quinta-feira, 19 de outubro de 2017
O caminho de pedras do litoral catarinense (parte 2)
POR FAHYA KURY CASSINS
Volto ao tema das praias “enrocadas” porque é assunto dos mais graves e ainda mais grave é o silêncio que o ronda. Como se Santa Catarina não dependesse do Turismo do litoral, como se não houvesse, ainda, um descalabro sobre as construções “à beira-mar” (aquelas sobre as dunas, restingas, costões) licenciadas de qualquer jeito ou nem isso, como se não precisássemos com urgência da conscientização dos cidadãos (seja o juiz com sua mansão ou o farofeiro) e das autoridades competentes.
Temos inúmeros exemplos. Em nome de “preservar” imóveis que foram construídos em áreas vulneráveis ou de preservação (e que usam o argumento “mas existe aqui há décadas”) as prefeituras e, em alguns casos, os donos dos imóveis decidem arbitrariamente jogar pedras nas praias. O “enrocamento” é feito até para “preservar” tubulações e postes de iluminação pública, assim como ruas. Os casos não são de hoje, como exemplo emblemático há a praia da Armação, na Capital, que passou por isso em 2010* – e este ano volta a ser um grave problema com as mesmas pobres “soluções”.
É da mesma forma que inventam molhes de qualquer jeito, para “preservar” as praias e, sem estudo nem debate nem planejamento, chegam os caminhões com enormes pedras. Para “conter” o avanço do mar, sem perceber que, também, são eles causadores desses problemas. Na Armação do Pântano do Sul havia um feixe de pedras natural entre o final sul da praia e o rio que a separa da praia do Matadeiro, através do qual era possível alcançar a Ponta da Campana na maré baixa. Não sei quem teve a brilhante ideia de construir ali um deck sobre mais pedras, o que impediu o acesso natural da água do rio com a água do mar. E foi a partir disso que os problemas na região começaram. Tudo para evitar que as pessoas molhassem o pé na travessia, ou dependessem do horário da maré.
Ano retrasado a prefeitura de Barra Velha começou a “construir” um molhe na barra do rio Itajuba. Vieram caminhões e caminhões de pedras. Dirão as más-línguas (aquelas que jamais aceitarão que são incompetentes) que não teve absolutamente nada a ver com a destruição que houve na praia do Grant, ao lado, nem com o assoreamento do rio Itajuba, nem com os últimos acontecimentos na praia contígua ao rio, das Pedras Brancas e Negras. O tal molhe é um acinte aos olhos e à paisagem, sendo muito questionado pela população e por engenheiros e demais profissionais.
Enquanto isso Balneário Camboriú apresentou proposta e projeto de alargar a faixa de areia, mesmo não tendo sido atingida gravemente pelas ressacas, apenas com ambições turísticas. Neste caso, temos o exemplo de Piçarras, depois de sucessivas ressacas na década de 1990, a cidade ficou totalmente sem faixa de areia na região central. Foi feito o alargamento da faixa de areia numa obra monumental, a cidade se reergueu, mas dez anos (o prazo de garantia da obra) depois lá estava a praia sofrendo novamente. Foi então que construíram os tais molhes (de pedras) para tentar “conter” o mar, para que ele não levasse embora a areia que fora trazida com tanto custo.
Ao mesmo tempo, vemos o surgimento de “home clubs pé na areia” em todas essas praias, com liberações duvidosas, licenciamentos alterados e promessas de “emprego e desenvolvimento”. Alguns estão mais para “home rocks” ou “home BR”. São conjuntos habitacionais que visam, principalmente, o investimento em apartamentos em condomínios com piscina, perto da praia, com incontáveis andares – e piscinas, é claro. Eu me pergunto se pouco importa que não exista, de fato, mais praia em frente a esses espigões. Pois, a julgar pelos de Piçarras, de Barra Velha e de outras praias, não haverá.
Fico admirada que no Estado não exista esta preocupação, que os profissionais competentes não sejam ouvidos, nem o Ministério Público tome atitude. Nem numa cidade como Joinville, onde uma boa parcela da cidade se desloca com frequência para o litoral que, felizmente, é tão próximo. Reclamam de estrada que não é duplicada, mas os problemas são muito piores nas praias.
* Dois links interessantes para acompanhar, visualmente inclusive, o que ocorreu na Praia da Armação do Pântano do Sul, em Florianópolis. Reparem nas informações, de promessas políticas, preocupações ambientais e certezas populares:
Armação 1
Armação 2
E informações importantes:
Considerações sobre obras de proteção
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Ótimo texto! Triste realidade.
ResponderExcluirMuito triste (não só para quem ama praia). E nada se faz, nem se fala sobre o assunto.
Excluir