogan da campanha de FHC para as eleições do seu segundo mandato: “Quem venceu a inflação vai vencer o desemprego”. Que nada! Somente no ano de 2003 para frente é que a situação mudou. Sejamos coerentes com a memória histórica!