terça-feira, 22 de julho de 2014

Cão Tarado.


José António Baço



POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Dilma é a minha escolha. Poderia elencar uma série de razões, mas tem peso decisivo o argumento da legítima defesa: o temor de que, em caso de vitória da oposição, o Brasil possa recuar aos tempos da privataria, quando as coisas eram feitas a pensar exclusivamente nos interesses dos poderosos e as políticas sociais eram bruma. Enfim, não se pode esperar "amanhãs" a partir de "ontens" de má memória.

O problema dos países menos desenvolvidos é tomarem como novidade o que já está a cair em desuso nos países mais evoluídos. É uma armadilha que o Brasil deve evitar. O ideário neoliberal já demonstrou que nada tem a oferecer além da precariedade, da concentração da riqueza e da falta de solidariedade para com os mais fracos. No entanto, é uma tentação à qual a direita se entrega levianamente.

A realpolitik levou o PT a se afastar de um certo ideário de esquerda - em especial por compor governo com partidos fisiológicos e conservadores -, mas o partido ainda representa a possibilidade de uma sociedade mais solidária. É claro que isso desagrada os que vivem a repetir o mantra do Estado mínimo, do individualismo e do endeusamento do mercado. E desperta os ódios irracionais que vemos todos os dias.

Outro fato é que os dois principais opositores – Aécio Neves e Eduardo Campos – parecem ter meros projetos de poder, mas nenhum projeto de governo ou de país. Aliás, esse é o grande dilema dos eleitores antiDilma: querem votar contra a presidente mas não conseguem ver estatura de estadistas nos opositores. Arrisco a dizer que teremos o voto silencioso e envergonhado: votarão contra Dilma, mas nunca a favor de qualquer um deles.

É claro que a minha visão é de quem vive fora e passa apenas um mês por ano no Brasil. Mas talvez seja exatamente essa posição a dar uma “frieza” de julgamento que muitas vezes falta no dia a dia. O Brasil mudou muito nos últimos anos. E para melhor. Tanto que a proposta dos opositores passa por "melhorar" o que o atual governo está a fazer. Ou seja, a oposição propõe fazer mais do mesmo. Não há proposta de valor.

E, para finalizar, deixo registrado que acredito na alternância no poder. O problema é que não se faz alternância sem alternativa.


domingo, 20 de julho de 2014

Felipe Silveira


POR FELIPE SILVEIRA

Como sou militante e filiado ao Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), é claro que meu voto vai para Luciana Genro. Assim como o 50 terá meu voto em todas as outras disputas da vez: governador, senador e deputado federal e estadual.

O critério fundamental é o partido, pois essa história de "votar em pessoas" é coisa de quem passa longe de uma discussão política séria. Votar em pessoas é ajudar a eleger uma série de cretinos que faz a política partidária ser o que é. (É claro que as pessoas interessam, mas colocá-las como critério sobre a questão do partido é ignorar a discussão que mais importa.)

Por isso voto no PSOL. Um partido relativamente novo, fundado em 2005, a partir do desencanto com o caminho escolhido pelo PT ao chegar no poder, e que amadurece a cada dia. Eu, que era petista, aderi à nova sigla somente em 2010, quando comecei a participar das atividades do partido recém-fundado em Joinville.

Acredito que a mudança da sociedade não se dará pela via parlamentar, mas entendo que este é um importante espaço a ser ocupado, onde o PSOL tem sido exemplar em suas atuações e lutas. Parlamentares como Marcelo Freixo, Chico Alencar, Ivan Valente, Jean Wyllys, Randolfe Rodrigues, Renato Cinco e Afrânio Boppré (vereador em Florianópolis e candidato ao governo de SC) demonstram todos os dias seus compromissos com o povo e com os direitos humanos.

Voto no PSOL porque sou contra o machismo, contra a homofobia e contra o extermínio sistemático da população negra e pobre. Voto no PSOL porque luto pelo direito à moradia e ao transporte público, gratuito e de qualidade. Participo do partido porque entendo que o povo deve ser protagonista das lutas, e vejo a sigla como uma ferramenta da população.

Voto no PSOL porque quero promover uma mudança radical no sistema econômico, pois entendo o modo de produção capitalista como a raiz dos problemas da sociedade. Voto neste partido porque quero uma sociedade mais justa, que nos permita desenvolver todas as nossas imensas potencialidades enquanto brasileiros e seres humanos. E o programa de Luciana Genro e do PSOL tem propostas claras para começarmos a caminhar até lá.

sábado, 19 de julho de 2014

As várias Joinvilles

POR JORDI CASTAN


Falar de duas Joinvilles é apresentar uma visão excessivamente simplista desta cidade e da sua sociedade: o correto seria se referir as Joinvilles, assim mesmo no plural, porque esta cidade são muitas cidades. A pública e a privada, a oficial e a real, a rica e a pobre, a pobre e a miserável, ou a Manchester catarinense e o reino dos manguezais. Todas elas são Joinville, todas elas formam juntas, a imagem caleidoscópica desta cidade.

Gostaria hoje de me referir a um único aspecto, que chama a atenção de quem procura se aprofundar além das respostas de sempre. Frente ao discurso ufanista da Joinville das maravilhas, a cidade do milhão de habitantes, a cidade que não para de crescer, a realidade mostra uma outra cara da mesma Joinville. Uma pobre cidade rica. A Joinville dos R$ 18,4 bilhões de PIB, a maior cidade do estado, maior que a capital, com um PIB per capita de R$ 35,8 mil, é um pedinte sem recursos para enfrentar os seus desafios. Uma cidade em que a maioria da população é pouco qualificada e ganha pouco. Uma cidade que vem perdendo qualidade de vida a passos agigantados e enfrentará, já a curtíssimo prazo, problemas cada vez maiores e de solução mais complexa.

O PNUD ( Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) divulgou recentemente a renda per capita de todos os municípios brasileiros. Joinville está na 65ª posição, com uma renda de R$ 1.126,74. Comparando com outros municípios de Santa Catarina, Joinville é o décimo, atrás de Florianópolis, com uma renda per capita de R$ 1.798,12, e de Balneário Camboriú, Rio Fortuna, Treze Tílias, Joaçaba e Blumenau.

5.- Florianópolis - R$ 1.798,12
10.- Balneário Camboriú - R$ 1.625,59
14.- Rio Fortuna - R$ 1.570,51
21.- Treze Tílias - R$ 1.471,95
31.- Joaçaba - R$ 1.338,50
38.- Blumenau - R$ 1.253, 17
41.- Timbó - R$ 1.214,03
49.- Seara - R$ 1.188,18
57.- São José - R$ 1.157,43
65.- Joinville - R$ 1.126,74

Parte da situação origina-se no modelo econômico, dependente da disponibilidade abundante de mão de obra barata e pouco qualificada. A título de exemplo: 46,56% da população só tem o ensino fundamental, considerando completo e incompleto; e só 5,84% dos joinvilenses tem formação superior completa, incluindo os 1,01% que tem doutorado ou mestrado.  A esse quadro há que acrescentar a falta de uma visão estratégica e o imediatismo na hora de definir os rumos da cidade. O resultado é que Joinville, frente ao silêncio generalizado, vem perdendo protagonismo no cenário nacional e regional. Quando o prefeito Udo Dohler afirmou que Joinville era a terceira economia do sul do Brasil e estava a caminho de tornar-se a segunda, provavelmente discursava tendo em mãos dados de três décadas atrás. 

As duas tabelas abaixo evidenciam dois aspectos que refletem a nossa realidade quotidiana. A primeira informa sobre nosso contexto econômico e ajuda a explicar o perfil do comércio e das empresas prestadoras de serviços destinadas ao mercado local.
Na Joinville operária, 61,05% da população recebe entre 1/2 e 2 salários mínimos.

A segunda mostra as nossas taxas de crescimento populacional, que não sustentam o mito que Joinville alcançará, a curto prazo, ao numero mítico do milhão de habitantes - o prefeito Udo Dohler usa esse número cabalístico para defender um modelo de cidade.



Ignora o prefeito, convenientemente, que na Joinville de hoje, sem mudar uma vírgula a legislação, nem aumentar um único metro quadrado o perímetro urbano, caberia uma Joinville de dois milhões de habitantes.


Joinville e os seus dirigentes, não só os políticos, mas também suas lideranças empresariais, tem optado por apostar numa cidade menos eficiente, numa cidade ambientalmente pior, em que a visão e os projetos de médio e longo prazos cedem lugar ao “curto pracismo”. Os motivos e as escusas para não fazer são os mais variados: desde a judicialização, a incompetência, a falta de recursos para fazer frente aos custos mais básicos e prosaicos, seja remédios de uso continuado, troca de lâmpadas, desapropriações para duplicar ruas e avenidas, inclusive para materiais de uso diário. Sem mudanças importantes a curto prazo o resultado desse quadro é no melhor dos casos um futuro incerto e pouco promissor. 

sexta-feira, 18 de julho de 2014

A Copa da segregação: onde estavam os negros?

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

A Copa do Mundo 2014 foi, de fato, a Copa das Copas. Recorde de gols, estádios maravilhosos construídos a preços exorbitantes, em locais onde o futebol não é desenvolvido, e passando por cima de direitos humanos básicos de milhares de famílias brasileiras. O turista estrangeiro, que esperava pelo caos, viu que nosso país possui o mínimo de organização, ainda mais quando um Estado de exceção é construído pelos governos das cidades-sede. Agora que a Copa acabou, parece ser tudo lindo e maravilhoso. Mas continuo insistindo que não foi. Esta foi a Copa da segregação. Foi uma Copa de poucos, para poucos.

Após assistir aos 64 jogos, olhar milhares de fotos nos portais de internet, acompanhar as centenas de reportagens produzidas pelas emissoras de TV (desde a mais crítica, como a ESPN Brasil, até a mais café com leite, como a Globo), chego a conclusão de que a segregação social brasileira foi retratada perfeitamente neste mundial. O evento escancarou este fenômeno que, para muitos, é invisível e não acontece no dia-a-dia de nosso país. É uma coisa apenas de números, ou do pessoal que "só sabe criticar".



Segundo o Censo 2010, 97 milhões de pessoas se autodeclararam negras ou pardas. Isto sem contar aquelas que, por uma vergonha causada pelo ranço histórico de nosso país, não se declararam como tal. Isto representava, na época da pesquisa, mais da metade da população brasileira. o Censo 2010 também mostrou que há uma desigualdade de distribuição de renda conforme a classe étnica: os rendimentos mensais dos brancos e amarelos, se aproximaram do dobro do valor relativo aos grupos de pretos, pardos ou indígenas.

A situação nos estádios não poderia ser diferente: predominância de brancos nas arquibancadas. Com ingressos caros, na mão de cambistas, e estádios com grandes setores VIPs e com mordomias, estava óbvio que a segregação que existe no país se espacializaria no jogo de futebol. Nem falo somente sobre jogos do Brasil, mas de todos os 64, onde os brasileiros foram maioria.

Enquanto isto, as emissoras de TV mostravam onde estava o negro, o pardo, o pobre, o "cara da comunidade": estava do lado de fora, nas ruas, nos botecos da esquina, no "pagode", nas "Fan Fests". Estava em todo os lugares, menos dentro do estádio. As imagens e fotos estão rolando na internet e provam isto que escrevo. Não é nenhuma falácia.



Se aprofundarmos um pouco, perceberemos que a parcela étnica mais pobre de nosso país estava, sim, acompanhando os jogos in loco. Os vendedores, os seguranças, os serventes, faxineiros estavam lá, em suas profissões de base como fazem todos os dias, visto que é a única coisa que vos resta devido à baixa qualificação e a falta de melhores oportunidades. E, se formos reparar, estas profissões são um retrato invertido do que eram os torcedores. Lá, sim, estavam os negros, os pardos, os "caras da comunidade".

As únicas exceções à regra eram os jogadores, e alguns "gatos pingados" na torcida.



Agora dá para entender porque os estádios brasileiros exalavam ódio contra a Presidenta e suas políticas sociais?

quinta-feira, 17 de julho de 2014

Amizades e brigas de irmãos


CAROLINA PETERS

Terça-feira, 15 de julho. Horas após o anúncio da criação do banco dos BRICS na minha ensolarada Fortaleza, eu morria de frio no centro de São Paulo. No Salão Nobre da Faculdade de Direito da USP, o presidente equatoriano Rafael Correa fala por quase duas horas sobre a chamada “revolução cidadã” em curso no país. Ao final, entre as perguntas, alguém levanta a bola: como fica a tal integração latino-americana diante do fortalecimento do bloco dos BRICS?

“A integração não é somente um sonho dos nossos libertadores, mas uma necessidade de nossas economias”, respondeu, criticando a falta de iniciativas do Brasil como país economicamente mais forte da região. Destaco dois pontos de sua fala: a necessidade de investir em obras de integração física entre os países latino-americanos e de tirar do papel o Banco do Sul.

A bem da verdade, é preciso dizer que se o novo banco, sediado em Xangai, é a menina dos olhos do governo e da mídia. O Banco do Sul, que não passou de vaga menção, está mais para o patinho feio. Aos desavisados, vale lembrar que é para a América Latina que exportamos cerca de metade de nossos manufaturados, 30% dos quais para o Mercosul. Não é a dita “fronteira linguística”, senão uma forte campanha político-midiática que nos afasta política e economicamente de nossos hermanos. A investida ideológica que nos fez sequer curar a ressaca dos 7x1 e torcer entusiasmados para os alemães, não porque merecessem a vitória pela campanha irrepreensível nessa Copa, mas por puro ódio aos argentinos.

Concordo com os que distanciam o futebol e a política na medida em que, para a infelicidade de alguns, não será o pífio desempenho da seleção brasileira que logrará uma derrota eleitoral a Dilma. Talvez algum problema grave na organização e estrutura do evento fosse capaz de alguma ranhura na popularidade da presidenta, mas como o viaduto em BH desabou em cima da cabeça de pobre brasileiro, em território tucano. Mesmo a imprensa de patente mas não declarada oposição a Dilma tratou de por panos quentes.

Mas este fenômeno nacionalista, que se expressa de maneiras tão diversificadas durante os mundiais de futebol (ao menos nos masculinos), merece um olhar reflexivo. Porque a seleção argentina, que entra com faixas defendendo sua soberania sobre as ilhas Malvinas; os movimentos sociais da Colômbia que escrevem carta ao artilheiro James Rodrigues, demonstrando que o bom desempenho inesperado da seleção enche de esperança aquelas e aqueles que lutam por paz e terra nesse país sitiado; a solidariedade dos uruguaios a Soarez, não pela mordida absurda mas pela punição desproporcional deferida pela FIFA; a recusa de Benzema, o filho de imigrantes, a entoar a “Marseillaise”, estão bastante distantes de cantar nosso hino abraçadinhos.

Este nacionalismo ocasional, que é “brasileiro com muito orgulho e muito amor” quando a seleção ganha, sem perceber que vamos aos trancos e barrancos também no futebol, é conveniente e conivente com o Estado de Exceção que se abriu por exigência da FIFA, uma empresa internacional. Mas não é capaz de se mostrar uma identificação legítima com uma cultura, um território, e a resistência de um povo aos arbítrios daqueles com maior poder econômico.

Da fala de Correa, me peguei pensando que talvez não compartilhemos enquanto brasileiros dessa premissa de “sonho de nossos libertadores”. Nossa história de independência é um quadro estático do imperador em seu cavalo, no qual não cabem todas as lutas populares que agitaram e continuam agitando o país a despeito do que nos fizeram acreditar, que somos um povo dócil; um gigante que acordou em junho de 2013 e voltou subitamente a dormir.

Essa história de libertação ainda precisa se construir no nosso imaginário, e isso passa por perceber que, mesmo que a gente não queira, os farofeiros argentinos que tomaram Copacabana sem ingressos, pra apoiar sua seleção, são muito mais parecidos conosco, e com quem foram os alemães que colonizaram o Sul do país, do que Angela Merkel.

quarta-feira, 16 de julho de 2014

O mundo vê o Brasil. E é bonito...

POR ET BARTHES

A Copa acabou, ficam as imagens. Melhor ainda quando divulgam a imagem do país no exterior, como foi o caso deste filme da BBC, no Reino Unido.







Ser rico é a melhor coisa que podemos querer


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O texto de ontem do Felipe Silveira abre caminho para uma reflexão interessante. Diz ele que ser rico é algo que não deseja a ninguém, “pois o rico pressupõe o pobre”. Não concordo com a ideia (mesmo que seja mera retórica), ainda mais quando apresentada em termos absolutos. Porque tudo é relativo, até mesmo a pobreza. Ser pobre na Noruega não é o mesmo que ser pobre no Brasil.

Mas a relatividade da pobreza é questão de somenos. O problema é que essa visão “franciscana” deixa implícito o discurso da socialização da miséria. É mau em termos políticos. Porque é o argumento que dá sustentação à semântica reacionária da direita, que acusa as esquerdas de vocação para a pobreza. Ora, o ideal de socialismo tem que ser afirmativo e apontar noutra direção: a socialização da riqueza.

E antes que apareça um conservador mais afoito a falar em tirar dinheiro dos ricos para dar aos pobres, não é isso que estou a dizer. O tema aqui é uma melhor divisão da riqueza. Não vamos esquecer que o relatório "Credit Suisse 2013 Wealth Report" revelou, há poucos meses, que 0,7% da população concentra 41% da riqueza mundial. E é contra essa “taxa de ganância” que a humanidade deve se insurgir.

Não odeio os ricos. Só não quero ser como esses incultos e gananciosos que formam as elites econômicas latino-americanas. Aliás, como escreveu Victor Bulmer-Thomas, especialista em assuntos da América Latina e Caribe, as elites locais “só conseguem sentir-se ricas se estiverem rodeadas de pobres”. Fazer uma profissão de fé pela pobreza é dar-lhes esse prazer.

Eis a diferença: não rejeito a riqueza. Só não quero ser rico sozinho. Porque a riqueza produzida pelo modo de produção capitalista é suficiente para todos. Aliás, acho que o problema mais imediato nem é acabar com o capitalismo, mas com os maus capitalistas e sua voracidade sem limites nem ética. Enfim, ao contrário do co-blogger Felipe Silveira, eu quero experimentar a riqueza. Porque a pobreza já sei como é.

É como diz o velho deitado: “Há uma guerra contra a pobreza… e os pobres estão a perder”.

terça-feira, 15 de julho de 2014

De olho na estrada...

POR ET BARTHES

Os telefones celulares são a maior causa de acidentes de automóvel em alguns países. Mas nada como experimentar a sensação...




Ser rico é a pior coisa que podemos querer

POR FELIPE SILVEIRA

Minha família achava que era coisa passageira da adolescência quando eu dizia que não queria ficar rico. De fato, não fiquei, e assim sigo. Inclusive, hoje digo mais: ficar rico é a pior coisa que podemos querer. Pois o rico pressupõe o pobre, e isso é coisa que não desejo pra ninguém.

Não desejo porque entendo que o pobre é alguém sem recursos para usufruir dos seus direitos – moradia, educação, transporte, saúde, lazer – em maior ou menor escala.

A imensa distância que colocamos em relação aos problemas dos pobres é uma das principais ferramentas para a manutenção desse sistema de exclusão, pois o justifica.

Dias atrás eu discutia com uma pessoa bastante próxima sobre as remoções em razão da copa e ela me questionava se as pessoas haviam comprado ou não as casas, pois “não achava certo invadir”. Eu falei sobre o processo de formação dessas comunidades, sobre as razões dessas “invasões”, mas fiquei com a impressão de ter sido em vão. Claro, é muito difícil para alguém que, emergente, cresce com a ideia de conquista da casa própria por meio do trabalho. Mesmo que este sonho seja frustrado ao longo da vida pelos mesmos que forçaram a existência daquelas comunidades.

Os mesmos sonhos e valores ganham as periferias, favelas e outras comunidades. Desde o adolescente que deseja o tênis de marca ao jovem que almeja a compra de um apartamento. O sonho de todos é ficar rico (e aí não importa o grau de riqueza) para conseguir usufruir dos direitos que devem ser de todos. Comprar o tênis, o carro, ir pra balada, viajar...

É difícil mudar essa ideia sem depender das contradições do capitalismo, que, em determinado momento, forçam uma noção mais realista do sistema. O que é uma pena, já que isso não ocorre sem perdas e dor.

Seguimos, no entanto, tentando. Não se trata de fazer voto de pobreza. É o contrário. É um voto de direitos para todos.