segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Eleições anuais

POR JORDI CASTAN

Nada parece fazer tão bem a um estado ou a um país como o período eleitoral. Aqui, lamentavelmente, as eleições acontecem a cada quatro anos e é por isso que só vemos obras públicas em lapsos quadrienais. O que, convenhamos, é uma pena. Não há eleitor que não goste de ver o Brasil prosperar, crescer, se desenvolver. Mas os nossos políticos, como sabem que o eleitor tem memória de cará e que esquece rápido de tudo, só se dedicam a fazer e inaugurar obras nos meses imediatamente anteriores ao período eleitoral.

Esta prática tem vantagens para os políticos, principalmente os que tentam se reeleger. A primeira é que as obras recém-feitas não apresentam ainda sinais de decadência precoce, comuns nas obras públicas. Os telhados ainda não desabam e não aparecem os pontos de ferrugem nas estruturas metálicas, por citar alguns exemplos. A segunda é que se cria no eleitor a ilusão que a gestão atual, seja ela qual for, tem trabalhado e tem feito muito. Há ainda os que acreditam que possa existir uma correlação entre as obras públicas eleitoreiras e o posterior financiamento de campanha. Mas todos sabem que a rígida legislação eleitoral brasileira não só inibe este tipo de prática, como a pune severamente, desestimulando-a completamente.

Alguns políticos para dar a impressão que fazem muito mais do que na realidade fazem tem desenvolvido a técnica de revitalizar, requalificar ou reformar prédios, ruas e praças que com um pouco de trabalho e um muito de orçamento em poucos dias se convertem em novos ícones urbanos. Assim pipocam a Nova Rua disso, a Nova Praça daquilo e não são poucos os estultos que caem no velho truque do lavou, pintou esta novo. Alguns destes espaços recebem uma reforma a cada quatro anos em geral sempre no segundo semestre do quarto ano.

Mas o caso mais flagrante desta técnica dissimuladora é a de inaugurar ou celebrar o lançamento da licitação, da pedra fundamental, da abertura das propostas ou da assinatura do contrato. Tanta inauguração confunde o eleitor que acaba acreditando que o foguetório, a charanga e os discursos trazem algo de concreto, quando até agora só tem servido para produzir vento, ocupar espaço na mídia e criar a falsa impressão que esta gestão, qualquer que seja ela, é a que mais tem feito pelo desenvolvimento deste estado e dos seus habitantes.

Por isso desde este espaço proponho que os governantes precisem se submeter com menor frequência à avaliação do eleitorado e que as eleições passem a ser semestrais ou no pior dos casos anuais. Desta forma, viveremos sempre nesta constante efervescência que agora experimentamos e trocaremos este desenvolvimento espasmódico por uma prosperidade e um desenvolvimento contínuos.

Em tempo, a uma semana das eleições o quadro é de vitéria de Dilma no segundo turno, de Colombo no primeiro e de reeleição de Marco Tebaldi para deputado federal e de Darci de Matos e Kennedy Nunes como deputados estaduais. Que temos feito para merecer isso? Ou pior: o que deixamos de fazer? Provavelmente a pergunta correta seja a segunda.


sexta-feira, 26 de setembro de 2014

PlanMOB Joinville: ouvir não é deixar decidir

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Há alguns meses, quando relatamos aqui no Chuva Ácida os oito motivos para mostrar que a confecção do Plano Setorial de Mobilidade e Acessibilidade (batizado de "PlanMOB") seria em formato "express", sem debater com a sociedade, creio que acertamos em cheio. Apesar dos números apresentados nesta semana parecerem animadores, o processo de construção do PlanMOB apresenta falhas e ignora princípios básicos estabelecidos pelo Estatuto das Cidades.

As oito oficinas públicas realizadas durante o período da Copa do Mundo (onde reconhecidamente o ambiente social é alterado) reuniram cerca de 590 pessoas. Pode parecer um número expressivo, mas não é. Não chega a atingir nem 0,15% da população de nossa cidade. Um município próximo, como Itapema, atingiu mais de 500 pessoas nas mesmas oito consultas públicas para a revisão do Plano Diretor local. E Itapema tem um pouco mais que 50 mil moradores.

Depois, comemora-se o fato de mais de 12000 formulários serem respondidos pela internet e em pontos estrategicamente colhidos pela cidade. Além do formato ser insuficiente, pois é frio e não gera nenhum tipo de debate, também é insignificante quanto ao índice de pessoas atingidas (considerando a facilidade de uma pessoa entrar na internet e responder um formulário ou pegá-lo na padaria da esquina): 2,16% da população. Pífio.

Para piorar, um relatório síntese divulgado pelo IPPUJ nesta semana, diz que


O 3º Workshop do PlanMOB de engajamento social ocorrido em 18 de agosto contou com 
105 participantes, conduzido pela Embarq Brasil tendo como público alvo representantes 
de organizações sociais, instituições civis, conselhos profissionais e municipais, 
universidades, órgãos financiadores e administrativos, empresas, sindicatos e outros.

Sem contar o fato de que

A Leitura Técnica ocorreu de 1º a 12 de setembro, com 18 reuniões formadas por 9 grupos 
temáticos de trabalho – GTs, com a participação de cerca de 70 convidados voluntários 
que apresentam grande conhecimento e envolvimento com os temas tratados e teve a 
atribuição de aprofundar e discutir questões específicas de mobilidade com os temas: GT1 
- Transporte a pé; GT2 - Transporte por bicicleta; GT3 - Transporte coletivo; GT4 - 
Transporte de cargas; GT5 - Saúde e meio ambiente; GT6 - Circulação nas áreas centrais; 
GT7 – Financiamento; GT8 – Mobilidade regional considerando áreas conurbadas; e GT9 – 
Mobilidade e Ordenamento Territorial. 

Por duas vezes, o órgão responsável pela gestão do PlanMOB (neste caso, o IPPUJ), demonstra que não parece muito preocupado com a ampla divulgação dos fatos e a abertura dos processos decisórios para a população. Digo isto por a) o workshop não ser, diante do exposto no documento, um evento direcionado à população em geral e sim às entidades organizadas; b) esconder o nome dos 70 "convidados voluntários que apresentam grande conhecimento e envolvimento com os temas", pois não há nenhum decreto nomeando-os ou evento para elegê-los, caracterizando uma escolha unilateral e antidemocrática; c) uma leitura técnica da mobilidade de uma cidade de 554 mil habitantes ser realizada com 18 reuniões em míseros 12 dias e d) tudo isso ser divulgado através de "um banner" no dia mundial sem carro, sobretudo pela Prefeitura de Joinville ter um orçamento bem gordo para publicidade.

Este ato de escolher 70 pessoas com notório saber sobre o tema, é um recado dado para a sociedade civil num geral: somente técnicos e especialistas sabem debater o que acontece na cidade. É um discurso muito parecido com o período da ditadura, onde somente arquitetos, urbanistas e engenheiros decidiam o futuro da cidade, sem ao menos deixar a população participar dos processos decisórios. Penso que os gestores das políticas urbanas de Joinville confundem as coisas. Ouvir a população é uma coisa, e deixar ela participar das decisões é totalmente diferente. E além disso, qual o problema em manter escondido durante tanto tempo o fato de 70 pessoas serem convidadas sem que a sociedade soubesse? Medo de alguma retaliação dos movimentos populares? Qual foi o critério de escolha? Quem são estas pessoas? Foram registradas atas destas reuniões?

Nada contra os convidados que participaram, porém conheço, no mínimo, umas 10 pessoas de entidades populares ou não que poderiam contribuir mas não foram convidadas e provavelmente nem estavam sabendo deste fato. E conheço outros 554 mil que poderiam ajudar. A pressa em aprovar o Plano de Mobilidade, após anos protelando (falta de aviso não foi), culmina na privação dos diretos já conquistados pela população e, mais uma vez, a gestão democrática da cidade de Joinville é ceifada mediante interesses difusos dos gestores públicos. 

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Marina é um desvio da direita

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

O leitor e a leitora já devem ter visto acontecer aqui no blog (e não só). Tem gente a defender que, por viver em outro país, uma pessoa não pode opinar sobre o Brasil. Mesmo que esteja muito antenada. É uma atitude provinciana e um erro crasso. Mas por sorte há outras pessoas, em número significativo, que aproveitam para a troca de ideias e de intercâmbio de narrativas.


Aliás, no que toca à organização social, política e econômica, por exemplo, as experiências vividas em outras sociedades deveriam servir como alerta para os brasileiros. Porque há situações que vão além do plano teórico e estão a ser vividas pelos analistas nos seus lugares de origem. É o caso do europeus, que neste momento enfrentam a lógica desumanizadora do neoliberalismo.


Quer dizer, os europeus sabem o quanto as políticas neoliberais podem ser ruinosas para os povos. Os brasileiros escaparam disso nos últimos 12 anos. No entanto, há muitos entre os mais velhos que parecem ter esquecido. E os mais novos ainda não sentiram as presas do neoliberalismo na jugular.  É por isso que muitos ainda se deixam seduzir pelo canto da sereia neoliberal. 

Austeridade. Desemprego. Empobrecimento. Precariedade. Ruína. Desespero. Essas palavras são a luz no fim do túnel neoliberal. É assim na Europa e quem tem noção desse fato – e dois dedinhos de testa – só poder rejeitar essa lógica. Aliás, é algo que venho repetindo aqui, mas que hoje reforço através do sociólogo Boaventura Sousa Santos, outro português (neste caso um português ilustre).


É caso para dizer: faço minhas as palavras do professor da Universidade de Coimbra. Em especial no que se relaciona à candidata Marina Silva, apontada por ele como um desvio da direita para voltar ao poder, uma vez que ela será manipulável. E também quando fala na proposta de independência do Banco Central, que é a regra de ouro do neoliberalismo. 

"A independência do Banco Central é a regra de ouro de todo o neoliberalismo. Esqueçam políticas sociais, esqueçam educação, esqueçam saúde, esqueçam o que for. A ideia de que há uma independência do Banco Central significa efetivamente que a lógica dos mercados financeiros vai regular as políticas públicas", diz Sousa Santos.

E arremata ao analisar a candidata Marina: "A direita não pode voltar ao poder diretamente. Tem que usar um desvio de esquerda. Tem que instrumentalizar alguém para chegar ao poder. O desvio é a Marina, claramente". E mais não digo. O filme com Sousa Santos é suficientemente esclarecedor. Assista, porque são três minutos que valem a pena.


quarta-feira, 24 de setembro de 2014

E no Rio Cachoeira?

POR FELIPE SILVEIRA

A resposta do Coletivo Pintelute à vergonhosa e caríssima campanha de criminalização do pixo, lançada há poucos dias pela prefeitura de Joinville, é simplesmente espetacular. Veja a imagem ao lado e exploda de alegria.

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Devido aos dados das últimas pesquisas, passo a acreditar que o Brasil possa dilmar ainda no primeiro turno. Significa, na minha opinião, que o brasileiro não aceita dar mais nenhum passo à direita, mesmo com duas opções reais distintas. Acho, de fato, que o povo brasileiro vê o PT como a esquerda, pelo menos a possível, e vai com ela.

*

À esquerda que faço parte, mais à esquerda do que o PT se propõe, cabe se organizar e ajudar a organizar o movimento para puxar o barco chamado Brasil para a esquerda. O PT faz um governo cheio de contradições e que permite esta disputa. A professora Ivana Bentes trouxe esse argumento dia desses no facebook, e eu concordo. Quem mais disputa? Malafaia, Feliciano, agronegócio, entidades patronais e toda a cacalhada. Eles têm a grana, mas com o povo ninguém pode.

*

Eu não descarto, claro, uma vitória da direita. Nem do moribundo Aécio nem da já não tão confiante Marina.

*

Falei da necessidade de organização da esquerda, seja nos movimentos sociais, nos partidos ou nos sindicatos. Lembro, então, de algo que me chamou a atenção recentemente, que é a organização dos novos liberais, inspirados em Ludwig von Mises. O trabalho dos caras é impressionante, mas no sentido negativo. Com textos simples e rasos, sem compromisso com a História, a organização tem fornecido vasto material para seus leitores debaterem facebook afora. E é incrível notar que uma galera simplesmente embarcou na ideia sem autocrítica alguma. A estratégia: promover uma luta do bem (liberalismo) contra o mal (marxismo). Tem dado certo. E isso tá muito errado.

*

Este escrevedor registra todo seu apoio ao goleiro Aranha, do Santos. Um heroi numa sociedade que escancara, cada dia mais, seu racismo, seu machismo, sua homofobia e muitos outros preconceitos.

*

Tem jeito. Tem muita coisa pra fazer. Mas tem jeito.

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Essa Gente de Bem.

POR CAROLINA PETERS

Uma revoada de homofóbicos.
Vamos fazer as contas das últimas semanas. Um incêndio criminoso num CTG (Centro de Tradições Gaúchas) no Rio Grande do Sul, dias antes do local sediar a celebração da união de um casal de lésbicas. Uma travesti é espancada e atirada do alto de um caminhão em movimento em Caçapava, São Paulo. A notícia do caso, absolutamente desrespeitosa, a trata por o travesti*, anônimo -- mais uma mostra do péssimo jornalismo que acomete o país.

O caso que possivelmente contou com maior repercussão pela brutalidade e pelo desenrolar, é do assassinado do jovem goiano João Donati. Crime de brutalidade sem tamanho, João foi esquartejado e, para não deixar dúvidas da motivação do crime, o assassino deixou em sua boca um bilhete: vamos acabar com essa raça. Alguns -- os que certamente iam mal nas aulas de interpretação de texto na escola -- podem afirmar que o pronome poderia indicar muitas outras características. Mas os mais espertinhos sabem que "essa raça" se refere aos homossexuais. Os gays. Vi-a-do. B-I-C-H-A.

Parecia que diante de tamanho horror, uma ficha caiu. O termo homofobia virou palavra popular na pauta jornalística. Até que o assassino confessou. E de repente, tudo não passou mais de uma briguinha de amor. Como se um homem que admite ter sentido atração por outro homem, e depois assassina o menino de forma cruel, buscando apagar sua existência desmantelando seu corpo, e deixa tão clara mensagem, talvez até como forma de exorcizar os próprios fantasmas, não pudesse ser taxado de homofóbico.

E o caminho continua livre para a "gente de bem" que defende publicamente no horário gratuito "a vida e os valores da família", mas só da família que garanta o controle social, a propriedade. E a vida de quem interessa.

Fobia: aversão irracional, desproporcional.

Mas a homofobia não é somente a que choca os distraídos. Ao rés-do-chão e em doses mais homeopáticas ela também agride e mata. A revoada de homofobia das "gaivotas" da torcida são-paulina, uma forma de escárnio contra os rivais corintianos, é mais um sintoma. A forma como a homo-afetividade é usada para diminuir um adversário ou antagonista escancara o quanto na nossa sociedade existem pessoas cuja vida vale menos. Cuja vida é descartável.

Há algumas semanas, o próprio Corinthians manifestou seu repúdio aos gritos homofóbicos por seus torcedores. Ainda é pouco, mas quando um dos maiores times do país adota essa postura, é um respiro para quem espera um futebol mais inclusivo, dentro de campo e nas arquibancadas. E também dos portões pra fora. Afinal, o futebol é extensão da vida dos brasileiros. Eu já entrei na campanha para que o meu Flamengo assuma a mesma postura.



*Uma breve nota de gramática: Travesti é uma palavra de gênero neutro. O artigo concordará com o gênero com o qual a pessoa travesti se identifica para si e para o mundo através de diversas linguagens, entre as quais a vestimenta. Dizemos A travesti para as travestis de identidade feminina (sexo biológico masculino, mas identidade de gênero feminina). Dizemos O travesti quando se trata de pessoa de identidade de gênero masculina, nascida com sexo biológico feminino.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Minha granja,Minha vida.


Em quem não votar?


POR JORDI CASTAN


Se está esperando uma lista com os nomes e os números dos candidatos em quem seria melhor não votar, pode parar por aqui. Não encontrará essa informação nesse post. Pior ainda se você precisa passar pelo Chuva Ácida para saber em quem não votar. Então você tem um problema grave. Você não é um eleitor informado, você é um eleitor opinionado e isso é perigoso. É perigoso para sua saúde, é perigoso para sua educação, é perigoso para sua segurança e, pior, é muito ruim para o Brasil.

Nesta altura, você já deveria conhecer os nomes dos deputados que enriqueceram depois que entraram na política. Você sabe que esse patrimônio todo não veio do seu trabalho, nem de seu esforço e eles também sabem. Tanto sabem que a maioria esta em nome de laranjas. Que você não sabe? Viu como já intuí que você tem um problema grave? Esses caras são tão caras de pau, os deputados, que nem tem mais vergonha de fazer declarações de bens em que informam patrimônios médios e moderados, carros velhos, imóveis de pouco valor. Em outras palavras, patrimônio de classe média- média.

Eles fazem isso por dois motivos. Primeiro, porque se declarassem todo o seu patrimônio, poderiam ter algum problema com as suas declarações do imposto de renda. O segundo é porque no fundo acham que você eleitor é um trouxa e vai acreditar que eles não tem outro patrimônio que aquele. É uma forma de dizer que eles são iguais a você. Cuidado. Não se deixe iludir, eles não são. Não deixe que se comparem a você. Ainda que se você vai votar neles, pode ser mesmo que eles tenham razão é você tenha muito mais em comum com eles do que imaginava.

Você não sabe quando custa um apartamento naquele prédio da Rua Orestes Guimarães ou na Otto Bohem? Ou quanto custa uma chácara em Campo Alegre ou na Estrada da Ilha? Ou quanto custa um apartamento em Balneário Camboriú ou em Itapema na frente para o mar? Quanto custa um carro é mais fácil, é só dar uma olhada nas revistas especializadas. Mas gostamos de ser enganados. E fechamos primeiro um olho e depois os dois para estes patrimônios milionários, para as festas frequentes com bebidas e comidas importadas e garçons engravatados. Afinal, vemos o candidato comendo pastel ou pão com margarina uma vez a cada quatro anos.

Eleitor, deixe de ser trouxa. Pare de ser cúmplice desses caras, eles não merecem seu voto. Eles estão enganando você.



Outro grupo de candidatos surge entre os atuais vereadores, que aproveitam as verbas partidárias e tiram umas férias legislativas para sair a fazer campanha. A maioria deles não tem nenhuma chance de se eleger, mas topam servir de escada, inclusive a candidatos de fora, com o único objetivo de reforçar o seu nome entre o eleitorado. O objetivo real é unicamente fazer que seja mais fácil a sua reeleição daqui a dois anos. Assim podem esvaziar as sessões do Legislativo Municipal. Ao final das contas, não há em Joinville qualquer tema urgente ou importante que requeira sua presença na Câmara de Vereadores. Analise cada um destes candidatos e diga seriamente qual você acha que de verdade esta em campanha para deputado estadual e qual esta só fazendo de conta que concorre?

Aqui neste mesmo post, você pode dar os nomes deles. Em quem você acha que não devemos votar?
Nem vou dedicar mais de três ou quatro linhas aos candidatos que, tendo participado na última eleição como candidatos à Camara de Vereadores e tendo feito menos votos que na eleição a síndico de prédio, se lançam agora a uma aventura, com pouquíssimas possibilidades de sucesso. Você deveria saber que eles são só comparsas de uma encenação. Não desperdice seu voto com eles. Vote com responsabilidade. Seu voto é a única possibilidade de mudar este país. Comece com aqueles que estão mais perto de você. Conheça-os.

Fica a sugestão. Poste, como comentário, quem você acha que não deveria merecer o nosso voto. Ajude a desmascarar os políticos que devem ser erradicados da vida pública. Vamos ver como anda nosso conhecimento da política estadual. 

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Marinando

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Reservei-me de comentar as eleições deste ano aqui no blog, pois considerava que a morte de Eduardo Campos não geraria cenários sólidos, e a espera seria necessária. Por um lado, a comoção nacional em torno do ocorrido geraria um cenário favorável para a ecocapitalista Marina (com seu natural crescimento nas pesquisas) e, por outro, um ataque direto de Dilma e Aécio, temendo perder espaço.

Quando um candidato ganha notoriedade, sua vida é revirada por partidos, imprensa e população. Foi isto que aconteceu com a socialista. Sua atuação como Ministra foi posta em xeque juntamente com suas relações com os banqueiros e mega empresários do país. O vice escolhido, Beto Albuquerque, tem estreitas ligações com o agronegócio e contraria tudo aquilo que Marina fala. Contrariedade, digamos, é a marca registrada dela: o escândalo sobre as políticas LGBT no plano de governo fala por si só.

Em um trocadilho tosco, sempre pensei que as intenções de voto para Marina estavam "marinando" em torno do que aconteceu com o jatinho lá em Santos. E a tendência, após as semanas passarem, seria a acomodação para perto do cenário "normal", com Aécio e Marina se aproximando, e Dilma mantendo a ponta, principalmente pela força da máquina estatal e as alianças que ela possibilita. As últimas pesquisas mostram isto. Até a tão badalada vantagem de Marina no segundo turno vem diminuindo.

Quanto aos demais candidatos, outro cenário de acomodação em direção ao natural: Pastor Everaldo desce de seu posto de surpresa, e dá lugar para candidatos com propostas mais densas, como Luciana Genro e Eduardo Jorge. E o resto vira meme na internet ou é motivo de piada.

No segundo turno o jogo é outro, claro, mas a comoção acabou e a fidelidade em torno de Marina está chegando ao fim. É consenso que candidato que sobe rápido demais nas pesquisas e na hora errada, não leva. É esperar para ver.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Feios, pobres e temidos


 POR CLÓVIS GRUNER

Na semana passada a Associação Comercial e Industrial de Ponta Grossa (ACIPG) foi notícia nacional. Mas não por causa da pujança econômica dos campos gerais paranaenses: a entidade, que reúne parte da elite pontagrossense, publicou uma cartilha de orientação aos candidatos da região onde defende, literal e textualmente, a “suspensão do direito ao voto para beneficiados de qualquer programa de transferência direta de renda, nas esferas municipal, estadual ou federal”. O presidente da associação, Nilton Fiori, defendeu a iniciativa apelando a uma pretendida “lisura” nas eleições. Ecoando uma ideia distorcida, que circula principalmente pelas redes sociais, o empresário teme que programas de distribuição de renda acabem por favorecer principalmente os candidatos governistas, que teriam assegurado o voto dos beneficiados.

É claro que, apesar da menção às “esferas municipal, estadual ou federal”, a proposta da ACIPG mira, principalmente, o Bolsa Família e seus milhões de beneficiários que, a depender dos empresários e, parece, também de alguns candidatos locais, dispostos a bancar a sugestão da entidade de classe, teriam suspensos parte de seus direitos políticos. A proposta reverberou no Twitter e no Facebook do deputado estadual carioca Carlos Bolsonaro, filho do deputado federal Jair Bolsonaro, que a repercutiu em suas redes sociais. Mas, não satisfeito, ele decidiu expandir a ideia original, acrescentando a ela um adendo.

Em um tweet, o deputado defendeu condicionar a inclusão no programa “às cirurgias de laqueadura e vasectomia”; em sua página no Facebook, livre das amarras dos 140 toques, ele explicou melhor: “Defendo a liberdade de escolha, normatizando, orientando e condicionando o recebimento de bolsa-família à realização de cirurgias de laqueadura e vasectomia”. E arremata: “em certo tempo estancaríamos a ferida econômica aberta no Brasil e ainda estaríamos ajudando à curar a fome, a miséria e a violência no país.” A uma seguidora que defende também a criação de uma “lei do filho único” ele replica: “A diferença é que com nossa proposta a cirurgia é uma escolha do cidadão, respeitando assim a sua liberdade individual!”. Não, você não leu errado: segundo Bolsonaro, apesar do Estado normatizar, orientar e condicionar o recebimento de um benefício à esterilização dos futuros beneficiados, tudo será feito em “defesa da liberdade de escolha” e da “liberdade individual”. Mais que um contrassenso, um horror.

GUERRA CONTRA OS FRACOS – Já não me surpreende, mas continua a incomodar, a maneira como as tímidas políticas de inclusão social vem sendo tratadas por muita gente. Normalmente fruto da desinformação e do preconceito, tem proliferado com assustadora rapidez um discurso que insiste em condenar parcelas da população a uma espécie de sub-cidadania, justamente quando há um esforço republicano por arrancá-las de lá. Mas ainda não tinha lido nada parecido com a proposta de Carlos Bolsnaro, nem tão preocupante. Mas a “guerra contra os fracos” não é um fenômeno novo. E tem um nome: eugenia.

Impulsionadas pelas teses naturalistas surgidas ainda nas primeiras décadas do século XIX, as teorias eugênicas se desenvolvem ao longo da segunda metade do oitocentos. Em seu cerne, a concepção da evolução humana como resultado imediato de leis biológicas e naturais que determinam o comportamento humano. As raças se constituiriam como o fenômeno final e resultado irredutível do processo evolutivo, no interior do qual se configuraram e cristalizaram as desigualdades. Esta naturalização das diferenças legitimou um conjunto de proposições com desdobramentos políticos bastante significativos: se as desigualdades são racialmente determinadas e estruturadas na natureza das populações, é possível asseverar a superioridade de uma raça sobre outras, mesmo a um nível mais cotidiano, afirmando a continuidade entre os caracteres racialmente determinados e a conduta moral dos indivíduos, por exemplo.

Amplamente aceita pela comunidade científica, a eugenia orientou igualmente ações políticas e governamentais já nas primeiras décadas do século XX. Nos Estados Unidos, por exemplo, estima-se que pelo menos 70 mil americanos foram esterilizados compulsoriamente, a maioria mulheres. A política de esterilização em massa seduziu também cientistas e políticos brasileiros. Uma das principais bandeiras da Sociedade Brasileira de Eugenia, criada pelo médico paulista Renato Kehl, era a revisão do Código Civil, no sentido de autorizar o Estado a proibir o casamento entre indivíduos que apresentassem o risco da geração de filhos que pudessem apresentar alguma tendência à degenerescência, exigindo como garantia de uma boa prole a esterilização do casal.

Mas ninguém levou a eugenia tão longe quanto a Alemanha nazista. Os esforços americanos chamaram a atenção de Hitler, que tratou de aprimorar as tecnologias de eliminação dos indesejados, elevando-as a parâmetros industriais. E não é demais lembrar que, antes da guerra e dos campos de concentração, os nazistas a praticaram com a aprovação invejosa dos americanos. Superintendente de um hospital na Virgínia, o Western State Hospital, Joseph DeJarnette declarou, em 1934, que “Hitler está nos vencendo em nosso próprio jogo”. Os anos seguintes mostrariam os resultados trágicos e bárbaros deste placar.

DO BIOLÓGICO AO SOCIAL – Não faltarão comentaristas, provavelmente anônimos, a me acusar de “exagero” no trato da questão. Pouco importa o que pensam, principalmente se o que pensam justamente legitima esse rebaixamento dos já subalternos a uma subalternidade ainda mais aterradora. A ausência do componente biológico, fundamental às doutrinas de pouco mais de um século atrás, não ameniza o conteúdo dos discursos da ACIPG e de Carlos Bolsonaro. Ambos direcionam seu arsenal exatamente para os mesmos grupos e indivíduos que estavam na mira das políticas eugenistas de há um século: pobres e despossuídos sejam de recursos econômicos ou políticos. 

E como ontem, encontram um ambiente e interlocutores dispostos a respaldar e legitimar o ressentimento e o ódio, sentimentos que estruturam suas propostas, como os principais afetos políticos. Homens e mulheres que assistiram, em uma conivência silenciosa, a ofensiva das forças conservadoras e fascistas, o fizeram em parte movidos por um medo e um temor diuturnamente tecidos e alimentados justamente pelas forças conservadoras e fascistas que tinham todo o interesse em produzi-los e alimentá-los: fundamentalmente, o medo e o temor do outro em suas múltiplas mas sempre estranhas e desconhecidas facetas. No passado, apenas depois de testemunhar o horror muitos perceberam as implicações do monstro que ajudaram a nutrir. Hoje, a serpente continua a chocar seus ovos. Me pergunto até onde continuaremos a alimentá-la, coniventes e, graças principalmente às redes sociais, já nem tão silenciosos.  

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Alguma coisa acontece entre a Beira-rio e a São João

Meme em resposta à campanha anti-pixo
POR FELIPE SILVEIRA 

Dois acontecimentos me chamaram a atenção nesta semana. O primeiro é a terrível campanha anti-pixação da prefeitura de Joinville. O segundo é o terrível ataque da pm paulista aos sem-teto da Ocupação São João. Vamos falar sobre eles...

Deve estar em algum lugar do diário oficial o valor gasto com produção e veiculação da campanha anti-pixo. O vídeo custa caro e o custo de divulgação em outdoor, rádio, TV e jornal custa uma fortuna, vocês sabem. E, apesar de não ser contra a propaganda institucional, me espanta que as prioridades sejam estas. Tanta coisa para trabalhar a conscientização da população e a gente se depara com essas coisas.

Tenho pra mim que a motivação da guarda dohleriana não está no tipo tradicional que também é atacado de tempos em tempos. Acredito que as claras mensagens políticas (o pixo tradicional, estilizado, também é político, mas aqui falo de outro), sobretudo feministas, que surgiram nas paredes e muros da região central nos últimos meses tenham causado tão onerosa reação.

No governo de Dohler, não importa se a cidade está às escuras, esburacada, com obras paradas, plano municipal de cultura desrespeitado... O que importa é que em nenhuma parede esteja escrito que “outro mundo é possível”.

Nada disso surpreende. Udo Döhler fala e trabalha para satisfazer um grupo de cidadãos muito específico, que deve ter vibrado ao dar de cara com a campanha no seu jornal favorito.

É um tipo que também deve vibrar com as cenas vistas na capital paulista nessa quarta. Fico me perguntando se tem algo que dá mais prazer a certas pessoas do que ver sem-tetos serem despejados. Duvido.

Para quem não sabe, a polícia cumpriu, com muito gás lacrimogênio, uma reintegração de posse na capital paulista. Cerca de 200 famílias ocupavam o prédio há seis meses, sendo que este estava abandonado há dez anos. Não é curioso que ninguém tenha se incomodado com o prédio vazio nos nove anos e meio anteriores?

Não é curioso que as pessoas não se incomodem com as casas e terrenos vazios que descumprem a constitucional função social da propriedade? Que não se incomodem com a invasão quando ela é feita pelos ricos? Que não se incomodem com a especulação, com o rentismo, com o abuso de autoridade, com o preconceito, com a cidade às escuras, com a falta de água?

Não! A gente gosta de ver família sem teto, criança chorando por causa de gás lacrimogênio, gay assassinado e campanha contra o pixo, pois o pixo, ah, o pixo já é vandalismo!

terça-feira, 16 de setembro de 2014

Os dois maiores marxistas do mundo

Karl e Groucho Marx

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Um deles é marxista e tende para o marxismo. O outro é um marxista que tende para a anarquia (não confundir com anarquismo). Os dois viveram em tempos diferentes e já foram desta para... para lugar incerto. Acontece que um era ateu e não acreditava nesse papo de vida após a morte. O outro não levava essa coisa de morrer muito a sério. Mas vamos ficcionar* um encontro entre dois dos maiores marxistas da humanidade: Karl Marx e Groucho Marx numa mesa de bar.

Karl Marx – Senta aí, Groucho. Vamos conversar...
Groucho Marx – Antes de começar a falar, tenho algo importante a dizer...
Karl – Com calma, temos tempo. Queres beber alguma coisa? Comer um bife? Ou és vegetariano?
Groucho – Não sou vegetariano, mas como animais que são. Posso comer e beber, mas não pago. Pagar a conta é um costume absurdo.
Marx – Dinheiro, sempre o dinheiro, Groucho. A propriedade privada tornou-nos tão estúpidos e limitados que um objeto só é nosso quando o possuímos.
Groucho – É por isso que morreste pobre. Aliás, sabes que o segredo do sucesso é a honestidade. Se conseguires evitá-la, não tem erro...
Karl – O dinheiro é a essência alienada do trabalho e da existência do homem.
Groucho – Tens razão, Karl. Há muitas coisas na vida mais importantes que o dinheiro. Mas custam tanto.
Karl – O dinheiro não é tudo. E, cá para nós, o declínio da sociedade burguesa é inevitável. Por que não te juntas aos comunistas?
Groucho – Nem pensar. Não entro para clubes que me aceitam como sócio.
Karl – Sabes que o capitalismo gera o seu próprio coveiro.
Groucho – Não fales em coveiros. Eu pretendo viver para sempre... ou morrer tentando.
Karl – Tenta entender. O comunismo não é para nós um estado que deve ser estabelecido, um ideal para o qual a realidade terá de se dirigir...
Groucho – Não concordo. E estes são os meus princípios. Mas se não gostas deles, eu tenho outros.
Karl – Te liga, Groucho. Podes crer... a revolução é o motor da história.
Groucho –  Claro. Todo mundo precisa crer em algo. Portanto, creio que vou tomar uma cerveja.
Karl – És duro na queda. A tua falta de fé é muito sólida. Mas lembra: tudo o que é sólido desmancha no ar.
Groucho – Então vamos beber aquela cervejinha, que é líquida. E fazer um brinde às nossas esposas e namoradas: que elas nunca se encontrem.
Marx – Não brinca com isso. Sabes que o meu casamento com a Jenny sempre esteve acima dessas coisas.
Groucho – Sim. O casamento é uma bela instituição. Naturalmente, se você gostar de viver numa instituição. Aliás, fui casado por um juiz... eu deveria ter pedido um júri.
Karl – Ora, Groucho, isso é como tantas outras coisas. Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem sob circunstâncias de sua escolha...
Groucho  Diz aí, Karl, tu vivias metido em política, viveste muito tempo fora de casa, no exílio e até na cadeia... e tiveste seis filhos? Ah... e ainda tiveste tempo para engravidar a empregada? Imagina se trabalhasses em casa...
Karl – Eu nego essa coisa da empregada. 
Groucho – Também corri atrás de uma garota por dois anos, apenas para descobrir que os seus gostos eram exatamente como os meus: nós dois éramos loucos por garotas. Mas sou solidário contigo.
Karl – É... mas o caminho do inferno está pavimentado de boas intenções.
Groucho  Boas intenções? Tu não assumiste a criança. O Engels é que perfilhou o moleque. Aliás, esse sim é um amigão...
Karl – É um companheiro de luta. Os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de diversas maneiras, mas o que importa é modificá-lo. Ele percebeu isso. E fez muito por mim.
Groucho  Mas é como eu sempre digo: ninguém é completamente infeliz diante do fracasso do seu melhor amigo.
Karl – Olhaê... vou nesssa. Prazer em conhecer...
Groucho – Prazer? Ora… conheço Groucho há anos e não tive prazer nenhum nisso.

* texto construído a partir de falas ou escritos dos dois (com as devidas liberdades poéticas).


Corra que a polícia vem aí!


segunda-feira, 15 de setembro de 2014

O karaokê aqui do lado

POR JORDI CASTAN

Morar numa área residencial em Joinville está cada vez mais difícil. Aos poucos, as áreas exclusivamente residenciais estão sumindo. Aqui perto da casa há um karaokê que todas as noites fustiga toda a vizinhança com a cantoria dos seus clientes. Reclamar? Para quê? Para quem? A Fundema, a Seinfra e os demais setores responsáveis da Prefeitura autorizaram e deixaram de fiscalizar.

Que não cumpra a legislação municipal sobre silêncio parece não importar a ninguém. A Polícia Militar tem sido mais amável e, quando a coisa passa do ponto, especialmente nos finais de semana, depois de muita insistência, tem agido. O problema é tanto do som, que à noite se espalha muito mais e com maior nitidez, alcançando mais de 500 metros de raio, como o fato que o karaokê não tem nenhum tipo de controle de qualidade e permite que qualquer um possa fazer uso do microfone. Como resultado, os que pior cantam são os que mais tempo o fazem, gritam mais alto e perturbam a paz e o sossego dos que gostariam de dormir depois da meia-noite.

Pretender que se respeite o limite de decibéis depois das 22 horas já sei que é utópico em Joinville. Numa cidade que autoriza a construção de galpões, que posteriormente serão ocupados por indústrias, comércios e todo tipo de atividades barulhentas em áreas residenciais, que se pode esperar? Uma Joinville que se omite de fiscalizar - e que vai crescendo de forma desordenada - não é o melhor exemplo.

Quando a situação fica crítica de verdade, aprovam-se leis, com o nome do vereador autor da ideia, para regularizar tudo aquilo que foi executado em desconformidade com a legislação. Se concede, assim, uma ampla anistia e se perpetua a cultura do fazer errado e legalizar ou regularizar depois. Como resultado temos uma "lei Cardozinho", para regularizar tudo o que sabidamente foi feito de forma irregular. E agora se debate a necessidade de aprovar uma lei para regularizar tudo o que as igrejas, salões paroquiais e outras instituições assemelhadas fizeram de errado e em desacordo com a lei. E são essas instituições as que primeiro deveriam dar o exemplo.

Assim Joinville vai ficando cada dia um pouco pior, com ferro-velho ou galpões de reciclagem operando irregularmente na zona rural e, depois, servindo de motivo para regularizar o que é ilegal. Construções ocupam irregularmente recuos ou têm alturas superiores às permitidas, mas serão legalizadas pela bondade de uns e pagamento de uma taxa que os redimirá de todos os pecados.
A nova LOT avança neste caminho de propor uma cidade mais conflituosa.  De legalizar muito do que está errado, o que acaba incentivando a fazer o que deveria ser exceção, acaba se convertendo em regra e os infratores acabam beneficiados. Se hoje já é difícil, no futuro será impossível conviver com o barulho, os incômodos e o desconforto.

A única fiscalização que tem agido com firmeza e independência é a da Vigilância Sanitária. A fiscal Lia Abreu tem se convertido num exemplo de como deve ser a fiscalização. O resultado é que constantemente é punida pela sua eficiência. E o seu trabalho tem sido dificultado com frequência, sem veículos e sem motoristas a fiscalização fica de pés e mãos amarradas. Quem ganha com a falta de fiscalização? Joinville não, com certeza.



Em tempo, se algum vereador tiver interesse em elaborar um projeto de lei que regule a qualidade da cantoria nos karaokês e impeça a bêbados e desafinados cantar depois das 22 horas terá o meu apoio incondicional. Imaginar que algum dos nossos vereadores fiscalizará a fiscalização é um sonho. Assim, as leis seguirão sem ser cumpridas... e quase todos felizes.

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

A xenofobia só atinge o pobre, o negro, o favelado?

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Após a experiência prática de algumas situações, e a leitura de manchetes de jornais (e seus respectivos comentários no facebook), encontro cada vez mais pessoas xenófobas. Segundo o dicionário Michaelis, xenofobia é a aversão a pessoas e coisas estrangeiras. Este fenômeno é crescente, e reproduz uma série de preconceitos. Entretanto, precisamos nos lembrar que a vida é um atuar migrante, uma adaptação às circunstâncias... e muitos esquecem-se disto.

Quando uma cidade quer controlar o seu crescimento populacional, por exemplo, é comum levantarmos notícias de Prefeituras que colocaram mendigos, profissionais do sexo, e demais pessoas pobres em ônibus e mandaram para alguma outra cidade, bem longe dali. Mas são as mesmas Prefeituras que querem mais empresas na cidade e mais executivos morando nela. Até que ponto a xenofobia atinge as mais altas classes de nossa sociedade?

A última onda xenófoba muito presente em nosso dia-a-dia atinge os haitianos. Após incentivos do governo brasileiro, vários deles estão vindo para o Brasil para ter uma vida diferente de seu país natal, que há décadas sofre com problemas políticos internos e uma grande desigualdade social. É um retrato muito parecido com a onda migratória dos anos 1800, quando alemães vieram para nossa região, fugindo do cenário catastrófico que estava a Alemanha pré-unificação. Ou semelhante aos italianos que vieram décadas depois, fugindo da Primeira Guerra e das poucas esperanças na Itália. São estes, inclusive, responsáveis por boa parte da herança étnica que temos aqui no sul do país, juntamente com os afro-descendentes, os ibéricos e a população indígena que aqui habita há muito tempo. Se olharmos mais recentemente, o forçado êxodo rural do século XX nas cidades brasileiras trouxe muita gente do interior para o litoral em busca de melhores oportunidades. O joinvilense médio não é o descendente germânico, mas, sim, uma mistura de várias etnias.

Os haitianos não vieram para invadir o país ou declararem guerra. Vieram para ter uma vida diferente e ocuparem postos de trabalho que geralmente não são ocupados por brasileiros. Há muitos municípios em que as Prefeituras locais criaram programas de atendimento específicos para estes migrantes, mas a população em geral ainda carrega um preconceito bobo, fantasiado de xenofobia. O executivo alemão que vem morar na região por causa da BMW não recebe o mesmo tratamento que o haitiano que expõe a sua trajetória de vida num jornal. O motivo: o primeiro é rico, o segundo é um "pobre coitado". Joinvilenses reproduzem há muitos anos piadas contra paranaenses, só pra citar um outro exemplo.

Infelizmente é uma praga que se espalha não só pela nossa cidade, mas por todas aquelas que sofrem grande crescimento demográfico. Dói demais escutar e ler pessoas com estes preceitos, esquecendo-se que, antes de mais nada, somos todos seres humanos nos adaptando às nossas diferenças, às nossas realidades, às nossas desigualdades. Somos todos migrantes em algum momento de nossas vidas, seja por nós mesmos ou nossos antepassados.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Outra vez o racismo

POR ET BARTHES

É ficção. Qualquer semelhança com personagens reais será mera coincidência.



“i”- “di”- “o” - “ta”

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

A torcedora do Grêmio que chamou o goleiro Aranha de macaco é racista. Ponto final. É um fato captado pelas câmaras de televisão e não permite atenuantes. Não permite? Como sempre repito, no Brasil tudo o que é proibido é moderamente tolerado. E o caso ganhou contornos ridículos, porque houve muita gente a tentar “branquear” (a palavra é proposital) a imagem da moça.

Ora, há pessoas a dizer que, afinal, ela não é tão racista. Tive mesmo o desprazer de encontrar uma pessoa - torcedora do Grêmio, mas supostamente esclarecida - a defender que não foi um ato de racismo, mas um arroubo da juventude. É um daqueles absurdos que só se respondem com outro absurdo. E apliquei a Lei de Godwin (se não sabe o que é, a Wikipedia traz um verbete) para acabar logo com a discussão.

O gesto da moça não tem a ver com a idade ou o calor do momento. É racismo. É ignóbil. É escroto. É só olhar para a foto - essa que publico aqui - e ver que ofender o goleiro foi  uma questão de escolha. Enquanto a moça se esguela a repetir a palavra “ma”-”ca”-”co”, a loira do lado, que parece ter a mesma idade, permanece em silêncio. Aliás, sem ser um especialista em leitura de feições, parece que está incomodada.

Mas o absurdo só tende a piorar. E não é que tem gente da imprensa à espera de um encontro entre Aranha e a torcedora racista? Mas a ideia não é discutir o tema racismo de forma séria. O que se pretende é produzir um espetáculo, levantar as audiências. Uma música dramática, uma lagriminha no canto do olho, um abraço entre o goleiro e a torcedora. E pronto. O Brasil chora com a reconciliação. Não há mais racismo.

O bom nesse episódio é que Aranha não topou. Porque há o risco - ridículo, volto a repetir - de se desenhar um quadro invertido. A mocinha ainda acaba por se tornar heroína. E, se bobear, o goleiro ainda acaba virando o vilão dessa história. Enfim, mantenho a minha posição de primeira hora: aos racistas, sejam mocinhas simpáticas ou não, o rigor da lei. Sem contemplações.

É como diz o velho deitado: “i”- “di”- “o” - “ta”.

terça-feira, 9 de setembro de 2014

O Estrangeiro e as Clandestinas


POR CAROLINA PETERS


A “Menina Zero” (M.O.).

Por esses dias eu lembrei uma história triste na qual há muito não pensava.

Era adolescente, época em que explodiu a onda dos Fotologs – uma espécie de instagram rudimentar, um tanto mais próxima dos blogs, que se iniciavam no mesmo período. Estudava em um colégio católico bastante tradicional, líamos Capricho, namorávamos “sério” e nunca falávamos sobre sexo. Começamos uma semana chuvosa com a notícia da morte de uma menina um ano mais velha que eu. Não a conheci pessoalmente nem lembro seu nome, mas era muito amiga de amigas minhas, o que tornou a morte mais próxima. O laudo oficial falava em “infecção generalizada”.

Foi uma história conturbada, daquelas que com o passar dos anos se tornam quase lendas urbanas e que nos dias que seguiram o velório levantou inúmeras conspirações pelos corredores. Diziam as amigas que ela tinha um namorado problemático, falavam em drogadição. Não sei quem era, se era mal sujeito, ou se não gostavam dele porque não fazia parte dos nossos círculos. O pai da menina morrera dias antes, um ataque cardíaco fulminante. Era jovem ainda, não devia ter cinquenta anos. No dia do enterro, o ex-namorado invadiu seu fotolog da menina e postou uma imagem de sapatinhos de tricô, daqueles de bebê. Os menos chegados e mais fofoqueiros que estiveram presentes no velório relataram um corpo inchado, sobretudo no abdome. E logo se espalhou da forma mais desonesta possível o rumor de que M.O. fizera um aborto.

Lembro da reação de minhas amigas – nossas amigas – negando a história, e achando o mais absurdo do mundo a difamação que sofria a morta. Para mim, ambos buscavam anular a existência daquela menina: os que a condenavam – e que foram cúmplices desse assassinato; e as que julgavam proteger, quando negavam a essa jovem mulher o direito da escolha e arbítrio sobre seu corpo. Mais uma camuflada na cifra dos abortos clandestinos no país.

Das poucas menções ao debate do aborto que me lembro nos tempos de colégio, nenhuma trazia dados, posições distintas, textos de apoio. Foram homens, párocos, professores de Ensino Religioso, que de maneira cretina passavam de raspão sobre o tema evitando polêmica; mas ideologicamente certeiros para carimbar a posição: o aborto é um crime contra a vida. No limite, ela(s) merecia(m) morrer?

E o que mais me instiga, já longe de Santa Catarina física e moralmente, era saber que essa menina, a amiga da minha amiga que estudava ali, na sala ao lado, é o ponto fora da curva na estatística alta de mortes decorrentes de abortamento no Brasil. Ela tinha todas as condições financeiras e acesso a equipamento hospitalar para recorrer a um procedimento seguro e anônimo. Quem sabe hoje estaria se formando na faculdade, aceitando um pedido de casamento. Planejando, agora sim, engravidar.

Quantas naquele colégios – nesses colégios tradicionais catarinenses – não deveriam ter feito um aborto? Ou pensado sobre isso num eventual atraso da menstruação? Distante, a morte me parece a consequência lógica de outra história do mesmo período, da menina que esperou o oitavo mês de gestação e uma consulta ginecológica forçada pela mãe – preocupada com a interrupção abrupta no ciclo menstrual da filha – para se declarar grávida.

Se o sexo deixa de existir quando não falamos dele, a vida não pode existir tampouco.

A “Mulher Zero”.
Jandira Magdalena dos Santos talvez agora seja não mais que um corpo carbonizado. Ela tinha o dinheiro (quase R$5mil) para abortar, mas esbarrou na clandestinidade e agora seu rosto estampa jornais e portais de notícia.

Jandira é uma das cerca de um milhão de mulheres brasileiras que decidem interromper a gestação. O número é impreciso devido à ilegalidade que impede uma pequisa mais aprofundada, mas há uns anos, pesquisadoras da UnB divulgaram um estudo interessante sobre o perfil dessas mulheres que optam por realizar um aborto são em sua maioria casadas, cristãs, têm mais de trinta anos. As cerca de um milhão de mulheres que abortamos no Brasil podemos ser eu, sua irmã, mãe, tia. Você.

Pode ser inclusive a vovó. E de quantas avós já ouvi histórias... Não há quem não conheça uma mulher que já fez um aborto. Mas acima da idade; das crenças pessoais; do relacionamento estável ou não; de já terem filhos ou não; das condições financeiras, o ponto em comum entre todas elas é a convicção de que têm o direito de ser mães. E como direito, essa é uma escolha delas, não do Estado ou de qualquer religião. A maternidade não é um karma, uma sina, mas uma escolha consciente que as mulheres tomamos. Porque somos sujeitos de nossa própria história. Porque somos gente.

O Estrangeiro.

Assistindo aos debates e ao horário eleitoral, me senti relendo O estrangeiro, de Albert Camus, em uma versão esteticamente pobre. Aos que nunca leram, ou que por ventura não tenham entendido o texto, se trata da história de um homem condenado à morte por não enlutar a mãe. O homem se torna réu pelo assassinato de um árabe, mas este não passa de um episódio secundário que dá corda à trama. A ação principal não é senão a sobreposição do código moral individual sobre o plano público, o qual deveria ser regido por um código autônomo de forma a garantir igualdade de julgamento a todos os indivíduos, independente de suas convicções íntimas – ou antes, as convicções de seus juízes.

O discurso obscurantista que criminaliza e demoniza a Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) é um discurso que criminaliza unicamente as mulheres, como se sua gestação fosse fruto de autogênese. Que submete mesmo aquelas que passam por abortamentos espontâneos, em hospitais públicos e privados de primeira linha, a um atendimento vexatório, negligente. Humilhante. É o discurso que coage famílias simples de crianças estupradas a obrigar essas meninas a seguir com uma gravidez que seus pequenos corpos e mentes infantis não têm condições de gestar. Que dificulta o acesso de uma gestante ao aborto legal – previsto por lei – para que possa dar sequência a um tratamento de saúde emergencial. É um discurso de ódio, que faz das mulheres cidadãs de segunda categoria. O discurso que diz defender a “vida”, defende que nossa vida, a vida das mulheres, valha menos ou quase nada.

Que fique claro aos que se chocam com os vídeos enganosos que circulam pela rede: um feto formado vai nascer. Nossa defesa do aborto considera as semanas iniciais da gestação, entre 12ª e 14ª, conforme exemplos que temos pelo mundo. Enquanto o embrião ainda é dependente do corpo da mulher para sobreviver, ou seja, não tem existência autônoma. Aos curiosos em saber como se parece, sugiro esse link aqui.

Legalizar o aborto não é forçar ninguém a violar suas crenças pessoais. É tratar um grave problema de saúde pública que mata e mutila centenas de mulheres todos os anos, e assegurar dignidade e direito de escolha a todas nós.

"A fazedora de anjos", 1908: tríptico de Pedro Weingärtner, do acervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo, retrata o aborto na virada do século XX. De perto é impressionante.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Dar uma espiada em Arapongaville

POR JORDI CASTAN

Era uma vez na sambaquiana capital do reino dos manguezais. O burgomestre andava fascinado com a segurança, ao ponto de criar uma secretaria de segurança sui generis. Sonhava ver os seus agentes uniformizados desfilando garbosos e armados - e bem armados. Acreditava que aí sim a segurança de Arapongaville estaria resolvida. Roubos, assaltos e outros crimes diminuiriam porque a sua pomposa guarda municipal traria a tranquilidade para os arapongavillenses, coisa que nem a Policia Civil, nem a Policia Militar tinham conseguido garantir.

Mas enquanto a sua guarda local não começava o seu patrulhamento ostensivo - e enquanto a segurança de fato não melhorava - o burgomestre decidiu dedicar-se a curtir o seu brinquedo mais novo: a belíssima “Central de Arapongagem da Estrela”. Um brinquedo lindo, equipado com o último grito na tecnologia da bisbilhotagem. Não havia telefone fixo nem celular que não pudesse ser grampeado. Não havia secretário que não tivesse a sua agenda esquadrinhada com atenção. Nada escapava ao olhar implacável da dita central.

Os relatórios seriam detalhados. Quem? Quando? Onde? Com quem? O que? A que hora? Quanto tempo? Lembravam os da Stassi (Ministerium für Staatssicherheit, MfS) da antiga Alemanha Oriental, a policia política do ex-presidente Erich Honecker, que acumulou toneladas de relatórios, dezenas de milhares de horas de gravações, milhares de terabites de informações inúteis. Informações que incluíam desde receitas de bolo a medidas da roupa interior dos amantes do regime, passando pelo número de colheres de açúcar que uma determinada pessoa colocava no cafezinho.

Só havia um problema. Havia quem dissesse que o velho general estaria usando os recursos públicos do orçamento municipal para bisbilhotar. Muitos diziam: se quisesse brincar de James Bond dos manguezais com o seu patrimônio, tudo não passaria de uma excentricidade de um velho gagá que nunca superou a sua fascinação pelas marchas militares prussianas e crente de que ordem é progresso. Mas dedicar recursos públicos, tempo dos funcionários e o próprio tempo que seria destinado a resolver os problemas de Arapongaville preocupava e entristecia os arapongavilenses. Porque o velho general não percebia o ridículo da imagem de um coscuvilheiro de pijama e pantufas lendo mexericos da vida alheia, como quem acompanha, sem perder detalhe, o enredo a novela das oito. 


Mas esta história, como uma novela das oito, é ficção.

sábado, 6 de setembro de 2014

Putin, Putin, Putin

POR ET BARTHES

Sempre que um post tem o nome de Putin, de repente aparecem leitores na Russia e na Ucrânia (Ukraine). Então hoje vamos testar, para ver se eles aparecem. Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin, Putin. Enough?

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

O povo está oficialmente fora do Conselho da Cidade

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

O que acontece em Joinville nos últimos anos, principalmente quando falamos sobre planejamento urbano, vem em uma corrente totalmente contrária ao que acontece de mais moderno pelo mundo todo. Enquanto muitos lugares avançam, nós regredimos. E regredimos muito, inclusive em aspectos básicos de nossa democracia.

Quando em 2013 se questionou a Conferência da Cidade, momento em que somente cidadãos com CNPJ ou estatuto social poderiam se candidatar a delegados para o Conselho da Cidade, percebemos que algo não estava de acordo com os preceitos legais e teóricos sobre o assunto. Só se elegeu para o Conselho da Cidade quem fazia parte de alguma entidade, associação ou OSCIP. Foi privado de seu direito todo o qualquer cidadão residente na cidade, rasgando o que diz o Estatuto da Cidade:

Art 1, II - gestão democrática por meio da participação da população E de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;


Art. 45. Os organismos gestores das regiões metropolitanas e aglomerações urbanas incluirão obrigatória e significativa participação da população E de associações representativas dos vários segmentos da comunidade, de modo a garantir o controle direto de suas atividades e o pleno exercício da cidadania. (Grifos nossos)

O Conselho da Cidade foi, então, questionado, mas mantido através de decisão judicial. De acordo com algumas inobservâncias do Estatuto nas decisões judiciais, alguns recursos foram proferidos pela sociedade civil, com algumas respostas positivas (principalmente através de recursos em Florianópolis) e outras frustrantes. Uma das mais mais contrárias à participação popular aconteceu nesta semana.

Quando a ação popular questionou o fato da não-participação da sociedade civil nas reuniões do Conselho da Cidade, o Juiz Roberto Lepper, da 2a. Vara da Fazenda Pública de Joinville, sentenciou que a população "comum" não deve ter acesso às reuniões do Conselho da Cidade, já que ela não tem direito a voz e nem a voto. Segundo a decisão:

não há porque determinar-se aos réus que garantam que as reuniões do Conselho da Cidade e de seus órgãos fracionários sejam abertas ao público e a qualquer do povo, com direito a voz etc, cumprindo- lhes apenas a observância das regras previstas no Regimento Interno. (Grifo nosso)

Todavia, há algumas considerações a se fazer:

a) Os conselheiros eleitos, mesmo que com o CNPJ, tiveram votos da população "comum", após a garantia deste via ação popular pós-Conferência da Cidade em 2013 (se dependesse da prefeitura de Joinville nem isto teria acontecido);

b) Como há uma representação não só das associações representativas dos segmentos, mas também da sociedade civil num geral, nada mais justo que a abertura das reuniões para a população aconteça como forma de fiscalização social e acompanhamento dos trabalhos dos representantes eleitos (mesmo que, ao nosso ver, de forma antidemocrática pela obrigatoriedade de uma representação associativa) na gestão democrática da cidade de Joinville. É assim que funciona com qualquer órgão representativo: Câmara de Vereadores, Assembleia Legislativa, etc.;

c) O Regimento Interno diz que todas as manifestações são registradas em ata e isto, para o magistrado, já vale como instrumento de observação do que acontece nas reuniões do Conselho da Cidade. Como proceder em casos como o do ex-conselheiro Juarez Vieira, onde suas manifestações contrárias ao modelo de análise da nova Lei de Ordenamento Territorial foram omitidas das atas oficiais, mesmo com a sua ênfase para que constasse o registro por escrito?

Está muito evidente que algumas situações estão indo contra aos preceitos mais modernos de participação popular e gestão democrática da cidade. A população deve, sim, ter acesso a todas as ações públicas, especialmente quando estas forem tomadas em Conselhos e demais canais participativos. Cercear a participação popular nestes órgãos é, em minha visão, ceifar anos de construção popular em torno do planejamento urbano participativo, além de declarar abertamente que existe medo em torno da pressão popular que pode existir nestas reuniões, mesmo somente com sua presença física, sem direito a voz e nem a voto. Ou seria aceitar, de forma implícita, que há algo para ser escondido e que a população não deve saber?

É por estas e outras que a justiça se torna um agente determinante na construção das cidades, e o foco sob sua atuação deve ser aumentado, evitando, ao longo dos anos, que casos como este apresentado tornem-se menos comuns como atualmente. A flexibilização da lei não deve acontecer a favor de ninguém, muito menos aos grupos dominantes do cenário político-financeiro e aos grupos do capital imobiliário-construtivo.

Obs: a íntegra da decisão pode ser obtida em www.tjsc.jus.br, autos número 0803258-37.2014.8.24.038.