sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Você lembra? Em 2011, Darci, Nilson e Clarikennedy usaram diárias para "visitar" Joinville

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Quatro anos passam muito rápido. Entretanto, algumas coisas que aconteceram neste período são rapidamente esquecidas, principalmente quando o assunto é política e a atuação de nossos representantes. Em 2011, nos primeiros meses do blog, publicamos documentos públicos que comprovavam o uso de diárias por deputados estaduais (neste caso Darci de Matos, Nilson Gonçalves e Clarikennedy Nunes) para "visitar" Joinville, mesmo sendo esta a cidade de residência dos parlamentares. Ou seja, uso de verba pública para estadia na cidade de residência.

Na época o assunto foi muito comentado, e o post original (que você pode ler na íntegra clicando aqui) esteve, durante muito tempo, como líder de acessos no blog Chuva Ácida.
Agora, os três tentam a reeleição para uma das 40 vagas na Assembleia. É nosso dever relembrar o caso.

***

Como diria Galvão Bueno, haja coração amigo! Pode ler o título deste post novamente se quiser. É tudo procedente, bizarro, e acontece diante de nossos olhos. Graças a um leitor assíduo de nosso blog e muito atento aos bastidores políticos (ele poderia muito bem seguir a linha do jornalismo investigativo), fiquei sabendo dessa prática na Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina.

 Ao pesquisar as diárias que Darci de Matos, Clarikennedy Nunes e Nilson Gonçalves receberam neste ano de 2011, me surpreendi com as várias diárias para “visitas” a Joinville. Mas, tem um detalhe: é sabido e certo que eles moram em Joinville e tem aqui o domicílio eleitoral. Como classificar esta atitude? No mínimo é um mau uso do dinheiro público. E o outro detalhe: R$ 670,00 para cada diária!! Presume-se, portanto, que o deputado estadual sai de sua casa, toma café, almoça, janta e dorme num hotel de Joinville e o cidadão desembolsa esse valor todo. Não nos esqueçamos que cada um tem uma verba de gabinete gigantesca, carro com motorista, auxílios para deslocamento entre sua cidade de moradia e Florianópolis para acompanhamento das sessões, e várias outras mordomias que o título de deputado estadual impõe. E ainda tem deputado estadual que é demagogo ao ponto de defender a redução no número de vereadores.

 Os documentos oficiais da Assembleia provam tudo. Quero ver a desculpa deles agora. Não sou contra o auxílio para viagens, elas devem acontecer. Mas só para um lanche e um almoço. Ponto. Esse valor todo para uma diária é um absurdo, caro demais. E olha que nem pesquisei sobre as diárias de nossos Senadores e Deputado Federal aqui da região de Joinville.

 Abaixo seguem os prints dos documentos, e aí, cada um que tire sua conclusão. Inclusive os que acham que os integrantes do Chuva Ácida só “batem” sem fundamento e com parcialidade. E ah! Como eu gostaria de ter acesso ao obscuro mundo do Judiciário, o menos transparente dos três poderes. Quem sabe um dia, Charles... quem sabe um dia...




Observação: algumas imagens estão com link quebrado e não conseguimos recuperar. Entretanto, a consulta pelas diárias destes deputados pode ser realizada pelo seguinte link: http://transparencia.alesc.sc.gov.br/diarias.php

Observação 2: como o post foi em 2011, quando eu ainda trabalhava como comentarista político na rádio MAIS FM (103,1), as respostas de Darci de Matos e Clarikennedy Nunes foram veiculadas naquela emissora. A resposta se baseou em negativas de ambos, e creditaram o fato ao sistema da Assembleia, pois era obrigatório constar todas as cidades por onde o deputado passava. Nilson Gonçalves, à época, não se manifestou. 

Observação 3: A denúncia feita pelo blog acarretou em uma mudança no sistema de diárias. Hoje não se encontra mais a cidade de residência do deputado em qualquer relatório de diárias, e sim "região norte de SC", no caso dos deputados deste post. 

Observação 4: ao procurar pelas diárias do deputado Darci de Matos no dia de ontem, este blogueiro percebeu que todos os seus dados sumiram do sistema.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Marina é uísque paraguaio

POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO


O fato aconteceu nas praias do Algarve há alguns anos. Os banhistas viram uma barra altíssima a levantar no horizonte e fugiram, crentes de que era um tsunami a avançar. Mas o tempo passou e a tal onda gigante nunca chegou à praia. Depois as autoridades esclareceram ser um alarme falso – criado pela multidão na praia – e que era uma simples camada de neblina. O fenômeno ficou conhecido como o “falso tsunami”.

Por que contar essa historinha? É que tenho lido, nos últimos dias, muitos títulos a chamar Marina Silva de tsunami da política brasileira, em especial depois da recente pesquisa divulgada pelo Ibope. Mas será que podemos confiar nesses números? Em se tratando de institutos de pesquisa no Brasil é melhor não pôr a mão no fogo. Mas insisto na ideia de que os números refletem um momento em que ela está no olho do furacão.

Não quero opor intuições pessoais aos resultados das pesquisas. Mas não acredito que esses números tenham lastro para aumentar ou mesmo para se manter nos atuais níveis. Pergunto: será que os brasileiros teriam coragem de entregar o governo a uma pessoa que não parece minimamente preparada, que tem uma história marcada por rupturas com os parceiros políticos e não consegue esconder um sem-número de contradições?


Eu diria que não. Marina Silva é como uísque paraguaio. Tem gente que toma acreditando ser autêntico, mas acaba com uma puta dor de cabeça no dia seguinte. E nada pior que uma ressaca que dura quatro anos. E esse filme nós já vimos. Jânio, Collor. De qualquer forma, arrisco a dizer que Marina Silva também é um falso tsunami que vai perder força e desaparecer antes de chegar à praia. Mas isso sou eu a torcer contra ela, claro.


É como diz o velho deitado: "Com Marina, a coisa é simples. O Brasil passaria de país emergente para país submergente. Não tem como errar".

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Da política da TV e da política da rua

POR FELIPE SILVEIRA

O primeiro debate dos presidenciáveis, que ocorreu na Band, na noite de terça-feira, 26 de agosto, não trouxe nenhuma novidade para quem já estava acompanhando as eleições. Confirmou Dilma, Marina e Aécio na disputa a tapa pelo voto, ainda mais porque o formato proposto pela emissora beneficiou os candidatos em evidência. Confirmou também o pastor Everaldo como o doido que representa o pior da internet – contra o aborto, contra o casamento gay, pela privatização de tudo etc. Luciana Genro apareceu pouco e Eduardo Jorge, embora tenha levantado bandeiras importantes, foi levado na brincadeira por causa do seu jeito.

A Band também não colaborou quando seus jornalistas de direita fizeram perguntas. Um maluco perguntou sobre os plebiscitos “bolivarianos” para Dilma, usando termos que o Rodrigo Constantino adora. Como pode?

É por isso que acredito na democratização da mídia como a reforma mais urgente. Enquanto a principal fonte de informação do país for o Jornal Nacional e os similares das outras emissores, não teremos coberturas e debates sérios. Sobre eleições e sobre qualquer coisa.

Não discutiremos segurança, apenas ficaremos com medo; não discutiremos saúde, apenas vamos consumir fast food; não discutiremos mobilidade, apenas ficaremos presos dentro em engarrafamentos quilométricos; não discutiremos direitos, apenas os negligenciaremos. 

Contra o assédio no busão
Também não discutiremos o machismo como causa da violência contra as mulheres. Preferimos achar que a culpa é do tamanho da saia ou do decote. Em Joinville, pelo menos, este debate é feito pelo movimento feminista.

O coletivo Mulher na Madrugada realiza, nesta semana, dois eventos que fazem parte da campanha “Assédio Zero no Zarcão”, cujo objetivo é “desnaturalizar o assédio no transporte público, incentivar as mulheres a denunciarem os abusos sofridos nos ônibus de Joinville e cobrar políticas públicas”.

O primeiro evento ocorre nesta quarta, 27, às 19h15, no Anfiteatro 1 da Univille (Universidade Regional de Joinville). O segundo ocorre na quinta, 28, às 19h15, no Anfiteatro da Associação Educacional Luterana Bom Jesus/Ielusc. 

Muros que conscientizam e incomodam
Não é só a mídia que precisa mudar. Há muita gente que não quer a formação de cidadãos críticos, que lutem por seus direitos, inclusive nas escolas. O coletivo Pintelute realizou uma atividade, a convite de estudantes, em uma escola estadual de Joinville. O resultado é esse muro lindão aí da foto abaixo.

No entanto, o grupo informa que a escola quer transformar o muro numa parede vazia novamente. Não surpreende que tal mensagem incomode quem deseja manter tudo como está.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Suicídio eleitoral [2]

POR JORDI CASTAN


Há 40 candidatos a deputado estadual, com domicílio eleitoral em Joinville, mais outros 8 concorrendo pela região. A maioria nem se elegeria vereador se a eleição fosse hoje. Uma parte não conseguiria sequer se eleger representantes de turma. E há ainda os que não devem receber os votos necessários para ser eleitos síndicos num condomínio com seis pavimentos e dois apartamentos por andar.

A estes há ainda que somar os candidatos à Assembleia Legislativa pela região. São quatro candidatos por São Francisco do Sul, um por Itapoá, outros por Garuva, Araquari, Barra Velha e ainda deve ter um candidato por Barra do Sul. Ao todo oito candidatos a deputado estadual pela região. Quantos destes candidatos acreditam sinceramente que tem alguma chance de se eleger?

O quadro entre os candidatos à Câmara dos Deputados não é muito diferente. Só Joinville tem 21 candidatos, a maioria sem nunca ter sido eleita para outros cargos ou mesmo tendo disputado cargos eletivos para valer. Mesmo assim, não têm o menor problema em se lançar candidatos ao Legislativo, convertendo a campanha num bando de lemures, correndo aloucadamente em direção a um suicídio eleitoral. Sem ter a menor possibilidade, poluem a campanha, impedem um debate consistente e servem de escadinha a os candidatos de sempre, que se usam destes “tontos úteis” para continuar se elegendo. O que leva estes candidatos a lançar-se, mesmo sabendo que não tem a menor chance? É uma boa pergunta e com múltiplas respostas. Cada candidato tem a sua.

Porque é um suicídio eleitoral lançar tantos candidatos? Desde o ponto de vista dos partidos não há nada mais lógico, quantos mais candidatos, mais chances de eleger alguém. Por isso os partidos formam nominatas enormes, mesmo sabendo que a maioria dos candidatos está, na realidade, pleiteando só um emprego ou um cargo comissionado no futuro próximo e não cogita ou não tem a menor possibilidade de realmente se eleger. Os partidos se lançam na disputa pelo eleitor e novos partidos representam também  mais candidatos. Como exemplo, desde as últimas eleições surgiram cinco partidos novos: PSD, SDB, PPL, PEN e o PROS. E nenhum quer ficar sem lançar no mínimo um candidato no maior colégio eleitoral do estado. Resultado, uma enxurrada de candidatos.


Mas esse pessoal não sabe fazer contas? Ou não percebe que quantos mais candidatos menor a chance de eleger mais representantes de Joinville?  E a campanha "Vote por Joinville" não tinha como objetivo melhorar a nossa representatividade e para isso os partidos deveriam concordar em reduzir o número de candidatos? O papel da ACIJ nesta edição da campanha foi semelhante ao do Papa Francisco pedindo o fim da violência em Gaza e Israel. Totalmente inútil. Fez uma declaração,e nada mais. Achando que os partidos imediatamente reduziriam por própria iniciativa o numero de candidatos.

Achou a ACIJ que a política se rege pelos critérios da racionalidade e do bom senso. Sobrou estultice e faltou sair a campo e falar com os partidos e com os seus líderes. Cada partido - e principalmente cada cacique dentro de cada partido - tem os seu próprios interesses pessoais e são eles os que de verdade decidem todo o processo. Cada um faz as suas contas. E numa campanha curta, sem debates entre os candidatos a deputado e dependendo basicamente do tempo de televisão, no horário eleitoral gratuito os atuais deputados têm uma grande vantagem frente aos demais candidatos. Assim, na sua maioria os 40 candidatos por Joinville são meros coadjuvantes, numa grande peça de teatro em que o povo paga a conta e sofre as consequências. 

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

O legado de Colombo para Joinville

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Com as eleições de 2014 chegando, está na hora de algumas figuras políticas prestarem contas perante a sociedade. O político que precisa dar mais explicações à comunidade joinvilense é o atual governador Raimundo Colombo. Fugindo da discussão muito comum de que "Joinville é a maior cidade e merece mais do que as outras", pretendo, de forma introdutória, analisar o que Colombo deixa como legado para nossa cidade nestes seus quatro anos de governo.

Sendo assim, não existe, em minha avaliação, um governo estadual com resultados tão patéticos para a nossa cidade, superando inclusive as gestões LHS. Escrevo isto pois não é admissível, só para começar, que uma cidade tenha tantas escolas estaduais interditadas durante tão pouco tempo. Antes das aulas começarem em 2013, por exemplo, nove escolas estaduais estavam interditadas na cidade, sem condições de receber aulas. A atual gestão também fechou escolas, como o caso da EEB Monsenhor Scarzello. Soma-se as péssimas condições das escolas, e mais 4 anos sem a construção de nenhuma nova unidade estadual de ensino, mesmo que a população tenha avançado no período. Sem contar a greve dos professores em 2011 que durou 62 dias. Como lembrança, o ex-Secretário da pasta (Marco Tebaldi, de Joinville) é um político com extensa ficha suja.

Raimundo Colombo também é o gestor responsável pelo sucateamento da UDESC Joinville, por mais que isto seja um processo de muitos anos que vem piorando. Não houve, nestes últimos anos, um planejamento para que o campus fosse reformado ou que tivesse um plano de expansão de cursos e de infraestrutura. Um curso novo foi criado, mas os professores tiveram que "passar o chapéu" até acharem salas disponíveis para as aulas.

Colombo é o governador responsável pelos desastres ocorridos nas duas unidades de saúde em que o estado é responsável na cidade: Hospital Regional e Maternidade Darcy Vargas. No Regional, faltou água quente no chuveiro e uma pessoa morreu por falta de leito. Na maternidade, muitas denúncias na imprensa de que médicos estariam forçando mulheres a realizarem partos sem consentimento, e também foi noticiada uma carta de reclamação da classe médica para o Ministério Público, denunciando a falta de condições de trabalho. Tudo sob gestão de Dalmo Claro de Oliveira, "doutor", indicação de seus correligionários de Joinville, e com larga experiência na gestão da Unimed.

O binário do Vila Nova demorou anos para sair do papel. A morosidade das obras deveu-se, em grande parte, pela falta de verbas estaduais. E logo após a inauguração da obra, vários moradores reclamaram de que buracos e outros problemas estavam surgindo na via. Em nenhum momento Colombo conversou com os moradores, ou recebeu algum representante destes em seu gabinete.

Por outro lado, Colombo se mostrou como o governador das entidades empresariais, contrariando seu discurso de campanha em 2008, quando dizia que queria ser o "governador das pessoas". Até Esperidião Amin ouvia mais a comunidade joinvilense. Colombo foi constante nas reuniões e importantes solenidades de entidades como ACIJ, CDL e Ajorpeme. Entre discursos vazios e promessas para os empresários (como a duplicação da Avenida Santos Dumont), uma cidade com centenas de demandas sociais sem resolução.

O que acontece em Joinville certamente não se resume somente a esta lista que é apenas um debate inicial. E certamente não é uma realidade exclusiva desta cidade, pois representa problemas seguidamente noticiados em outras cidades e outras regiões de Santa Catarina, e cada um com sua peculiaridade. A patetice é tamanha que nada parece ter acontecido, de acordo com o conteúdo das primeiras semanas da campanha do atual governador. O legado, infelizmente, é de histórias tristes para a comunidade. Nada mais do que isto.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Mais do mesmo

POR CLÓVIS GRUNER

Na manhã seguinte à morte de Eduardo Campos, me perguntavam no programa de rádio onde, quinzenalmente, participo como comentarista, quais os eventuais desdobramentos de seu desaparecimento na campanha eleitoral. Ainda era muito cedo para qualquer prognóstico seguro, mas procurei destacar a dificuldade em consolidar sua candidatura como uma “terceira via” aos petistas e tucanos. Indagado sobre seu eventual sucessor ou sucessora, disse ainda que não vislumbrava outra alternativa aos “socialistas” além de indicar a vice, Marina Silva, como a nova candidata. Passada uma semana e com a candidatura de Marina Silva confirmada pelo PSB, não acho que meus comentários tenham sido despropositados.

O falecimento precoce de Eduardo Campos deixou em aberto se sua candidatura conseguiria, efetivamente, apresentar-se como uma alternativa aqueles eleitores que, descontentes com a bipolarização entre PT e PSDB, ainda assim pretendem escolher seu candidato dentro de limites ideológicos e programáticos mais convencionais. A nos pautarmos pelas pesquisas eleitorais, Campos não conseguira ir além de um acanhado terceiro lugar e havia, a meu ver, dois problemas que sua candidatura precisaria superar.

O primeiro era o caráter por demais regional de sua liderança. Mesmo que herdeiro de um espólio político significativo, o do avô Miguel Arraes, o ex-governador pernambucano enfrentava dificuldades para “nacionalizar” seu nome. Em parte porque, diferente de Aécio Neves, com trajetória em muitos aspectos similar, protelou tempo demais o necessário investimento para fazer-se conhecido além de seu estado e região. Além disso, Campos se viu enredado em uma dupla caracterização desabonadora às suas pretensões políticas. No discurso do PT ele passou a ser apontado como uma espécie de “sub-Aécio”; para o PSDB, sua passagem pelo governo petista era o pretexto ideal para colar nele o estigma da continuidade. Espremido entre petistas e tucanos, não teve estofo político para posicionar-se como liderança alternativa; era, independente do ângulo por onde o olhássemos, mais do mesmo. Jamais saberemos se, com a propaganda eleitoral e os debates, isso mudaria de forma significativa. Particularmente, acho que não.

O FATOR MARINA – Diante do inusitado que foi a morte de seu candidato, o PSB optou por confirmar o que, desde as primeiras horas após o acidente, já era cogitado. A indicação de Marina Silva como candidata à presidência foi confirmada, tendo o deputado federal e líder da bancada do partido na Câmara, Beto Albuquerque, como seu vice. A entrada de Marina na corrida presidencial embaralhou a disputa, o que já é alguma coisa em uma campanha que seguia morna, no limite da estagnação.

A reação raivosa de aecistas e dilmistas, incluindo o uso despropositado e infeliz de sua imagem no velório do ex-correligionário, deu o tom: pela primeira vez em meses, surge efetiva a possibilidade de um segundo turno; e Aécio Neves não está nele. Tucanos e petistas tem motivos para se preocupar: as primeiras sondagens indicam um empate técnico entre Dilma e Marina, e se Aécio corre o risco de ver naufragada suas ambições presidenciais, Dilma também precisa repensar estratégias se quiser continuar no Palácio do Planalto por mais quatro anos. Claro que a arrancada de Marina Silva está, em parte, ligada à comoção pela morte de Eduardo Campos; com o passar do tempo e acomodadas as manifestações emocionais mais imediatas, as reações podem ser outras.

Mas Marina não tem a seu favor apenas a tragédia que ceifou a vida de seu antecessor. A meu ver ela encarna melhor, para o eleitor médio, a tal “terceira via”, e pode apresentar-se como uma alternativa à bipolarização partidária que mencionei acima. Apesar de ter militado no PT por duas décadas, inclusive ocupando um ministério no governo Lula, ela conseguiu se descolar de maneira eficiente do antigo partido e do governo, principalmente depois de sua bem sucedida candidatura em 2010, quando obteve o terceiro lugar e algo em torno de 20 milhões de votos – pouco mais de 19% do total. Além disso, figura conhecida em todo o país – e isso é importante em uma eleição presidencial – ela não precisará “nacionalizar-se”, algo fundamental já que sua candidatura surge algo tardiamente em relação à de seus principais adversários.

FRAGILIDADES E CONTRADIÇÕES – Mas o “fator Marina” não foi submetido ainda ao crivo da campanha, onde suas fragilidades e contradições serão amplamente exploradas e expostas pelos seus dois principais adversários, como bem observou meu colega de blog, José António Baço. Em 2010, sua candidatura não representava uma ameaça a nenhum dos dois projetos em disputa; agora, ela ameaça ambos, e isso não escapará aos estrategistas do PT e PSDB. Neste sentido, os 20 milhões de votos conquistados na última eleição podem não garantir muita coisa, porque o contexto é radicalmente outro.

E não apenas o contexto: a Marina Silva de hoje também não é a mesma, porque sua trajetória algo acidentada levou-a a fazer escolhas que podem comprometer a pretensão de apresentar-se como candidata alternativa. A começar por sua filiação ao PSB, problemática para dizer o mínimo: é amplamente conhecido que seu projeto partidário, a Rede Sustentabilidade, continua de pé, e é uma posição oficial de suas lideranças que a filiação aos “socialistas” é apenas transitória. Além da urgência oportunista de quem não pode esperar mais quatro anos para lançar-se à frente de seu partido e defendendo um projeto próprio e original, o PSB vive a situação algo esquizofrênica de franquear uma candidatura que, talvez, abandone o partido depois de e se eleita.

Além disso, a crescente exposição nos futuros embates eleitorais colocará Marina Silva diante da tarefa de se posicionar, de maneira mais firme e transparente, frente a temas sobre os quais sempre tangenciou, na melhor das hipóteses. Os eleitores precisam saber – embora a maioria aparentemente não se importe muito com isso – o que uma candidata com chances reais de vir a ser presidenta pelos próximos quatro anos pensa, e quais políticas pretende implementar caso eleita, sobre temas como educação, saúde, violência e segurança pública, direitos humanos, laicidade do Estado, política externa, dívida pública, privatizações, desenvolvimento sustentável, política econômica etc... Em parte por sua posição coadjuvante, Marina Silva sempre passou ao largo desses temas. Agora não dá mais.

MUITAS PERGUNTAS – E talvez resida aí, nessa necessidade de exposição, o principal risco a comprometer o “fator Marina”. Porque do pouco que se sabe, o que se depreende são posicionamentos frágeis e ambíguos sobre temas importantes: como Marina Silva, uma vez presidenta, lidará, por exemplo, com o desmatamento, tema caro aos ecologistas, tendo como vice um dos principais representantes do agronegócio no Congresso Nacional? Quais serão as alianças que pretende firmar para assegurar a governabilidade, já que a atual, capitaneada por PSB e PPS, parece não ser sólida o suficiente para governar sem o recurso aquelas mesmas concessões que ajudaram a comprometer irremediavelmente parte do projeto petista? Sendo o PPS um partido que nos últimos anos viveu à sombra do PSDB, aliado de todas as horas do DEM, teríamos em um eventual governo Marina Silva a volta de setores da direita hoje na oposição?

A trajetória de Marina está diretamente ligada às demandas ecológicas, e uma das razões de sua ruptura com o governo petista foi, justamente, sua posição minoritária como ministra do Meio Ambiente frente ao incremento da política neodesenvolvimentista da então ministra Dilma Rousseff. Como ela pretende conciliar estes interesses com os da retomada da produção e do crescimento industriais? Ela manterá a promessa, feita por Eduardo Campos, do passe livre nacional para estudantes? No passado recente, a então senadora defendeu Marco Feliciano quando este, à frente da Comissão de Direitos Humanos, foi duramente criticado por ativistas principalmente do movimento LGBT. Evangélica e sabidamente contrária ao casamento homoparental, Marina destravará a pauta dos direitos humanos e das minorias ou permanecerá arredia frente à necessária e urgente laicidade do Estado? Há muitas incógnitas. Não sei se Marina Silva tem condições ou pretende responder a todas elas. Pessoalmente, duvido.

Porque apesar do momento particularmente agudo em que foi alçada à condição de presidenciável, e da intenção de apresentar-se como a “terceira via”, acredito que parte da novidade que ela pretende representar advém, justamente, da ausência de novidade: seja por seu percurso político mais recente; pelas alianças já forjadas para assegurar sua candidatura; pelas posições ambíguas e mesmo vacilantes sobre temas controversos, entre outras coisas, Marina Silva é incapaz de extrapolar os limites de uma candidatura convencional – no que segue, aliás, o caminho já trilhado por Eduardo Campos – e sua presença nestas eleições está bem ao gosto de eleitores que, para tudo mudar, não pretendem mudar absolutamente nada. Na prática a teoria é outra, e Marina Silva é só mais do mesmo.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Cão Tarado


Nós, bolsonarinhos

Imagem: Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
POR FELIPE SILVEIRA

Tive uma das experiências mais fascinantes da minha vida na semana passada, quando passei dois dias com cerca de vinte detentas do Presídio Regional de Joinville, durante o 6º Seminário de Gestão Prisional, Segurança Pública e Cidadania. Eu estava a trabalho.

Foram momentos de intenso aprendizado e de oscilação das emoções. Uma tristeza imensa que se faz presente naquele lugar era quebrada por alguns momentos de alegria, descontração e confraternização. Elementos, creio, que funcionam como escape para enfrentar aquela dura realidade.

O seminário, que ocorreu em um hotel da região central, foi transmitido ao vivo para o complexo prisional. Minha tarefa era acompanhar o seminário com as internas, organizando a participação delas no evento.

Entre uma palestra e outra, ouvi dezenas de histórias, que, somadas às falas dos palestrantes, me deixavam chocado e com vergonha por não fazer nada para mudar essa realidade do sistema prisional.

Um sistema que desrespeita a lei de execução penal em inúmeros aspectos e afronta a dignidade da pessoa humana de maneira absurda. Que coloca vidas em risco cotidianamente. Que não presta assistência médica necessária, deixando que doenças se agravem de maneira irreversível. Que mantém crianças longe das suas mães e sem amparo algum. Que prende e mantém presos injustamente. Que aumenta a pressão sobre agentes penitenciários. Que dificulta e não respeita as visitas. Que não dá satisfação a ninguém.

E não dá satisfação porque a sociedade não se interessa. Qualquer um que se aproxime minimamente do sistema prisional vai perceber e reconhecer os problemas apontados aqui e muitos outros. Qualquer um que não seja um verme fascista, é claro.

Execução penal no Brasil é uma terra sem lei”, afirmou o advogado criminalista Leandro Gornicki, durante um painel da OAB-SC realizado recentemente. E eu trago o link pra cá apenas para engrossar a reflexão. Uma reflexão que nem discute quem estamos prendendo. Negros, pobres, crianças...
 
Parte dessa discussão pode ser encontrada neste link, em uma entrevista com o juiz de execução penal de Joinville, João Marcos Buch, que tem enfrentado o sistema (por dentro) diariamente. Desde que assumiu a função, o juiz busca solucionar os problemas. Dessa maneira, e com resultados objetivos e subjetivos, conquistou o respeito dos detentos e da sociedade.

Mas o juiz é um só. Os defensores públicos nem existiam em SC até pouco tempo, e hoje estão longe do número ideal. Os ativistas são poucos. Fundamentais, mas poucos.

Tudo isso poderia ser diferente. Se não fôssemos um bando de bolsonarinhos tão preocupados com as nossas panças e cartões de crédito. Mas somos.

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Marina Silva tem cacife para vencer?

Foto que circula na internet
POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Qual é a margem de erro de uma pesquisa de opinião pública feita quando o velório ainda nem acabou? Não vou fazer contas – é coisa para os especialistas -, mas todos sabemos que os fatores emocionais interferem nas respostas dos eleitores. E a comoção nacional pela morte de Eduardo Campos produziu um efeito instantâneo: alçou Marina Silva para o segundo lugar nas preferências do eleitorado, com 21% das intenções de voto.

Então, qual é a validade da pesquisa? Ora, é um bom método para tomar a temperatura política num momento específico, em que a memória do acidente ainda está fresca. Mas nos próximos dias, assim que esse clima de consternação passar (e, acreditem, passa rápido) a tarefa de Marina Silva começará a ficar difícil, caso o seu nome venha a ser confirmado pelo PSB, como tudo indica que será.

Vamos começar pelo óbvio. Marina Silva é problema de Aécio Neves. A correr o risco de não ir para o segundo turno, o candidato do PSDB vai gastar o seu tempo (inclusive os seus preciosos minutos de televisão) a atacar a ex-senadora. Aliás, os inomináveis chiens de garde aecistas já começaram a disparar sobre a adversária, como pudemos acompanhar em textos publicados ontem nos lugares do costume. É esperar para ver até que ponto a imagem de Marina Silva resiste.

Outro aspecto importante é a imagem da candidata. Marina Silva pode ser alternativa para um voto de protesto, mas não tem estatura para ser presidente de um país tão complexo como o Brasil. De fato, ela é desprovida de conteúdo e cheia de contradições, fato que não escapará aos eleitores. Aliás, tenho a intuição de que quando começar a falar, Marina Silva só tem a perder porque vai revelar as suas fragilidades. E vai dar munição para os adversários.

Exemplo? Mesmo que fruto de um acaso, aparecer a sorrir ao lado do caixão de Eduardo Campos é um azar colossal. A imagem pode atrapalhar as suas pretensões. E vou explicar, para que fique claro: não acredito que ela estivesse em regozijo, mas a imagem é um prato feito para os assessores de qualquer dos outros candidatos. Nada os impede de usar a foto ad nauseum como forma de atacar a sua imagem e estancar o crescimento da candidatura.

A foto tem uma história plausível – até já houve uma explicação – e é óbvio que a ex-senadora não estava feliz. No entanto, há um fato em política: boa parte dos eleitores não entende a complexidade do cargo de presidente, mas entende a simplicidade de um sorriso (que parece matreiro) numa foto. Pessoalmente, lamentaria que ele fosse alijada do processo por causa de uma foto (que ilustra este texto), mas quem está na chuva é para se queimar...

Marina Silva tem fragilidades que ganharão evidência quando ela puser a candidatura na rua. Não vamos esquecer que ela é acusada de ser contumaz em roer a corda dos seus parceiros políticos, o que cria uma imagem pouco aceitável. Ou seja, ela pode até dar uma embolada na disputa, mas com o tempo as suas deficiências irão ficar tão indisfarçáveis que muita gente ainda vai achar Aécio Neves um candidato aceitável.

Enfim, essa conversa de reinício do processo eleitoral, como se tudo fosse recomeçar do zero, é apenas o desejo de alguns. Porque com o andar da carroça as melancias se ajeitam. 


É como diz o velho deitado: “previsões só no final”.

P.S. Este texto foi escrito antes da entrevista de Dilma Rousseff ao JN. Tendo corrido bem ou mal (as opiniões divergem), é provável que a entrevista nada vá alterar nas intenções de voto.

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Suicídio eleitoral [1]

POR JORDI CASTAN


Não é segredo que a política e o bom senso não andam de mãos dadas. Tanto é assim que quando alguém diz “é uma decisão política”, todos entendemos imediatamente, sem necessidade de maiores esclarecimentos, que será uma decisão que não segue a lógica ou o senso comum.

Assim não deve causar estranheza que em alguns dicionários em breve possa aparecer “decisão política” como sinônimo de burrice, estupidez, estultícia ou má fé. No mesmo sentido poderíamos falar de chamada “vontade política”, que pode ser interpretada também como sinônimo de “porque sim” ou “porque eu quero”, nas suas versões mais comedidas.

Joinville tem uma pobre representação política. E não é de hoje. A sua pobreza é dupla: uma pelo número de representantes, que já foi pior, e também pela péssima qualidade dos nossos deputados. É difícil poder se sentir representado por qualquer dos nossos deputados estaduais. E no caso dos federais a situação não é melhor. Se alguém acreditava que agora teria possibilidade de mudar alguma coisa, minha sugestão é que podem tirar o pônei do sereno, porque nada deve mudar.

A matemática partidária funciona numa lógica estranha e o resultado é que mais serão menos. Quantos mais candidatos se lancem, menos possibilidades de eleger algum e, pior, mais chances de reeleger esses que aí estão. Que gente que nem se elegeria sindico de prédio - e olha que é fácil se eleger síndico na maioria dos prédios -, se lança a aventura de querer se eleger deputado estadual, alguma coisa está errada.

Tem casos de candidatos que na eleição municipal não tiveram votos nem para ser vigésimo segundo suplente de um partido que não elegeu nenhum vereador e agora se lançam numa campanha para se eleger deputado. Será que alguém toma estes nomes seriamente? E se objetivamente não têm nenhuma possibilidade, porque se lançam? O que está por trás destas candidaturas natimortas?


Não tenho bola de cristal, mas o bom senso diz que dos 40 candidatos a deputado estadual com domicilio eleitoral em Joinville, com “sorte” elegeremos três. Como não há nada tão ruim que não possa piorar, o mais provável é que sejam os mesmos três que já temos hoje . Para deputado federal, dos 21 candidatos da cidade, dificilmente elegeremos três. O mais provável é que sejam só dois e nenhum de novo chegue a se eleger.

Assim devemos continuar sendo representados por essa casta de políticos profissionais, que sem competência para se estabelecer profissionalmente, encontram na política o caminho para fazer fortuna. As declarações de bens, de gente que nunca tem ganhado um único centavo com o resultado do seu trabalho e do seu esforço, são um estímulo para que a cada eleição nuvens de novos candidatos se aventurem na busca do dinheiro fácil e do prazer de dispor do dinheiro dos outros.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

O caso UFSC Joinville é a maior vergonha desta cidade

POR CHARLES HENRIQUE VOOS

Não há, em minha curta memória de vida, algum outro caso tão pitoresco e lastimável como o caso da UFSC Joinville. Acompanho esta situação há anos, e, infelizmente, nunca pude falar ou escrever sequer uma coisa positiva sobre este tema. A última notícia veiculada é de que as obras ficarão prontas só em 2016. Ou seja: quase nove anos para construção e instalação de uma extensão de campus universitário, com apenas um curso. É, definitivamente, a maior vergonha de Joinville, pelo menos no começo deste terceiro milênio.

O projeto, diga-se de passagem, já começou muito errado. Além da localização do terreno na curva do arroz ser péssimo em vários aspectos, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou a venda do terreno como abusiva, pois estaria muito acima do valor de mercado. Na mesma ação, o órgão alegou que a escolha dos cursos havia acontecido de forma unilateral para atender as demandas dos empresários locais, e não da sociedade joinvilense como um todo (já escrevemos muito sobre isso aqui no Chuva, nos jornais locais e na audiência pública que a Câmara de Vereadores fez em 2009). Enquanto a necessidade da cidade é por cursos na área de humanas, biomédicas e sociais aplicadas, temos mais engenharias "goela abaixo".

O segundo erro, ao meu ver, foi o de deixar o projeto a cargo da UFSC ao invés de torná-lo independente, com a criação de uma nova Universidade Federal. O exemplo da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) explica muito bem, pois, neste caso, a UFSC foi a organizadora do processo de criação da nova Universidade, mas a autonomia da nova instituição agilizou - e muito - o processo. Todos os campi da UFFS operam atualmente com uma grande diversidade de cursos. E tudo isto aconteceu no meio tempo entre o lançamento da pedra fundamental da UFSC Joinville e o dia de hoje. Para piorar, a UFSC parece não fazer esforço algum para que o campus de Joinville saia do papel, e se contenta com aulas improvisadas em espaços alugados (começou na Univille, depois foi para o antigo elefante branco Shopping América e agora está na Rua Prudente de Moraes). Alunos irão se formar sem nunca ter pisado no prédio da curva do arroz. No mínimo, lúgubre.

Por fim, é espantosa a omissão da classe política local neste assunto. Dificilmente vi, nestes anos de militância na questão, algum deputado (federal ou estadual) cobrar agilidade no processo, ou investigar o porquê disto estar acontecendo em Joinville. Nenhum senador. Três prefeitos diferentes e nada. Nem a própria ACIJ, tão interessada na instalação de mais cursos de engenharia em Joinville (fez um lobby enorme para tal fim), faz declarações firmes pedindo maior cuidado com a UFSC Joinville.

Além de ser vergonhoso, estamos falando do perfeito retrato de como a educação pública superior é tratada em Joinville: sempre no segundo escalão, longe das pautas principais, pois o que importa nesta cidade não é a construção do conhecimento, do debate, da crítica, do desenvolvimento social através da educação. O que importa nas terras da Dona Francisca é o trabalho, a reprodução massiva de moldes sociais, o discurso acéfalo, vazio.

Vazio como o meu sentimento de esperança sobre a breve mudança desta situação.


quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Eduardo Campos: para além do ódio internético, que rumo toma a disputa eleitoral?

 POR CAROLINA PETERS

Pesquisa Datafolha registrada em 13/08/2014
Não dá nem tempo do corpo esfriar. Pauta se manipula quente. A Globo ainda enrolava a audiência para liberar a informação da morte do presidenciável Eduardo Campos quando na CNN analistas já palpitavam sobre a entrada de Marina Silva no pleito e os impactos do acidente na corrida presidencial. Nem o Datafolha perdeu tempo. Na noite de ontem, já estava no site do TSE o registro de uma pesquisa que será realizada por telefone no dia de hoje com Marina candidata, e uma pergunta bônus: qual caminho você acha que o PSB deve tomar.

Dessas coisas que não é na primeira manchete na timeline do facebook que a gente acredita. E no dia da morte do avô, Miguel Arraes?! Dá pano pra manga dos conspiracionistas!

Dos conspiracionistas, e da gente sem noção. Toda sorte de pseudojornalistas e comentaristas das redes sociais e canais de notícias. Sempre tem o homem que viu e emocionado quer contar em rede nacional dos corpos dilacerados, carbonizados, com todos os detalhes que o repórter permite. E sempre uma senhorinha assustada. Neste episódio, conhecemos a simpática D. Roseli, moradora de Santos, que pensou estar presenciando o fim do mundo ao ver a aeronave em chamas planar próxima à sua janela:

“Meu Deus, mais um desses meteoros!”

“Depois de morto, todo mundo vira santo”, sempre diz papai. As demais candidaturas pausaram suas campanhas em luto, mas o meteoro de Eduardo Campos cai em cheio no horário político, que se inicia na próxima semana. E o bode logo estará nas salas de estar dos brasileiros.

É com o início da propaganda televisiva que o bicho pega. As alianças fisiológicas entre legendas para aumentar seu tempo de propaganda não acontecem sem um cálculo eleitoral apurado. Apesar do avanço dos smartphones e da grande presença dos brasileiros no facebook, a televisão é ainda a principal fonte de informação durante a campanha e decisiva para a escolha do voto da maioria dos brasileiros.

A chapa Eduardo-Marina foi capaz de um programa econômico mais liberal que o tucano, que ainda pisa em ovos e se rebola para manter sua base nos setores médios enquanto tenta ganhar o voto das famílias mais pobres (renda familiar mensal de até 5 salários mínimos), as quais ainda têm presente a lembrança pesarosa dos anos FHC, e que sempre foram, por sua extensão, o setor decisivo no resultado da disputa do Planalto. Será Aécio mais agressivo, afim de ganhar os antigos simpatizantes do partido que optaram nessas eleições por Campos, mas não se convencem do discurso um tanto etéreo de Marina Silva? Dilma será capaz de levantar essa bola e buscar bloquear Marina Silva e seu discurso “novo”, o mais do mesmo que Dilma já administra bem, quiçá um tanto piorando? E a esquerda, em particular a candidatura de Luciana Genro, será suficientemente incisiva e cirúrgica para ganhar a confiança deste eleitorado fragilizado pela tragédia que busca uma alternativa viável, ao mesmo tempo em que traz à baila o finado aliado de Marina para disputar um voto progressista que não se transferiria para Eduardo Campos? (Bem, já estou supondo e aceitando que Marina substitua Eduardo na disputa.) Valerá o ditado latino "dos mortos não se fala"?

Emfim, é sempre desejável, mas será possível, agora mais que há uma semana, uma eleição presidencial em que a Política e os projetos de desenvolvimento para o país, voltem a dar a tônica do debate? Digo, acima dos malabarismos feitos com a política de varejo (e talvez agora, cruelmente com o luto alheio) para ganhar um ou outro setor. Será?

Mas tudo isso é especulação. O que sobra de certeza é que a luta política nunca pode nos tirar a humanidade, que todo acidente é lamentável e não se justifica desejar a morte aleatória de um outro alguém. Cada família e amigo dos envolvidos no acidente, os pilotos, passageiros, moradores e transeuntes, sabe a dor que sente por sua perda.

ERRATA: A pesquisa citada foi registrada pelo instituto Datafolha, não IBOPE, como anteriormente mencionado.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Dilma, Leitão e o fait-divers


POR JOSÉ ANTÓNIO BAÇO

Os brasileiros sabem que dois mais dois são quatro. Mas muitos se recusam a fazer a conta. Só por isso tem gente aí a acreditar na existência de um Wikigate Tupiniquim, por causa das alterações no perfil da jornalista Miriam Leitão na Wikipédia. Ora, qualquer pessoa com dois dedos de testa é capaz de perceber que estamos a tratar de um fait-divers e nunca uma notícia a sério.

Há uma tentativa de implicar Dilma Rousseff no episódio, uma vez que o IP usado é do Palácio do Planalto. Aliás, foi o que bastou para os opositores – aqueles que odeiam o partido da presidente acima de qualquer coisa – se lançassem sobre o osso. Afirmam, com a convicção dos incautos, que o autor das alterações no perfil só pode ser alguém a serviço de Dilma Rousseff. Mas vamos ao que interessa. E basta somar dois mais dois...

1.     O que a presidente ganharia com a mudança no perfil da jornalista?
Nada. Não haveria consequência prática, uma vez que a mudança não teria como produzir qualquer efeito, seja na governação ou na disputa das eleições.

2.     Que pessoas poderiam ser influenciadas por essas alterações?
Arrisco a dizer que nenhuma. Ou vocês, leitor e leitora, conhecem alguém que já tenha ido à Wikipédia de propósito para pesquisar sobre Miriam Leitão? Aliás, a própria jornalista não deve ir lá com muita frequência, porque as alterações foram produzidas em maio de 2013 e só agora ela parece ter dado conta da coisa, por causa de uma matéria publicada no “O Globo”.

3.     O IP é do Palácio do Planalto?
Sim, mas o Palácio do Planalto afirma não ter meios de saber quem usou a rede, que está aberta aos visitantes. Quem viaja e fica em hotéis, por exemplo, sabe como funciona a coisa do wireless.

4.     Na suposição de que a ideia tenha vindo de alguém do governo, é sensato achar que um hacker deixaria rastro?
Ora, o que faz um hacker ser hacker é justamente o fato de não poder ser identificado. Será que alguém do partido da presidente iria contratar um hacker que deixa impressões digitais no local do crime? Seria muita aselhice, convenhamos.

5.     Faz sentido “difamar” Miriam Leitão, conforme está a ser alegado?
A palavra difamação parece ser forte demais. Depois da notícia decidi dar uma olhada no perfil. Talvez alguém tenha feito um contraponto ao perfil. Porque a "biografia" só pode ter sido escrita por alguém que, não tarda, ainda pede a beatificação da senhora. Ela é apresentada apenas como “a jornalista mais completa do país”. Tudo o que aparece por lá são elogios. Ninguém cita, por exemplo, que o pessoal da oposição chama Miriam Leitão pelo carinhoso apelido de “urubóloga”, por conta das suas previsões sempre catastrofistas (e, não raro, furadas).

Ah... muita gente ainda não sabe que a Wikipédia é um espaço participativo e aberto onde é possível mudar os textos. Não é crime mudar os conteúdos. Enfim, os opositores queriam um escândalo, mas estão a ter apenas um fait-divers. E aqui o governo tem culpa. Se tivesse dado a pouca atenção que o tema merece, eu talvez não teria escrito este texto hoje.


É como diz o velho deitado: “A montanha pariu um rato”.