quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Marina e a letargia democrática

POR CLÓVIS GRUNER

A semana foi de Marina Silva, e não por menos: fato único na nossa história política recente, a candidata do PSB conseguiu, em apenas duas semanas, mudar radicalmente o roteiro eleitoral, que até sua entrada em cena repetia a mesma polarização PT x PSDB das últimas duas décadas e cinco eleições. A acreditarmos nas pesquisas, o “fator Marina” não apenas conduz a candidatura de Aécio Neves a um fim bíblico (“do pó vieste, ao pó retornarás”), como acendeu todos os sinais de alerta na de Dilma Rousseff, que pela primeira vez vislumbra no horizonte o risco de ver comprometido, em um eventual segundo turno, o projeto da reeleição.

Mas não foi apenas sua ascensão meteórica nas pesquisas que tornou Marina Silva a principal protagonista nos debates políticos e redes sociais. Porque suas intenções de voto crescem na mesma proporção em que se tornam visíveis as muitas fragilidades de seu discurso. Nos dois debates de que participou, por exemplo, a candidata socialista tergiversou sobre todas – e não exagero – as questões controversas e urgentes que lhe foram propostas. Tudo parece se resumir a esta coisa algo vaga que ela define como a “nova política”, ainda que o preço para eventualmente implementá-la no futuro seja firmar, no presente, alianças com alguns velhos políticos.

Ao longo da última semana, à medida que seu protagonismo fez crescer o interesse especialmente midiático por suas ideias e projetos, Marina Silva mergulhou em um sem número de contradições. Entre elas, a mais lamentável foi o episódio envolvendo Silas Malafaia, o pastor que por razões e fantasias insondáveis, lidera uma raivosa campanha contra os direitos LGBTs. Bastou Malafaia falar mais alto, e ela retirou rapidamente do seu Programa de Governo aquilo que poderia comprometer o seu apoio e o voto evangélico e conservador. O episódio traz algo de didático, é verdade: ao recuar diante da pressão de um fundamentalista cristão, Marina sinaliza mais claramente não apenas com quem e para quem pretende governar. Implícita em sua atitude está o risco de retrocedermos ainda mais justamente onde o Estado brasileiro pouco avançou nos últimos anos: a laicidade, condição fundamental para se consolidar uma política de direitos civis efetivamente republicana.

CONTRA TUDO O QUE ESTÁ AÍ – Ao menos parcialmente, a ascensão de Marina Silva pode ser explicada pelo descontentamento, algo generalizado, com os esquemas políticos que vigoraram nos últimos 20 anos. Como disse anteriormente, ela encarna melhor, para o eleitor médio – aquele não deseja nem a reeleição de Dilma, nem o retorno tucano, mas que pretende escolher seu candidato dentro de limites ideológicos e programáticos mais convencionais –, a “terceira via”. Além disso, sua biografia política é, como a de Lula, singular – o que tornam equivocadas, a meu ver, as inúmeras comparações feitas nos últimos dias entre ela e Fernando Collor.

Uma coisa e outra, e Marina atraiu muitos dos eleitores sem uma candidatura definida e mesmo desinteressados do debate eleitoral, e é significativo que o número de indecisos e de votos brancos e nulos tenha diminuído sensivelmente, também de acordo com as últimas pesquisas. Para muitos eleitores, ela representa efetivamente a promessa de renovação. O que pode significar, entre outras coisas, que para eles as contradições de seu discurso, as incongruências de seu programa de governo e a fragilidade de sua aliança partidária não são importantes ou, talvez, sequer percebidas. As tentativas de dilmistas e aecistas de jogar com o medo do eleitor tão pouco funcionaram até aqui: Marina agrega votos porque conseguiu se posicionar, no imaginário de muitos brasileiros, naquele lugar intermediário entre a continuidade do que é e a reedição do que já foi.

De certa forma ela deu voz e forma aquele sentimento difuso que é “contra tudo o que está aí”, tão presente nas redes sociais e em pelo menos duas ocasiões – as “Jornadas de Junho” de 2013 e, mais recentemente, nas manifestações contra a Copa –, também nas ruas. As outras duas candidaturas que poderiam assumir esse papel – Luciana Genro (PSOL) e Eduardo Jorge (PV) – não lograram êxito em parte porque abrigadas em legendas “nanicas”, extremamente desfavorecidas pelas regras do jogo eleitoral. Mas também porque a opção por um ou outro implica um posicionamento político e ideológico claro, inexistente quando se trata da candidata socialista. A despolitização é um dos traços da candidatura de Marina Silva e, neste sentido, ela caminha na contramão do legado das manifestações do ano passado.

POLITIZAR A POLÍTICA – Quando milhares de brasileiros, principalmente jovens, saíram às ruas, me misturei à multidão, mesmo não sendo mais jovem, e vi com entusiasmo o que era o retorno da política às ruas, depois de um longo hiato. De certa forma uma resposta ao desgaste, depois de três décadas, do modelo político surgido com a redemocratização, as “Jornadas de Junho” alertavam, entre outras coisas, para a necessidade de fazer avançar a democracia. Num momento em que a maioria dos partidos, o PT inclusive, se distanciava dos segmentos e movimentos sociais, e que o enfrentamento com o discurso conservador ganhava contornos mais claros e críticos, as manifestações de junho nos lembraram da necessidade de inventarmos outras formas de pensar e fazer política.

Nos últimos dias aqui e ali apareceram textos a sugerir uma ligação – mais ou menos tênue, a depender do autor – entre as “Jornadas” de 2013 e a candidatura de Marina Silva. O argumento central é de que, ao colocar fim à polarização partidária, ela reúne as condições para organizar os fluxos dispersos e fragmentados que circularam pelas ruas durante as mobilizações. Em um outro nível, institucional, Marina representaria parte daquilo que estava na ordem do dia das passeatas em função de sua independência frente aos esquemas políticos cristalizados nas candidaturas petista e tucana.

Entendo as razões pelas quais muita gente apostou nisso – e alguns parecem ainda apostar –; mas não consigo concordar com a aproximação. E não apenas porque a candidatura de Marina Silva é a parada do velho novo: seu ingresso oportunista no PSB; sua subserviência aos grupos religiosos e conservadores; as alianças já firmadas e as promessas de apoio futuro, tudo ali é mais do mesmo. Seu discurso calculadamente descompromissado com a “velha política” pode mobilizar votos, mas desmobiliza na política sua capacidade de organizar e regular as multiplicidades e o convívio de e entre diferentes: ao recusar o confronto pela conciliação, sustentada em compromissos vagos, abstratos e contraditórios de futuro, Marina Silva despolitiza a política. Presta um desserviço à nossa ainda frágil democracia, e erra onde as “Jornadas de Junho” acertaram: é preciso fazê-la avançar. Com Marina, na melhor das hipóteses, serão mais quatro anos de letargia.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Tacanhas com diplomas fazem estatísticas

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Um dia destes, o Guilherme Gassenferth, que já integrou o time do Chuva Ácida, publicou, numa rede social, os resultados de uma pesquisa da Datafolha sobre a intenção de voto para presidente por escolaridade. O que chamou a atenção foi ele ter usado a expressão “mais instruídos” para descrever os apoiantes de Marina Silva.

Fiz um comentário a dizer que ele se referia a pessoas com diploma e não necessariamente mais instruídas (aliás, instruído pode ser sinônimo de adestrado). O fato é que nos dias de hoje ter um diploma não dá grandes garantias, apesar de o canudo ainda ter peso no Brasil. Aliás, convenhamos, isso é simples resultado do apartheid social e educacional em que o país sempre viveu.

Quando olho para as pesquisas lembro da tirada extraordinária de Millôr Fernandes, para quem “estatística é a ciência de torturar os números até que eles confessem”. Mas neste caso a tortura é dispensável. Quando se olha para os números é indiscutível que as pessoas com curso superior  preferem Marina Silva (43%), deixando Dilma Rousseff  (23%) e Aécio Neves (22%) para trás.

Mas essa relação entre diploma e instrução carece de substância científica. Nem preciso ir longe. Basta lembrar que Silas Malafaia, um dos mais destacados apoiantes de Marina Silva, tem diploma de psicólogo (Freud, Reich, Jung e Lacan devem estar a chutar lápides de tanta decepção). Vocês, leitor e leitora, conhecem alguém mais obscurantista que o telepastor? Podemos considerar instruída uma mente tão tacanha? Mas entra na estatística.

Se formos ler os números de forma absoluta é possível concordar com a pesquisa. Mas uma relativização dos dados pode mostrar outra coisa. Se subirmos a fasquia para pessoas com grau superior ao de simples licenciatura ou bacharelado, sou capaz de apostar que os números de Marina Silva despencam. Pode ser defeito do meu círculo de amizades, mas não conheço qualquer mestre ou doutor que cogite votar na senhora.

As pesquisas valem o que valem. E os números podem dar a impressão de que as pessoas “instruídas” apoiam Marina Silva. Mas não parece que isso encontre respaldo na realidade. Aliás, sobre a relação instrução-diploma recomendo uma leitura de um texto publicado hoje no “The New York Times” sobre os custos econômicos das falhas na educação (aqui)

É como diz o velho deitado: "O que a natureza não dá, Salamanca não empresta".

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Os plebiscitos e o Estado Laico


POR CAROLINA PETERS

Lembrou bem o Zé Baço: essa história de recomeço das eleições presidenciais não passa do desejo de alguns. “Com o andar do caminhão, as melancias se ajeitam” ele disse e, no limite, acrescento que desde o pleito passado esse desorganizar e reordenar das melancias se dá na boleia brasileira.

Nessa semana, até o 7 de setembro, movimentos sociais e organizações políticas colocarão na rua, nas escolas, universidades e bairros as urnas para o Plebiscito Popular pela Constituinte Exclusiva da Reforma Política. Essa mobilização que vem tomando corpo desde o ano passado visa dialogar com a população sobre as deficiências do nosso sistema político e apresentar um conjunto de propostas capazes de ampliar a democracia institucional, proporcionando mais espaços de participação popular e privilegiando o debate político-ideológico ao levantar, entre outras bandeiras, a proposta de fim do financiamento privado de campanhas; e colocando o dedo na ferida do fisiologismo questionando as coligações proporcionais.

É uma leitura com a qual eu concordo que a alta influência do poder econômico e a forma de distribuição do horário político gratuito têm cada vez mais esvaziado de política as disputas eleitorais, atribuindo sobretudo ao marketing o papel de consolidar a imagem de tal ou qual candidata (ou candidato) como o melhor gestor para a máquina pública.

No geral, entre as maiores candidaturas, que a mídia carinhosamente chama “principais” e às quais destina privilégios na cobertura jornalística – aquelas candidaturas que contam com maiores recursos financeiros e amplas coligações absolutamente heterogêneas – não há muita diferença. Nuances, talvez. Mas nem bem assumiram as candidaturas, Dilma, Aécio e então Campos reafirmaram seu compromisso sacrossanto com a manutenção do tripé macro-econômico. Em bom português: no limite, tudo fica como está. E a temerosa inflação continua a ser (des)controlada através da alta da taxa de juros, para alegria do capital especulativo, e a pequena produção agrícola familiar, que alimenta os brasileiros, continua sendo escanteada pelos latifúndios de soja e gado para exportação.

Ao mesmo tempo, enxergo outro movimento simultâneo no tabuleiro eleitoral: a volta de um debate mais ideológico à agenda política do país, protagonizado pela direita. A caricata figura do pastor Everaldo cumpre esse papel trazendo às claras uma linha que interessaria, por exemplo, ao PSDB, mas que os tucanos para buscar viabilizar a natimorta candidatura de Aécio não puderam assumir. Pautas que uma Marina Silva, com menor rejeição e inesperadamente recolocada no tabuleiro político pode abraçar sem pudor.

Os direitos das pessoas, de amar, de se relacionar e de crer, são dependentes do seu peso no jogo político. Um tuíde de Malafaia vale mais no jogo da vida do que eu e você. É a defesa de um Estado tão mínimo e privativo que atua somente no campo do privado, com preferência sobre os direitos sexuais e reprodutivos das pessoas.

É certo que o pleito não se dá em esfera única, e por vezes nos atemos em demasiado à corrida presidencial e deixamos livres de reflexão os concorrentes ao legislativo. O que representa o aumento de 70% no número de pastores concorrentes ao cargo? A liberdade religiosa e de culto deve ser irrestrita, mas qual o limite entre o foro íntimo e a intervenção de determinada crença (com maior poder financeiro, não esqueçamos, pois as mães de santo não tem nem representação no Congresso Nacional e sequer o direito de crença respeitado, sofrendo com recorrente ações arbitrárias policiais em seus terreiros) na esfera politica? Qual o limite entre o direito legítimo e fundamental de expressão e solapar as indualidades por uma crença hegemônica, que conta com vergonhosas isenções fiscais e insumos financeiros do governo para a construção de empreendimentos de negócios – de fé, mas ainda assim, e mais absurdo, negócios? Aproveito e pontuo que a que chamamos Bancada Fundamentalista não atua somente no campo dos costumes, mas mantém relação orgânica com o setor do agronegócio.

Como eu falava no começo: o Plebiscito. Eu voto SIM pela reforma política.

Em tempo, antes que me julguem principista ou contraditória, não se leva a voto direitos individuais. Não se vota pela descriminalização do aborto ou pelo casamento civil igualitário. Se vota pela permissão ou não de doações de pessoas jurídicas a campanhas políticas. Se leva a plebiscito a proposta de desarmamento versus porte de armas. Se leva a plebiscito a reeleição (que aliás voltou recentemente a ser comentada como votação comprada no Congresso...).

É preciso voltar o debate às claras, dar espaço pras opiniões. Permitir espaço para o confronto público. Votar em ideias, não em figuras. Isso faz bem pra democracia.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Aberta a temporada de caça

POR JORDI CASTAN


A cada dois anos - nesta época do ano - abre a temporada de caça. De um lado, os eleitores são alvo fácil de charlatães, políticos e outros mentirosos. Do outro, os eleitores, se convertem em caçadores e saem às ruas a procura de um candidato honesto em quem possam votar. É uma luta desigual, inglória em que os charlatães, embaucadores, mentirosos e trapaceiros têm todas as chances de ganhar.

O bom senso recomenda manter distância dos trapaceiros ignorantes, uma boa distancia se equipara a gozar da proximidade de um sábio. A tarefa do eleitor é duplamente difícil: por uma parte, não se deixar seduzir pelo canto de sereia dos candidatos, que, contando com a colaboração de marqueteiros e com recursos quase infinitos, projetam uma imagem que pouco tem a ver com a realidade. O eleitor médio tem poucas possibilidades de não sucumbir ao encanto do discurso fácil, da imagem editada, do sorriso falso e da roupa impecavelmente passada. 

Armados com dados, pesquisas e informantes, inclusive de dentro da própria comunidade, os candidatos dizem o que o eleitor quer ouvir.  E o eleitor cai com facilidade na arapuca, atraído pela isca do verbo melífluo daquele que mesmo não tendo feito nada, nos últimos quatro anos e sem pretender fazer, promete agora que fará o que não fez.  É hora do eleitor aprender a reconhecer os charlatães que se escondem no meio dos políticos honestos e sinceros. Há inclusive estudos científicos, que insistem em assegurar que há políticos sinceros. Que mesmo pertencendo ao mundo mitológico das fadas, os gnomos, os trolls, os dragões, o saci-pererê e a curupira eles conseguem ser indicados nas convenções partidárias e ganham o direito de disputar eleições com chance real de ganhar.

Evitar os charlatães é mais fácil do que parece. A melhor tática é utilizar a “via negativa” e em lugar de concentrar-nos em dizer o que é ou como é um charlatão, focar no que não é, e proceder a um processo de eliminação. Assim, a melhor forma de identificá-los é olhar para aqueles que oferecem sempre visões ou mensagens positivas, aqueles que vendem a imagem que tudo é fácil, simples, que não há problemas. Imaginemos que alguém disser que a BR-280 estará duplicada em menos de um ano e que agora vai, que não haverá problemas na abertura da licitação. Pronto... é tiro e queda. Só pode ser um charlatão. Pintou o mundo de cor de rosa? é charlatão.

A dica serve também para outras duplicações como a da Santos Dumont ou a Dona Francisca. Se diz que serão instaladas trocentas câmaras de segurança, com tecnologia digital de alta definição. Acertou, é outro charlatão. São todos candidatos a escrever livros tendo como título: “Como encontrar um marido em 12 passos”, ou “Como ter sucesso com as mulheres” ou “Os dez degraus para o sucesso”, ou “Como administrar Santa Catarina” ou “Como navegar na marolinha”. Reconheceu algum? Ficou fácil verdade? Para concluir, quando aparecer um candidato que fale dos problemas reais que o Estado e o país vivem, preste atenção, você pode estar frente à frente com um candidato honesto.

A parte triste é termos aprendido, ao longo do tempo, que nem sempre os melhores candidatos vencem. E que a maioria do eleitorado gosta de se deixar iludir e vota em quem oferece soluções mágicas para emagrecer sem sacrifício, para prosperar sem trabalho e para progredir sem educação.




sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Você lembra? Em 2011, Darci, Nilson e Clarikennedy usaram diárias para "visitar" Joinville

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Quatro anos passam muito rápido. Entretanto, algumas coisas que aconteceram neste período são rapidamente esquecidas, principalmente quando o assunto é política e a atuação de nossos representantes. Em 2011, nos primeiros meses do blog, publicamos documentos públicos que comprovavam o uso de diárias por deputados estaduais (neste caso Darci de Matos, Nilson Gonçalves e Clarikennedy Nunes) para "visitar" Joinville, mesmo sendo esta a cidade de residência dos parlamentares. Ou seja, uso de verba pública para estadia na cidade de residência.

Na época o assunto foi muito comentado, e o post original (que você pode ler na íntegra clicando aqui) esteve, durante muito tempo, como líder de acessos no blog Chuva Ácida.
Agora, os três tentam a reeleição para uma das 40 vagas na Assembleia. É nosso dever relembrar o caso.

***

Como diria Galvão Bueno, haja coração amigo! Pode ler o título deste post novamente se quiser. É tudo procedente, bizarro, e acontece diante de nossos olhos. Graças a um leitor assíduo de nosso blog e muito atento aos bastidores políticos (ele poderia muito bem seguir a linha do jornalismo investigativo), fiquei sabendo dessa prática na Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina.

 Ao pesquisar as diárias que Darci de Matos, Clarikennedy Nunes e Nilson Gonçalves receberam neste ano de 2011, me surpreendi com as várias diárias para “visitas” a Joinville. Mas, tem um detalhe: é sabido e certo que eles moram em Joinville e tem aqui o domicílio eleitoral. Como classificar esta atitude? No mínimo é um mau uso do dinheiro público. E o outro detalhe: R$ 670,00 para cada diária!! Presume-se, portanto, que o deputado estadual sai de sua casa, toma café, almoça, janta e dorme num hotel de Joinville e o cidadão desembolsa esse valor todo. Não nos esqueçamos que cada um tem uma verba de gabinete gigantesca, carro com motorista, auxílios para deslocamento entre sua cidade de moradia e Florianópolis para acompanhamento das sessões, e várias outras mordomias que o título de deputado estadual impõe. E ainda tem deputado estadual que é demagogo ao ponto de defender a redução no número de vereadores.

 Os documentos oficiais da Assembleia provam tudo. Quero ver a desculpa deles agora. Não sou contra o auxílio para viagens, elas devem acontecer. Mas só para um lanche e um almoço. Ponto. Esse valor todo para uma diária é um absurdo, caro demais. E olha que nem pesquisei sobre as diárias de nossos Senadores e Deputado Federal aqui da região de Joinville.

 Abaixo seguem os prints dos documentos, e aí, cada um que tire sua conclusão. Inclusive os que acham que os integrantes do Chuva Ácida só “batem” sem fundamento e com parcialidade. E ah! Como eu gostaria de ter acesso ao obscuro mundo do Judiciário, o menos transparente dos três poderes. Quem sabe um dia, Charles... quem sabe um dia...




Observação: algumas imagens estão com link quebrado e não conseguimos recuperar. Entretanto, a consulta pelas diárias destes deputados pode ser realizada pelo seguinte link: http://transparencia.alesc.sc.gov.br/diarias.php

Observação 2: como o post foi em 2011, quando eu ainda trabalhava como comentarista político na rádio MAIS FM (103,1), as respostas de Darci de Matos e Clarikennedy Nunes foram veiculadas naquela emissora. A resposta se baseou em negativas de ambos, e creditaram o fato ao sistema da Assembleia, pois era obrigatório constar todas as cidades por onde o deputado passava. Nilson Gonçalves, à época, não se manifestou. 

Observação 3: A denúncia feita pelo blog acarretou em uma mudança no sistema de diárias. Hoje não se encontra mais a cidade de residência do deputado em qualquer relatório de diárias, e sim "região norte de SC", no caso dos deputados deste post. 

Observação 4: ao procurar pelas diárias do deputado Darci de Matos no dia de ontem, este blogueiro percebeu que todos os seus dados sumiram do sistema.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Marina é uísque paraguaio

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO


O fato aconteceu nas praias do Algarve há alguns anos. Os banhistas viram uma barra altíssima a levantar no horizonte e fugiram, crentes de que era um tsunami a avançar. Mas o tempo passou e a tal onda gigante nunca chegou à praia. Depois as autoridades esclareceram ser um alarme falso – criado pela multidão na praia – e que era uma simples camada de neblina. O fenômeno ficou conhecido como o “falso tsunami”.

Por que contar essa historinha? É que tenho lido, nos últimos dias, muitos títulos a chamar Marina Silva de tsunami da política brasileira, em especial depois da recente pesquisa divulgada pelo Ibope. Mas será que podemos confiar nesses números? Em se tratando de institutos de pesquisa no Brasil é melhor não pôr a mão no fogo. Mas insisto na ideia de que os números refletem um momento em que ela está no olho do furacão.

Não quero opor intuições pessoais aos resultados das pesquisas. Mas não acredito que esses números tenham lastro para aumentar ou mesmo para se manter nos atuais níveis. Pergunto: será que os brasileiros teriam coragem de entregar o governo a uma pessoa que não parece minimamente preparada, que tem uma história marcada por rupturas com os parceiros políticos e não consegue esconder um sem-número de contradições?


Eu diria que não. Marina Silva é como uísque paraguaio. Tem gente que toma acreditando ser autêntico, mas acaba com uma puta dor de cabeça no dia seguinte. E nada pior que uma ressaca que dura quatro anos. E esse filme nós já vimos. Jânio, Collor. De qualquer forma, arrisco a dizer que Marina Silva também é um falso tsunami que vai perder força e desaparecer antes de chegar à praia. Mas isso sou eu a torcer contra ela, claro.


É como diz o velho deitado: "Com Marina, a coisa é simples. O Brasil passaria de país emergente para país submergente. Não tem como errar".

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Da política da TV e da política da rua

POR FELIPE SILVEIRA

O primeiro debate dos presidenciáveis, que ocorreu na Band, na noite de terça-feira, 26 de agosto, não trouxe nenhuma novidade para quem já estava acompanhando as eleições. Confirmou Dilma, Marina e Aécio na disputa a tapa pelo voto, ainda mais porque o formato proposto pela emissora beneficiou os candidatos em evidência. Confirmou também o pastor Everaldo como o doido que representa o pior da internet – contra o aborto, contra o casamento gay, pela privatização de tudo etc. Luciana Genro apareceu pouco e Eduardo Jorge, embora tenha levantado bandeiras importantes, foi levado na brincadeira por causa do seu jeito.

A Band também não colaborou quando seus jornalistas de direita fizeram perguntas. Um maluco perguntou sobre os plebiscitos “bolivarianos” para Dilma, usando termos que o Rodrigo Constantino adora. Como pode?

É por isso que acredito na democratização da mídia como a reforma mais urgente. Enquanto a principal fonte de informação do país for o Jornal Nacional e os similares das outras emissores, não teremos coberturas e debates sérios. Sobre eleições e sobre qualquer coisa.

Não discutiremos segurança, apenas ficaremos com medo; não discutiremos saúde, apenas vamos consumir fast food; não discutiremos mobilidade, apenas ficaremos presos dentro em engarrafamentos quilométricos; não discutiremos direitos, apenas os negligenciaremos. 

Contra o assédio no busão
Também não discutiremos o machismo como causa da violência contra as mulheres. Preferimos achar que a culpa é do tamanho da saia ou do decote. Em Joinville, pelo menos, este debate é feito pelo movimento feminista.

O coletivo Mulher na Madrugada realiza, nesta semana, dois eventos que fazem parte da campanha “Assédio Zero no Zarcão”, cujo objetivo é “desnaturalizar o assédio no transporte público, incentivar as mulheres a denunciarem os abusos sofridos nos ônibus de Joinville e cobrar políticas públicas”.

O primeiro evento ocorre nesta quarta, 27, às 19h15, no Anfiteatro 1 da Univille (Universidade Regional de Joinville). O segundo ocorre na quinta, 28, às 19h15, no Anfiteatro da Associação Educacional Luterana Bom Jesus/Ielusc. 

Muros que conscientizam e incomodam
Não é só a mídia que precisa mudar. Há muita gente que não quer a formação de cidadãos críticos, que lutem por seus direitos, inclusive nas escolas. O coletivo Pintelute realizou uma atividade, a convite de estudantes, em uma escola estadual de Joinville. O resultado é esse muro lindão aí da foto abaixo.

No entanto, o grupo informa que a escola quer transformar o muro numa parede vazia novamente. Não surpreende que tal mensagem incomode quem deseja manter tudo como está.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Suicídio eleitoral [2]

POR JORDI CASTAN


Há 40 candidatos a deputado estadual, com domicílio eleitoral em Joinville, mais outros 8 concorrendo pela região. A maioria nem se elegeria vereador se a eleição fosse hoje. Uma parte não conseguiria sequer se eleger representantes de turma. E há ainda os que não devem receber os votos necessários para ser eleitos síndicos num condomínio com seis pavimentos e dois apartamentos por andar.

A estes há ainda que somar os candidatos à Assembleia Legislativa pela região. São quatro candidatos por São Francisco do Sul, um por Itapoá, outros por Garuva, Araquari, Barra Velha e ainda deve ter um candidato por Barra do Sul. Ao todo oito candidatos a deputado estadual pela região. Quantos destes candidatos acreditam sinceramente que tem alguma chance de se eleger?

O quadro entre os candidatos à Câmara dos Deputados não é muito diferente. Só Joinville tem 21 candidatos, a maioria sem nunca ter sido eleita para outros cargos ou mesmo tendo disputado cargos eletivos para valer. Mesmo assim, não têm o menor problema em se lançar candidatos ao Legislativo, convertendo a campanha num bando de lemures, correndo aloucadamente em direção a um suicídio eleitoral. Sem ter a menor possibilidade, poluem a campanha, impedem um debate consistente e servem de escadinha a os candidatos de sempre, que se usam destes “tontos úteis” para continuar se elegendo. O que leva estes candidatos a lançar-se, mesmo sabendo que não tem a menor chance? É uma boa pergunta e com múltiplas respostas. Cada candidato tem a sua.

Porque é um suicídio eleitoral lançar tantos candidatos? Desde o ponto de vista dos partidos não há nada mais lógico, quantos mais candidatos, mais chances de eleger alguém. Por isso os partidos formam nominatas enormes, mesmo sabendo que a maioria dos candidatos está, na realidade, pleiteando só um emprego ou um cargo comissionado no futuro próximo e não cogita ou não tem a menor possibilidade de realmente se eleger. Os partidos se lançam na disputa pelo eleitor e novos partidos representam também  mais candidatos. Como exemplo, desde as últimas eleições surgiram cinco partidos novos: PSD, SDB, PPL, PEN e o PROS. E nenhum quer ficar sem lançar no mínimo um candidato no maior colégio eleitoral do estado. Resultado, uma enxurrada de candidatos.


Mas esse pessoal não sabe fazer contas? Ou não percebe que quantos mais candidatos menor a chance de eleger mais representantes de Joinville?  E a campanha "Vote por Joinville" não tinha como objetivo melhorar a nossa representatividade e para isso os partidos deveriam concordar em reduzir o número de candidatos? O papel da ACIJ nesta edição da campanha foi semelhante ao do Papa Francisco pedindo o fim da violência em Gaza e Israel. Totalmente inútil. Fez uma declaração,e nada mais. Achando que os partidos imediatamente reduziriam por própria iniciativa o numero de candidatos.

Achou a ACIJ que a política se rege pelos critérios da racionalidade e do bom senso. Sobrou estultice e faltou sair a campo e falar com os partidos e com os seus líderes. Cada partido - e principalmente cada cacique dentro de cada partido - tem os seu próprios interesses pessoais e são eles os que de verdade decidem todo o processo. Cada um faz as suas contas. E numa campanha curta, sem debates entre os candidatos a deputado e dependendo basicamente do tempo de televisão, no horário eleitoral gratuito os atuais deputados têm uma grande vantagem frente aos demais candidatos. Assim, na sua maioria os 40 candidatos por Joinville são meros coadjuvantes, numa grande peça de teatro em que o povo paga a conta e sofre as consequências. 

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

O legado de Colombo para Joinville

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Com as eleições de 2014 chegando, está na hora de algumas figuras políticas prestarem contas perante a sociedade. O político que precisa dar mais explicações à comunidade joinvilense é o atual governador Raimundo Colombo. Fugindo da discussão muito comum de que "Joinville é a maior cidade e merece mais do que as outras", pretendo, de forma introdutória, analisar o que Colombo deixa como legado para nossa cidade nestes seus quatro anos de governo.

Sendo assim, não existe, em minha avaliação, um governo estadual com resultados tão patéticos para a nossa cidade, superando inclusive as gestões LHS. Escrevo isto pois não é admissível, só para começar, que uma cidade tenha tantas escolas estaduais interditadas durante tão pouco tempo. Antes das aulas começarem em 2013, por exemplo, nove escolas estaduais estavam interditadas na cidade, sem condições de receber aulas. A atual gestão também fechou escolas, como o caso da EEB Monsenhor Scarzello. Soma-se as péssimas condições das escolas, e mais 4 anos sem a construção de nenhuma nova unidade estadual de ensino, mesmo que a população tenha avançado no período. Sem contar a greve dos professores em 2011 que durou 62 dias. Como lembrança, o ex-Secretário da pasta (Marco Tebaldi, de Joinville) é um político com extensa ficha suja.

Raimundo Colombo também é o gestor responsável pelo sucateamento da UDESC Joinville, por mais que isto seja um processo de muitos anos que vem piorando. Não houve, nestes últimos anos, um planejamento para que o campus fosse reformado ou que tivesse um plano de expansão de cursos e de infraestrutura. Um curso novo foi criado, mas os professores tiveram que "passar o chapéu" até acharem salas disponíveis para as aulas.

Colombo é o governador responsável pelos desastres ocorridos nas duas unidades de saúde em que o estado é responsável na cidade: Hospital Regional e Maternidade Darcy Vargas. No Regional, faltou água quente no chuveiro e uma pessoa morreu por falta de leito. Na maternidade, muitas denúncias na imprensa de que médicos estariam forçando mulheres a realizarem partos sem consentimento, e também foi noticiada uma carta de reclamação da classe médica para o Ministério Público, denunciando a falta de condições de trabalho. Tudo sob gestão de Dalmo Claro de Oliveira, "doutor", indicação de seus correligionários de Joinville, e com larga experiência na gestão da Unimed.

O binário do Vila Nova demorou anos para sair do papel. A morosidade das obras deveu-se, em grande parte, pela falta de verbas estaduais. E logo após a inauguração da obra, vários moradores reclamaram de que buracos e outros problemas estavam surgindo na via. Em nenhum momento Colombo conversou com os moradores, ou recebeu algum representante destes em seu gabinete.

Por outro lado, Colombo se mostrou como o governador das entidades empresariais, contrariando seu discurso de campanha em 2008, quando dizia que queria ser o "governador das pessoas". Até Esperidião Amin ouvia mais a comunidade joinvilense. Colombo foi constante nas reuniões e importantes solenidades de entidades como ACIJ, CDL e Ajorpeme. Entre discursos vazios e promessas para os empresários (como a duplicação da Avenida Santos Dumont), uma cidade com centenas de demandas sociais sem resolução.

O que acontece em Joinville certamente não se resume somente a esta lista que é apenas um debate inicial. E certamente não é uma realidade exclusiva desta cidade, pois representa problemas seguidamente noticiados em outras cidades e outras regiões de Santa Catarina, e cada um com sua peculiaridade. A patetice é tamanha que nada parece ter acontecido, de acordo com o conteúdo das primeiras semanas da campanha do atual governador. O legado, infelizmente, é de histórias tristes para a comunidade. Nada mais do que isto.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Mais do mesmo

POR CLÓVIS GRUNER

Na manhã seguinte à morte de Eduardo Campos, me perguntavam no programa de rádio onde, quinzenalmente, participo como comentarista, quais os eventuais desdobramentos de seu desaparecimento na campanha eleitoral. Ainda era muito cedo para qualquer prognóstico seguro, mas procurei destacar a dificuldade em consolidar sua candidatura como uma “terceira via” aos petistas e tucanos. Indagado sobre seu eventual sucessor ou sucessora, disse ainda que não vislumbrava outra alternativa aos “socialistas” além de indicar a vice, Marina Silva, como a nova candidata. Passada uma semana e com a candidatura de Marina Silva confirmada pelo PSB, não acho que meus comentários tenham sido despropositados.

O falecimento precoce de Eduardo Campos deixou em aberto se sua candidatura conseguiria, efetivamente, apresentar-se como uma alternativa aqueles eleitores que, descontentes com a bipolarização entre PT e PSDB, ainda assim pretendem escolher seu candidato dentro de limites ideológicos e programáticos mais convencionais. A nos pautarmos pelas pesquisas eleitorais, Campos não conseguira ir além de um acanhado terceiro lugar e havia, a meu ver, dois problemas que sua candidatura precisaria superar.

O primeiro era o caráter por demais regional de sua liderança. Mesmo que herdeiro de um espólio político significativo, o do avô Miguel Arraes, o ex-governador pernambucano enfrentava dificuldades para “nacionalizar” seu nome. Em parte porque, diferente de Aécio Neves, com trajetória em muitos aspectos similar, protelou tempo demais o necessário investimento para fazer-se conhecido além de seu estado e região. Além disso, Campos se viu enredado em uma dupla caracterização desabonadora às suas pretensões políticas. No discurso do PT ele passou a ser apontado como uma espécie de “sub-Aécio”; para o PSDB, sua passagem pelo governo petista era o pretexto ideal para colar nele o estigma da continuidade. Espremido entre petistas e tucanos, não teve estofo político para posicionar-se como liderança alternativa; era, independente do ângulo por onde o olhássemos, mais do mesmo. Jamais saberemos se, com a propaganda eleitoral e os debates, isso mudaria de forma significativa. Particularmente, acho que não.

O FATOR MARINA – Diante do inusitado que foi a morte de seu candidato, o PSB optou por confirmar o que, desde as primeiras horas após o acidente, já era cogitado. A indicação de Marina Silva como candidata à presidência foi confirmada, tendo o deputado federal e líder da bancada do partido na Câmara, Beto Albuquerque, como seu vice. A entrada de Marina na corrida presidencial embaralhou a disputa, o que já é alguma coisa em uma campanha que seguia morna, no limite da estagnação.

A reação raivosa de aecistas e dilmistas, incluindo o uso despropositado e infeliz de sua imagem no velório do ex-correligionário, deu o tom: pela primeira vez em meses, surge efetiva a possibilidade de um segundo turno; e Aécio Neves não está nele. Tucanos e petistas tem motivos para se preocupar: as primeiras sondagens indicam um empate técnico entre Dilma e Marina, e se Aécio corre o risco de ver naufragada suas ambições presidenciais, Dilma também precisa repensar estratégias se quiser continuar no Palácio do Planalto por mais quatro anos. Claro que a arrancada de Marina Silva está, em parte, ligada à comoção pela morte de Eduardo Campos; com o passar do tempo e acomodadas as manifestações emocionais mais imediatas, as reações podem ser outras.

Mas Marina não tem a seu favor apenas a tragédia que ceifou a vida de seu antecessor. A meu ver ela encarna melhor, para o eleitor médio, a tal “terceira via”, e pode apresentar-se como uma alternativa à bipolarização partidária que mencionei acima. Apesar de ter militado no PT por duas décadas, inclusive ocupando um ministério no governo Lula, ela conseguiu se descolar de maneira eficiente do antigo partido e do governo, principalmente depois de sua bem sucedida candidatura em 2010, quando obteve o terceiro lugar e algo em torno de 20 milhões de votos – pouco mais de 19% do total. Além disso, figura conhecida em todo o país – e isso é importante em uma eleição presidencial – ela não precisará “nacionalizar-se”, algo fundamental já que sua candidatura surge algo tardiamente em relação à de seus principais adversários.

FRAGILIDADES E CONTRADIÇÕES – Mas o “fator Marina” não foi submetido ainda ao crivo da campanha, onde suas fragilidades e contradições serão amplamente exploradas e expostas pelos seus dois principais adversários, como bem observou meu colega de blog, José António Baço. Em 2010, sua candidatura não representava uma ameaça a nenhum dos dois projetos em disputa; agora, ela ameaça ambos, e isso não escapará aos estrategistas do PT e PSDB. Neste sentido, os 20 milhões de votos conquistados na última eleição podem não garantir muita coisa, porque o contexto é radicalmente outro.

E não apenas o contexto: a Marina Silva de hoje também não é a mesma, porque sua trajetória algo acidentada levou-a a fazer escolhas que podem comprometer a pretensão de apresentar-se como candidata alternativa. A começar por sua filiação ao PSB, problemática para dizer o mínimo: é amplamente conhecido que seu projeto partidário, a Rede Sustentabilidade, continua de pé, e é uma posição oficial de suas lideranças que a filiação aos “socialistas” é apenas transitória. Além da urgência oportunista de quem não pode esperar mais quatro anos para lançar-se à frente de seu partido e defendendo um projeto próprio e original, o PSB vive a situação algo esquizofrênica de franquear uma candidatura que, talvez, abandone o partido depois de e se eleita.

Além disso, a crescente exposição nos futuros embates eleitorais colocará Marina Silva diante da tarefa de se posicionar, de maneira mais firme e transparente, frente a temas sobre os quais sempre tangenciou, na melhor das hipóteses. Os eleitores precisam saber – embora a maioria aparentemente não se importe muito com isso – o que uma candidata com chances reais de vir a ser presidenta pelos próximos quatro anos pensa, e quais políticas pretende implementar caso eleita, sobre temas como educação, saúde, violência e segurança pública, direitos humanos, laicidade do Estado, política externa, dívida pública, privatizações, desenvolvimento sustentável, política econômica etc... Em parte por sua posição coadjuvante, Marina Silva sempre passou ao largo desses temas. Agora não dá mais.

MUITAS PERGUNTAS – E talvez resida aí, nessa necessidade de exposição, o principal risco a comprometer o “fator Marina”. Porque do pouco que se sabe, o que se depreende são posicionamentos frágeis e ambíguos sobre temas importantes: como Marina Silva, uma vez presidenta, lidará, por exemplo, com o desmatamento, tema caro aos ecologistas, tendo como vice um dos principais representantes do agronegócio no Congresso Nacional? Quais serão as alianças que pretende firmar para assegurar a governabilidade, já que a atual, capitaneada por PSB e PPS, parece não ser sólida o suficiente para governar sem o recurso aquelas mesmas concessões que ajudaram a comprometer irremediavelmente parte do projeto petista? Sendo o PPS um partido que nos últimos anos viveu à sombra do PSDB, aliado de todas as horas do DEM, teríamos em um eventual governo Marina Silva a volta de setores da direita hoje na oposição?

A trajetória de Marina está diretamente ligada às demandas ecológicas, e uma das razões de sua ruptura com o governo petista foi, justamente, sua posição minoritária como ministra do Meio Ambiente frente ao incremento da política neodesenvolvimentista da então ministra Dilma Rousseff. Como ela pretende conciliar estes interesses com os da retomada da produção e do crescimento industriais? Ela manterá a promessa, feita por Eduardo Campos, do passe livre nacional para estudantes? No passado recente, a então senadora defendeu Marco Feliciano quando este, à frente da Comissão de Direitos Humanos, foi duramente criticado por ativistas principalmente do movimento LGBT. Evangélica e sabidamente contrária ao casamento homoparental, Marina destravará a pauta dos direitos humanos e das minorias ou permanecerá arredia frente à necessária e urgente laicidade do Estado? Há muitas incógnitas. Não sei se Marina Silva tem condições ou pretende responder a todas elas. Pessoalmente, duvido.

Porque apesar do momento particularmente agudo em que foi alçada à condição de presidenciável, e da intenção de apresentar-se como a “terceira via”, acredito que parte da novidade que ela pretende representar advém, justamente, da ausência de novidade: seja por seu percurso político mais recente; pelas alianças já forjadas para assegurar sua candidatura; pelas posições ambíguas e mesmo vacilantes sobre temas controversos, entre outras coisas, Marina Silva é incapaz de extrapolar os limites de uma candidatura convencional – no que segue, aliás, o caminho já trilhado por Eduardo Campos – e sua presença nestas eleições está bem ao gosto de eleitores que, para tudo mudar, não pretendem mudar absolutamente nada. Na prática a teoria é outra, e Marina Silva é só mais do mesmo.