quinta-feira, 11 de outubro de 2018

A criação de um monstro


POR FAHYA KURY CASSINS
No sábado algumas ruas da cidade foram tomadas pela carreata (a despeito do preço da gasolina) pró-Bolsonaro. Da porta de casa eu pude observar uma horda de pessoas com bons carros, na maioria esmagadora, sentados nas janelas, em pé nos tetos solares, muitos com bandeiras do candidato e camisetas verde e amarela. Havia uma grande quantidade de crianças, também sentadas nas janelas, com mais da metade do corpo para fora, algumas segurando seus celulares. Na sua totalidade faziam o gesto de arma de fogo pelo qual o candidato ficou conhecido.

Confesso que é uma imagem que eu jamais vou esquecer. Crianças fazendo aquele gesto, apontando pra mim, como se mirassem. Eu trabalho com crianças e sei o quanto elas não têm capacidade cognitiva para passar por este tipo de situação. Não entendo onde estão os órgãos responsáveis que não punem estes pais. Ah, sim, o Estatuto da Criança e do Adolescente é mais uma das “bobagens” que ele terá o prazer de rasgar. Para que pais idiotas façam o que quiser com seus filhos.

Domingo foi uma grande derrota. Diante de um panorama tão enriquecedor, com treze candidatos democraticamente listados, a população preferiu transformar a eleição em um mero Fla X Flu ridículo. Tivemos a chance de conhecer e estudar treze brasileiros que tinham (alguns não tanto) propostas para o país. Mas, diante de uma população rasa a nível de “vi na rede social”, que possui um entendimento do mundo via Facebook ou, muito pior, Whatsapp, que se deixa levar por vídeos e montagens esdrúxulas, perdemos a oportunidade de procurar alguém que estivesse disposto/a a fazer de nós um país melhor.

Nós não prevíamos que a onda rede social dominaria as eleições. Nós não estávamos preparados para conceber que as pessoas usariam do seu voto levianamente impulsionadas pela propaganda barata que se faz tão fácil e irresponsavelmente. Porque é propaganda, pura propaganda. Uma propaganda que não custa nada (basta um celular razoável nas mãos e conexão à internet) e aproxima as pessoas dos seus mitos. Estes, aliás, são o oposto do conhecimento. Vale ressaltar, o Conhecimento surge justamente para combater os mitos, os deuses que não explicam racionalmente e de forma lógica e coerente as coisas do mundo.

Mitos são a forma arcaica das religiões – e quando misturam-se mitos e religiões, a porcaria é maior ainda. A manipulação não está nas grandes emissoras, no domínio da mídia. A manipulação tornou-se um verme que prolifera suas mentiras e asneiras no contato fácil com qualquer dado ou afirmação que é replicado em segundos. Eu li, deve ser verdade. Não vou me dar ao trabalho de esperar, ver novamente, confirmar o que eu li. Assim fizemos nascer um monstro.

Jogamos fora, desperdiçamos uma das maiores oportunidades que a Democracia já nos deu. Agora a luta é por ela, por manter este país numa Democracia onde todos sejam respeitados. Não podemos jogar para os porões do totalitarismo todas as nossas conquistas dos últimos trinta anos. Respeito os votos de protesto, respeito os votos nulos e brancos e até mesmo as abstenções. Eu mesma pensei em me abster, neste segundo turno. Mas, no momento, abster-se, anular-se, protestar é acovardar-se. Há uma escolha bem evidente diante de nós. Mesmo que seja difícil sair às ruas da cidade pensando a todo momento que convivo no mesmo espaço que 230.200 pessoas que pregam atrocidades, como destruir a nossa Educação e dilapidar todo o patrimônio público entre bens imóveis e estatais.

Enquanto isso, na fila demorada de mais de duas horas no laboratório municipal, faltam kits para fazer exames – estão aguardando licitação. Mas o joinvilense parece estar mais interessado em portar uma pistola.

3 comentários:

  1. O choro tá grande. Chega logo dia 28 que quero dar muita risada aqui no chuva ácida. kkkk

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  2. A realidade é muito mais perversa do que essa que a autora está pintando no texto. Haviam, sim, bons nomes para ocupar a liderança e com boas chances de presidir o país, cito alguns: João Amoêdo, Geraldo Alckmin e Marina Silva. Entretanto, o partido lelinista, anti-democrático, centralista preferiu, ao invés de apoiar qualquer candidato do seu espectro ideológico e demonstrar que a variância de poder é saudável nas democracias, colocar um presidiário na cabeça de chapa com um vice-poste e outra vice-vice-poste. Difícil alguém se mostrar “politizada” não enxergar a estupidez e o desrespeito com as instituições jurídicas /eleitorais e a consequente polarização com aquele candidato que viria apontar toda essa fraude.
    Diga por você. Prevíamos, sim, toda onda das redes sociais, pois o candidato que hoje desponta nas pesquisas só tinha esse recurso para falar para os seus, e estava dando certo. O candidato do PSDB, por exemplo, acreditava piamente que, tendo o apoio do centrão e um maior tempo de exposição na TV, a ida ao segundo turno estaria certa. Ledo engano. Sobre mitos, estamos fartos, porém existe um solto e outro no xilindró (só que o último com outro termo). Durante anos o “mito” foi Lula, que conseguiu até colocar “postes” na presidência (duas vexes!), portanto, de “mito” ou “pai dos pobres” entendemos muito bem. O populismo é um câncer que ainda não foi vencido na América Latina, porém, Geraldo Alckmin (o picolé de chuchu) e Marina Silva (que retornou a sua nave espacial) não souberam combater nem o mito da esquerda, nem o da direita. Nesse caso, entre um governo fantoche encabeçado por um mito preso, e outro mito que tem como objetivo quebrar a espinha dorsal do establishment político podre do PT, MDB e PSDB, escolheremos alegremente o segundo.

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