POR GUILHERME GASSENFERTH
Uma comitiva catarinense viajou à cidade
americana de Spartanburg, na Carolina do Sul. O objetivo da missão era conhecer
o impacto que a fábrica da BMW causou naquela pequena cidade do leste
americano.
Uma reportagem publicada em ANotícia em 23
de março dá conta que a comitiva, formada mormente por políticos, está
empolgada com o que viu em solo yankee.
Crescimento econômico, desenvolvimento, vitalidade e efervescência urbana
contagiaram os catarinenses, que querem fazer de Araquari uma Spartanburg com a
vinda da BMW.
Esqueçam.
A primeira diferença é que Spartanburg está
nos Estados Unidos e Araquari está no Brasil. Nos Estados Unidos, há
desenvolvimento avançado por causa da infraestrutura. No Brasil, há algum
desenvolvimento apesar da infraestrutura.
Nos Estados Unidos, a sociedade é muito
organizada e participativa. Alexis de Tocqueville já preconizava em sua
obra-prima “A Democracia na América” (1835) que a organização da sociedade em
associações é fundamental para o desenvolvimento. Os Estados Unidos são ricos
em associações, em comércio, em lazer, em esporte, em história, em
conhecimento.
Spartanburg tem teatro, tem estádio, tem
museus, tem bibliotecas, tem livrarias, tem diversas opções de lazer. Já
Araquari... tem a Festa do Maracujá como epicentro da sua vida cultural e de
lazer.
Mas não é na infraestrutura, nas opções de
lazer, na cultura ou na organização que focarei para explicar porque o
desenvolvimento visto em Spartanburg nunca será alcançado na Capital
Catarinense do Maracujá. Vou prender-me aos aspectos educacionais.
Em Spartanburg, uma cidade com 40 mil
habitantes, há uma universidade e sete faculdades, duas delas fundadas no
século XIX. Em Araquari, com cerca de 25 mil habitantes, há uma faculdade com
cursos ligados a agricultura e poucos alunos – e frequentada por poucos
araquarienses. Não há boas escolas de ensino fundamental em Araquari.
Li uma vez um livro interessante, chamado
“A História dos Estados Unidos”, escrito por três brasileiros e um canadense
que vive e trabalha no Brasil. Num capítulo ele aborda a importância e ênfase
que os EUA dão à educação. Para ilustrar, apoia-se em uma Lei do Estado de
Massachussets, publicada em 1647 (quando nós não éramos sequer um país, mas uma
grande fazenda portuguesa), que obriga que quando um lugarejo chegar a 50
famílias, estas deverão cotizar-se para pagar um professor para ensinar às
crianças do local.
A qualidade da educação é o maior paradoxo
que vivemos. Não há neste país uma alma que contrarie o senso comum de que sem
a educação não há salvação. Os mais renomados intelectuais, os mais gabaritados
políticos e os mais leigos compatriotas tem na ponta da língua o mantra de que
é preciso investir na educação para que o Brasil alcance um dia patamares
satisfatórios de desenvolvimento. Mas o investimento apequenado que chega onde
deve produz igualmente pequenos resultados.
A culpa, meus caros, não é da nossa vizinha
Araquari. Não pensem que falo mal daquela cidade, mas tão somente contextualizo
as diferenças que existem entre uma cidade dos Estados Unidos e uma cidade
brasileira. O problema é sistêmico, conjuntural e está muito distante de ser
resolvido.
Se eu pudesse escolher uma instituição de
Munique a instalar-se por aqui não seria a BMW ou a Audi, mas a Universidade de
Munique Ludwig-Maximilians. Deixo claro que não sou contra a instalação da
fábrica de motores da Baviera, mas só quero demonstrar que o efeito BMW de
Araquari será diferente substancialmente do efeito BMW em Spartanburg.
O negócio é que podem vir BMW, Google, NASA
e o próprio Palácio do Planalto a instalar-se em Araquari, Joinville ou onde
for. Se não atraírmos e/ou desenvolvermos primeiramente boas opções de
educação, acessíveis a todos; se igualmente não pensarmos em desenvolver a
cultura e o lazer; se não investirmos com eficiência em infraestrutura e
urbanismo; sem planejamento consistente de longo prazo sendo levado a sério;
sem combater a burocracia e a ineficiência do gordo Estado brasileiro; jamais
poderemos chegar sequer perto do resultado ‘miraculoso’ que a BMW deu à cidade
estadunidense.