quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

O país do atraso


POR VALDETE DAUFEMBACK NIEHUES

Enquanto preparava o almoço de domingo passei por alguns canais de TV à procura de reportagem que trouxesse conteúdo informativo. Nesse movimento, visualizei cenas de uma comunidade que imediatamente identifiquei tratar-se de Noiva do Cordeiro, localizada em Belo Vale, Minas Gerais, pois já havia assistido um documentário narrado por Lya Luft sobre este lugar que guarda uma história carregada de sentidos, de persistência, de experiência de vida de mulheres que, por gerações, foram amaldiçoadas e estigmatizadas pela igreja e pelas comunidades vizinhas, obrigando-as ao isolamento. 

Logo percebi que as cenas exibidas eram tão somente para contextualizar uma apresentação coreográfica de Keila Fernandes, moradora de Noiva do Cordeiro. Como não estava interessada em programa de entretenimento fui logo mudando de canal, porém, antes que assim fizesse, o senso comum da narrativa do apresentador sobre a capacidade intelectual e artística de quem mora no campo, se constituiu em um convite para continuar assistindo. Em tom sensacionalista o sujeito desfiava repetidamente frases como se mantra fosse: “Da roça para o palco [...] uma mulher da roça, que planta [...] que pilota trator [...] artista que interpreta Lady Gaga...” Como se quem vivesse da agricultura não fosse capaz de ingressar no mundo artístico, ou não possuísse autonomia intelectual para vencer os obstáculos sociais. 

Na hora, lembrei da colonização européia quando negros e índios, considerados intelectualmente incapazes, eram levados para a Europa e, em pequenos cercados, como animais, ficavam à mostra sob observação de expectadores. 

Não estou à risca fazendo associação dos fatos, nem mesmo comparando os dois episódios, mas doeu na alma a falta de discernimento do apresentador do programa televisivo, que conceitualmente vive o período em que as primeiras noções do pensamento desenvolvimentista relacionavam a cidade com desenvolvimento e o campo com atraso. Desse equívoco, para representar o mundo rural, saiu das páginas de Monteiro Lobato, o Jeca Tatu, um sujeito desprovido de vontade, desanimado e intelectualmente incapaz de sair da situação em que se encontrava e, em poder dos urbanos, esse personagem ganhou contornos simbólicos de discriminação e preconceitos que atingiram milhares de pessoas que trabalhavam na lavoura. 

Na pesquisa que desenvolvi sobre o “ajustamento” do trabalhador rural nas fábricas de Joinville, em entrevista, operários afirmaram que se sentiam diminuídos como agricultores pela desvalorização de seu trabalho. Vistos como “colonos”, conceito pejorativo usado pelos urbanos, eles preferiram abandonar a lavoura e se tornar operários porque parecia ser mais nobre trabalhar no chão da fábrica, preso a uma rotina de atividades fabris, do que a produzir alimentos. 

Os trabalhadores de chão de fábrica, desde a revolução industrial, sempre foram reconhecidos por operários, enquanto aqueles que trabalham na lavoura passaram por várias denominações, entre as quais, camponeses, lavradores, agricultores, produtores rurais ou empreendedores rurais, sendo que as atividades são as mesmas, apenas mudam de acordo com as necessidades do mercado. 

O êxodo rural acentuado a partir da política desenvolvimentista, a qual foi responsável pela formação do desastroso e insustentável modelo de aglomerado urbano, só parou de expandir com a criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário, que formulou políticas públicas e programas de apoio à agricultura familiar. Comunidades com maior potencial de organização comunitária conseguem captar recursos financeiros para desenvolver atividades econômicas associadas ou não à agricultura e, assim, garantir a permanência de jovens no campo, como o caso de Noiva do Cordeiro. Geralmente são as atividades não agrícolas que dão visibilidade midiática às famílias rurais. Isso porque em nosso país, por razões históricas e culturais, ainda se cultiva a ideia de atribuir atraso intelectual aqueles que trabalham no campo. 

Os cursos que preparam profissionais para atuarem nos meios de comunicação precisam se esmerar em saberes propostos por Paulo Freire, a fim de garantir a autonomia de uma elegante fluidez em várias áreas do conhecimento, sem haver a necessidade de comunicar por meio de expressões sensacionalistas que além de reforçar estereótipos e preconceitos, em nada contribuem para democratizar informações.  

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

De Impeachments PASSIVOS.

A lista não tem fim. 
Tem uma coisa que parece não mudar nunca. Desde antes das eleições no ano passado, têm pipocado pedido após pedido (informal) de Impeachment contra a Presidente Dilma Rousseff. E claro, sempre por parte de pessoas que não parecem entender muito bem como a democracia, os três poderes e as suas esferas de influência, ou o próprio processo de Impeachment funciona.

Nenhum desses pedidos parece ter realmente à ver com qualquer irregularidade por parte da Presidente: os argumentos vão desde de responsabilidade indireta pela corrupção na Petrobrás (aquela que corre desde - ao menos - 1996) até os aumentos das contas de luz e água (atribuição dos ESTADOS), a precariedade das escolas públicas (Estados e Munícipios), o preço da gasolina (cujos tributos federais compõe apenas 06% do preço, e quase um terço é composto por tributos ESTADUAIS) e os preços do ônibus "que não param de subir" (Munícipios). Isso quando não entram no reino da teoria da conspiração e falam em golpe comunista, guerrilheiros cubanos/venezuelanos infiltrados, "doutrinação marxista/gayzista", eleições roubadas e outras sandices, jamais demonstrando uma única peça de evidência para essas alegações extraordinárias.

A lista de protestos pedindo impeachment é gigantesca. No entanto, Joinville conseguiu se superar no quesito "manifestação tola em prol do Impeachment". No meio da onda de protestos marcados para o dia 15 de março, a descrição do movimento joinvillense no facebook trazia:

"Protesto PASSIVO por nossos direitos não será aceito bandeiras ou camisas de partidos políticos, vândalos e black blocs serão entregues a polícia pela própria população!

Obs: Usar verde e amarelo de alguma forma (vestes ou pinturas no rosto).
Não da mais para aceitar o preço da gasolina esta um absurdo, a passagem de ônibus não para de subir, a luz os impostos tudo ficando sem controle, e um aumento razoável no salário do povo NADA!

Se já conseguiram uma vez podemos conseguir de novo.
BRASIL MOSTRA TUA CARA!"

A descrição foi corrigida, trocando de PASSIVO para PACÍFICO, mas a falta de total pontuação permaneceu. Não bastando o ufanismo patriótico, o revanchismo apartidário e a revolta com questões que não são de âmbito federal (e há muito que se criticar no âmbito federal), e com uma questão que diz muito mais respeito ao legislativo do que ao executivo (o valor do salário mínimo), temos essa gafe hilária. A confusão de PACÍFICO (não violento) com PASSIVO (inativo). Desta vez, os revoltosos tem sua desculpa para não comparecer: estão protestando passivamente. Uma dica: querem um impeachment passivo? É só esperar o fim do mandato.

E citado o nosso escabroso legislativo... Me pergunto se os revoltosos que pedem o impeachment estão cientes de como o processo funciona. Não são poucos os que parecem pensar que, derrubada Dilma, assumiria Aécio. Não pessoas: quem assume no impedimento da Presidente é o Vice, Michel Temer. Se esse for retirado do cargo também, antes do final da primeira metade do mandato, são feitas novas eleições diretas, e até o resultado dessas assume interinamente o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Se este cair, assume Renan Calheiros. Se Temer cair após a metade do mandato, as eleições para a presidência são indiretas, feitas pelo Senado. E é claro, o mais óbvio: o procedimento do Impeachment depende única e exclusivamente do congresso nacional, e engana-se quem pensa que mudar o executivo enquanto se preserva tal antro de corrupção como está vá mudar alguma coisa.

Claro, há mais uma questão aqui em jogo: Alguém poderia me dizer uma democracia que fora derrubada, e deu lugar a outra democracia? Não contentes com o resultado das eleições, alguns preferem rasgar todo e qualquer princípio democrático, somente para tirar Dilma do poder - não importanto quem ou o quê assuma. E isso que a brigada do impeachment é até moderada: preferem tomar uma via judicial para não ter que assumir que perderam mais uma vez. No entanto, tem gente no meio disso que pede abertamente por um golpe de estado uma Intervenção Militar Constitucional (sem base na constituição) caso o impeachment falhe.

Chega a ser cômico: a revolta com o governo petista é tamanha, que usam coisas que não são responsabilidade deste para pedir um golpe de estado "e reestabelecer a democracia". Já vi afirmarem que a reeleição da Dilma "acabou com a imagem do Brasil no exterior". Não é o que tenho visto no Reino Unido. Mas uma coisa posso dizer com certeza: não há nada mais devastador para as relações exteriores de um país do que um governo democrático caindo na base do grito. Governos interinos e transições forçadas são uma marca de "repúblicas de bananas" - e pelo visto, alguns preferem que voltemos a ser um estado fantoche, corrompendo o sistema "para acabar com a corrupção".

Ao menos o protesto será "Passivo". Sim, corrigiram o erro. Mas não deixa de ser cômico que tenham cometido uma falha tão óbvia quanto esta. Quem sabe se os revoltosos soubessem algo da política nacional além de "mensalão e petrolão", soubessem contra o que protestar. No entanto, para protestos com pautas claras, a resposta deles é sempre "contra a corrupção ninguém protesta".

Em uma nota cômica, um texto provavelmente humorístico circulando no facebook afirma que para conseguir o impeachment é necessário pedir no cartório "um COMBO DE QUATRO IMPEACHMENTS" - pois segundo o texto, ao ser retirado do cargo, assume o presidente anterior. Então tem que se pedir quatro impeachments (Dilma, Dilma, Lula, Lula) para que FHC volte ao poder e emposse o Aécio. Digo provavelmente devido a quantidade de asneiras que já vi serem ditas em completa seriedade. E não duvido que haja quem leve a sério e realmente vá no cartório pedir o tal combo (com refri e batata). 

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

O curto-circuito de Udo Döhler

Imagem meramente ilustrativa
POR FELIPE SILVEIRA

Deve ter entrado em curto o choque de gestão prometido pelo empresário Udo Döhler (PMDB) antes de assumir a prefeitura de Joinville. Já estamos no terceiro ano do mandato e não há sinais de que as promessas de campanha sejam cumpridas a tempo.

Não há dinheiro para concluir a duplicação da avenida Santos Dumont, a ponte do Adhemar Garcia ainda não saiu do chão, o mirante não está pronto, o parque da cidade está sem luz há muito tempo, o Plano Municipal de Políticas Culturais não tem sido cumprido, os quilômetros de asfalto prometidos estão muito longe de serem concluídos, a saúde não tem apresentado resultados expressivos e o ano letivo começa com muitas reclamações sobre as condições das escolas. Sem contar os significativos aumentos da tarifa de ônibus, que enriquecem empresários e empobrecem a população trabalhadora que mais precisa.

O povo, por sua vez, não parou de protestar desde o primeiro ano de governo. Houve inúmeros fechamentos de ruas na gestão Udo e todo tipo de protesto. Dois casos emblemáticos foram as mudanças de trânsito no bairro Iririú e na rua Guanabara, onde pessoas já morreram por causa das péssimas condições para os pedestres.

Evidentemente, há conquistas. Não se pode esperar que uma administração municipal não faça nada em quatro anos. Tem dinheiro e tem gente pra fazer. Alguma coisa vai ser feita. Mas tudo muito longe do prometido choque de gestão. Coisa que a população percebeu há tempos.

No entanto, mais do que um problema de gestão, o governo Udo Döhler tem um problema de concepção, de projeto. Não é um governo para avançar na resolução dos problemas mais básicos. Pelo contrário, é um projeto de governo que sempre visou resgatar a Joinville romântica que só existe na cabeça da elite econômica local e daqueles que se deixam influenciar por ela. E são muitos. Um exemplo disso é a proposta para a mobilidade urbana do prefeito na época em que ele ainda era candidato. Em um debate, quando perguntado sobre o tema, disse que sua meta era fazer centenas de quilômetros de asfalto. Nada mais século 20 em pleno século 21.

A questão que se impõe, então, é: qual projeto queremos para Joinville e de que forma vamos apresentá-lo?

A última eleição foi disputada por quatro grupos de força equivalente, tendo sido vencida nos detalhes (entre eles, muita grana) por Udo Döhler e o PMDB. A chapa petista saiu muito enfraquecida da briga e dificilmente conseguirá se apresentar com força para o próximo pleito. Marco Tebaldi e o PSDB disputaram sem a mínima vontade de ganhar, até porque perceberam no começo que não iriam muito longe. Kennedy Nunes (PSD), por sua vez, sentiu o gostinho da vitória, mas tiraram o doce da boca da criança nos últimos momentos. É quem está na briga para a próxima.

Mas será que Kennedy tem um projeto de cidade alternativo ao que está aí? Parece-me que não. O candidato dos elevados, embora mais populista, também pensa com a lógica de grandes obras como alternativa.

A população de Joinville precisa se organizar mais e mais para interferir no processo político – e não permitir que promessas vãs sejam um fator decisivo para o seu futuro. Há quem diga que mira o futuro, mas ainda pensa com a cabeça do século 19. O presente (convém lembrar que já estamos no décimo quinto ano do século 21) exige novas formas de organização, de ação e de democracia.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Precisamos mentir tanto?



POR JORDI CASTAN
Na semana passada, comentei aqui o tema do restaurante popular do Bucarein, fechado pelo governo municipal por conta de uma suposta reforma. Quem passe na frente não verá ninguém trabalhando, nem traços de nenhuma reforma, nem qualquer informação referente à dita reforma. Ou seja, nem data de inicio, nem data prevista para conclusão, nem valor do contrato, nem o nome da empresa ganhadora da licitação.

A impressão que fica é a de que o restaurante foi fechado e que ficou por isso mesmo. A escusa da necessidade de uma reforma não parece convincente. Conta a administração municipal com o esquecimento da população e com a impossibilidade de lembrar de todas as obras: iniciadas e não concluídas, sem data prevista de conclusão ou simplesmente abandonadas. Há que acrescentar a isto a falta de um seguimento eficiente por parte da imprensa ou da sociedade organizada, o que permite que o governo nos presenteie todos os dias com novas empulhações.

Nestes dias a SECOM (Secretaria de Comunicação) da Prefeitura Municipal de Joinville informou que  no ano de 2014 a SEINFRA (Secretaria de Infraestrutura) autorizou a construção de 1 milhão e 400 mil metros quadrados de novas edificações. Representa o maior número de metros quadrados da história de Joinville. Nunca se construiu tanto. A média histórica dos últimos quatro anos se situa na faixa do milhão de metros quadrados. 

Os dados são sempre do próprio governo municipal. Os números de 2014 representam um aumento de quase 40%. O que tem a ver este crescimento vigoroso e sustentado do setor da construção civil com a paixão compulsiva pela mitomania dos nossos dirigentes municipais? O prefeito não perdeu nenhuma oportunidade, nos dois últimos anos, para defender a aprovação da LOT (Lei de Ordenamento Territorial), alegando que a cidade estava parada. Ou seja, que Joinville precisa aprovar a LOT urgentemente. 

Tem acusado a judicialização da LOT e as Associações de Moradores que tem capitaneado o processo de propor uma LOT mais democrática, com mais e melhores estudos e com dados claros que evitem que seja aprovada uma lei que comprometa o futuro da cidade para as gerações futuras.

Os dados divulgados pela própria prefeitura provam que não há motivo para forçar a aprovação da LOT, que o debate com a sociedade é necessário e não deve ser apressado por conta de uma suposta paralisia ou um engessamento do setor imobiliário. Mas, mais que qualquer outra coisa, os dados divulgados reforçam a suspeita de que o prefeito ou não sabe o que diz ou, sabendo, usa seu discurso para pressionar uma aprovação expedita. Ou, o que seria mais grave, tem ataques de mitomania compulsiva, e se dedica a praticar a arte de mentira política, sabendo que suas afirmações, mesmo sendo falsas, servirão para alcançar o objetivo que almeja.

Seria melhor para todos se as declarações do prefeito fossem tomadas com menor credibilidade e mais espírito crítico. O prefeito não tem nem o dom da infalibilidade, nem o da verdade absoluta. É um simples mortal ocupando um cargo terreno, por um tempo determinado, ainda que às vezes possa agir como um semideus. E está muito longe da imagem que ele e os seus acólitos querem nos vender.



A quantidade de mentiras que escutamos todos os dias alcança níveis nunca antes imaginados. Nem vou aqui focar na corja de mitômanos que têm tomado o poder no governo federal. Lá o caso é de policia. Acho mais interessante manter o foco aqui na nossa paróquia.



sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Transformação


Ou mudamos, ou seremos mudados

                                                                                              
Você já conhece esta frase. Já ouviu em algum lugar. Nos últimos dias cansou de ver políticos a repeti-la como mantra. E cá está este jornalista a utilizar a frase novamente, que saco!

Ulysses Guimarães, famoso político brasileiro que sumiu do mapa sem que o tenham encontrado até hoje, tem um livro publicado com este título (1991). Talvez ele não tenha mudado, e alguém o mudou por conta e risco em um acidente aéreo em 1992. Políticos costumam utilizar tais frases de efeito para seduzir o eleitor. Fazer com que pensemos que a mudança que eles bradam é a mesma que nós queremos e desejamos. Pura ilusão nossa.

Vejamos a eleição municipal de 2012 em Joinville (SC). A mudança para algo diferente, novo, era o mote. Mas os candidatos, os mesmos de sempre. O atual Prefeito se elegeu com o discurso da gestão, da qual ele era o grande conhecedor. Pura quimera. Ele também já era figura conhecidíssima, nãos dos pleitos eleitorais, mas de bastidores. Para não deixar no poder quem nunca quiseram, o uso da “mudança” foi maciço. Deu certo. Mudamos? Que nada, fomos mudados para votar no que a elite local desejava. Olhem a cidade e a gestão... paramos ou até regredimos.

Mais um case? Vamos para algo novo, a eleição das mesas diretoras do Senado e Câmara dos Deputados. Notem que fomos nós, brasileiros, que elegemos e reelegemos os ocupantes daquelas confortáveis cadeiras, gabinetes com altos privilégios. No Senado, o ex-governador catarinense Luiz Henrique, ex-pupilo de Ulysses, utilizou a frase famosa do seu eterno líder ao tentar apear Renan Calheiros da presidência. O que mudaria? Apenas os nomes, pois a prática é a mesma, afinal, ambos e grande parte daquela casa não muda faz tempo. Lá estão a manipular os destinos da nação em nome dos Estados.

Eduardo Cunha, veterano na Câmara dos Deputados, também fez uso da máxima ao propor a independência daquele poder. Derrotou o candidato de Dilma, o candidato de Aécio e PSDB, com sobras. Agora manda prá valer, e é o terceiro na linha sucessória do país. Mudou alguma coisa cara pálida? Alguma prática vai mudar? Os grandes temas nacionais que sonhamos ver valendo serão efetivamente votados? Ou mudamos, ou seremos mudados. Pois é. Eles continuam mudando tudo para nada mudar, e nós apenas a observar.

O Congresso Nacional saiu muito mais conservador das últimas eleições. A mudança para a qual milhões foram às ruas em 2013 vai ficar para mais alguns anos à frente. Duvidam? A não ser que ocorram terremotos nas ruas, anotem: serão enterradas a união civil de pessoas do mesmo sexo, a regulação da mídia eletrônica, o imposto sobre fortunas, a reforma política com financiamento público de campanhas, e qualquer outro projeto progressista. 

E que se cuidem os trabalhadores e trabalhadoras, pois ficarão mais 20 anos nas gavetas do Congresso temas como a redução da jornada de trabalho. E direitos trabalhistas, estes sim, poderão ser “flexibilizados”.

Ulysses Guimarães tem mais uma frase importante que compartilho aqui. “Quando as elites políticas pensam apenas na sobrevivência do poder oligárquico, colocam em risco a soberania nacional. A governabilidade está no social. A fome, a miséria, a ignorância, a doença inassistida são ingovernáveis. O estado de direito, consectário da igualdade, não pode conviver com o estado de miséria. Mais miserável do que os miseráveis é a sociedade que não acaba com a miséria.”


Ainda não superamos a miséria e as desigualdades sociais, e continuamos a nos superar na miséria intelectual, e na participação política. Os movimentos sociais estão preguiçosos, longe das lutas e das ruas. Não entenderam o seu papel nos governos petistas, e estão inertes. Não reagem, perdem a luta midiática. Os partidos são meros balcões de negócios. E assim perdemos todos. 

Olhem para os cenários políticos em todos os níveis. Vejam o que temos como lideranças para escolher nos próximos pleitos. Queremos que algo mude, de fato? Se sim, mudemos nossa ação, analisando e participando ativamente. Se não, deixemos que nos mudem para o último lugar na história.



quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Qual o papel do ensino médio?

 POR CHARLES HENRIQUE VOOS

O ensino médio no Brasil não cumpre o seu papel, desde a sua gênese. A cada dia que passa vivemos a mercantilização da aprovação no vestibular. Andando pela cidade, ainda mais nesta época do ano, presenciamos inúmeras propagandas das escolas (particulares) locais que "vendem" como seu principal produto o aluno (ou a aluna) que foi bem colocado nos mais concorridos vestibulares da região. Não fica entendido, por exemplo, se aquele aluno "formado" será bem sucedido na sua função de agente social.

A escola não dá, no ensino médio, as bases fundamentais que um jovem necessita para encarar os desafios da maioridade. Não promove o senso crítico, a boa leitura, a boa escrita, a interpretação de sistemas complexos, e não sensibiliza ninguém a ser ativo num mundo cada vez mais passivo e que aceita o status quo. Está muito claro que, para os pobres, geralmente estudantes de escolas públicas, o ensino médio é obsoleto pois não apresenta nada de novo, não prepara a juventude e nem a dá caminhos para a tão falada inclusão social e diminuição das desigualdades.

Pelo contrário. O ensino médio é um reprodutor dos problemas, pois ainda temos grandiosas taxas de jovens que saem da escola antes de completar o "terceirão" em busca de trabalhos (nos mais baixos níveis da estrutura laboral) e do sustento. Dados do Censo 2010 mostram que, em Joinville, aproximadamente 28% dos jovens de 18 a 24 não terminaram o ensino médio e nem estavam estudando para completá-lo. Com certeza este quadro se agrava ao cruzarmos com outros fatores, como a renda, a escolaridade dos membros da família, as questões de gênero e o local de moradia na cidade.

Por outro lado, o ensino médio das escolas particulares é uma preparação para o vestibular. Simulados, exames vocacionados, e aquela decoreba toda fazem parte dos alunos, diariamente. Raras as exceções em que eles são preparados para enxergar o mundo além daquilo que pede o mercado de trabalho. Não é a toa que não temos propagandas com conteúdos de conquistas sociais da formação discente, mas sim de resultados explícitos em vestibulares e etc. Os cursinhos surgiram na mesma linha e potencializaram o cenário.

Precisamos, urgente, repensar o papel do ensino médio. Não podemos achar que a roupagem técnica, de preparação para o trabalho, vai resolver o problema dos mais pobres e nem a aprovação no melhor vestibular vai garantir uma vida de sucesso para o mais rico. O ensino médio deve se voltar para a essência de seu nome, dando as mesmas condições para todos, com ensino integral e integrador, sem segregar e nem dar mais oportunidades para aqueles que carregam consigo todo o capital social de seus familiares. E sem decoreba, por favor.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Vamos parar de falar de racismo

POR FELIPE CARDOSO

Já estou cansado de ouvir essa frase. Em uma época até cheguei a acreditar nisso, mas depois de muitas pesquisas e leituras vi o quão errado é esse pensamento.

Influenciados pela entrevista de Morgan Freeman (que viralizou na internet) na qual ele fala sobre racismo e o mês da consciência negra, muitas pessoas passaram a usar tal argumento para chegarmos a uma solução e vivermos em paz.

Pois bem, o “homem livre” parece não ser tão livre assim.

Para um artista milionário deve ser muito fácil falar isso.

Morgan não é o único (nem será o último, infelizmente) "famoso" negro a ficar distante da luta por igualdade e justiça social. No Brasil temos milhares como ele: Ronaldo Fenômeno, Neymar, Pelé, Alexandre Pires… Para eles, que acreditam não sofrer com o racismo, pode parecer simples a solução para esse terrível problema. Afinal, eles não devem levar a mesma vida que os jovens, adultos e idosos da periferia levam. Alguns deles nem se consideram negros (Ronaldo e Neymar). Logo, eles não devem mais passar pela opressão policial. São tolerados porque são conhecidos e suas contas bancárias podem comprar um pouco de respeito, às vezes. Oprah Winfrey, por exemplo, já sofreu com o racismo mesmo sendo uma "celebridade" mundialmente conhecida (http://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2013/08/oprah-winfrey-afirma-ter-sido-vitima-de-racismo-na-suica.html).

O que quero dizer é que, muitas vezes, as "celebridades" negras acabam por esquecer suas raízes e acabam servindo de lacaios para seus patrões. Ficam de quatro pelo dinheiro. Trabalham como capitães do mato para garantir o emprego, o padrão de vida, ou seja, acabam pensando somente neles. Sou mais o Tinga, o goleiro Aranha e, mais recente, a jogadora de vôlei Fabiana Claudino, que não se calaram diante do racismo e aproveitaram a visibilidade para denunciar o que milhares de pessoas “anônimas” enfrentam diariamente.

Imagine se mulheres estupradas ficassem caladas. Imagine se os homossexuais agredidos ficassem calados. Imagine se as crianças mal tratadas ficassem caladas. Imagine se nós negros continuarmos calados.

Você realmente acha que mudaria alguma coisa?

Obviamente não.

O que essas "celebridades" reacionárias não percebem é que elas estão contribuindo para o silenciamento dos movimentos sociais, das “pessoas comuns” que enfrentam todos os tipos de preconceitos e humilhações diariamente e, na maioria das vezes, não têm como se defender.

No texto “A importância da voz” destaco a relevância das lutas dos movimentos sociais. Graças à internet podemos mostrar diferentes pontos de vistas, denunciar e encorajar mais pessoas a não ficarem caladas. Confesso que em certo momento até cheguei a reproduzir pensamentos retrógrados como o do Freeman, mas uma professora da faculdade me apresentou uma certa “autonomia do pensamento”. Comecei a confiar mais na minha cabeça. Li, pesquisei, assisti e analisei. Pude me inteirar mais sobre o assunto e tirar a minha própria conclusão. Não tenho a vida de um artista milionário. Minha realidade é muito diferente das deles e tenho certeza que a da maioria da população negra também é.

Eles não nos representam.

Somos mais Tinga, Aranha, Fabi, Zumbi, Dandara, Teresa, Marighella, Angela Davis, Mandela, Luther King, Malcolm X e muitos outros militantes negros que mostraram e comprovaram que ficar calado diante as injustiças não é a saída, muito menos a solução para os nossos problemas.

Não nos calaremos. Para o desespero de Morgan, Pelé, Neymar, Ronaldo e tantos outros lacaios e covardes.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Volta às aulas!


Essa tal de "Geston"

POR JORDI CASTAN


Essa tal de “geston” é um bicho esquisito. Na campanha foi apresentada como a solução a todos os problemas. O problema de Joinville era um problema de gestão e o candidato que venceu se apresentava como garoto propaganda da gestão. Já no discurso de posse veio com aquele papo mole de "cuidar dos centavos" quando todos sabemos que o problema não são os centavos, o problema são os Reais e a vaca começou a ir para o brejo, devagarzinho no começo, com um trote alegre depois e agora num elegante galope. Em quanto a nível federal as vacas têm optado por ficar tossegosas, as sambaquianas têm se dirigido ao brejo.

Essa tal de “geston” não parece estar dando os resultados previstos. Escolhi alguns exemplos a esmo, estou convencido que cada leitor poderá acrescentar outros com pouco esforço. Como inicio de conversa:
- A arborização urbana.
- O restaurante popular do Bucarein.
- PA da Zona Norte
- A Rua das Palmeiras.
- As escolas municipais. 

A arborização urbana foi objeto de um post recente aqui no Chuva Ácida, e media de perdas das arvores plantadas na ultima empreitada esta sobre os 50%, numa rápida vistoria pela cidade. Ainda há que acrescentar a este numero as arvores que são mortas intencionalmente, as que morrem por falta de manutenção e as que se perdem por causas naturais e que tampouco são repostas. Qualquer leitor atento que passe perto da rotatória do tecelão poderá constatar que verde e arborização não é o ponto forte das empresas que estão perto. É difícil imaginar que quem não planta arvores e não tem um jardim cuidado na sua casa ou na sua empresa se preocupara com isso na sua cidade. “Geston” do verde “0”

O restaurante popular do Bucarein segue fechado. Alguém se lembra do motivo do fechamento e a data anunciada para a sua reapertura? Em novembro de 2013 e com menos de 3 anos de uso o restaurante foi fechado para “reformas” reformas orçadas em mais de R$600.000 e com data prevista de reapertura em junho de 2014. Até agora nada. Já sabemos que cumprimento de prazos e de preços não é o forte desta gestão. Mas ninguém até agora veio a dizer a que ritmo anda a obra e qual o novo prazo. O mais provável é que estem apostando em que logo o joinvilense esqueça que lá um dia teve um restaurante popular.

Fechar o PA da Zona Norte para reformas e transferir os pacientes e usuários para os outros PAs é uma pratica estranha. Já imaginou se uma indústria têxtil fechasse por meio ano a estamparia ou a tinturaria para reformas? Será que as empresas de Joinville não fazem manutenção preventiva dos seus equipamentos e instalações? Se as empresas fazem, essa não é uma pratica que forme parte da “geston” pública. Aqui as coisas se deixam sem manutenção até cair aos pedaços literalmente e depois se fecham “sine die” e se gastam uns bons recursos em grandes reformas que em pouco tempo exigirão novas reformas. Estou tentando lembrar quando foi a ultima vez que o Hospital Dona Helena, por citar um exemplo, fechou durante meio ano para fazer reformas? Alguém me ajuda a lembrar?

A Rua das Palmeiras segue sendo um cartão postal da cidade. Além de um cartão postal é também uma mostra do zelo para com o nosso patrimônio cultural e paisagístico. Depois que o mato tomou conta, que as flores desapareceram e que os canteiros estavam prontos para receber um rebanho de cabritos, a grama foi roçada e o lixo foi recolhido. Os responsáveis pela “geston” do espaço não devem ter sido informados que a grama cresce e deve ser podada regularmente, que a troca de flores e o corte da grama são atividades rotineiras e permanentes que qualquer jardineiro amador conhece bem. Aqui roçar a grama é algo tão extraordinário que vira noticia na imprensa local.

A boa noticia é que não deveremos ter escolas interditadas no inicio do ano escolar, o que não quer dizer que a “geston” municipal tenha feito a sua tarefa bem e tenha se antecipado aos problemas, sempre ao chegar mais perto do inicio das aulas começa a tensão para saber quantas e quais escolas não poderão iniciar o ano letivo por não atender as exigências legais referentes a vigilância sanitária. Deveria ser uma preocupação de toda a sociedade que o poder público cumpra o que exige da sociedade, o cumprimento da lei e que todas as escolas estivessem preparadas para receber os alunos em perfeito estado. Curiosamente neste ano e quando ainda falta fiscalizar 90% das escolas estaduais e mais de 40% das municipais, a única fiscal da vigilância sanitária foi afastada e este ano não teremos nenhuma escola interditada, porque não haverá uma fiscalização adequada. Isso é bom? Em principio que não se fiscalize não é bom. Que se afaste a fiscal Lia Abreu por 60 dias justamente nesta época em que se concentra a maior intensidade do trabalho de fiscalização das escolas é no mínimo estranho. Na verdade quanto mais informação esta disponível sobre o episodio mais aumentam as duvidas e mais estranha parece esta coincidência. A sociedade tem o direito a ser informada e bem sobre se as escolas cumprem o que a lei estabelece e quais os motivos que levaram ao afastamento da fiscal. Transparência é bom e quem não fez nada errado não deve temê-la.  


Quando já transcorreu mais de 50% do mandato desta administração parece que o gestor tem perdido brilho e que o que aparentava ser ouro resplandecente é só latão. A população segue esperando um choque de gestão, até agora só tem recebido lamurias e essa coisa chamada “geston”.